PARA LER O EVANGELHO DE MATEUS
ISRAEL BELO DE AZEVEDO
Título: Evangelho de Mateus
Capítulos: 28
Versículos: 678
Tempo aproximado para leitura: 60 minutos
O Evangelho de Mateus (ou Evangelho Segundo Mateus) é uma obra-prima de narrativa histórica sobre Jesus, que é a Pessoa central do livro. É “obra de um artista e mestre literário de primeira categoria” (E.C. Grant), artista que preferiu ficar anônimo.
Para mim, esta centralidade explica parcialmente o anonimato do autor. A tradição atribui a autoria do Evangelho a Mateus, o coletor de impostos mencionado duas vezes na obra (Mateus 9.9 e 10.3). O narrador quer ficar anônimo, para que o nome de Jesus fique em evidência.
O que ele quer, na verdade, ao prover um texto para ser lido semanalmente nas igrejas, é capacitar os seus leitores a manterem sua fé num contexto de oposição, que vinha do judaísmo e do paganismo. Ao mesmo tempo, ele pretende ensinar os leitores a viverem a ética do Reino dos céus.
ESTRUTURA
A estrutura do livro, bem desenhada, é dada pelo autor. Para notar esta estrutura, leia, por favor, os seguintes versículos, que são uma repetição, com ligeiras variações, da mesma expressão, como se fosse uma frase de transição (uma mudança de capítulo, como diríamos hoje): Mateus 7.28; 11.1; 13;53; 19.1; 26.10.
Eis a estrutura:
1. Preparação para ser Rei (Mateus 1-4)
2. Apresentação do programa do Reino (Mateus 5-7)
3. Treinamento para a missão do Reino (Mateus 8-10)
4. Pregação do Reino por parábolas (Mateus 11-13)
5. O Reino em meio à perseguição (Mateus 14-18)
6. O crescimento da oposição ao Rei (Mateus 19-25)
7. Sofrimento, vitória do Rei e comissionamento dos discípulos (Mateus 26-28)
SÍNTESE TEOLÓGICA
O livro é formado por uma narrativa sobre a vida de Jesus Cristo, que inclui histórias de milagres, debates com discípulos e adversários, sermões e parábolas.
Ao contar a história, o evangelista reafirma alguns valores:
1. Jesus é o Messias (Cristo) anunciado pelos profetas (há 17 referências neste sentido). Para Mateus, Ele é o Rei. Ele é apresentado em sua gloriosa majestade de Messias. Mateus situa Jesus num plano sobrenatural, bem acima dos seus discípulos, que 13 vezes se prostram dianta dEle (André Chouraqui).
2. A história tem sentido e este sentido é dado por Deus, que é o Senhor. Em Seu senhorio, sabe até quantos fios de cabelo há em nossas cabeças (Mateus 10.30). É por isto que o autor liga os fatos que narra com as profecias do Antigo Testamento (Mateus 1.22, 21.4, 26.54, 26.56). Há 50 citações veterotestamentárias.
3. O evangelho de Jesus Cristo é universal. Por isto o campo de atuação da igreja (palavra exclusiva, entre os Evantgelhos, de Mateus) é o mundo, conforme a grande comissão (ou a maior responsabilidade) transcrita no final do livro (Mateus 26.16-20).
PARA LER DEVAGAR
O sermão do Monte (Mateus 5 a 7) tem que ser lido bem devagar. Alguns versículos (como o “Pai Nosso”) precisam ser memorizados. Há lições de vida que não podem ser esquecidas, como a advertência sobre a nossa excessiva preocupação com as coisas materiais.
As parábolas do reino (Mateus 13) precisam ser lidas bem devagar, para que o sentido de cada uma delas ganhe corpo na nossa mente.
O TEXTO QUE MAIS TOCOU MEU CORAÇÃO
A escolha é difícil, porque me encanta aquele encontro de Jesus com Mateus (Mateus 9.9), chamando-o para ser seu discípulo. Foi só um olhar e o serventuário do fisco deixou tudo. Foi só um olhar.
Também me fascina a sugestão de que os lírios do campo se vestem melhor que as pessoas com dinheiro para comprar as roupas mais caras (Mateus 6.28). E eu posso viver assim, com os lírios, fazendo a minha parte e sabendo que Deus está no controle da minha vida.
Desafia-me ainda o convite de Jesus para tomar a minha cruz (Mateus 16.24) e segui-lo. Há desafio em entender a instrução. Há desafio maior em viver a instrução.
Fico, no entanto, com a extraordinária oferta, para ir a ele e deixar com ele o meu cansaço e a minha carga (Mateus 11.28). Estou desanimado? Posso ir a Jesus. Estou desesperado? Posso ir a Jesus. Ele é o único que me aceita como eu estou.
TEXTOS DIFÍCEIS
Os evangelhos apresentam baixo grau de dificuldade em sua compreensão. Contudo, o Evangelho de Mateus tem três textos que merecem mais atenção para serem bem lidos.
QUAL FOI O PAPEL DE PEDRO? — O primeiro trata do papel do apóstolo Pedro. Depois que faz sua confissão de fé em Jesus como sendo o Messias Filho de Deus, Pedro ouve de Cristo: “Você é Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do Hades não poderão vencê-la. Eu lhe darei as chaves do Reino dos céus; o que você ligar na terra terá sido ligado nos céus, e o que você desligar na terra terá sido desligado nos céus” (Mateus 16.19). Há três interpretações para esta entrega das chaves com o poder de ligar/desligar. A primeira, católica romana, que ensina que Jesus conferiu a Pedro a chefia da sua igreja, como o primeiro papa; quando lemos Atos, não vemos esta primazia de Pedro, que praticamente sai de cena quando a igreja se torna cosmopolita. A segunda, protestante clássica propõe que Jesus se refere à declaração de Pedro, referindo-se, portanto, a Si mesmo como Cristo; a interpretação demanda um estranho jogo de palavras, difícil de ser sustentado. Prefiro, junto com o teólogo Oscar Cullmann (1902-1998), pensar que Jesus encarregou Pedro de liderar a igreja nos seus começos em Jerusalém, o que de fato, aconteceu. Depois a liderança foi redistribuída, incluindo Paulo entre os não-judeus.
