Mateus 5.8: A BEM-AVENTURANÇA DA PUREZA DE CORAÇÃO

A BEM-AVENTURANÇA DA PUREZA DE CORAÇÃO
Mateus 5.8:

“O homem é elevado acima das coisas terrenas por duas asas: simplicidade e  pureza” (Thomas a Kempis).

2005

Quando penso em alguém puro, penso em alguém bom. E bom é quem faz o que é bom.
No entanto, aprendemos na Bíblia que nada de bom habita em nós, razão por que temos o desejo de fazer o que é bom, mas não o conseguimos (Romanos 7.18).
Na mesma Bíblia, contudo, somos convidados a sermos bons, porque a bondade é fruto do Espírito Santo em nós. E só os puros de coração podem ser bons. A pergunta inevitável é: é possível a alguém ser puro de coração?
Se o nosso coração é puro dele sai rios de pureza. É por isto que Jesus centrou sua mensagem na mudança dos corações. Ensinou o Mestre: “Vocês ouviram o que foi dito: `Não adulterarás’. Mas eu lhes digo: `Qualquer que olhar para uma mulher para deseja, já cometeu adultério com ela no seu coração`” (Mateus 5.27-28). “Uma árvore boa dá fruto bom, e uma árvore ruim dá fruto ruim, pois uma árvore é conhecida por seu fruto. (…) A boca fala do que está cheio o coração. O homem bom do seu bom tesouro tira coisas boas, e o homem mau do seu mau tesouro tira coisas más” (Mateus 12.33-35).
Jesus quer mudar o coração, porque é do coração que procedem o mal e o bem. Não é a língua, mas é o coração que leva uma pessoa a ofender o outro, a caluniar o outro, a mentir sobre o outro ou para o outro. Não é o desejo sexual, mas é o coração que leva uma pessoa a descer o poço da infidelidade conjugal. Não é o braço, mas é o coração que leva uma pessoa a se apropriar daquilo que não lhe pertence, seja o conhecimento que alguém adquiriu, seja o bem que alguém amealhou. Não são os lábios, mas é o coração que leva uma pessoa a proferir palavras que lhe beneficiem, parecendo o que não é.
Enquanto pregava à multidão, Jesus via pessoas que não estavam ali por ama de todo o coração, mas para ver o que podiam tirar para si mesmas.  Então, ele diz que veriam a Deus aqueles que tivessem seus corações puros.

1. OS PUROS…
É por isto que são bem-aventurados os puros de coração.

1.1. Bem-aventurados são os puros de coração, que são aqueles que não vivem uma vida dupla.
Os puros de coração não têm segredos que tentam guardar. Os puros de coração não têm intenções que buscam esconder. Se as suas mentes pudessem ser escrutinadas por um aparelho detector de mentiras, seriam encontradas ali os pensamentos e os desejos mencionados pelos seus lábios.
A maior tragédia do Cristianismo são cristãos duplos: cristãos que abençoam e amaldiçoam ao mesmo tempo; cristãos que elogiam fácil, mas a crítica fica guardada no sorriso; cristãos que seguem a Cristo mas não o Cristo da fé, mas o Cristo do sinal, o Cristo do milagre, o Cristo da magia, atrás de vantagens pessoais; cristãos que adoram a Deus, mas odeiam aos seus irmãos. Jesus nos adverte contra essas pessoas:  “Este povo me honra com os lábios, mas o seu coração está longe de mim” (Mateus 15.8). Jesus, neste texto, está citando o profeta Isaías, que diz: “O Senhor diz: `Esse povo se aproxima de mim com a boca e me honra com os lábios, mas o seu coração está longe de mim. A adoração que me prestam é feita só de regras ensinadas por homens'” (Isaías 29.13). Os puros de coração cultuam ao Senhor sem nada esperar dEle em troca ou em retribuição.
A maior tragédia para a saúde espiritual e emocional de uma pessoa é ter um coração duplo. O duplo se engana a si mesmo. O duplo não deixa a sua condição. O duplo é morno. A duplicidade é uma enfermidade espiritual e emocional. O duplo não está longe de Deus, mas também não está perto. Dificilmente o duplo se arrepende porque ele se acha fiel. É por isto que Deus tem que vomita (Apocalipse 3.16).
Os puros de coração são aqueles que buscam a Deus de todo o coração e se entregam a Ele sem reservas, sem coxear entre dois desejos. Quem é puro assim é verdadeiramente feliz. Como recomenda o salmista, “como são felizes os que obedecem aos estatutos [apresentados por Deus] e de todo o coração o buscam!” (Salmo 119.2).

