Apocalipse 2.18-26: O VERDADEIRO PODER

O VERDADEIRO PODER

Apocalipse 2.18-26

Pregada na Igreja Batista Itacuruçá, em 13.1.2001 (noite)

Nesta carta, remetida à Igreja em Tiatira, Jesus oferece outras promessas aos seus servos fiéis. O propósito do Senhor é mostrar a natureza do verdadeiro poder, da autêntica força, da melhor conquista, que se contrapõem ao poder da mentira, à força falaz e à conquista equivocada.
Em certo sentido, podemos dizer que a luta pelo poder, em suas várias dimensões, é a história do homem. Os cristãos também se encontram diante do dilema do poder.
Aqueles que se mantêm fiéis são os que buscam o poder para vencer suas adversidades e para viver a vida transbordante que lhes foi prometida (João 10.10b). Esses sabem que não há poder sem oração, não há poder sem submissão a Deus, não há poder sem o reconhecimento da fraqueza.
Há, no entanto, aqueles, cristãos alguns, que buscam o poder para vencer não as adversidades, mas os adversários, buscam-no não para a vida, mas para a morte, nem que para tal tenham que vender suas almas ao Inimigo das almas humanas, mesmo que travestido de prestígio e sucesso, prazer e alegria. Esses pretensos vencedores, porque na verdade perdedores, não sabem o que é submissão a Deus e muitos menos o que confessar suas fraquezas.
Jesus adverte os que querem se manter na fidelidade ao Senhor como devem se portar neste mundo, para que escrevam histórias onde presente esteja o poder verdadeiro, aquele que se encontra na Estrela da Manhã.
Nesta carta, nós aprendemos quem é o verdadeiro vencedor.

1. O vencedor é aquele que sabe que Deus conhece a sua vida.
Eis como Jesus olha para o vencedor: Conheço as tuas obras [bem como] o teu amor, a tua fé, o teu serviço e a tua perseverança; sei que as tuas últimas obras são mais numerosas que as primeiras (verso 19).
Jesus olha para nós, como olhou para Noé, e vê em nós algo que nem mesmo nós vemos. Ele vê e aprecia o nosso amor, a nossa fé, o nosso envolvimento com o seu Reino, o nosso ânimo. Depois de nos olhar, com os olhos que só Ele tem, diz-nos: “Você é um vencedor”.
Sim, Jesus nos vê como vencedores. Se todos os cristãos soubessem como são vistos por Jesus, levantariam mais os seus olhos, em lugar de os abaixar; saberiam que no topo da escada da vida, o seu Senhor os aguarda para abraçar; deixariam de caminhar pelas ruas estreitas para sorrir nas largas avenidas.
Jesus olha para nós para nos apreciar e também para cuidar. Ele nos conhece como somos e sabe do que precisamos. Ele nos conhece e tem prazer em nos atender. Ele nos conhece e quer nos alcançar.
Ele não conhece para nos apontar as fraquezas, mas para desenvolver as nossas potencialidades e nos ajudar a realizar as nossas possibilidades. Ele não nos conhece para publicar os nossos pecados, que Ele já cancelou na cruz, mas para nos conduzir para frente, sem nos incomodarmos com os erros que cometemos no passado, para a frente onde Ele está.
Os vencedores são aqueles que sabem que Jesus os conhece e querem ser por Ele conhecidos mais, cuidados mais e mais, protegidos mais e mais. Podemos até ignorar onde estamos pisando, mas Jesus sabe. Podemos não ter força alguma para lutar, mas Jesus tem-na toda.

2. O vencedor é aquele que participa do triunfo de Jesus sobre os poderes do mundo.
A promessa de Jesus é um sustentáculo em nosso presente: Ao que vencer e ao que guardar as minhas obras até o fim, eu lhe darei autoridade sobre as nações, e com vara de ferro as regerá, quebrando-as do modo como são quebrados os vasos do oleiro, assim como eu recebi autoridade de meu Pai (verso 27).
Podemos pensar nesta promessa como uma palavra de consolo para aqueles que sofrem. Podemos sofrer, mas um dia reinaremos, junto com o Rei Jesus. Esta é uma promessa real e nós fruiremos desta verdade.
É bom termos a certeza de que, embora possamos estar “por baixo” do viaduto, o nosso lugar é caminhar no alto da ponte. É bom termos a certeza que os poderosos deste mundo, sejam pessoas, sejam sistemas, que parecem invencíveis serão destronados pelo Senhor do Trono. Esta convicção nos anima a “engolir” as injustiças que nos trazem para nos tragar, em forma de corrupção, violência e mal uso dos recursos do povo. Mais que isto: esta convicção nos anima em nossa luta contra as potestades, tenham elas as formas que tiverem: pessoais ou institucionais. Todos serão derrotados com a facilidade com que o oleiro quebra seus vasos.

