Neemias 1-13: PARA VIRAR O JOGO DA VIDA

PARA VIRAR O JOGO DA VIDA)
Neemias 1-13

Pregado na igreja Batista Itacuruçá, em 31.12.2006, manhã, e 7.1.2007, noite

1. Precisamos reconhecer, sem nos vitimizarmos, que nossa vida é composta por uma teia de acontecimentos sob e fora (o exílio, a aflição dos que ficaram) nosso controle.
Nem tudo na vida está sob o nosso controle. Pais que cuidam bem dos seus filhos, amando-os, instruindo-os, deverão se alegrar com eles no futuro, mas esta lei comporta exceções. Uma vida regrada não garante saúde e longevidade, embora as favoreça. Um motorista atento não está isento da irresponsabilidade do outro na esquina ou na estrada. Um negócio feito com todos os cuidados não fica totalmente imune à desonestidade. Um sorriso em direção ao nem sempre produz sorriso no outro.
Nem todos colhem o que plantaram. E isto se aplica aos que plantaram ventos bons, mas também aos que plantaram tempestades. Quem plantou vento bom deve colher calmaria, mas pode colher tempestade. Quem plantou tempestade deve colher borrasca, mas pode colher calmaria.
Há uma lógica na vida, mas uma lógica nem sempre racional.
Quando não entendemos esta realidade cruel, tendemos a nos olhar como vítimas, como pessoas que não merecem esta ou aquela situação atual.
Neemias estava no exílio, sem o merecer. Ele mesmo nada fizera para estar ali. Decorriam já 150 anos que parte do seu povo, o povo judeu, tinha sido levado à força para o exílio na Pérsia (587 a.C.). Ele mesmo nasceu no exílio. Ele não teve nenhum papel na história. Não podia ser culpabilizado pela desobediência do seu povo.
Quando soube que a situação na terra dos seus avós continua péssima (cerca de 445 a.C.), ele poderia se esquivar ou apenas lamentar não ter nascido em Jerusalém. Ele era uma vítima, mas não se viu como vítima.
Ser vítima, ou da situação econômica do país ou da (des)educação recebida pelos pais, não altera nada o presente de uma pessoa.
Se queremos que nossa história mude, precisamos, como Neemias, reconhecer a vida é assim mesmo, geralmente justa, mas nem sempre.
Se queremos virar o jogo da nossa vida, precisamos abandonar a idéia de que podemos controlar tudo, porque não podemos. A paixão pelo controle apenas nos deixa menos capazes de resolver o que está em nossas mãos.

2. Precisamos nos lembrar que não há jogo perdido.
Jerusalém estava distante e destruída. Neemias, contudo, não julgou perdida a situação. A cidade podia florescer de novo.
Ele não se alegrou com o fato: Tanto se entristeceu que o seu chefe, o rei Artaxerxes I, o percebeu. Sua tristeza, no entanto, não foi apenas de lamento, mas de desejo, de desejo de dar a sua contribuição para mudar aquele quadro. Sua tristeza estava grávida de esperança.
Se estamos no primeiro tempo no jogo da vida e estamos perdendo feio, podemos virar o placar no segundo. Se o jogo está terminando, podemos provocar uma prorrogação. Se estamos perdendo na prorrogação, ainda assim podemos virar o resultado. O jogo só termina quando acaba. A vida só termina quando acaba.
Não há casamento sem solução. E mesmo que a solução não seja a esperada, devemos lugar até o fim.
Não há dívida que não se possa pagar. Nem que tenha que ser negociada e renegociada. Nem que os hábitos tenham que ser mudados. Nem que o padrão de vida tenha que baixar drasticamente`por ser mais realista.
Não há concurso no qual não se possa passar.
Não há ambiente de trabalho que não possa ser alterado. Mesmo que não possa, você pode sair de lá e começar de novo em outro.
Não há saúde que não possa melhor. E se não puder, deve ser enfrentada. Quando escrevia este parágrafo, chegava a informação sobre uma senhora da igreja que luta sozinha há anos contra uma doença. Esta é a palavra-chave: luta. Ela está viva porque luta. E só lutamos enquanto achamos que podemos vencer. Do contrário, entregaríamos os pontos.

3. Precisamos ter em mente que não há viradas fáceis.
Virar o jogo da vida implica em auto-superação e em superação.
Neemias teve que conter as lágrimas, para não ficar na auto-comiseração, e começar a traçar planos para o que pretendia fazer.
Quando chegou a Jerusalém,  teve que enfrentar dificuldades diversas. Uma delas foi a oposição do grupo de Sambalate, que ficou extremamente aborrecido com o fato de alguém viver procurar o bem dos filhos de Israel (Neemias 2.10). Neemias e sua equipe tiveram que superá-los. Não foi fácil: tiveram que reconstruir os muros com a espada na cintura. Neemias e sua gente estavam decididos a vencer.