1.2. Bem-aventurados são os puros de coração, que são aqueles não deixam que seus corações se contaminem com os estilos e práticas de outros corações.
O sangue bombeado para os corações dos puros vem de uma Fonte boa, não dos muitos rios que irrigam a terra. Eles convivem com pessoas ímpias, mas não fazem parte da sua comunidade; eles conversam com pessoas de índole perversa mas não se tornam perversos; eles circulam por grupos de zombadores, mas não se torna um deles. Eles são como árvores plantadas à beira das águas correntes que descobrem porque meditam dia e noite na Palavra do Senhor (Salmo 1.1,3).
Os puros são convidados ao vício, mas não se viciam. Os puros são desafiados aos prazeres ilegítimos, mas não cedem aos convites. Os puros são tentados a dirigir os seus negócios como “todo mundo” dirige, mas preferem perder a ganhar com a propina ou com a sonegação.
Os puros fazem como Daniel, que propôs no seu coração não se contaminar de forma alguma com os alimentos, aparentemente puros, do palácio onde morava (Daniel 1.8) Daniel sabia que, uma vez corrompido pela cultura do povo onde estava, teria muitas dificuldades de manter a sua fidelidade nas outras práticas também. Assim como a pureza é um processo, a contaminação também o é (Apocalipse 22.11). Gosto de dizer que o pecado é uma escada que só tem degraus de descida, mas também que, quando desejamos ser purificados, somos levantados do chão, tirados da lama.  A promessa bíblica continua fiel: Jesus nos purifica de todo o pecado, mediante a confissão. Por isto, “se você confessar com a sua boca que Jesus é Senhor e crer em seu coração que Deus o ressuscitou dentre os mortos, será salvo. Pois com o coração se crê para justiça, e com a boca se confessa para salvação” (Romanos 10.9-10).

1.3. Bem-aventurados os puros de coração, porque são bons.
Naturalmente não somos bons, porque a queda nos tornou maus. Redimidos, no entanto, devemos ser bons, uma vez que nossa imagem-semelhança foi, na cruz, restaurada.
A observação da realidade, nossa e dos outros, demanda uma explicação sobre a obra de Cristo. A Redenção, realizada por Jesus, apagou toda a nossa culpa, mas os efeitos dela ainda permanecem, como um animal que, tendo a sua cabeça decepada, ainda tem movimentos no seu corpo. É por isto que ser puro é um ato, que já ocorreu, e uma promessa, que está ocorrendo. Aqui reside a tragédia de muitos cristãos: são cristãos do passado, libertos na cruz, mas não são cristãos do presente, que devem continuar sendo purificados. Os puros de coração são os que foram libertos e estão sendo libertos. O pecado original foi extinto; os pecados de cada dia precisam ser confessados para que sejam perdoados.
Os puros de coração são os que ouvem todo o sermão da montanha e tomam os sonhos de Jesus ali apresentadas para a humanidade como sendo seus. Os puros são aqueles que estão dispostos a caminhar a segunda milha, em lugar de cultivar a vingança; na verdade, eles nunca desejam o mal de outras pessoas, mesmo que tenham sido feridas por elas. Os puros investem suas vidas na busca do reino de Deus em primeiro lugar, em vez de se deixarem dominar pelo seu eu; na verdade, eles conhecem a força do seu ego e têm medo dele; é por isto que querem manter o seu coração ligado no coração de Deus, para receber dEle vida e renovação. Os puros procuram se envolver em boas obras, ao invés de se contentarem com um cristianismo de louvores; eles preferem ser reconhecidos pelos frutos da sua vida, e não por algum tipo de identidade meramente formal. Os puros se esforçam para tratar com bondade seus colegas, superiores e subordinados; mesmo que este comportamento seja visto como ingenuidade e mesmo que alguns deles mereçam ser tratados como Nabal seria tratado por Davi, eles preferem ser Abigail (1Samuel 21). Afinal, “o fruto da luz  consiste em toda bondade, justiça e verdade” (Efésios 5.9).

