PROJETO DE PESQUISA (exemplo 1)

O LIBERALISMO RELIGIOSO DE RUI BARBOSA
Projeto de Pesquisa

Por
Israel Belo de Azevedo

Projeto apresentado ao Programa de Doutorado em Filosofia da Universidade Gama Filho.

Rio de Janeiro
1987

Posso não orar em Lourdes, mas Lourdes não me separa da humanidade.
(OC XX:1, p. 40)

Cumpre, (…) que os adoradores do Deus em espírito e verdade cinjam os rins para a defesa da liberdade e da consciência; porque uma e outra são eternas. Essa usurpação tenebrosa há de passar. Negreja-lhe na fronte, na púrpura da sua realeza, o sinal da besta, os dogmas blasfemos; e o motor que a anima, é o gênio perecedouro da dominação mundana, (…) e que (…) se lhe descobre, ex-fructibus, nas suas obras de iniqüidade, podridão e morte.
O Papa e o Concílio, p. 116)

A doutrina que o catolicismo ultramontano professa, e cuja rejeição constitui uma heresia monstruosa, incomparável com a felicidade eterna, é que a igreja é a lei, o estado a força; a igreja o direito, o estado a dependência; a igreja a cabeça, o estado o braço; a igreja a inspiração divina infalível e imutável, o estado a cegueira animal, caduca e inevitavelmente serva.
(O Papa e o Concílio, p. 135)

Tudo quanto, no catolicismo, era puro, divino, singelamente sublime; tudo quanto propendia a estabelecer essa união interior do homem com Deus, que é a essência do culto cristão, obliterou-se ou proscreveu-se. O que ficou é uma simbólica sem alma e sem verdade, pasto à credulidade supersticiosa das classes ignorantes e manto ao ceticismo dissimulado e calculista da minoria ilustrada.

(O Papa e o Concílio, p. 198)

SUMÁRIO

1. O ASSUNTO
1.1. Delimitação
1.2. Justificativa
1.3. Síntese tentativa da visão religiosa de Rui

2. PROCEDIMENTOS
2.1. Fontes
2.2. Problemas e hipóteses

3. CRONOGRAMA

4. PLANO PRELIMINAR

5. OBRAS CONSULTADAS

ABREVIATURAS
RB = Rui Barbosa
OC = Obras Completas de Rui Barbosa
NDC= Novos discursos e Conferências, organizados por Herculano Pires

1. O ASSUNTO
Um estudo sobre a natureza do pensamento religioso de Rui Barbosa (1849-1923)
1.1. Delimitação
Para entender a posição religiosa de Rui como um todo, será necessário organizar-se a investigação em torno de três eixos: no primeiro, levantando as matrizes do seu pensamento e a sua sincronia com o tempo-espírito brasileiro; no segundo, desvelando-lhe e sistematizando-lhe a teologia (ou seja: suas concepções dogmático-doutrinárias); e no terceiro, acompanhando-lhe e organizando-lhe a sua leitura da função emissão real e ideal do Cristianismo.

