ADORAÇÃO E VIDA
2Crônicas 20.1-37
O povo de Israel, à época liderado pelo rei Josafá (o quarto reino do reino de Judá, no sul), enfrentou uma séria dificuldade, no caso a ameaça vinda de um exército muito forte. O povo, Josafá à frente, buscou socorro em Deus e foi atendido.
A leitura de 2Crônicas 20.1-37 cai como um bálsamo para pessoas aflitas, seja qual for a origem de sua angústia. Recomendo que seja lido com atenção, porque serve de consolo e orientação.
Desejo que a leitura deste texto sirva de alento para a vida dos aflitos.
No entanto, quero extrair deste capítulo um outro tipo de conteúdo. Quero que esta história nos ensine sobre adoração e vida. Sim, adoração e vida, porque tendemos separar adoração e vida, como se a adoração fosse um intervalo na vida. Estamos diante de uma história em que vida e adoração caminham juntas, em que a adoração alimenta a vida, como sempre deve ser.
1. Adorar a Deus é buscar a Deus.
Coerente com sua vida de adoração, mesmo alarmado, Josafá buscou a ajuda de Deus, por meio da oração e do jejum. O capítulo é a narrativa de uma vitória de Deus na vida do seu povo. Toda vitória nossa, para receber este nome, é vitória de Deus em nós. Nossa vitória é Deus ou não é vitória.
A vitória foi buscada por meio da adoração e por vários meios. A adoração a Deus inclui a música vocal (congregacional e coral [com o coro dos levitas — versos 21 e 22] ou instrumental [com liras, harpas e cornetas — verso 28], mas não exclui outras modalidades, como oração (verso 6) e jejum (verso 3) e cultos públicos (versos 5 e 28).
A adoração a Deus se realiza em muitos lugares, embora não precise de lugar algum. Foi por isto que Jesus disse à mulher samaritana que não havia um monte especial para adoração; o monte da adoração é onde estão dois ou três reunidos em nome de Jesus. Por isto, a adoração pública começa no culto particular, aquele que prestamos sozinhos, em casa, na rua, no trabalho.
A biografia de Josafá é a de um homem que buscava a Deus. O povo de Israel estava em paz, quando a guerra chegou. O rei ficou alarmado. A fidelidade Josafá não impediu que as dificuldades surgissem. A adoração a Deus, portanto, não nos protege dos problemas da vida. Alguns nos deixam apavorados, tão graves são. Isso pode nos acontecer a qualquer momento. Então, geralmente nos perguntamos: por que comigo, Senhor, se lhe tenho sido fiel?
Diante das guerras da vida, devemos adorar a Deus, até por causa dessas guerras.
Adoração não pode ser um intervalo na vida. Adoração não é só para quando a guerra vem, mas deve ser uma atitude que nos deixa preparados para a guerra. Adoração a Deus é amizade com Deus. Neste texto, Abraão foi chamado de amigo de Deus (verso 7). A referência faz eco à voz de Deus em Isaías (“Você, porém, oh Israel, meu servo, Jacó, a quem escolhi, vocês, descendentes de Abraão, meu amigo” — Isaías 41.8) e ao ensino de Tiago (“Cumpriu-se assim a Escritura que diz: `Abraão creu em Deus, e isso lhe foi creditado como justiça’ e, e ele foi chamado amigo de Deus” — Tiago 2.23).
Adoramos para melhorar nossa amizade com Deus. Se o culto, particular ou público, nos tornou mais amigos de Deus, foi um culto a Deus. Este é um dos critérios para avaliarmos o culto que oferecemos ao Senhor.
2. Adorar é reconhecer Quem Deus é.
Parece que toda a Bíblia tem um só objetivo: mostrar-nos quem Deus é. Quando sabemos disto, nossa vida caminha sobre os trilhos da paz.
Quando a Bíblia exalta a Deus é para que nós O reconheçamos. Se precisamos de Deus e sabemos Quem Ele é, conhecemos suas promessas e nos alimentamos do que Ele é. Diante do perigo, Josafá adorou a Deus, reconhecendo: “Senhor, Deus dos nossos antepassados, não és tu o Deus que está nos céus? Tu dominas sobre todos os reinos do mundo. Força e poder estão em tuas mãos, e ninguém pode opor-se a ti” (verso 6). O Deus que fez faz.