1.4. Bem-aventurados são os puros de coração, que são aqueles que só desejam uma coisa: Deus (Kierkegaard), com Sua verdade e Seus valores.
Os puros de coração não confiam em si mesmos, mas em Deus. Já os impuros são arrogantes e petulantes. Os impuros desejam a si mesmos, como se fossem donos da verdade e mestres de seus próprios valores. A impureza é uma tentação para todos nós. Por isto, recebemos a divina recomendação: “Confie no Senhor de todo o seu coração e não se apóie em seu próprio entendimento” (Provérbios 3.5).
Por sua vez, os puros não desejam outra coisa, senão a Deus. Os puros não seguem outra verdade, senão a de Deus. Por isto, os “puros de coração são aqueles que permitem que Deus assuma o supremo lugar dentro de si mesmos”. WALLACE, Ronald. Aí vem o sonhador. São Paulo: Vida, 2004, p.252.
Por isto, a pureza é um processo de subtração. Nela, permitimos que Cristo, presente em nós, vá jogando para fora do nosso coração o que não deve estar ali. É como se permitíssemos que Ele fosse escavando, da superfície para o centro, nosso coração e fosse removendo a impureza encontrada. Quanto mais impureza é tirada, mais desejamos de Deus.
Deve ser assim com quem deseja mais de Deus, como quem deseja ver a Sua glória. Diante de alvos tão elevados, a pergunta inevitável é: quem é apto para uma caminhada dessas? O salmista responde que é “aquele que tem as mãos limpas e o coração puro, que não recorre aos ídolos nem jura por deuses falsos. Ele receberá bênçãos do Senhor, e Deus, o seu Salvador lhe fará justiça. São assim aqueles que o buscam, que buscam a tua face, oh Deus de Jacó” (Salmo 24.4-6).

1.4. Bem-aventurados os puros de coração, pela coragem que têm de fazer a difícil oração do salmo 139: “Sonda”.
Os puros de coração são aqueles que têm a coragem de orar como o poeta do saltério: “Sonda, o Deus, e conhece o meu coração; prova, e conhece as minhas inquietações. Vê se em minha conduta algo te ofende, e dirige pelo caminho eterno” (Salmo 139.23-24).
Quem é puro, toda manhã, se ajoelha e ora assim:
“Senhor, com os recursos que tens por si
e com o conhecimento que tens de mim,
eu te peço, porque dependo como de ti:
pesquisa todo o meu coração,
pesa na tua balança cada intenção,
põe tua luz sobre o meu íntimo pensamento
para descobrir se há algo que te ofenda
porque quero ser conduzido tão somente
ao longo de tua eterna e pura senda”.

Os puros de coração, portanto, são puros porque têm sede de ser purificados. Eles continuam orando assim: “Cria em mim um coração puro, o Deus, e renova dentro de mim um espírito estável” (Salmo 51.10). Não somos capazes de tornar puros os nossos corações, mas podemos pedir para que Deus o faça e Ele o fará.

Os puros de coração, por conseguinte, se aproximam de Deus, em lugar de tentarem, inutilmente, se afastar dEle. Ao fazerem assim, obedecem a recomendação bíblica: “Aproximem-se de Deus, e ele se aproximará de vocês! Pecadores, limpem as mãos, e vocês, que têm a mente dividida, purifiquem o coração” (Tiago 4.8). Quem se aproxima de Deus será abençoado com um encontro com Ele.