1.2. Justificativa
Razão teve Miguel Reale em lamentar, em relação a Rui Barbosa, o fato de continuarem “na sombra” tanto as suas “concepções filosóficas” como o “processo condicionante de sua evolução espiritual em fase do universo e da vida”. Este desinteresse pode ter sido produzido por três fatores, não necessariamente excludentes e nem nesta ordem hierarquizados. De um lado, os reducionismos de nossa cultura, inspirados por nossos atavismos positivistas, têm determinado a primazia do econômico e do político como fatores modais na historiografia brasileira das idéias. Por outro lado, o anti-ruismo da Igreja Católica no Brasil, diante da heterodoxia (própria de um liberal doutrinário) e do anti-erastianismo do pensador bahiano provocaram a sua estigmatização.
Ora, o estudo acadêmico da filosofia no Brasil, assim nos parece, vem sendo feito ou por pensadores cujos desiderata se centram no econômico-político ou por pesquisadores católicos (ou ex-católicos). Para ambos, Rui não é um bom objeto de estudo. Para aqueles, porque não pensou economicamente o Brasil (conquanto tivesse sido um Ministro da Fazenda republicana) e o seu liberalismo político se evidenciou um tanto tardio. Para estes, porque se aproximou de uma perspectiva religiosa um pouco destoante do catolicismo vigente.
Não fora estes aspectos, um terceiro, representado pela copiosíssima produção do jurisconsulto, tem afastado aqueles estudiosos preferidores de objetos mais facilmente manuseáveis.
E Rui tem ficado de fora. Por puro preconceito, soa-nos. Assim, por exemplo, a mais respeitada história da filosofia brasileira, escrita por Antonio Paim, simplesmente ignora a “Águia de Haia” como filósofo. E nisto Paim não está sozinho: antes, faz o coro da regra.
Longe desses atavismos, para nós estéreis, esperamos, ao descrever o liberalismo religioso de Rui Barbosa através dos seus escritos (discursos e ensaios) acerca do problema, contribuir para resgatar parte do pensamento deste filósofo, por entendê-lo absolutamente essencial para a compreensão da meditação brasileira.
A geração de Rui Barbosa se perguntou intensamente acerca da religião, em função dos combates travados no seu tempo.
Na Europa, contrapunham-se duas perspectivas: de um lado, a crença no progresso como regenerador da sociedade, encontrada em países deformação protestante (Alemanha e Inglaterra, especialmente) mas também influenciada pela Weltaanschaung deístico-ateística em função das brechas abertas pela ilustração nas veias do corpus christianorum; de outro, a luta católico-romana pela permanência dos valores tradicionais, mesmo que opostos à vertigem do progresso tecno-científico.
Em torno destas questões, as lutas não estiveram sempre apenas no domínio das idéias, mas acabaram se tornando delicados problemas políticos, como ocorreu particularmente no Brasil, em função da chamada “Questão Religiosa” (ou “Questão dos bispos”), ocorrida sob a égide do regalismo.
Para Rui, em linhas gerais, no conflito entre o episcopado brasileiro e o poder executivo, o que estava em jogo era “a existência, a autonomia, a supremacia terrena do Estado”. Ademais, mesmo por razões financeiras, fazia-se necessário por-se um fim aos “laços de um oficialismo opressivo”. O medo da Igreja Católica era da civilização mesma, da “independência do pensamento individual”, da “precedência temporal do Estado na administração da sociedade visível”.
É na intensidade deste calor (abrasado com o decreto da infalibilidade papal, do mesmo Pio IX, de 1870) que o Brasil moderno começou a se fazer, deste fazimento tomando parte visões como o positivismo, a maçonaria, o catolicismo “liberal”, o catolicismo “ultramontano” e, marginalmente, o protestantismo. A questão era saber que modelo seguir: o anglo-norte-americano, de formação protestante, ou o francês, de mentalidade a-religiosa, ou o ibero-americano, de cunhagem católica?
Católico por formação e por convicção, Rui Barbosa entrou na discussão porque queria um Brasil novo.

1.3. Síntese tentativa da visão religiosa de Rui
Numa época marcada pelo sorriso do progresso e pela segurança da autoridade, o caminho do abandono da fé pareceu mais largo há muitos. Não foi o caso de Rui, conquanto a campanha travada contra ele quisesse fazer crê-lo.
Rui se dizia, sempre se disse, um crente. Educado na leitura do Novo Testamento, enfrentou sua grande crise religiosa na juventude com a morte de sua mãe (1867), como ele mesmo o narraria dois anos depois. Em busca de respostas, iludiu-se “com os panegíricos com que a razão humana tem endeusado a si mesma”. Então, julgou que a inteligência fosse “onipotente e absoluta”:
Muitas vezes esperei descobrir nos recessos da ciência (…) a chave para os arcanos do universo, o alimento são, completo e abundante para o espírito, o bálsamo genuíno para as mágoas do coração. Deus, pois, estendeu o seu braço para mim e crestou a flor do meu orgulho. Então, achei os livros mudos, a razão muda e a filosofia estéril. Chorei e abracei-me à cruz. Foi a fé que me salvou.