4. Precisamos tomar a decisão de virar o jogo da nossa vida, porque há sempre algo a ser mudado.
Na verdade, Neemias tinha tomada a decisão de virar Jerusalém ao avesso.
A cidade estava assolada. As portas dos muros estavam queimadas a fogo e os muros estavam derrubados. Os inimigos entravam e saíam à vontade.
Nem todos somos Jerusalém. Nem tudo em nossa vida tem que ser reconstruído, mas há sempre algo a ser melhorado.
Seja pouco, seja muito o que precisa ser feito, o primeiro passo é a decisão.
Numa enquete com pessoas visitantes do site www.itacuruça.org.br, visando atitudes para um novo ano, perguntei: o que você mais almeja para este novo ano? Um terço respondeu que queria paz interior. Em segundo lugar, veio o desejo por “um novo relacionamento afetivo”.
Quem quer paz interior precisa decidir ter paz interior, e há uma caminhada longa neste sentido. Quem quer se envolver num novo relacionamento afetivo precisa tomar idêntica decisão. Quem quer mais tempo para orar (o terceiro desejo) precisa decidir que vai separar tempo para a oração no seu agitado dia-a-dia. Quem quer um carro (que foi a quarta resposta) precisa decidir que tudo fará para que esta compra se dê.
Quem deixar as coisas como estão não pode reclamar no futuro que nada se fez, porque nada se fez mesmo, porque não houve a decisão de se fazer, ou de se tentar. Antes e durante o tempo de Neemias, a situação incomodou a muitos, mas Neemias tomou a decisão de fazer algo para mudar aquele estado de coisas.
 
5. Precisamos olhar para o que queremos ver transformado.
Depois da decisão vem o conhecimento. Precisamos conhecer o objeto a ser mudado. Precisamos contemplar o mundo a ser transformado.
E há dois mundos a ser contemplados.

5.1. O primeiro é o mundo interior.
A mudança tem que começar em nós. Até o capítulo 4 temos um Neemias irrepreensível. Então, o povo pobre começou a reclamar da elite, da qual fazia parte o governador Neemias.
Neemias se incluiu no grupo dos opressores e se propôs a mudar de prática. Neemias percebeu que nele também havia erro. Ele também cobrava juros.
A vida de Neemias mudou a partir daí. A sua visão de uma grande obra a ser realizada não o impediu de ver seus próprios erros. Os líderes também têm pés de barro.
A partir desta conversão, Neemias passou a fazer uma oração, que pode nos soar estranha, mas ela se assemelha, ao seu jeito, à oração do salmo 139, aquela em que o poeta pede que o Senhor o sonde. Neemias ora assim:
1. “Lembra-te de mim, oh meu Deus, levando em conta tudo o que fiz por este povo” (Neemias 5.19).
2. “Lembra-te de mim por isso, meu Deus, e não te esqueças do que fiz com tanta fidelidade pelo templo de meu Deus e pelo seu culto” (Neemias 13.14).
3. “Lembra-te de mim também por isso, oh meu Deus, e tem misericórdia de mim conforme o teu grande amor” (Neemias 13.22b).
4. “Em tua bondade, lembra-te de mim, oh meu Deus” (Neemias 13.31b).
Gosto da sinceridade de Neemias nas duas primeiras orações. Mas gosto também de ver Neemias crescendo na fé, porque nas duas orações seguintes ele não se baseia mais na sua fidelidade e bondade, mas na bondade e fidelidade de Deus.
Aos poucos ele vai percebendo, ao olhar para dentro de si mesmo, Quem é Deus.

5.2. O mundo exterior
Olhar o mundo interior, que é muito pior, prepara-nos para olhar o mundo exterior.
Como parte de sua empreitada, Neemias fez uma viagem solitária. Eis como lemos: “De noite saí pela porta do Vale na direção da fonte do Dragão e da porta do Esterco, examinando o muro de Jerusalém que havia sido derrubado e suas portas, que haviam sido destruídas pelo fogo” (Neemias 2.13).
Precisamos conhecer o que queremos mudar.