2… VERÃO A DEUS
Fico imaginando o que os primeiros ouvintes desta promessa (“Os puros de coração verão a Deus”) escutaram. Nós temos alguma dificuldade de entender esta bem-aventurança, mas aquela multidão que esperava o Messias entenderam: os puros de coração iriam ver o Messias, embora não soubessem que o Messias era aquele que lhes falava naquele instante. Como a mulher samaritana, antes da revelação final, ainda não sabiam que estavam diante daquele que podia lhe dar uma vida feliz para sempre, nesta vida e na próxima.
Neste sentido, a promessa de Jesus já se cumpriu, porque Deus “tornou-se carne e viveu entre nós. Vimos a sua glória, glória como do Unigênito vindo do Pai, cheio de graça e de verdade” (João 1.14). Por isto mesmo, o próprio Jesus garantiu: “Quem me vê, vê o Pai” (João 14.9). A promessa se cumpriu.
A promessa se cumpre.
Ver a Deus é ser admitido na presença de Deus. Porque pecou, o homem saiu da presença de Deus (Gênesis 3.8). No entanto, o convite feito a Abraão é renovado a nós: “Eu sou o Deus todo-poderoso; ande segundo a minha vontade e seja íntegro” (Gênesis 17.1). Quem anda na presença do Senhor é fortalecido (2Crônicas 27.6). Somos admitidos na presença de Deus, quando O buscamos de todo o coração, com um coração desejoso de ser purificado. Esta busca começa com a aceitação, pela fé, do sacrifício redentor de Jesus Cristo na cruz. É Ele quem nos purifica, a partir da fé. Esta busca prossegue na oração, no estar em solitude diante de Deus.
Ver a Deus é ficar apavorado com sua glória, por uma experiência direta de Sua santidade. Muitos homens e muitas mulheres da Bíblia e da história viveram esta experiência. Isaías se achou indigno quando sentiu a presença de Deus, que é sempre gloriosa, invadindo o templo onde estava cultuando ao Senhor (Isaías 6). A presença de Deus é sempre confrontadora. Sem pureza ninguém pode ver a Deus (Hebreus 12.14). Depois desta visão, podemos cantar como Jó: “Meus ouvidos já tinham ouvido a teu respeito, mas agora os meus olhos te viram (Jó 42.5). Esta visão de Deus acontece hoje por meio da Sua palavra ou de Sua obra na providência. Graças a isto, “vemos imagens e reflexos de Sua glória”, bem como “ouvimos os ecos e as reverberações de Sua voz”. PIPER, John. Blessed are the pure in heart. Disponível em <http://www.desiringgod.org/library/sermons/86/030286.html>.
Ver a Deus é ser confortado por Sua graça. O Senhor ouve as orações dos puros e conforta os seus corações (Salmo 10.17). A Bíblia está cheia de histórias sobre o consolo de Deus. Numa delas, relata um poeta, com a intimidade de um resgatado: “Quando a ansiedade já me dominava no íntimo, o teu consolo trouxe alívio à minha alma” (Salmo 94.19) Com toda a razão, Deus é chamado de Deus da consolação (Romanos 15.5; 2Coríntios 1.3). Nossa oração, para ser objeto desta graça, deve ser a de outro salmista: “Ouve a minha voz quando clamo, o Senhor; tem misericórdia de mim e responde. A teu respeito diz o meu coração: Busque a minha face! A tua face, Senhor, buscarei. Não escondas de mim a tua face, não rejeites com ira o teu servo; tu tens sido o meu ajudador. Não me desampares nem me abandones, oh Deus, meu salvador!” (Salmo 27.7-9)

3. UM INVENTÁRIO MORAL
A maioria das pessoas não gosta de olhar para dentro de si mesmas.
Quem age assim procede como alguém que retira a radiografia que mandou fazer de uma parte do seu corpo, mas a guarda em casa. Não tem coragem de leva ao médico, com medo do que vai ouvir. Só que esta é a sua única chance, nem que tenha que passar por uma cirurgia.
Quem vive desse modo se assemelha a alguém que deixa de abrir uma correspondência, com receio do seu conteúdo.
Há um outro modo de vida: uma vida de qualidade, que começa com a coragem de enfrentar a própria realidade, por mais dura que seja ou possa parecer.
No caminho da recuperação de vícios, traumas e hábitos ruins, há um quarto princípio a produzir vida: “Unilateral e abertamente analiso e confesso todas as minhas falhas a mim mesmo, a Deus e a alguém da minha confiança” (Princípio 4). Este princípio corresponde ao passo 4 do programa de recuperação dos Alcoólicos Anônimos: “Fizemos um minucioso e destemido inventário moral de nós mesmos” (Passo 4 do AA).

