PARA LER A CARTA AOS ROMANOS

INTRODUÇÃO À CARTA DE PAULO AOS ROMANOS

 

POR
MICHEL FERREIRA

 

Título: Carta de Paulo aos Romanos

Capítulos: 16

Versículos: 433

Tempo aproximado para leitura: 120 minutos

 

Não há que se duvidar que a Bíblia em sua totalidade é considerada espetacular, fascinante e surpreendente, mas, quando um pastor de qualquer denominação menciona e sugere que a igreja abra a carta de Paulo aos Romanos, confesso que fico muito apreensivo.

Creio que ninguém tem autoridade para dizer que essa ou aquela carta ou livro ou parte da Bíblia é a melhor ou deve ser a mais considerada no que tange à relevância. Todavia, tenho que confessar que dou preferência e gosto mais de ler Romanos do que outros livros da Bíblia. Isto se dá pelos fatos e motivos que passo a expor. Vejamos:

Romanos, sem dúvida alguma, é a mais rica e mais completa exposição do apóstolo Paulo acerca do evangelho, bem como das principais questões da Bíblia, como salvação, pecado, depravação humana, natureza corrupta, lei, graça, fé, justificação, santificação, o lugar do judeu e do não-judeu nos propósitos de Deus e tantos outros temas.

Já ouvi muitos comentários errôneos acerca desta carta. Isto ocorre porque esta carta não foi feita para ser lida apenas e sim ser meditada, mastigada, sugada ao máximo, ser aproveitada em seus detalhes, minúcias e palavras.

Enfim, a carta aos Romanos pode ser equiparada a um tesouro escondido e enterrado, mas, quando achado, presenteia seu leitor com uma riqueza de entendimento que susterá sua vida para todo sempre.

Coaduna com a exposição o comentário advindo da Bíblia de Estudo de Genebra:

 

“Todos os reformadores viam Romanos como sendo a chave divina para o entendimento de todas as Escrituras, já que aqui Paulo une todos os grandes temas da Bíblia”. (p.1316)

 

Romanos não é uma carta para acomodados e sim para crentes famintos, curiosos e corajosos que estão dispostos a abrir mão de sua justiça e se render à justiça divina.

Não há que se entender Romanos com a nossa mente, que é tão finita e pequena, mas, sim, pedir que Deus coloque o seu entendimento em nós, de tal forma que venhamos a nos despojar de nossas ideologias e aceitar a verdade divina.

Mesmo que isso venha ferir princípios morais, culturais, sociológicos, filosóficos, políticos, religiosos e tantos outros, o que importa é que nossas mentes sejam libertas de nós mesmos e através de suas escrituras sagradas, Deus nos escravize cada vez mais a si; pois essa escravidão é a nossa liberdade, pois, viver com a mente de Cristo é ser livre de verdade, não só do pecado, mas de nossas vãs filosofias.

Por isso, no que tange a Romanos, a devida atenção deve ser prestada, pois muitos mistérios de Deus para o homem são revelados nessa carta; não mistérios no que toca aos misticismos ou esoterismos religiosos e sim mistérios já revelados nesta carta referentes ao plano de Deus para salvação do homem, que, uma vez entendidos, trará ao leitor uma nova forma de viver a vida, isto é, vivê-la de forma segura, confiante e apoiada na graça divina.

 

ESTRUTURA

A estrutura de Romanos apresentada de forma mais genérica, para melhor compreensão, pode ser vislumbrada nos seguintes moldes:

 

  1. Saudações de Paulo e introdução pessoal (1.1-15)
  2. A justiça de Deus para judeus e gentios (1.16-17)
  3. A pecaminosidade universal da humanidade (1.18-3.20)
  4. A Justiça de Deus para a justificação (3.21-5.21)
  5. A graça reina através da justiça de Deus (caps. 6-8)
  6. Deus demonstra sua justiça em relação a judeus e gentios (caps. 9-11)
  7. A justiça de Deus compreendida e expressada na vida de seu povo (12.1-15.33)
  8. Os planos de Paulo e as saudações finais (15.14-16.27)

 

BREVES RELATOS INTRODUTÓRIOS

De forma majoritária, tem-se entendido nos meios dos estudiosos da teologia que Paulo é autor da carta aos Romanos. Quando esta autoria tentou ser questionada, muito dificilmente tal tentativa alcançou algum êxito.