Neste sentido, podemos também tomar esta promessa como um convite à parceria. Deus quer que, com Ele, quebremos o poder dos príncipes deste mundo. O protótipo desta luta é Jesus Cristo. Ele venceu a morte, embora aparentemente tenha perdido para Pilatos e para cultura judaica dominada pelo ódio. No entanto, a morte não o tragou e ele debochou dela, ao ressuscitar pelo poder de Deus.
A luta de Deus continua e ele nos chama para brigar com Ele. Este é o bom combate para o qual somos chamados. Não interessa o combate por poder ou prestígio. Nada vale o combate por dinheiro ou domínio. Jesus está triunfando sobre os poderes e sobre os poderosos do mundo e nos convida para guerrear com Ele. A vitória dEle é certa. A vitória dos que lutarem com Ele também é certa.

3. O vencedor é aquele que não aceita cargas sobre a sua vida que não venham com o selo da graça de Jesus.
A garantia Jesus é clara em si mesma: outra carga vos não porei; mas o que tendes, retende-o até que eu venha (v. 24).
Jesus se refere aqui à recomendação do primeiro concílio ecumênico da Igreja, reunido no início dos anos 30. Cristãos judeus e cristãos não-judeus discutiam sobre as práticas judaicas que os cristãos deviam adotar. A resposta, pela boca de Tiago, aceita por todos foi: Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós não vos impor maior encargo além destas coisas essenciais: que vos abstenhais das coisas sacrificadas a ídolos, bem como do sangue, da carne de animais sufocados e das relações sexuais ilícitas; destas coisas fareis bem se vos guardardes (28-29).
As cargas (as proibições) já estavam dadas. Os cristãos não deviam tocar (comer, beber) em coisas oferecidas aos ídolos nos templos pagãos, nem se alimentar (comer, beber) de sangue, nem ingerir animais mortos por sufocação e nem manter relações sexuais ilícitas (fora do casamento ou com pessoas do mesmo sexo).
Aqui o mesmo Espírito Santo, e agora num contexto universal e atemporal, reduz as proibições (ou carga/s, ou encargo/s) a duas: relações sexuais ilícitas (prostituição) e a participação em banquetes com alimentos separados para os ídolos (verso 20).
A garantia é um consolo diante dos legalistas e um anteparo à sua ação anti-graça. O Evangelho é lindo demais para ser manchado com proibições que nada têm a ver com o Seu autor, mas com o desejo humano de controlar o seu próximo.

A garantia é também convite a uma vida de liberdade diante das pressões de Jezabel. E aqui nos encontramos diante de um rica imagem. Sabemos quem é Jezabel lendo o livro de Reis (1º e 2º livros). Ela enfrentou Elias, para tentar manter o culto idolátrico e orgiástico a Baal. Seu fim foi triste. Seu corpo serviu de esterco para o campo (2Reis 9.37).
Agora em Tiatira, havia alguém que se portava como Jezabel, ensinando e seduzindo, como se fosse uma profetisa, os servos de Jesus a se prostituírem e a comerem das coisas sacrificadas a ídolos (v. 20).
Prostituir-se é fazer do corpo o que o corpo quer fazer, sem lhe controlar. Prostituir-se é viver sob a égide (domínio) dos instintos. Há muitos que pensam que isso é liberdade, mas é uma carga. Em todos os tempos, os pagãos ensinam que este é o caminho da felicidade.

Prostituir-se é a outra face do comer das coisas sacrificadas a ídolos. Em todos os tempos, e no nosso em particular, nosso modo de pensar é determinado pelos ídolos da estação, especialmente os cantores e os atores.
Alguns desses ídolos nos dizem, através dos meios de comunicação de massa, que cada um deve fazer aquilo que lhe faz feliz. Quem quiser pode se enganchar no corpo do outro, à luz do dia, que não há problema. O problema é de quem está olhando. Quem se engancha é que merece respeito, não o contrário.
Alguns desses ídolos nos dizem, através dos meios de comunicação, que é preciso viver na vertigem, nem que provocada pela droga. Então, os consumidores de ídolos perdem-se na droga. O ídolo é notícia. O consumidor é um número nas estatísticas dos dependentes. Por isto, vale a pena ouvir um ídolo, Yves Saint-Lauraint: “”(Revista Época).