Esta experiência com o Deus dos seus pais marcou-o para o resto da vida, contribuindo para que ele jamais viesse a romper com a Igreja Católica. Assim, mesmo que, junto com sua geração, blasfemasse, esses momentos passaram “sempre como rápidas tempestades”: “Quando elas se agitavam, o horizonte do mistério eterno me reaparecia como eu o vira no coração dos meus pais”.
Por esta razão, já velho, pôde dizer que, embora a fé lhe houvesse “fraqueado muitas vezes”, nunca se sentiu “constrangido em professar” o catolicismo. “Católico, no entanto, associei sempre à religião a liberdade”, batendo-se sempre pela liberdade religiosa.
Sua confissão de fé está já no último parágrafo, recheado de 14 citações do Novo Testamento tiradas da Vulgata, de sua introdução a “O Papa e o Concílio”:
Religião não de “fábulas ineptas e senis”; não de praxes farisaicas e sensualistas; não sepultada no mistério de uma língua morta; não ao desses pseudo-apóstolos, do paganismo infalibilista, caluniadores do evangelho, pregadores hipócritas e mentirosos da opressão sacerdotal, com a boca cheia de Deus e a consciência cauterizada de interesses mundanos; não a das diatribes no púlpito, na imprensa, nas pastorais, nas letras apostólicas; não a do ódio, da cisão entre os homens, da desconfiança no lar doméstico, da separação entre os mortos, do privilégio, do amordaçamento das almas, da tortura, da ignorância, da indigência do espírito e no corpo, do cativeiro moral e social; mas a do “homem novo”, renascido sob a cruz; do espírito que vivifica, e não da letra, que mata; da comunicação interior entre o coração e Deus; da caridade e brandura para com todos os homens; religião de luz, que se alimenta de luz, e que na luz se desenvolve; religião cujo pontífice é o Cristo; religião de igualdade, fraternidade, justiça e paz; religião em cujas entranhas formou-se a civilização moderna, em cujos seios sugou o leite de suas liberdades e de sua instituições, e à cuja sombra amadurecerá e frutificará a sua virilidade; religião de tudo quanto o ultramontanismo nega, amaldiçoa e inferna. Por ela o altar algum dia, e não longe, não será mais uma especulação; por ela as consciências não terão mais contar quedar de si senão ao Onipotente; por ela todas as crenças serão iguais perante a lei, todas as convicções respeitáveis perante os homens. Em que pese ao Vaticano, aos partidos reatores, às transações políticas e às realezas impopulares.
Para ele, Deus é “a garantia suprema” da liberdade, por providenciar a regeneração moral da humanidade através do Cristianismo. Quanto mais vivia, mais convencido ficava de que “Deus superintende os negócios humanos”.
Por isso, não sabia conceber o homem sem Deus, “a necessidade das necessidades” nem antever “uma nação civilizada e atéia”.
A nacionalidade se urde com a fé, como acontece nos “celeiros do mundo”, fertilizados “com o suor dos povos crentes”, pois neles “a consciência domina todas as instituições e todos os interesses. A religião os fez livres, fortes e poderosos”.

Não há qualquer conflito entre esta defesa do valor do sentimento religioso com a crença no progresso cientifico. Rui distingue as funções da religião e da ciência. Ele, bêbado de ciência, absolutizou-a; nesta peregrinação, pôs “a ciência acima de todas as coisas”, sem negar, porém, a possibilidade de um encontro: “nunca encarei a ciência como sistematização do espírito”.

Não me acolhi entre as filosofias que fez da ciência a grande negação. Percorri as filosofias; mas nenhuma delas me saciou: não encontrei o repouso em nenhuma. (…) Vejo a ciência que afirma Deus; vejo a ciência que imprescinde de Deus. A mesma fé que nos arrasta das tribulações da fé ao exclusivismo científico, pode reconduzir-nos do radicalismo científico à placidez da fé.

A fé, de modo algum, enfraquece o indivíduo para a ciência. Pelo contrário, cinge “melhor os rins para os grandes estudos da realidade, iluminando-a do alto com esse clarão sereno, a que a ciência sobressai livre e magnífica na imensidade dos seus triunfos”.

A ciência, pois, em nada, ao contrário do que prega o Vaticano, prejudica o desenvolvimento intelectual do povo, “mediante a difusão das verdades positivas”. A ciência e o evangelho, em resumo, devem dar as mãos para nivelarem a face da terra, através da liberdade e da igualdade. E aí se chega ao cerne de sua visão apologética: o catolicismo romano conspira “contra a ciência e a consciência, entre a história e o evangelho, entre a liberdade e o progresso”. Rui era um católico. Seu catolicismo, porém, recusa a recusa católica ao progresso das nações e rejeita o dogmatismo e a superstição em que se transformara, segundo ele, o catolicismo “ultramontano”.