Quando exaltamos a Deus, reconhecemos nossa própria finitude. Esta tensão é indispensável. Gosto da sinceridade de Josafá, que deve ser a de todo adorador: “não temos força para enfrentar esse exército imenso que vem nos atacar. Não sabemos o que fazer, mas os nossos olhos se voltam para ti” (verso 12). Suas palavras refletem seu coração. Ele sabia Quem Deus era e quem ele era. Por isto, prostrava-se diante dEle (verso 18). Adorar é prostrar-se para exaltar a Deus (verso 17). O contrário é exaltar-se para negar a Deus.
É por isto que adorar a Deus é ficar diante dEle (verso 13), seja para exaltá-lO, seja para buscar o Seu socorro. Este é outro critério para avaliarmos o culto que oferecemos a Deus: ficamos diante dEle, ou apenas diante dos amigos?
A adoração a Deus nos realiza esteticamente, mas não é este o seu objetivo. Quando Josafá organiza os levitas, ele o faz para que participem da guerra, adorando a Deus e levando o povo a adorar este Deus. A estética é uma dimensão humana. E o humano gosta de ver. O que se vê é espetáculo. A permanente questão é se a adoração, no caso, um culto em que se adora a Deus, pode ser visto como espetáculo. Pode, mas não será mais adoração. Será espetáculo. Aqueles que participam de um culto na função de liderança (instrumentistas, regentes, coristas, que tanto se esforçam, à beira até do sacrifício) devem aprimorar o que fazem, no mesmo nível de um espetáculo, mas eles não tocam, regem ou cantam para serem vistos por uma platéia, embora sejam contemplados por ela; seu alvo é outro; seu alvo é levar a platéia a contemplar Deus em sua amorosa grandeza. Um crente pode participar de um evento; participará de um espetáculo, se ouvir ou ver; participará de um culto, se, ouvindo ou vendo, cantando ou tocando, reconhecer a sua finitude e perceber a infinitude de Deus. É a consciência da nossa pequenez que nos lança para cima. Um espetáculo é aferido por sua beleza e harmonia; um culto é aferido por sua beleza e harmonia e também pelo tipo de impacto que provoca na vida do adorador. Se, ao adorarmos, reconhecemos a majestade de Deus, então adoramos.
Adoramos a Deus quando agradecemos por suas ações em nossas vidas. Quando o exército de Josafá recebeu o triunfo das mãos de Deus, no meio do caminho, de volta para casa, e antes que algum general reescrevesse a história para roubar a cena para si, houve uma pausa essencial: “No quarto dia eles se reuniram no vale de Beraca, onde louvaram o Senhor. Por isso até hoje esse lugar é chamado vale de Beraca” (verso 26). Em lugar de emendarem uma luta com outra, eles pararam para agradecer. Neste sentido, o momento mais elevado da adoração é a gratidão pela(s) bênção(s) recebida(s). A bênção recebida é uma prova de quem Deus é. A bênção agradecida é uma prova de que Deus agiu. O poder de Deus é contagiante. O louvor a Deus tem que ser algo contagiante
3. Adorar a Deus é ouvir Deus falar.
Quando ficamos diante de Deus, Ele fala conosco. A adoração nos capacita para a vida. Portanto, a adoração a Deus é didática.
Este é outro critério para julgarmos o nosso culto. Adoramos? Seja em particular, seja no culto público, devemos nos perguntar: O que Deus nos falou hoje? Pode ser pela mensagem, pela música, pela voz silenciosa no coração. O que importa é se Ele falou.
Na adoração Deus fala conosco. E o que nos fala?
Nesta história, lemos que o profeta Jaaziel pregou: “Escutem, todos os que vivem em Judá e em Jerusalém e o rei Josafá! Assim lhes diz o Senhor: ‘Não tenham medo nem fiquem desanimados por causa desse exército enorme. Pois a batalha não é de vocês, mas de Deus. (…) Vocês não precisarão lutar nessa batalha. Tomem suas posições, permaneçam firmes e vejam o livramento que o Senhor lhes dará, o Judá, o Jerusalém. Não tenham medo nem desanimem. Saiam para enfrentá-los amanhã, e o Senhor estará com vocês’” (versos 15-17).
Adoração dá ânimo à vida. Você anda com medo? Adore a Deus. Você anda desanimado? Deixe Deus falar ao seu coração enquanto presta culto a Ele, em casa ou no templo. Você contempla a Deus, mas Ele não está mudo.