QUEM APARECEU NO MONTE? — No capitulo 17, temos a experiência da transfiguração, em que Moisés e Elias aparecem conversando com Jesus. O que aconteceu ali?
Embora alguns estudiosos defendam que Deus operou um milagre, ao trazer dois dos seus maiores profetas do paraíso para se apresentarem aos homens, parece mais adequado interpretar as aparições como visões. Uma leitura cuidadosa de Mateus 17.1-8, Marcos 92-8 e Lucas 9.28-36 mostra que o milagre consistiu em os discípulos verem Moisés e Elias e eles os viram como o Antigo Testamento os representa.
O rosto de Jesus se transfigurou, tomando talvez uma forma resplandecente, como aconteceu a Moisés no Monte Sinai. Em meio a esta transformação, os discípulos tiveram uma visão: a de contemplar Moisés e Elias conversando com Jesus. O aparecimento dessas duas personagens centrais do Antigo Testamento foi uma visão. A Bíblia condena a consulta aos mortos (Levítico 20.27), prática que custou caro ao rei Saul. Para confirmar a divindade do Seu Filho, Deus não lançaria mão de um recurso que Ele mesmo condena. Pelo contrário, a experiência da visão é uma forma usada por Deus para se comunicar com os homens, sempre carecidos de experiências concretas.
O QUE ACONTECEU E O QUE VAI ACONTECER? — Lemos no capitulo 24 um sermão de Jesus com uma natureza profética. Algumas profecias já se cumpriram (porque se referiam à destruição de Jerusalém, que ocorreria no ano 70) e outras, não (porque ocorrerão no final dos tempos). Como distinguir as duas? Os versos 2 e 34 mostram que as profecias eram para aquela geração. Os demais descrevem realidades do final dos tempos. Uma solução para o problema é a seguinte: Jesus falava ao mesmo tempo da destruição de Jerusalém e da destruição do mundo. Muitos sofrimentos típicos do final dos tempos se realizaram, só que em menor escala, com o cerco à Jerusalém pelo general Tito. Os leitores daquela época entenderam, mas também entenderam que viriam desolações ainda maiores, antecedendo a volta de Cristo. É o que estamos esperando.
VIVENDO OS ENSINOS DE MATEUS
Das páginas de Mateus, sai o seu ensino, mesmo que transmitido em forma de histórias e parábolas. A preocupação central de Mateus é apresentar o ensino de Jesus Cristo como um anúncio da chegada do Reino dos céus. A conseqüência é que os membros deste Reino devem viver um novo tipo de vida, que implica em rejeição, que deve ser substituída por uma radical obediência às regras do Reino, expressas basicamente em amor e compaixão (Marshall).
Eis o que Mateus ensina sobre Jesus:
1. Jesus via a condição precária em que vivia o povo e responsabilizava seus líderes por essa condição. Por isto, diz que os pobres são bem-aventurados (Mateus 5.3)
2. Jesus demostrou, através da sua presença entre os pobres, do ensino e da realização de atos poderosos, o amor de Deus para com o seu povo, formado de judeus e não-judeus que respondem ao convite para entrarem no Reino dos céus. Por isto, o nome de Jesus é Emanuel (Mateus 1.23).
3. Jesus incluiu os gentios alvos do Seu amor, convidando-os também a entrar no Reino. Por isto, não recusa curar a filha de uma estrangeira (Mateus 15.22)
4. Jesus morreu em nosso lugar, perdoando-nos dos nossos pecados (Mateus 26.28).
5.Jesus julgará o mundo quando voltar para a consumação do Reino dos céus (Mateus 25.31-46).
Eis, portanto, o que aprendemos, para viver:
1. Somos convidados a entrar no Reino dos céus.
2. O Reino dos céus deve ser ocupar o centro de nossas vidas. É a partir dele que todos os relacionamentos devem ser construídos.
3. Os valores do Reimo dos céus, mesmo que sejam desprezados pelo mundo em que vivemos, devem ser a bússola pela qual nos guiamos, como peregrinos que somos.
4. Devemos confiar num Pai que se relaciona com aqueles que respondem à boa notícia do Reino dos céus.
5. Os seguidores de Jesus devem formar uma igreja, cuja missão é convidar novas pessoas para o Reino dos céus.
6. O pertencimento ao Reino dos céus pode implicar em oposição até à morte, mas seus seguidores podem ter esperança, porque no fim o Rei Jesus vence.
PARA MEMORIZAR
“Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas lhes serão acrescentadas”. (Mateus 6.33)
“Tomem sobre vocês o meu jugo e aprendam de mim, pois sou manso e humilde de coração, e vocês encontrarão descanso para as suas almas. Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve”. (Mateus 11.29-30)
“O Filho do homem veio para salvar o que se havia perdido”. (Mateus 18.11)
“Portanto, vão e façam discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a obedecer a tudo o que eu lhes ordenei. E eu estarei sempre com vocês, até o fim dos tempos”. (Mateus 28.19-20)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CHOURAQUI, André.
MOUNCE, Robert H.
MARSHALL, I. Howard.
STERN, David H.