Tiago 4.13-17: SANTIFICANDO OS PROJETOS

SANTIFICANDO OS PROJETOS
Tiago 4.13-17

Pregado no dia 27.02.2000 – noite

1. INTRODUÇÃO
Tem gente que prefere ver a vida pela tela da televisão. É mais confortável; é mais seguro. Os jovens-jovens (sim, os jovens-jovens porque há jovens-velhos e velhos-jovens) sabem disso e deriva daí parte do seu conflito com os mais velhos. Os mais antigos tendem a priorizar a segurança; os mais jovens se amarram na felicidade, na aventura, no desafio, no perigo, na adrenalina a mil, no suor total.
Os jovens não estão errados, exceto se cometerem dois equívocos, que os mais velhos também podem cometer. Tiago nos fala desses erros.

2. UM DUELO DE TITÃS (vv. 13, 15)
O primeiro erro humano é expulsar Deus da suas cogitações. É não considerar Deus.
O salmista critica esta disposição intelectual:

O perverso, na sua soberba, não investiga; todas as suas cogitações são que na há Deus (Sl 10.4)

Até hoje o homem vive a síndrome de Babel, que já era uma extensão da síndrome do Éden, expressa no seguinte equívoco: “se nós comermos do fruto do bem e do mal, ficaremos tão sábios e poderosos quanto Aquele que nos criou” (Gn 3.5). A síndrome de Babel não era diferente: “não aceitemos nossas limitações, e vamos ser como o próprio Deus, fazendo uma torre que o alcance” (Gn 11.4).
Desde então o homem vem fazendo Deus desaparecer do seu horizonte. O Criador passou a “sobrar” na história. A idéia de Ele ser Senhor se tornou absurda. Netzsche chegou a chamar o Cristianismo de uma religião de escravos, para subgente, por propor a fé cristã uma atitude de dependência de Deus, que o autor achava muito bom para os senhores do dinheiro.
Na sua esteira, o poeta português Fernando Pessoa (que muitos aqui apreciamos; eu, inclusive, exceto a sua teologia), o mal do Cristianismo, “em toda a plenitude de sua maleficência” (1917), está em sua ética humanitarista, baseada num sistema metafísico, não passando de um (o machismo dele é terrível) “misticismo para mulheres”, que só possuem auto-domínio por força da pressão social”; afinal, elas “individualmente seguem a sua natureza sexual que é pertencer a (alguém), ser possessão de alguém e não possuir”. O grande mal do cristianismo é subordinar o indivíduo à comunidade. (1928/1930).
A proposta de Fernando Pessoa é o retorno do paganismo, em que os deuses se nos curvam e não ao teísmo, em que nós nos curvamos diante do Deus único e pessoal.
Tiago tem outra visão.

13 E agora, vós que dizeis: Hoje ou amanhã iremos a tal cidade, lá passaremos um ano, negociaremos e ganharemos.
15 Em lugar disso, devíeis dizer: Se o Senhor quiser, viveremos e faremos isto ou aquilo.