6. Precisamos orar.
Orar aparece aqui em sexto lugar, mas é um dos primeiros verbos que Neemias conjuga. Lemos logo no primeiro capítulo: “Quando ouvi [o relato de como iam as] coisas [em Jerusalém], [Neemias assentou-se chorou. Ele passou] dias lamentando-me, jejuando e orando ao Deus dos céus” (Neemias 1.4).
Neemias, o habilidoso assessor do rei Artaxerxes, o competente engenheiro, o inteligente estadista, o arguto estrategista militar, era um homem de oração.
Ele orava porque sabia que é Deus quem cria as oportunidades. Não foi sua tristeza transparecia da tez que criou a oportunidade de liderar uma caravana a Jerusalém. Foi Deus quem o fez. Mesmo quando o rei lhe concedeu os passaportes e os recursos para a viagem, Neemias reconheceu que foi a befazeja mão de Deus sobre ele que tornou tudo isto possível tudo isto (Neemias 2.8s).
Pelo mesmo motivo devemos orar. Não é o acaso que cria as condições para a virada. Não é o caos que oferece oportunidades para novos caminhos. É Deus intervindo.
Neemias orava para que Deus lhe pusesse no coração o que deveria realizar (Neemias 2.12). Quando oramos, temos a oportunidade de ouvir Deus nos chamando. Quando oraamos, damos a Deus a oportunidade de confirmar a obra de nossas mãos.
Neemias orava para que Deus fortalecesse as suas mãos (Neemias 6.9b). Eram as suas mãos que deviam fazer, mas suas mãos fortalecidas por Deus.
Deve ser este o nosso caminho, mesmo que feito em lágrimas.

7. Precisamos saber que a oração não substitui a ação.
Neemias orava e agia. Ele sabia que a oração não substitui a ação. Ele não orava e cruzava os braços. Na Bíblia, aquietar-se (acalmar-se) não é cruzar os braços; antes, é pôr os braços em movimento, sabendo que o Senhor agirá junto conosco.
Dois versos nos revelam o itinerário correto:
. “Eu lhes respondi: `O Deus dos céus fará que sejamos bem-sucedidos. Nós, os seus servos, começaremos a reconstrução'” (Neemias 2.10a).
. “Nós, porém, oramos ao nosso Deus, e pusemos guarda contra eles de dia e de noite” (Neemias 4.9).
Oração e ação, nesta ordem sempre, são complementares.

8. Precisamos saber que a oração não elimina a oposição.
Na verdade, todo aquele que se propõe a mudar algo em sua vida ou no mundo em que está precisa saber que a oposição, que estava silente, gritará.
A oposição segue o roteiro traçado por Sambalate, coadjuvado (a oposição nunca é singular, mas sempre plural). Leiamos:
“Quando Sambalate soube que está­vamos reconstruindo o muro, ficou furioso. Ridicularizou os judeus e, na presença de seus compatriotas e dos poderosos de Samaria, disse:
— O que aqueles frágeis judeus estão fazendo? Será que restaurar o seu muro? Irão oferecer sacrifícios? Irão terminar a obra num só dia? Será que vão conseguir ressuscitar pedras de construção daqueles montes de entulho e de pedras queimadas?
Tobias, o amonita, que estava ao seu lado, completou:
— Pois que construam! Basta que uma raposa suba lá, para que esse muro de pedras desabe!” (Neemias 4.1-3)
Não tivesse Neemias uma boa auto-estima, voltaria correndo para Pérsia, para chorar no colo do rei…
Precisamos saber que, ao nos pormos a virar o jogo, seremos chamados de fracos, incapazes, sem suficiente fé, impotentes e idiotas.
Diante da conspiração contra a virada, Neemias orou. A informação está imediatamente após as falas de Sambalate e Tobias: “Ouve-nos, oh Deus, pois estamos sendo desprezados” (Neemias 4.4).

9. Precisamos agir.
Não basta decidir que a vida vai mudar, porque não vai, se a decisão não for completada com a ação.
Não adianta orar para que a vida mude, porque não vai mudar, se a oração não for complementada com a ação.
Decisão e oração devem nos acompanhar.
O homem decidido e o homem de oração era um homem de ação.

Vejamos como Neemias agia.
9.1. Ele agia com confiança. Agir com confiança é agir sabendo que se faz uma obra de Deus.
Esta confiança lhe inspirava coragem e ousadia. Sua coragem se desenvolvida em meio ao medo. Ele temeu (Neemias 2.2), mas não se deixou paralisar. Confiante, agiu. Diante do rei, que o flagrou triste, teve a coragem de pedir o que precisava. Diante de Sambalate e seus companheiros, teve a coragemde não se intimidar. Diante da imensidão da tarefa (a reconstrução de Jerusalém), não se acovardou e foi e fez. Para isto, correu o risco (Neemias 2.13-14), de visitar sozinho, e de noite, os escombros dos muros a serem restaurados.

