O jornalista Ruy Castro conta uma história que nos ensina o poder da mágoa.
Na Copa de 50, realizada no Maracanã, o escalado para enfrentar a Suécia, no jogo inaugural foi Julinho e não Garrincha.
“Havia forte suspeita de que o Brasil teria Julinho, do Palmeiras, na ponta-direita, em lugar de Garrincha, que, para desgosto do treinador Feola, passara a semana fugindo da concentração para os lençóis da vedete Angelita Martinez. Quando os times entraram em campo e a suspeita se confirmou, o Maracanã vaiou Julinho. Uma vaia como nunca se vira. Um assustador assobio em uníssono, que abafaria os hinos e se estenderia à primeira bola que ele recebesse.
Mas Julinho, mesmo chorando, reagiu à altura. Mal dada a saída, deixou um inglês no chão. E, com menos de dois minutos, abriu o placar. O Maracanã curvou-se e, pelo resto da partida, passou a gritar seu nome a cada vez que ele tocava na bola. E, como Julinho acabou com o jogo, os aplausos não paravam. Diante da tevê, eu, 11 anos, tinha consciência de estar presenciando um momento histórico.
Trinta e cinco anos depois, em 1994, entrevistei Julinho em São Paulo (…) e percebi como sua mágoa era invencível. Ao recordar aquela tarde no Maracanã, ele só falava da vaia — que, da entrada em campo até o gol redentor, durara cinco minutos. Depois, tivera 85 minutos de aplausos e gritos de amor. Mas era como se os aplausos e gritos não tivessem existido”.