A princípio, a igreja romana não teve a possibilidade de estar em contato com algum apóstolo de forma direta, seja Paulo, Pedro ou qualquer outro apóstolo.

Paulo, quando escreve aos romanos, não os conhecia pessoalmente; todavia, tinha um enorme desejo de estar com eles algum dia. Afirma-se que Paulo, na verdade, estava bem atarefado com as questões atinentes às suas várias viagens missionárias; dessas ocupações e falta de tempo, acabou por surgir a oportunidade de Paulo escrever a sua carta aos Romanos.

 

SÍNTESE TEOLÓGICA

A igreja de Roma é composta por judeus e gentios convertidos, a priori mais gentios que judeus, e o objetivo principal de Paulo na sua escrita é tornar bem claro que todos, sejam gentios ou judeus, absolutamente todos, pecaram e destituídos estão da glória de Deus (Romanos 3:23) e conseqüentemente todos merecem a condenação eterna (Romanos 6:23).

Os judeus sentiam-se rejeitados, esquecidos, e não entendiam tais situações, tendo em vista que as promessas que foram feitas aos seus patriarcas, sobretudo a Abraão, eram incompatíveis com a rejeição que eles alegavam sofrer.

Na verdade, os judeus é que rejeitaram a Deus, bem como ao evangelho apresentado por Paulo. A partir dessa rejeição, Paulo dá início a seu ministério, levando o evangelho aos gentios, que foram se convertendo em grande número.

Os gentios que não faziam parte do grupo escolhido por Deus, que, no caso, era o povo de Israel (povo escolhido para manifestar as maravilhas de Deus) foram unicamente alcançados pela graça de Deus; isso causou ciúmes nos judeus, e esse ciúme, no fim, acabou por redundar na salvação destes, conforme o perfeito plano divino.

Os judeus, percebendo as grandes bênçãos que alcançaram os gentios, tiveram vontade, vontade esta muito positiva, de se arrependerem e voltarem para Deus a fim de reconhecerem sua soberania, bem como o senhorio de Cristo Jesus (Romanos 11).

É fácil observarmos que do capítulo 1 ao 15, Paulo desde o início até o fim de sua carta, quer deixar claro que tanto judeus quanto gentios foram condenados, mas, a misericórdia e graça divina, alcançou tanto um grupo como o outro, e que não há mérito em nenhum dos dois grupos, pois ambos estavam condenados por seus pecados, como melhor fica evidenciado nos capítulos 1,2 e 3. O amor de Deus, que foi bem maior que o pecado quanto a sua eficácia, alcançou a todos os dois grupos (Romanos 5).

Muitos problemas ficam evidenciados nessa carta, os judeus se vangloriavam, pois eram o povo escolhido desde lá de trás, guardavam as leis e costumes, faziam as festas etc; queriam encontrar justiça própria advinda de suas  práticas.

Os gentios, conforme se percebe da admoestação de Paulo (Romanos 11:17-18), e pelas brigas também repreendidas pelo apóstolo em Romanos 14, também se vangloriavam de terem sido alcançados unicamente pela graça de Deus, quando não faziam parte do grupo escolhido, como o povo nacional de Israel o era.

É a partir desse ponto que Paulo escreve a carta de Romanos, com a finalidade de deixar claro que não há mérito algum em nenhum dos dois grupos. Pelo contrário, ambos, pelos seus pecados, merecem a condenação eterna; e se a salvação alcançou os dois, foi única e exclusivamente pela graça, eterno propósito e amor divino, que em si, são insondáveis (Romanos 11:33-36).

 

PARA LER DEVAGAR

Não há dúvida que Romanos 11 precisa ser lido devagar, atentando-se sempre para suas minúcias, o que muito contribuirá para sua compreensão. Só isso não basta: o importante a se frisar também, e a insistência não é por demais excessiva, é que Romanos 11 seja lido sempre atrelado aos capítulos anteriores, com atenção voltada principalmente para os capítulos 3, 4 e 5, onde fica constatado que não há que se falar em mérito humano para os grupos destinatários da carta paulina.

