CORAÇÃO EM PAZ
João 14.1
1
Jesus pregou muitos sermões. Num deles (transcrito nos capítulos 14, 15, 16 e 17), Ele revelou seu próprio coração e preparou seus discípulos para os momentos finais de sua trajetória aqui.
Um pouco antes, chegando a Jerusalém, seguido por uma multidão, anunciara sua própria partida próxima. A perspectiva de sua morte lhe trazia preocupação ao coração. Ele mesmo o disse (João 12.27), embora soubesse que sua agonia traria glória para seu Pai e completaria sua missão aqui, missão que nos alcança até hoje.
Seus ouvintes chegaram a questionar se Ele era mesmo o Messias, já que estava anunciando que iria morrer e um messias não morre. Para muitos, incluídos aí seus discípulos, a morte seria o fracasso de sua missão. Quem iria crer nele, morto?
A caminho do momento crucial de sua vida, reúne seus seguidores mais íntimos para uma confraternização de final de vida, que conhecemos com “Ceia do Senhor”. Os curiosos ficaram de fora. Neste culto, que incluía orações, cânticos e pregação, duas revelações extraordinárias seriam feitas sobre as circunstâncias de sua morte. A primeira é que seria traído por um daqueles que comiam e bebiam com ele. E Judas, de fato, o traiu. A segunda é que um deles, que lhe jurava fidelidade permanente, acabaria por negá-lo três vezes numa mesma noite. E Pedro, de fato, o negou.
Que discípulo não ficaria perplexo? Todos, Pedro inclusive e Judas exclusive, porque saíra para armar a traição.
Tinham, portanto, seus discípulos todas as razões do mundo para a perplexidade.
2
A situação deles pode ser comparada a um casamento que foi desmarcado por um dos noivos, horas antes da cerimônia.
Ou a uma formatura, há tanto esperada, com os convidados já chegados, sendo cancelada na última hora porque o formando desapareceu sem dar notícias.
Ou com a descoberta de que o bebê, querido e esperado, está sem vida no ventre de sua mãe.
Ou com um diagnóstico de uma doença fatal sendo anunciada no dia anterior às férias cuidadosamente planejadas pelo casal.
Ou com a morte de um presidente minutos antes de tomar posse porque desapareceu num avião que afundou no mar.
Ou com a amargura de um funcionário demitido depois de bater todas as metas.
Ou com a decepção de um empresário que descobre que seu sócio e amigo de anos está roubando a empresa; com a dor de uma esposa que testemunha o adultério por parte do seu marido, até então amigo e fiel; com frustração de um amigo que é abandonado sem razão e sem aviso; com a indignação de um chefe de família que acorda com o estrato em branco de uma conta bancária formada por décadas de economia e sacrifício; com a estupefação de um pai ao concluir que seu filho é drogado.
Quem não ficaria perturbado?
3
Segundo o evangelista João, diante dos tristes momentos por virem, seus discípulos ficaram atônitos, perguntando-se sobre o que seria da vida deles sem seu mestre.
Jesus olha para dentro dos seus discípulos, tanto os que se mostravam desesperados quanto os que se mostravam calmos, e vê a preocupação lhes crispando os corações. Então, dirige-lhes as doces palavras:
“Não se perturbe o coração de vocês. Creiam em Deus; creiam também em mim” (João 14.1).
A cena pode ser transferida para os nossos dias e mirar também os nossos corações. As palavras de Jesus nos soam como uma promessa e um convite, porque somos submetidos a pressões diversas.
Como não ficar com o coração perturbado quando a lógica é que fiquemos perturbados?
Como ter paz no coração, que é ter o coração revestido de serenidade mesmo quando o inferno está socando a porta e tumultando os portões da nossa casa (conforme a expressão de J.H. Jowet)?.
Jesus responde: “creia em Deus; creia em mim”. É como se dissesse: “Daqui a pouco eu serei crucificado, mas não fiquem perturbados. Creiam em Deus; creiam em mim. Daqui a pouco eu estarei morto, mas não fiquem perturbados. Creiam em Deus; creiam em mim”.
Em forma sintética, Jesus nos diz, então agora, podemos imaginar: “Creia na soberania absoluta, na sabedoria absoluta, na fidelidade absoluta, no amor absoluto de Deus.
Creia no Deus poderoso do Antigo Testamento, que fez o que fez. Creia no Deus amigo do Novo Testamento, que fez o que fez. Eu [Jesus] sou a prova de que Deus não mudou.