A OBRA DE DEUS
Antes de prosseguir, precisamos recordar aquilo que Deus faz por nós nesta jornada para a felicidade.

1. Deus coloca padrões elevados para as nossas vidas.
E por que o faz? Ele o faz para que tenhamos uma vida de qualidade. Não há atalhos para uma vida que vale a pena. Jesus conclui uma de seus ensinos, com o seguinte conselho: “Portanto, sejam perfeitos como perfeito é o Pai celestial de vocês” (Mateus 5.48). É para a perfeição que vamos; é para ter a estatura de Cristo que fomos redimidos.

2. Como somos pecadores e falhamos no atingimento destes padrões, Deus nos perdoa quando confessamos os nossos pecados. Se afirmarmos que não temos cometido pecado, faremos de um mentiroso (1João 1.7), mas “se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para perdoar os nossos pecados e nos purificar de toda injustiça” (1João 1.9)..

3. Deus nos cura quando confiamos nEle. “Deus nos chama a viver em santidade. Se não sararmos, ainda que vamos para o céu (como aleijados emocionais), não viveremos tudo o que Deus tem para nós aqui na terra”. CARVALHO, Esly. Saúde emocional e vida cristã. Viçosa: Ultimato, 2002, p. 47. O poeta orou: “Senhor meu Deus, clamei a ti, e tu me saraste” (Salmo 30.102 — ARA). Deus perdoa todas as nossas iniqüidades e sara todas as nossas enfermidades (Salmo 103.3). E isto porque Jesus “levou em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro, a fim de que morrêssemos para os pecados e vivêssemos para a justiça; por suas feridas vocês foram curados” (1Pedro 2.24).

A OBRA DO HOMEM
O que devemos fazer diante da riqueza da bondade de Deus (Romanos 2.4)?
No caminho da recuperação de vícios, traumas e hábitos ruins, há um quarto princípio a produzir vida: “Unilateral e abertamente analiso e confesso todas as minhas falhas a mim mesmo, a Deus e a alguém da minha confiança” (Princípio 4). Este princípio corresponde ao passo 4 do programa de recuperação dos Alcoólicos Anônimos: “Fizemos um minucioso e destemido inventário moral de nós mesmos” (Passo 4 do AA). Pode ser que a negação tenha protegido você dos seus sentimentos e da dor reprimida por algum tempo. No entanto, continuar negando impede a restauração dos seus traumas, dos seus vícios e dos seus maus hábitos.
Diante disto, nesta caminhada, preciso tomar algumas decisões.

1. Decido me examinar a mim mesmo.
Há pessoas que passam suas vidas justificando o passado, reclamando do presente e temendo o futuro, mas a única forma de superarmos a dor do nosso passado é enfrentando-a. Na estrada da recuperação, precisamos examinar abertamente nossos erros, precisamos confessar esses erros a nós mesmos, a Deus ou alguém de nossa confiança. BAKER, John. Celebrando a recuperação; guia do líder. São José dos Campos: Propósitos, p. 93.
Neste auto-exame, um bom recurso é preparar um inventário moral. Um inventario é uma lista, preferencialmente, por escrito dos acontecimentos do nosso passado, tanto os bons quanto os maus. Não podemos olhar apenas para as coisas ruins, mas também para as coisas boas. O inventário nos ajuda a nos ver cara a cara conosco mesmos. “Examinemos e coloquemos à prova os nossos caminhos, e depois voltemos ao Senhor” (Lamentações 3.40).
O inventário é uma forma de nos dirigirmos ao território do perdão. Não é para nos manter presos à culpa. Fazer um inventário demanda tempo, porque não pode ser feito às pressas. Nesse processo, eu me pergunto, por exemplo: o que está errado comigo? o que preciso mudar na minha vida?
Devemos ter em mente que há três tipos de caráter:
. O caráter que mostramos.
. O caráter que pensamos ter.
. O caráter que realmente temos. BAKER, John, op. cit., p. 114.
Não podemos olhar apenas para as coisas ruins, mas também para as coisas boas.

