CELEBRANDO O CORDEIRO
Apocalipse 5
1
Para nós, a figura do cordeiro representa muito pouco, num contexto industrial e comercial que é o nosso. A maioria de nós nada sabe sobre os chamados mamíferos caprinos.
Para os judeus e para os primeiros cristãos, os animais caprinos faziam parte da sobrevivência material (como fonte de alimento e de agasalho) e espiritual (como animal essencial no sistema sacrificial). A vida não seria possível sem as ovelhas.
Para os sacrifícios, designados para reparar as faltas dos homens diante de Deus, era utilizadas as ovelhas jovens (cordeiros).
Na Páscoa, o cordeiro é o símbolo central (Ex 12), devendo ser sacrificado todos os dias pela manhã e à noite. Devia também ser sacrificado na Festa das Semanas (Nm 28), no Dia da Expiação (Nm 29), na Festa dos Tabernáculos (Nm 29) e em inúmeras outras situações (Lv 3,4,5,32). Em todos os sacrifícios, o cordeiro morria no lugar de outra pessoa, cujo pecado merecia a morte.
Pelo conhecimento que tinham do seu comportamento, os judeus viam no cordeiro as características da inocência, da pureza, da mansidão e também da eficácia, por possibilitar um sacrifício perfeito. Sem o cordeiro, o pecador teria que morrer. Os judeus tinham um enorme apreço pelas ovelhas.
No Novo Testamento, a figura do cordeiro é essencial para o entendimento da pessoa e da obra de Jesus Cristo. Ele é o cordeiro de Deus, sem defeito e sem mancha (1Pd 1.19), por isto, capaz de tirar o pecado do mundo (Jo 1.29), pela eficácia do seu sangue (1Pd 1.19).
Em nenhum livro da Bíblia, a palavra com tanta freqüência, exuberância e riqueza simbólica quanto no Apocalipse, que, por 29 vezes (capítulos 4, 5, 6, 7, 12, 13, 14, 15, 17, 19, 21 e 22), usa o termo para se referir a Jesus Cristo. (Propositalmente, o autor de Apocalipse um termo — arnion — que aparece poucas vezes na Bíblia, que geralmente usam amnos.)
2
Celebrar o Cordeiro é aceitar o Seu sacrifício.
Segundo o cântico dos remidos, eis o que o Cordeiro é:
Digno és de tomar o livro
e de abrir os seus selos;
porque foste morto
e com o teu sangue compraste para Deus homens de toda tribo, e língua, e povo e nação;
e para o nosso Deus os fizeste reino, e sacerdotes;
e eles reinarão sobre a terra.
(Ap 5.9b, 10)
A morte de Cristo é sacrificial, possibilitando a vida para todos quantos a aceitam, extinguindo a culpa e oferecendo sentido (abrir os selos) para a vida.
A culpa nos persegue por causa da Lei escrita para nós e da lei inscrita em nós. Quando erramos, nossa consciência moral nos impõe um sentimento de culpa. A culpa quer dizer: se pudéssemos voltar no tempo e fazer diferente, nós faríamos, mas não podemos retroceder. Só nos resta a culpa ou o perdão.
Em nosso relacionamento com Deus, nós somos culpados, os únicos culpados. Nos erros que cometemos uns com os outros, anda podemos transferir a culpa para o outro. Nosso Deus nos ofereceu a vida e nós escolhemos a morte. Ele nos ofereceu o convívio e nós preferimos a solidão. Nós nos separamos dEle e somos culpados. Por tudo quanto fizemos, nós nos condenamos à morte. Não podíamos nos indultar (perdoar) a nós mesmos, como pode fazer um governador nos Estados Unidos onde haja a pena capital. Só Deus pode nos indultar/perdoar e Ele o fez por meio da morte, não da nossa, mas do Seu filho, que nos substituiu na cruz, onde cada um de nós devia estar.
