Quando a liberdade é uma prisão

Leia, primeiro, o depoimento abaixo. Depois digo quem é autor e faço um comentário.

“Um querido amigo morreu na semana passada, depois de 15 dias no hospital. Nesse período, que passou quase todo inconsciente, seu fígado, coração, pressão e pulmões quiseram várias vezes abandoná-lo. Teve também alucinações. Os remédios que lhe aplicaram paralisaram-lhe os rins. Se não fosse tão forte, teria ido logo embora. Até que nem ele aguentou. Em certo momento, os contadores dos mecanismos que tentavam mantê-lo vivo foram zerando, um por um. Tinha 50 anos.
A causa da morte, no relatório médico, foi choque séptico-pulmonar. Mas, por trás desse diagnóstico frio e neutro, havia 30 anos de consumo pesado de álcool e drogas, dos quais os primeiros 20 foram uma sucessão de festas, risos, frases rápidas, sucesso profissional e grande apetite pela vida. A dependência, no entanto, não deixa de cobrar a conta. E o pagamento é a vida.
Seu irmão, quase da mesma idade e com o mesmo quadro, terá destino igual, com a desvantagem de que sua vida nunca foi aquela euforia. A namorada de meu amigo, alguns anos mais nova, também não deve durar muito tempo. Como não precisa trabalhar para viver, pode dedicar-se full time às substâncias que, a esta altura, já nem lhe dão prazer -apenas impedem que passe mal.
Outra amiga sua, exatamente de sua geração, e o filho dela, de pouco mais de 20 anos, gente de classe média e berço fino, estão incrivelmente na cadeia, depois de um desastrado assalto a um taxista, de quem tentaram levar a féria para comprar cocaína. O ex-marido desta mulher, por sinal, há muito já viu sua carreira profissional encerrada pelo ácido. E por aí vai.
Há hoje uma grande incidência de pessoas na faixa dos 50 com data marcada para morrer. São os que acreditaram que a década de 70 iria durar para sempre. Os que viveram para chegar até aqui, claro”.

O artiguete é do historiador Ruy Castro, em sua coluna na Folha de S. Paulo, de 25.3.2009. Não é um moralista.
Seu artigo, no entanto, é apenas a evidência daquilo que o apóstolo Paulo escreveu: o salário do pecado é a morte.