Isto fez com que, conforme seu próprio relato, os católicos lhe pedissem uma definição de sua fé, ao mesmo tempo em que “as confissões dissidentes e os livres pensadores” receassem seu catolicismo. “Nem de uma nem de outra parte há razão”, pois seu catolicismo deveria estar evidente, prática pessoal de fé que não o levaria de modo algum a abroquelar as minorias ou a sancionar o ateísmo.
Quanto à sua filiação à maçonaria, considerava-se um ”desgarrado”, tendo ficado apenas “um membro avulso e simples aprendiz”; por isto, “tanto direito tem a maçonaria de reclamar-me, quanto o ultramontanismo”. Rui, pois, era um católico. O seu brado não era contra Deus.

O deus das minhas indignações era o deus da idolatria e da opressão, o deus da hipocrisia e do obscurantismo, o deus da reação e da imobilidade, o deus das mundanidades e das ambições temporais.

Em outras palavras, disse ele no Asilo de Lourdes, em Feira de Santana: “Posso não orar em Lourdes; mas Lourdes não me separa da humanidade. Quando uma criancinha me reclina e abraça ao seio, não vou repulsá-la por causa dos amuletos”. Este posicionamento lhe trouxe, como recorda do exílio em Londres, uma “reputação de incredulidade, materialismo e ateísmo”, fruto de “especulações malignas de adversários sem escrúpulos”, em questões onde a sua atitude “era justamente o penhor mais claro da seriedade das minhas crenças morais”. No que ele se empenhou foi combater o “jesuitismo com o Evangelho, o exclusivismo religioso com a palavra de Cristo, o concílio do Vaticano com a história da igreja primitiva”.
Sua resposta a Affonso Celso foi clara: “Não me fiz cristão agora, porque nunca deixei de sê-lo”.

Fui eu, na minha ínfima humildade, convertido em inimigo de Deus, calúnia contra a qual protesta a minha vida, o lugar que teve sempre a religião na minha casa, nas minhas relações domésticas, na educação dos meus filhos, para não falar na estima com que me têm honrado tantos sacerdotes, católicos e protestantes. O púlpito ressoou, nos sertões e nas cidades, sob as apóstrofes mais violentas e as histórias mais inverossímeis contra o meu nome. Fui acusado de enxovalhar imagens, mantê-las em baixo da cama e estampá-las na sola dos meus sapatos. É a perversa história, a mesma história contra os espíritos liberais.

Com toda a paradoxalidade, Rui, no dizer de um de seus biógrafos, “como católico viveu, como católico procedeu, como católico morreu”. Seu, porém, era o catolicismo primitivo, evangélico, e não o farisaico, como se revela de sua Introdução a “O Papa e o Concílio”.
Certamente, esses epítetos ele o deve à sua própria proposta-símbolo: “o crente emancipado na igreja, a igreja livre no Estado, o Estado independente da igreja”. Se o Brasil se quisesse fazer, deveria se fazer assim.
A este ideário dedicou Rui sua vida, razão por que, conforme seu (quase) auto-epitáfio, “estremeceu a pátria, viveu no trabalho e não perdeu o ideal”. E neste ideal, uma luta ocupou um lugar de destaque: a luta contra o catolicismo ultra-montano, visto por ele como inimigo do progresso moral, político e econômico do Brasil, razão por que ele dizia que o problema religioso do Brasil era um problema político.

2. PROCEDIMENTOS
A pesquisa se organizará, a partir do exame das fontes, em torno de problemas a serem respondidos.

2.1. Fontes
Para compreender o itinerário de Rui Barbosa será necessário compulsar-se toda a sua produção, mesmo aquelas eminentemente políticas e jurídicas. Além disso, será imprescindível percorrer as obras que Rui citou nos seus trabalhos, em busca das influências que hauriu.
Nosso método de trabalho consistirá, então, neste particular, em ler superficialmente toda a obra de Rui (seguindo geralmente o cânon estabelecido pela Casa de Rui Barbosa, constante de 168 volumes), para rastrear aqueles textos que tragam subsídios para a compreensão do problema. Estabelecido este novo cânon específico, poder-se-á descrever o conteúdo do seu pensamento, para, em seguida, analisá-lo, à luz da meditação brasileira e à luz das matrizes em que bebeu suas visões.
Pelas primeiras leituras que se fizeram, a visão ruiana de religião pode ser encontrada, basicamente, nos seguintes trabalhos:

DATA TÍTULO FONTE
1865/71 Primeiros Trabalhos OC I:1
1876 A Igreja e o Estado (Discurso proferido no
Grande Oriente Unido do Brasil) NDC-HP
1877 Alexandre Herculano (Panegírico fúnebre) NDC-HP
1877 O Papa e o Concílio(Prefácio e Introdução) OC IV:1-2
1879 Discursos Parlamentares OC VI:1
1880 Discursos Parlamentares OC VII:1
1881 (Textos) Diversos OC VIII:1
1882 (Textos) Diversos OC IX:2
1883 Reforma do Ensino Primário OC X:1-4
1891 Constituição de 1891 OC XVII:1
1893 Discursos OC XX:1, 2
1895 Cartas da Inglaterra OC XXIII:1
1897 Discursos OC XXIV:1
1898 Artigos OC XXV:2
1899 Artigos OC XXVI:4
1903 Discurso… no Colégio Anchieta OC XXX:1
1910 Discursos Eleitorais OC XXXVII:1

Evidentemente, sua visão pipoca em inúmeros textos dos 50 volumes de sua vasta obra, como se pretende investigar.

2.2. Problemas e Hipóteses
Para percorrer estes volumes, a pesquisa em projeto procurará responder à seguinte pergunta básica:
— Em que consiste o liberalismo religioso de Rui Barbosa? (P0)
Em torno dessa, concebeu-se outras, corolárias:
— Em que matrizes se fundou o pensamento religioso de Rui e que relação mantém com o tempo brasileiro? (P1)
— Como Rui viu a função da religião numa sociedade em mudança? (P2)
— Qual o lugar específico do catolicismo romano nesta visão? (P3)
— Em que linhas se pode traçar o conteúdo da dogmática (teologia doutrinal) de Rui? (P4)
— Porque Rui continuou num Cristianismo católico que condenava, quando suas idéias o aproximavam de outro Cristianismo, mais evangélico? (P5)
— Há uma evolução na sua perspectiva religiosa (P6)?
A estas três perguntas oferecem-se as seguintes hipóteses:
— O liberalismo religioso de Rui consiste, fundamentalmente, na compreensão da democracia como sendo “a representação proporcional das minorias, o reconhecimento de que o direito, ainda que seja o de um indivíduo só, não pode sacrificar-se aos interesses, ainda que seja do povo inteiro; é a sagração da propriedade individual, da liberdade da palavra, da liberdade de imprensa, da liberdade de reunião, da liberdade de cultos, da liberdade de trabalho, da liberdade política”.
Por isto, seu catolicismo passava pelo crivo de um racionalismo moderado e de um tradicionalismo renascentista, no sentido que não seguiu os deístas alemães, na tarefa de depurar o catolicismo daquilo que não passasse pelo cânon da razão, e no projeto de recuperar o original do Cristianismo, recuperando-lhe a evangelicidade. (H0)
— Rui bebeu seu suco liberal-religioso de fontes diversas, nelas participando, atavicamente, suas experiências domésticas e, dialogicamente, suas leituras de autores diversos, mas especialmente dos liberais ingleses. (H1)
— A religião é vista por Rui como um componente indispensável da vida humana e, por inclusão, da nacionalidade, uma vez que Deus é percebido como a garantia da liberdade que preconizava. (H2)
— O catolicismo, legítimo para Rui, não é o ultramontano (isto é, o vigente ao seu tempo), mas o evangélico, sem infalibilidade papal e sem desvio da função eclesiástica (do espiritual para o temporal), porque um Cristianismo como católico brasileiro não era mais Cristianismo; antes, era “a mais flageladora de quantas gangrenas morais podem afligir uma sociedade. É pior que uma doutrina; é uma política, um partido, uma permanente solapa às instituições liberais”. (H3)
— Rui, conquanto não fosse teólogo, pensou, embora marginalmente, algumas questões teológicas, como a natureza e a ação de Deus na história (trinitologia e escatologia), a função da igreja (eclesiologia) e a prática cristã (ética e piedade), ausentes, porém, outros tópicos por não fazerem parte sequer de sua formação. (H4)
— Muito embora sua visão religiosa estivesse mais afinada a uma perspectiva protestante, Rui continuou católico pelo respeito a fé recebida do seus pais, pela extração dessa fé na cultura brasileira e pela incipiência do Cristianismo protestante que não chegou a representar para ele uma alternativa como o era o protestantismo inglês (anglicano), por exemplo. (H5)
— Conquanto tenham feito, no plano doméstico, concessões ao catolicismo vigente no Brasil, as suas posições, que poderiam ser tachadas de moderadamente liberais, permaneceram intactas, parecendo incorreta a interpretação de que teria deixado de ser católico de sua vida, para voltar a ele ao final dela. (H6)