Em outros termos, o oferecimento da vida-sem-culpa por intermédio de Jesus Cristo é universal, logo ilimitado, e singular, logo limitado. O sacrifício de Jesus é universal porque seus efeitos não se restringem a nacionalidades e épocas. Aquele que se sacrificou por todos espera que a Igreja cumpra a missão de levar esta notícia a todos os lugares e pessoas.
O sacrifício de Jesus é singular, porque não pode ser imposto a ninguém. O efeito libertador acontece quando uma pessoa, reconhecendo que devia morrer, aceita o sacrifício do Cordeiro por ela. Neste sentido, a morte de Jesus tem um efeito limitado, uma vez que depende da aceitação de cada um, embora a vontade de Deus é que ninguém morra e todos se salvem, pois por isto enviou Seu filho.
Ao ser sacrificado, o Cordeiro nos comprou do Diabo para Deus, das trevas para a luz. O nosso passe, na linguagem do futebol, pertencia ao clube da morte, de quem éramos escravos. O Cordeiro nos comprou, não pagando alguns milhões de dólares (que é quanto valem os grandes jogadores), mas pagando com seu próprio sangue, isto é, sua própria vida.
O sacrifício do Cordeiro tem o propósito de nos fazer reis e sacerdotes, permitindo-nos o triunfo sobre a morte, não uma vitória física, mas uma vitória espiritual, que é vitória com efeitos duradouros na vida que passa (esta) e na vida que não cessará jamais (a próxima).
Ao nos fazer reis, ele nos convida a reinar com Ele, desde agora e na eternidade, numa espécie de vitória duradoura, porque sobre nós mesmos e sobre nossa resistência a amá-lO e sermos amados de modo perfeito. Ao nos fazer sacerdotes, ele nos chama a estar em sua presença, sem nenhum véu, sem nenhuma parede de separação e sem nenhum intermediário (interlocutor).
3
Celebrar o Cordeiro é viver segundo os valores do Cordeiro.
Se somos chamados a viver sem culpa por causa do sangue do Cordeiro, somos também convidados a viver segundo os valores do Cordeiro.
Destes valores, o maior é não amar a própria vida.
Quando aceitamos o sacrifício dEle por nós já o indicamos que deixamos nossas vidas na cruz. Agora, a cruz tem que ser real em nós.
Deus sabe que a memória dos grandes feitos dEle por nós tende a se apagar em nós e Ele sabe que a nossa natureza nos leva a esquecer a superioridade dos seus ensinos. Por isto, o autor do Apocalipse, ao longo do livro, nos recorda que a vitória completa será para aqueles que forem fiéis até à morte.
No capitulo 12, quando celebra o triunfo de Cristo e seus salvos, o autor descreve os vencedores como sendo aqueles que não amam a própria vida.
Eles [os que foram salvos] venceram o acusador
[a lhes lembrar da culpa e a lhes fazer esquecer o sacrifício de Jesus por eles]
por causa do sangue do Cordeiro
e por causa da palavra do testemunho que deram
e, e mesmo em face da morte, não amaram a própria vida.
(Ap 12.11)
Mesmo nós, redimidos, amamos demais a vida.
Diante da beleza da vida (isto é, do nosso estilo de vida, dominado pelos valores do presente século), o sétimo anjo nos ajuda a entender
O reino do mundo passou a ser de nosso Senhor e do seu Cristo,
e ele reinará pelos séculos dos séculos.
(Ap 11.15)
Em lugar de celebrar o mundo, nosso cântico deve ser o mesmo dos 24 anciãos:
Graças te damos, Senhor Deus Todo-Poderoso,
que és e que eras,
porque tens tomado o teu grande poder, e começaste a reinar.
Iraram-se, na verdade, as nações;
então veio a tua ira, e [veio] o tempo de serem julgados os mortos,
e [veio] o tempo de dares recompensa aos teus servos, os profetas, e aos santos e aos que temem o teu nome, a pequenos e a grandes,
e [veio] o tempo de destruíres os que destroem a terra.