Alguns desses ídolos nos dizem, através dos meios de comunicação de massa, que ter filhos não tem nada a ver com o casamento e que a produção independente é válida e desejável. Os ídolos têm os seus filhos e cuidam deles. Os consumidores aumentam as estatísticas das crianças abandonadas e alugadas como mendigos nos sinais.
Alguns desses ídolos nos dizem, através dos meios de comunicação de massa, que o corpo deve ser sarado, por meio da malhação e nos anabolizantes, demonstrando força e poder. Os consumidores imitam os veneram seus ídolos, que se enriquecem à custa da pobreza daqueles. Os jovens ficaram sarados. Os pais também querem ficar moderninhos. Na ponta, um filho não quer que seu pai o leve a escola, para quem ninguém saiba que tem um pai “velho” e “superado”.
Alguns desses ídolos governam como ditadores implacáveis sobre as mentes e as mentes aceitam as cargas, como se fossem produtos de sua escolha. Eles não sabem que escolhem, mas que são escolhidos e escovados e manipulados e manobrados, com interesses senão o de audiência.
Os cristãos, no entanto, são convidados e capacitados (se oram ao Senhor) a resistir a esta visão de mundo, ensinada por Jezabel. Ela queria ver o triunfo da carne sobre o espírito, do desejo sobre a fé, do instinto sobre a liberdade. Em nome da liberdade, ela punha outra carga sobre as pessoas. Esta não era uma carga da graça, mas da des-graça.
O perdedor, fascinado por Jezabel, se entrega aos desejos. O vencedor, guiado pelo Espírito Santo, é aquele que resiste à força dos desejos/instintos, mesmo que protagonizados e promovidos pelos ídolos.
O perdedor, conduzido por Jezabel, é um fraco, que cede à sedução dos apelos. O vencedor, inspirado pelo Espírito Santo, é livre para dizer não à droga, ao instinto, ao modismo, à ditadura sobre as mentes.
O perdedor, tomado por Jezabel, se curva a poluição do corpo, do pensamento e da língua. O vencedor, fortalecido pelo Espírito Santo, mantém seu corpo, seu pensamento e sua língua puros diante de Deus e dos homens.

4. O vencedor é aquele que  aceita o poder de Deus sobre a sua vida.
A promessa de Jesus chega ao seu ápice, quando promete ao vencedor: também lhe darei a estrela da manhã (2.28).
Esta expressão (estrela da manhã ou estrela da alva) aparece quatro vezes na Bíblia. Em Isaías 14.12, é aplicada à Babilônia, em função do seu fulgor político e militar. A segunda epístola de Pedro, no entanto, nos ajuda a entender o significado desta imagem no Apocalipse: Temos, assim, tanto mais confirmada a palavra profética, e fazeis bem em atendê-la, como a uma candeia que brilha em lugar tenebroso, até que o dia clareie e a estrela da alva nasça em vosso coração (2 Pedro 1.19).
Esta estrela da manhã, disso não há dúvida, é Jesus Cristo, como o mostra Apocalipse Apocalipse 22.16: Eu, Jesus, enviei o meu anjo para vos testificar estas coisas às igrejas. Eu sou a Raiz e a Geração de Davi, a brilhante Estrela da manhã. Jesus mesmo se dá este título.
O que sua promessa, então, nos garante? Que nós O conheceremos plenamente, isto é, nós nos relacionaremos com Ele plenamente.
Esta é uma promessa para o futuro, que se realiza desde já.

Assim, recebe a estrela da manhã quem vê os reinos deste mundo, mas prefere o Reino de Deus, nele tendo alegria e dele derivando a força para a vida, mesmo que na contramão da corrente cultural.
Recebe a estrela da manhã aquele que vê as glórias da nossa cultura (prestígio, poder, prazer) e não se seduzir por elas, porque passageiras. Quem tem a estrela da manhã resiste aos ídolos de músculo ou barro.
Recebe a estrela da manhã a pessoa que se deixa ser conhecido por Jesus Cristo e se permite ser satisfeito por Ele.
Recebe a estrela da manhã o cristão que aceita o convite de Jesus Cristo para um projeto junto com Ele na sua vitória sobre as potestades que governam este mundo, contra a falta de solidariedade (no plano individual) e contra a falta de justiça (no plano social).
Recebe a estrela da manhã o fiel que tem o poder de Deus sobre a vida, seja em forma de glória no tempo da escuridão, seja em termos de força no tempo da fraqueza.