Quando adoramos a Deus, somos corrigidos por Ele. A graça inclui a disciplina.
Josafá, o grande Josafá (que diremos de nós, tão pequenos!), tinha algo a ser corrigido na sua vida. São assim os heróis da Bíblia, verdadeiros como nós devemos ser.
Josafá, por medo ou por comodismo, não reformou por completo a religião. Como o povo gostava de adorar aos ídolos (é assim em todos os tempos, até hoje), o rei deixou os altares para ali se satisfazerem. Como resultado, o povo não se converteu a Deus; logo após a morte do rei, afundou-se por completo na lama da idolatria.
Josafá, por auto-confiança e falta de humildade, deixou de confiar em Deus para a vitória e passou a confiar na sua própria força. Por isto, fez um acordo operacional com seu vizinho, o ímpio Acazias, que governava o reino de Israel, no norte. Os dois se juntaram para construir navios mercantes. O problema é que Acazias não temia a Deus, como Josafá temia. O problema é que ambos estavam permitindo que o poderio tecno-econômico lhes subisse ao palácio. Deus não recusa o crescimento tecno-econômico; Deus recusa a soberba que pode acompanhar o crescimento, seja ele profissional ou financeiro, porque a soberba antecede a queda. A Bíblia ecoa esta exortação (“Quando vem o orgulho, chega a desgraça, mas a sabedoria está com os humildes” — Provérbios 11.2; “O orgulho vem antes da destruição; o espírito altivo, antes da queda” — Provérbios 16.18). Por isto, frustrou o projeto. (Conforme lemos, o profeta Eliézer (…) profetizou contra Josafá, dizendo: `Por haver feito um tratado com Acazias, o Senhor destruirá o que você fez’. Assim, os navios naufragaram e não se pôde cumprir o tratado comercial”. — verso 37).
A advertência de Eliézer é para nos lembrar que nosso louvor deve ser só para Deus, não para nenhum Acazias poderoso. Nosso louvor é para Deus, não para nós mesmos, não para nossas causas, não para coisas, não para pessoas.
Devemos cuidar para que outros deuses não ocupem nossos “altares” de adoração. Para adorar, precisamos vigiar, para que não confiemos em nós mesmos ou em nossa tecnologia. E esta é a área de maior perigo. Adorar é perigoso. A adoração pode se tornar idolatria. Adoração a Deus demanda integridade diante de Deus. Podemos adorar a Deus sem integridade. Podemos adorar a Deus e ter outros deuses no bolso, para uma necessidade que, quem sabe, Deus não deve ser consultado, até porque já conhecemos Sua expressa vontade como apresentada em Sua Palavra.
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Então, antes de concluir, sintetizo os critérios pelos quais a adoração deve ser conferida.
Depois de um culto (na solitude de nossa casa ou na comunidade), devo me perguntar:
. Tornei-me ainda mais amigo de Deus? Adoramos para melhorar nossa amizade com Deus.
. Fiquei diante de Deus ou apenas diante dos amigos?
. O que Deus me falou hoje?
Todo culto deve ser uma experiência de adoração, não de um ritual que se repete, vazio como uma luta vazia. O apelo é à seriedade.
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Aos adoradores (da congregação e das equipes), que somos todos nós, cabe outro desafio, além destes?
. Estou fazendo o máximo que posso? Tenho procurado cantar melhor, mesmo que seja apenas na congregação. Tenho me dedicado aos ensaios, no coro ou equipe instrumental? Reconheço que posso fazer melhor o que faço?
. Tenho procurado viver uma vida de adoração, de modo que minha adoração reflita a minha vida? O que de mim se escreverá? Serei exaltado como o Josafá a quem Deus concedeu vitórias? Serei achado em falta, por adorar os ídolos? Estarei me associando com os Acazias, para me exaltar?
Há sempre áreas em nossas vidas com falhas a serem corrigidas, com altares a serem destruídos. O apelo é à santidade.
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Aos participantes (ouvintes/leitores) que ainda não adoram a Deus, embora freqüentem cultos, o desafio é à conversão, à adesão total ao Deus revelado em Jesus Cristo.
Só pode adorar a Deus quem vai a Ele por meio de Jesus Cristo, aceitando o sacrifício dEle para a remissão dos pecados.
Quer adorar? Receba a graça de Jesus.
ISRAEL BELO DE AZEVEDO