Vento contra

Henry Ford enfrentou muitas dificuldades na vida, antes, durante e depois de ser o mais bem sucedido empreendedor de sua época. E é dele o seguinte convite: “Lembre-se que o avião decola contra vento, não a favor dele”.
A frase me tocou porque gosto de viajar de avião e me encanto quando ele sai do solo, impelido pelo vento. Depois disso, o adversário se torna amigo e a aeronave singra os ares. No entanto, foi preciso enfrentar o vento contrário.
Procuro por “vento” na Bíblia e nas 155 vezes em que aparece, acho pouca relação com o pensamento de Ford. Acho, no entanto, uma referência que tem tudo a ver: “Quem fica observando o vento não plantará e quem fica olhando para as nuvens não colherá” (Eclesiastes 11.4).
Quem fica contemplando a força do vento recolhe-se sob alguma proteção. O piloto, ao contrário, observa o vento e arremete sua aeronave contra ele, que o faz subir.
Penso nos pais que tendemos a evitar que nossos filhos peguem vento contra. É duro: se não pegarem vento contra, não vão subir, só se amarrados a nós, que voamos apesar do vento. Ah somos maduros; nossos filhos não são. Sim: e quando o serão, se não aprenderem a enfrentar ventanias e tempestades?
Acho ainda outro texto, que não tem nada a ver com vento ou aviação, mas tem a ver com a vida. Nele o querido apóstolo Paulo escreve: “Portanto, eu me gloriarei ainda mais alegremente em minhas fraquezas, para que o poder de Cristo repouse em mim. Por isso, por amor de Cristo, regozijo-me nas fraquezas, nos insultos, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias. Pois, quando sou fraco é que sou forte” (2Coríntios 12.9b-10).
Somos chamados a considerar como bênçãos os ventos contrários, para que o favor de Cristo repouse sobre nós e nos conduza. Que são fraquezas, insultos, necessidades, perseguições e angústias, senão ventos contrários?
EM TEMPO: escrevi esta crônica antes da tragédia de Congonhas, que nos deixa com muito medo de viajar de avião. Evitável ou não, o acidente é um vento contra a aviação comercial. Espero que todos, empresários e governantes, usem este vento contra para vôos melhores. Quanto às milhares de pessoas que perderam cônjuges, filhos, pais, netos, avós e outros familiares e amigos, para eles rogo a Deus que, visitando-os, o Seu Espírito lhes sobre conforto e vigor. Enquanto a vida segue, os sinos (como aprendemos com o poeta inglês John Donne) dobram pelos que se foram, mas tocam mais forte pelos que ficamos. Essas mores nos diminuem.

ISRAEL BELO DE AZEVEDO