Esta percepção nos leva a culpa. Esta é uma verdade, mas não uma verdade completa. A verdade completa é que, segundo o Evangelho de Jesus Cristo, a culpa pode ser apagada, a partir da fé em Jesus Cristo como Salvador.
Muitos cristãos, no entanto, ainda não entenderam a dinâmica poderosa do perdão e ainda vivem na velha dispensação da culpa.
A culpa destrói a nossa confiança. Dominados pela culpa, a pergunta que nos fazemos é sempre a mesma: “Que acontecerá conosco, quando a verdade aparecer?” A culpa danifica nossos relacionamentos. Tomados pela culpa, julgamos os e afastamos os que se acercam de nós. A culpa nos mantém isolados em nosso passado. Sentir culpa não muda o nosso passado, do mesmo modo que a preocupação não muda o nosso futuro. O único “beneficio” da culpa é tornar miserável o nosso presente; é nos deixar doentes. WARREN, Rick. O caminho da recuperação. São José dos Campos: Propósitos, 2004, p.49.

2. Decido confessar minhas falhas, ressentimentos e pecados. Deus quer eu assuma minhas responsabilidades e admita que sou culpado pelos erros que cometi. Como aprendo na Bíblia, “quem esconde os seus pecados não prospera, mas quem os confessa e os abandona encontra misericórdia” (Provérbios 28.13). É mais cômodo lançar as culpas de meus erros sobre as costas dos outros, mas não é honesto. Preciso enfrentar a verdade acerca de mim mesmo. Preciso parar de arranjar desculpas. Preciso parar de me enganar a mim mesmo.

3. Decido obedecer à orientação de Deus e pedir perdão a Ele. Eis o seu convite para mim: “Venha, vamos refletir juntos –, diz o Senhor. —  Embora os seus pecados sejam vermelhos como escarlate, eles se tornarão brancos como a neve; embora sejam rubros como púrpura, como a lã se tornarão” (Isaías 1.18). Quando confesso, concordo que cada um deve dar conta de si mesmo diante do Pai (Romanos 14.12); então, confesso os meus pecados. Davi relutou em confessar o seu pecado e enquanto o mantinha escondido, o seu corpo definhava de tanto gemer secretamente. Suas forças, dia após dia, noite após noite, foram-se esgotando (Salmo 32.3-4). A confissão restaura a minha comunhão com o Senhor. A sensação, depois da confissão, é de alívio. Está começando a cura em mim. Quando confesso, a mim mesmo, a Deus ou a um mentor, deixo de negar a verdade, perco a sensação de isolamento, venço minha própria relutância em me perdoar e abro mão de meu orgulho.

4. Decido entender que não há mais culpa para quem está em Cristo. Em Cristo, Deus me reconciliou com Ele, não levando mais em conta os meus pecados, mas me entregando a mensagem da reconciliação (2Coríntios 5.19). BAKER, John, op. cit., p. 125-130 Neste processo, preciso estar seguro de três verdades bíblicas acerca do perdão:
. Deus perdoa instantaneamente. Ele não espera. No momento em que peço perdão, eu sou perdoado. Deus não me faz esperar. Ele não me faz sofrer um pouco mais; isso é coisa de ser humano.
. Deus perdoa gratuitamente. Ele remove gratuitamente de mim os meus pecados. Eu não o mereço, mas Deus age assim comigo. Não faço nada para isto, mas Deus me perdoa, pela graça, graça que custou o preço da vida de Jesus Cristo.
. Deus perdoa completamente. Meu pecado é apagado completamente. É por isto que “agora já não há condenação para os que estão em Cristo Jesus” (Romanos 8.1).

RECURSOS PARA A RECUPERAÇÃO
Deus, portanto, nos disponibiliza os recursos para a cura.