Lembre-se do Deus que agiu no passado, no passado registrado na Bíblia, no passado de seus discípulos, no passado de sua família, no seu próprio passado. O Deus que agiu no passado age agora também. Lembre-se que, em situações difíceis da sua vida, você encontrou alívio para a sua tristeza nas promessas de Deus. Estas promessas continuam impressas em letras de ouro que brilham diante de vocês”.
Quando diz “creia em Deus, creia também em mim”, Jesus está dizendo que as promessas de Deus estão demonstradas visivelmente nEle.
Jesus não nega as dificuldades, fechando os olhos para a realidade. Não espera que neguemos as pressões e nos afundemos numa religião que pretenda impedir que vejamos, que sintamos, que soframos. Ele quer que creiamos.
Jesus nos diz que a paz interior não vem de uma vida mergulhada em tranqüilas circunstâncias mas de corações que não ficam perturbados com as circunstâncias difíceis, sejam pressões por resultado no trabalho ou dificuldades por falta de trabalho, sejam conflitos desanimadores em casa ou demandas irrefreáveis por consumo, sejam perspectivas sombrias sobre a saúde (nossa ou de pessoa querida) ou o frenesi do corpo, sejam desgraças da injustiça, da criminalidade e da crueldade humanas ou falta de sentido por excesso de sentidos, seja o fio da dúvida se tornando caudaloso ou a fé transbordando ao ponto de virar alienação. A paz interior vem de Jesus, por meio da fé nEle como Senhor e Salvador.
Nosso problema é que, na busca da paz, gastamos mais tempo evitando as dificuldades do que conhecendo Jesus Cristo, em quem está a plena liberdade.
A paz interior vem não para quem nega as adversidades mas para quem as enfrenta com o poder de Jesus. A paz interior vem não para quem encara as adversidades confiante na força da sua sabedoria, mas para quem as enfrenta confiante no poder de Jesus, em Quem crê.
4
Quando diz “creia em Deus, creia também em mim”, Jesus está nos convidando a crer nEle como Senhor e Salvador.
Jesus é a promessa concretizada de paz na vida. Quando estava na agonia máxima provocada por seus inimigos, orou: “Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem”. Sua paz não advinha de ser amado pelas pessoas. Sua paz vinha de sua comunhão com o Pai. Só a paz quando nada nos separa do Pai e Jesus tornou possível nossa ida ao Pai.
Jesus é a promessa concretizada de orientação para vida. Quando não sabemos o que fazer, abrimos os evangelhos e encontramos luz para a nossa caminhada. Ele disse: “Eu sou a luz do mundo”. Bendito é aquele que se deixa conduzir por esta luz. As trevas forçam mas não predominam porque Jesus é a luz do mundo. Quem se põe no foco desta luz enxerga e não tropeça.
Jesus é a promessa concretizada de amizade. Quando nos achamos sozinhos, mesmo naquelas noites muito longas por trágicos eventos que aconteceram ou parecem que vão acontecer, podemos ouvi-Lo dizendo: “Eu estou com você todos os dias”.
As promessas de Deus estão demonstradas visivelmente em Jesus. Deus pode ser invisível;Jesus é visível. Deus é Espírito; Jesus é pessoa de carne e osso, que chorou como nós choramos, que ficou indignado como nós ficamos, que sentia compaixão pelos pobres e oprimidos como devemos sentir. Deus pode ser refeito por nós à nossa imagem e semelhança, mas Jesus é Deus que não temos como confundir porque temos visto a sua glória. Quem verdadeiramente crê em Deus crê também em Jesus. Quem verdadeiramente crê em Jesus crê também em Deus.
5
Não se perturbe. Você crê em Deus, que promete paz. Não deixe que o seu coração, o centro da sua vida emocional e espiritual, fique cheio senão de Deus.
Não se preocupe. Você crê em Deus, que promete orientação. Não deixe que a preocupação controle o seu coração.
Não fique ansioso. Você crê em Deus, que promete estar ao seu lado. Não deixe que a ansiedade domine o seu coração.
Não seja dominado pelo medo. Você crê em Deus, que é mais poderoso que todos os obstáculos, até aqueles que o seu coração produz. Não deixe que o medo tome conta do seu coração.
As muitas ondas da vida trazem perturbação ao coração. As muitas idéias que ouvimos trazem dúvida ao coração. Deus existe mesmo? Se se existe, tem interesse por mim?
Aconteça o que acontecer, creia em Deus.
Mesmo que não esteja crendo, continue crendo.
Mesmo que não esteja vendo, continue crendo.
Mesmo que não esteja entendendo, continue crendo.
Para crer, creia.
Para crer, continue crendo.
Creia em Deus. Creia em Jesus.
ISRAEL BELO DE AZEVEDO