(Ap 11.17-18)
Por que então somos tão dependentes, tributários e idólatras dos valores do mundo, valores que, pela fé, sabemos destruídos pelo Cordeiro?
4
Celebrar o Cordeiro é cantar as virtudes do Cordeiro.
Os mártires, na visão da glória, não cantavam a si mesmos, mas ao Cordeiro.
Só tu és santo.
Por isso, todas as nações virão
e adorarão diante de ti,
porque os teus atos de justiça são manifestos.
(Ap 15.4b).
É a Ele que devemos glorificar, não a nós mesmos.
O Apocalipse nos apresenta o Cordeiro, como temos lido e cantado:
. digno
Ele é o único digno de abrir os selos. Ele pode revelar o sentido da vida porque o mundo foi feito por Sua vontade (Ap 4.11) e porque Ele expiou as culpas de cada um de nós. Agora, então, podemos participar da gloriosa liberdade dos filhos de Deus, de que fala o apóstolo Paulo (Rm 8.21).
. santo
Ele é o único capaz de se apresentar santo diante do Pai, como Cordeiro sem defeito e sem mancha. Sua perfeição é a prova concreta da nossa perfeição no futuro. É em direção a Ele que nós marchamos, para chegar à mesma estatura que Ele alcançou (Ef 4.13). Pelo pecado de Adão e pelo nosso, fomos afastados do Deus santo. Pela morte de Cristo e por nossa aceitação desta morte de nós, podemos novamente ter comunhão com a santidade de Deus e moldar as nossas vidas por intermédio da convivência com Ele.
. justo
Ele é o único a quem podemos considerar justo. Todos os seus atos são justos. Ele manifestou seus atos de justiça para conosco, libertando-nos de toda a culpa. Ele nos capacita a viver de modo justo, embora ainda imperfeitamente, porque apenas no plano do desejo e na realização de alguns atos, não de todos, porque a inteireza da justiça só Ele as pratica.
5
Celebrar o Cordeiro é permitir que suas vestes sejam lavadas no sangue dEle.
O Convite que a Igreja faz é um convite à felicidade:
Bem-aventurados aqueles que lavam as suas vestes no sangue do Cordeiro
para que tenham direito à arvore da vida
e possam entrar na cidade pelas portas.
(Ap 22.14)
O convite implica uma resposta. O sacrifício do Cordeiro não tem eficácia (valor) em si mesmo. Ele só tem valor para você quando você aceita este sacrifício para sua vida. A morte de Jesus será a sua vida se você a aceitar como tendo acontecido em seu lugar.
Celebrar o Cordeiro é participar da sua festa.
São chegadas as bodas do Cordeiro,
cuja esposa a si mesma se ataviou
pois lhe foi dado vestir-se de linho finíssimo, resplandecente e puro.
Por que o linho finíssimo são os atos de justiça dos santos.
(Ap 19.7-8)
Só podemos entrar na festa do Cordeiro com as vestes lavadas por Ele. A maioria de nós já teve as suas roupas alvejadas (branqueadas) pelo sangue do Cordeiro.
Além disso, precisamos estar prontos (com roupas limpas e de linho finíssimo) para a festa. Alguns de nós temos permitido que nossas vestes se sujem. O convite do Cordeiro é para que as mantenhamos puras por meio de uma vida feita de atos de justiça, de vidas que vivam, prazerosamente (não por medo de perder a festa), segundo os valores do Cordeiro, festejando-O desde já.
Se roupas ficaram sujas, se seu linho ficou grosso, venha outra vez ao Cordeiro. Viva por Ele e para Ele, como Ele vive para você.
BÊNÇÃO
Amém.
Louvor, e glória, e sabedoria, e ações de graças, e honra, e poder, e força
sejam ao nosso Deus, pelos séculos dos séculos. Amém.
A graça do Senhor Jesus seja com todos.
(Ap 7.12; 22.21)