Tiago condena os ateísmos teóricos e os práticos, sejam eles metafísicos ou individuais, por recusarem a participação de Deus na vida dos homens.
Tiago está preocupado menos com o ateísmo teórico e mais com o prático, levado a cabo por aqueles que dizem acreditar em Deus, mas vivem como se Ele nada tivesse com suas vidas.
Nesta categoria de comportamento encontra-se a confiança do planejamento. Tiago não condena o planejamento. Ele sabe que boa parte das pessoas não chega a lugar nenhum porque não sabe a que lugar quer chegar. Nós precisamos de planejamento, para agendar as prioridades de nossa vida (não podemos querer todas as coisas, fazer todas as coisas, embora os adolescentes e os jovens achem que podem…) e para organizar o nosso tempo (e como precisamos organizar o nosso tempo, para não perder tempo…).
Se você almeja algo (uma profissão, um emprego, um carro), precisa se organizar, traçar planos e estratégias, para os os alcançar. Não desista nunca. Pode demorar anos. Você pode até não conseguir precisamente aquilo que planejou, mas pode conseguir coisas de igual ou maior valor. Você precisa se preparar. Não existe nada realmente bom que seja extremamente fácil.
Tiago nos encoraja a fazer planos, mas planos dos quais Deus participe, desde a concepção à realização. Planejar sem Deus é a mais pura burrice.
Você não pode viver apenas o agora, que tem seus méritos (não podemos projetar nossa felicidade apenas para o futuro), mas é insuficiente. Cada um de nós precisa ter um projeto de vida  Não basta apenas querer ser feliz. O projeto de ser feliz é comum a todos. O problema é como coordená-lo com a vida real, que inclui os projetos e mesmo a maldade dos outros. Por isso, nossos projetos têm que contemplar os dados concretos da vida, mas têm que ir além do presente e sonhar coisas grandiosas. Nós seremos tão pequenos quanto nossos sonhos. Nós seremos tão grandes quanto nossos sonhos.

Qual é o seu projeto? Não dá para viver apenas o agora. Quais são os seus sonhos?

Tiago, portanto, condena a independência rebelde de Deus, daquele que não considera o imprevisto da vida e muito menos a participação de Deus nos seus planos. Estamos, na verdade, diante de uma sabedoria equivocada de vida e de uma teologia equivocada acerca da nossa relação com o Pai.
Precisamos entender que o homem só se levantará quando se dobrar diante de Deus. Este é o paradoxo cuja compreensão nos capacita a viver. Por isso, se fôssemos definir a fé, diríamos que é o sentimento que leva o ser humano a desistir de confiar em si mesmo para confiar em Deus, tomando a atitude de aceitar o Seu convite para uma vida de relacionamento pessoal.
Deixemos de lado a arrogância do pensamento ou a arrogância da ciência. A arrogância pode ser de muito ou de pouco estudo, mas será arrogância, que escraviza. Os sábios e cientistas nem sempre sabem viver, porque escravos da arrogância.
A propósito, alguém perguntou a Napoleão se Deus estava do lado da França, nas suas conquistas militares. O imperador respondeu: “Deus está do lado da artilharia mais potente”. Veio a batalha de Waterloo, a perda do império e finalmente o exílio em Santa Helena, tudo num espaço de pouco mais de três meses. Nesta ilha, abandonado e humilhado, ele escreveu algo bem diferente: “O homem propõe; Deus dispõe”.
A solução para a arrogância é a humildade diante de Deus. A nossa atitude deve ser a recomendada por Tiago.

15 Em lugar disso, devíeis dizer: Se o Senhor quiser, viveremos e faremos isto ou aquilo.

O apóstolo Paulo disse a mesma coisa, quando se despediu dos cristãos de Éfeso: Se Deus quiser, de novo voltarei a vós (At 18.21). Não se trata de um “se Deus quiser” formal, mas de submetimento da vontade humana à vontade divina.

Quem quer se curvar?

Nada manifesta mais claramente nossa submissão a Deus que uma vida de oração. Não orar significa dizer: “Oh Deus, eu sou independente; eu me viro”.

3. O GRANDE AUTO-ENGANO (vv. 14, 16)
14 No entanto, não sabeis o que sucederá amanhã. Que é a vossa vida? Sois um vapor que aparece por um pouco, e logo se desvanece.
16 Mas agora vos jactais das vossas presunções; toda jactância tal como esta é maligna.