1. O primeiro é a cruz; se olharmos para ela, ficaremos curados.
A cruz é o poder de Deus para a nossa salvação completa (1Coríntios 1.18).
Somos fracos, mas podemos ser fortes em Jesus Cristo.

2. O segundo é a oração, por meio da qual mantemos comunhão com Deus.
Uma psicoterapeuta cristã escreveu algo que merece a nossa reflexão: “Por muitos anos, eu meu consultório, tenho acompanhado pessoas que realmente gastam tempo com Deus. É interessante observar que elas têm outro ritmo de recuperação. É como se tivessem um co-terapeuta fora da terapia. De fato, há o Senhor. É notável a diferença entre cristãos com uma verdadeira vida devocional e aqueles que não praticam um tempo diário a sós com Deus. Por outro lado, quase não vejo diferença entre cristãos sem o exercício diário da oração e os não-cristãos, quanto ao processo de recuperação. O processo acontece apenas no plano humano. Mas, quando há oração séria, que diferença! A oração os conecta ao poder do Espírito Santo, poderoso para fazer as mudanças tão necessárias”.  CARVALHO, Esly, op. cit., p. 35.

3. O terceiro recurso é a prestação de contas.
Segundo a sabedoria bíblica, “assim como o ferro afia o ferro, o homem afia o seu companheiro” (Provérbios 27.17). Não por acaso, a expressão “uns aos outros” aparece mais de 50 vezes no Novo Testamento. Para tirar o lixo de nossas vidas, precisamos da ajuda de alguém, a quem podemos chamar de mentor. Esta é uma jornada que não se faz sozinho. BAKER, John, op. cit.,  p. 122.Precisamos prestar contas a alguém. Somos tão doentes quanto os segredos que carregamos. “Quando compartilhamos nossos segredos mais profundos, dividimos a dor e a vergonha e começamos a construir uma auto-estima saudável que não se baseia nos padrões do mundo, e sim na verdade de Jesus Cristo”. BAKER, John, op. cit., p. 126.
“A prestação de contas aperfeiçoa o compromisso e força a abertura de sua vida ao exame de outra pessoa. Nem todos se dispõem a fazer isso — correr o risco de revelar a vida interior, pois acarreta a perda da independência e da auto-suficiência. Prestar contas nos obriga a agir e abre a porta para o fracasso. Mas as recompensas são maiores que os riscos”. WHITE, Jerry. O poder do compromisso. Niterói: Textus, 2003, p.84.
A amizade espiritual é exaltada na Palavra de Deus, de várias formas:
. “É melhor ter companhia do que estar sozinho, porque maior é a recompensa do trabalho de duas pessoas. Se um cair, o amigo pode ajuda a levantar-se. Mas pobre do homem que cai e não tem quem o ajude a levantar-se! E se dois dormirem juntos, vão manter-se aquecidos. Como, porém, manter-se aquecido sozinho? Um homem sozinho pode ser vencido, mas dois conseguem defender-se. Um cordão de três dobras não se rompe com facilidade” (Eclesiastes 4.9-12).
. “Meus irmãos, eu mesmo estou convencido de que vocês estão cheios de bondade e plenamente instruídos, sendo capazes de aconselhar-se uns aos outros” (Romanos 15.14).
. “Sejam bondosos e compassivos uns para com os outros, perdoando-se mutuamente, assim como Deus os perdoou em Cristo” (Efésios 4.32).
. “Portanto, confessem os seus pecados uns aos outros e orem uns pelos outros para serem curados. A oração de um justo é poderosa e eficaz “(Tiago 5. 16).

4. O quarto recurso é a participação num grupo de ajuda.
A comunhão cura. Participar de uma igreja cura. Participar de um grupo de ajuda cura. “Quando confessamos as nossas faltas uns aos outros e procuramos a ajuda das pessoas através da oração, podemos descobrir o poder de Deus para nos mudar”. WARREN, Rick, op. cit., p. 74.
Os Alcoólicos Anônimos perceberam o valor de um grupo de ajuda e se tornaram o mais significativo programa de recuperação. Não tenha vergonha de procurar um grupo. A caminhada pode ser longa e dura demais para ser feita sozinho.