3. CRONOGRAMA

ANO MESES ATIVIDADE
COLETA DE DADOS
1987 06-08 Rastreamento das obras
1987 09 Xerox (e/ou aquisição) de textos pertinentes
1987 10-12 Registro do conteúdo

ANÁLISE DOS DADOS
1988 01-02 Sistematização do material
1988 03-06 Interpretação dos dados, conforme categorias estabelecidas
1988 06 Elaboração do plano preliminar definitivo

REDAÇÃO
1988 07-08 Primeira redação
1988 09 Segunda redação

EDITORAÇÃO
1988 10 Primeira digitação
1988 11 Segunda digitação
1988 12 Copiagem
1988 12 Encadernação

4. PLANO PRELIMINAR

1. INTRODUÇÃO

2. CORRENTES FILOSÓFICAS NO BRASIL DO SÉCULO XIX
2.1. A herança colonial
2.2. Os liberalismos
2.3. Os positivismos
2.4. Outros (pequenos) caminhos
2.5. O que se lia no século XIX

3. SER CRISTÃO NO BRASIL IMPERIAL
3.1. O problema da crença e da incredulidade
3.2. Formas do catolicismo tradicional
3.3. Formas do catolicismo (que se queria) moderno
3.4. Ser cristão sem ser católico
3.4.1. O catolicismo dissidente
3.4.2. Os protestantismos

4. IGREJA E ESTADO NA PASSAGEM DO IMPÉRIO
4.1. O regalismo
4.2. A questão religiosa
4.3. A solução de compromisso
4.4. As propostas de solução ao impasse
4.5. A prática republicana

5. O PROGRAMA DE RUI
5.1. A função da religião
5.1.1. Função ideal
5.1.2. Função real
5.2. Perfil da Igreja Católica
5.2.1. Catolicismo romano internacional
5.2.2. Catolicismo romano brasileiro

6. A TEOLOGIA DE RUI
6.1. Piedade pessoal
6.2. Filosofia da história (escatologia)
6.3. O lugar de Deus (trinitologia)
6.4. Outros aspectos

7. AS FONTES RELIGIOSAS DE RUI
7.1. As leituras filosóficas
7.1.1. Os ingleses
7.1.2. Os norte-americanos
7.1.3. Os franceses
7.1.4. Os italianos
7.2. As leituras teológicas
7.3. O uso dessas fontes por outros brasileiros

8. A COERÊNCIA DO TEMPO
8.1. Os compromissos religiosos
8.1.1. Formação de Rui
8.1.2. Juventude
8.1.3. Maturidade
8.1.4. Provectude
8.2. A religião como fonte
8.3. O catolicidade permanente
8.4. O protestante que não foi

9. CONCLUSÃO

10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

5. OBRAS CONSULTADAS (PARA A ELABORAÇÃO DESTE PROJETO)

BARBOSA, Rui. Obras Completas. Rio de Janeiro: MEC/Casa de Rui Barbosa, 1940- . 50 tomos.
BETTENSON, H. Documentos da igreja cristã. São Paulo: ASTE, 1967. 370p.
PAIM, Antonio. História das idéias filosóficas no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Convivio/INL, 1984. 615p.
PEREIRA, Baptista. Diretrizes de Rui Barbosa. São Paulo: Nacional, 1938. 284p.
REALE, Miguel. Posição de Rui Barbosa no mundo da filosofia. Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 1949. 42p.
SALDANHA, Nelson. Rui Barbosa e o bacharelismo liberal. Em: CRIPPA, Adolpho, ed. As idéias políticas no Brasil. São Paulo: Convivio, 1979, p. 94-122.
VIANNA FILHO, Luiz. A vida de Rui Barbosa. 2a. ed. São Paulo: Nacional, 1952. 446p.

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O PRAZER DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA

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