Nosso grande engano é achar que somos o que não somos.
Você se acha uma pessoa importante.
Eu também acho que eu sou uma pessoa importante. Fiz dois cursos superiores, dois mestrados, um doutorado. Tenho dois pares de sapato (acho que estou ficando vaidoso: sempre tive um só) e alguns ternos (eu que sempre só tive um e geralmente meio apertado). Publiquei dez livros, um deles em oitava edição. Traduzi vários livros do inglês para o português (embora não saiba inglês, mas este é um segredo só nosso…). Tenho uma biblioteca razoável que nunca contei, mas deve estar em torno de uns três mil volumes.
Tiago, no entanto, me diz: “Israel, você não passa de um vapor”. “Cara: você é apenas uma neblina, que o vento dissipa”.
Falemos das ondas do mar. Neblinas não me trazem boas recordações. Quando caminho na praia, entendo melhor o que Tiago diz. Eu, o importante, sou como a onda do mar, que pode desaparecer ao encontro da areia. Sexta-feira à noite, eu estava caminhando à beira-mar e me admirando do fato que à noite as ondas também trabalham. Elas são importantes e desaparecem quando encontram a praia.
Nesse mesmo dia, eu tinha estado num supermercado e o atendente estava olhando para cima. Ele me mostrou os pássaros empoleirados num dos travessões no alto. Então me lembrei que aquele passarinho podia cair lá de cima e deixar de existir. Um dia desses eu parei na Via Dutra, numa viagem para São Paulo, e um pássaro caiu do travessão e morreu.
Minha vida vale tanto quanto a onda do mar, tanto quanto o passarinho.
Ninguém se importa que a onda do mar desapareça, pois logo vem outra. Ninguém se importa com um passarinho, que algumas pessos caçam como esporte. No entanto, eu me acho muito importante. Como eu sou um estúpido me achando importante!
Não posso esquecer o Guilherme de Almeida (num poema que li quanto tinha 14 anos e que ainda está num dos livros da minha biblioteca) escreveu:

Tudo muda, tudo passa
neste mundo de ilusão:
vai para o céu a fumaça,
fica na terra o carvão.

A vida, queiramos nós ou não, é frágil e temporária. Por que então, me jactar? Arrotar que sou o máximo?
Talvez aqui alguns quisessem ter alguns centímetros a mais ou a menos na altura (na largura, o desejo de menos é predominante…). A largura pode ser diminuída, mas a altura, não. Jesus perguntou, muito sabiamente: “Ora, qual de vós, por mais ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado à sua estatura?” (Mt 6.27)
O apóstolo Paulo nos lembra que sequer sabemos pedir como nos convém, porque não sabemos sequer do que precisamos. Devemos desenvolver a humildade de quem não conhece o amanhã, de quem não conhece o próprio corpo.
Precisamos entender que não temos controle de nossas vidas, mas Deus tem.
Eu digito todos os meus sermões antes de os pregar (aliás, eu eu envio pela internet na segunda-feira a todos os membros da Igreja que participam de nossa lista de discussão). Na editoração, eu coloco sempre uma nota de rodapé, após a referência bíblica: “Preparado para ser pregado no dia X”. Eu não posso escrever “pregado no dia x”. Eu não sei se pregarei o sermão que preparo.
Comprender isto não é arrasar nosso ego ou arrebentar com a nossa auto-estima. É ter a visão correta acerca de nossa natureza. Queiramos nós ou não, a vida é assim.
Não podemos esquecer que foi por este “vapor” que Jesus morreu. Ele deu a sua vida por esta “ondinha do mar” que sou eu.

4. O BEM COMO PROJETO DE VIDA
De posse da compreensão que devemos submeter a nossa vontade (ignorante vontade) à vontade (sábia vontade) de Deus e que devemos reconhecer nosso lugar na vida e na história, nosso projeto de vida deve ser fazer o bem.
Diz Tiago:
17 Aquele, pois, que sabe fazer o bem e não o faz, comete pecado.

Não  deixe de tomar a decisão correta em direção a Deus.

Não deixe de fazer projetos para o seu futuro. Não deixe de incluir Deus neles. Incluir Deus nele significar orar tanto para que o oriente (isto é, ponha eixo na sua vida) quanto para que você viva os seus valores e seus compromisso.
Se eu posso usar meus dons e não uso, eu peco. Se eu posso usar meuns bens (para o bem dos outros) e não uso, eu peco.

5. CONCLUSÃO

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