9.2. Ele agia com inteligência. Agir com inteligência é buscar a forma melhor de se fazer o que se precisa fazer.
Neemias foi sozinho e secretamente visitar a área a ser reedificada. O segredo era essencial para que pudesse manejar com os adversários internos e externos ao “ambicioso” projeto.
Em seu trabalho, o governador usou os seus conhecimentos, obtidos num país estrangeiro. O modo como coordenou a restauração dos muros é discutido nos livros de administração como simplemente notável, por vários aspectos, como o trabalho coordenado, entre outros aspectos.

9.3. Ele agia com um projeto. Quando temos um projeto, sabemos para onde vamos. Sabendo para onde vamos, temos como chegar.
O trabalho de Neemias teve várias etapas. Sua reconstrução estava planejada para ser patrimonial, mas também espiritual. Ele começou com a reforma patrimonial, mas seu plano incluía o reavivamento espiritual. Por saber onde queria chegar, chegou.
O planejamento foi essencial. Quando lemos o relato da reconstrução, notamos que aquele não foi um mutirão desorganizado, mas um mutirão planejado nos seus detalhes relevantes. Neemias teve uma visão, percebeu a oportunidade e se organizou, concebendo um projeto detalhado, para a sua realização.
(Aqui preciso lembrar a alguns que não devem se esconder atrás do planejamento. Há muitos que, a pretexto de planejar, planejam a vida inteira, mas não se dispõem a tirar seu projeto do plano do desejo ou do papel. É melhor, embora pouco sábio, fazer sem planejar do que planejar sem fazer.)

9.4. Ele agia com persistência.
Diante da distância em que se encontrava, Neemias persistiu e fez a caminhada até Jerusalém. Para a viagem precisava de autorizações e ele as obteve.
O que o separa do seu ideal? O ideal de Neemias era uma nova Jerusalém. E o seu? Vá e faça.

Diante da visão da obra a se realizada, com tudo estando por ser refeito, Neemias persistiu e se empenhou para a restauração acontecesse, e aconteceu.
Sua vida está no chão? Persista na reconstrução. O mundo ao seu redor está ruindo, persista em levantá-la.

Diante da oposição de Sambalate e sua camarilha, Neemias persistiu, tomando a dificuldade como uma oportunidade. Sambalate lhe fez bem, porque exigiu que orasse mais, que planejasse mais, que caprichasse mais.
Você também tem os seus sambalates? Ficou triste com isto, achando-se melhor que Neemias? Agradeça a Deus por eles e não se deixe intimidar.

Diante do gigantismo do trabalho a ser desenvolvido, Neemias persistiu, recrutando gente, organizando gente, estimulando gente.
São poucos os obreiros, mas se você um deles, não olhe para o que ainda tem que ser feito, mas para o que já foi feito. A promessa bíblica é clara: quem começou a obra em você (ou através de você) vai terminá-la.

Diante da ameaça do inimigo, Neemias persistiu, mesmo tendo que transformar uma obra civil (a reconstrução dos muros) numa operação militar.
Pode ser seu inimigo esteja em casa, mas não desanime. Persista.

Diante das intrigas internas, Neemias persistiu, chamando para si a responsabilidade de resolvê-las todas.
Se você é um líder, não se exima de suas responsabilidades.

Diante das críticas justas que recebeu, de também ser um explorador dos pobres, como fazia a elite que integrava, Neemias persistiu, arrependendo-se do seu pecado, reencontrando-se com o seu Deus e ampliando a sua obra, que deixou de ser apenas de engenharia material para ser uma engenharia espiritual, cujo resultado foi um reavivamento nacional.
Tem recebido críticas pelo que tem feito? Veja se são justas. Se são, mude, confesse, lamente-se, jejue. Se não são, apague-as do seu coração, para que não virem mágoas.

Diante do afastamento espiritual do povo, Neemias persistiu e conseguiu, com êxito, conclamá-lo ao arrependimento, por meio da leitura da Palavra de Deus.
Não perca o foco do que precisa ser feito.

Diante da necessidade de povoar Jerusalém, de modo a poder ser defendida, Neemias persistiu, usando e recursos estratégias capazes de acelerar este processo.
Que você tem nas mãos para realizar a obra que Deus lhe confiou? Peça-Lhe para fortalecer as suas mãos.

Diante do comportamento da elite e do povo, Neemias persistiu, dotando a todos de instruções que, seguidas, abençoaram toda aquela gente.
Abençoe quem precisa ser abençoado.