 

O TEXTO QUE MAIS TOCOU MEU CORAÇÃO

Sem dúvida alguma, Romanos 11.33-36 é espetacular, pois Paulo nos conforta dizendo, em outras palavras, que os planos de Deus para com nossa salvação são perfeitos e que nós, criaturas finitas, jamais alcançaríamos o entendimento e os planos de um Deus infinito.

Tristes de nós, como poderíamos fazer Deus nosso devedor ou ensiná-lo alguma coisa? (Romanos 11:34-35).

O nosso maior conforto é que todas as coisas referentes a nossa salvação são guardadas e confiadas em Deus, e por causa disso temos paz, estamos tranquilos e perseveramos em direção à ele.

Podemos dizer que dele e por meio dele e para ele são todas as coisas referentes a nossa salvação; essa seria a aplicação do texto constante no versículo 36 ao contexto de Romanos 11.

 

TEXTOS DIFÍCEIS

As idéias já mencionadas muito vão ajudar na leitura destes capítulos, mas aconselho que os capítulos 9,10 e 11 sejam lidos com cuidado, pois é através deles que Paulo vai esclarecer toda a sua argumentação em relação aos judeus e gentios no plano da salvação, bem como esclarecerá também as dúvidas quanto às promessas feitas aos patriarcas.

 

AFINAL DE CONTAS.  DEUS FALHOU NA SUA PROMESSA PARA COM ABRAÃO E OS PATRIARCAS? — Através da leitura de Romanos 9, conseguimos adquirir boas respostas e tirarmos muitas dúvidas sobre esta pergunta, mas a lição que Paulo deixa bem transparente, de novo, é que a justificação que alcançou os gentios decorre da fé que é dom de Deus e não de méritos ou obras humanas.

Era essa uma das grandes dificuldades que os judeus tinham, pois achavam que iam conseguir alcançar justificação através da obediência das leis e outras obras, o que era impossível, uma vez que a justificação só pode ser alcançada mediante a fé. (Romanos 4)

 

OS JUDEUS REJEITARAM A JUSTIÇA DIVINA? — Esse é o ponto a ser tratado por Paulo no capítulo 10 de Romanos. Verdadeiramente,  os judeus rejeitaram e ainda queiram ser justificados pelas suas próprias obras, o que era impossível, conforme já afirmado, enfim, justificação se dá só por meio da fé advinda da graça divina.

 

QUEM ESTÁ INSERIDO NA PROMESSA FEITA A ABRAÃO? — Romanos 11 esclarece esse problema; todavia, resumindo a história, o remanescente é que será salvo, esse remanescente comporta tanto judeus quanto gentios, mas nenhum destes por méritos próprios ou qualquer tipo de obras, mas pela justiça de Deus e sua vontade graciosa.

 

VIVENDO OS ENSINOS DE ROMANOS

Apesar de Romanos trazer alguns assuntos profundos e até complexos, creio que a lição maior que tem a nos dar é simples.

Devemos aprender a nos largarmos na bondade, amor, misericórdia e soberania divina, pois, Deus tem planos perfeitos para com a nossa salvação, e isso nos basta, pois é mais que suficiente e nada mais nos falta.

Se algo ainda nos faltar ou de forma prioritária sentirmos falta de algo mais que não seja Deus, talvez não estejamos dando atenção ou tendo entendimento suficiente à cruz de Cristo e sua morte.

Romanos mostra quem verdadeiramente o homem é, bem como seu lugar na condenação eterna e torna claro que não há que se falar em nenhum tipo de mérito por parte dele.

Mas deixa claro também que Deus é soberano e que seus planos de salvação para seus filhos são perfeitos. Temos motivos de sobra para confiarmos em um Deus tão amoroso e nunca esquecermos que a nossa justificação vem somente pela fé e nunca por nossas obras ou merecimentos.

O que nos resta, com Romanos, é simplesmente agradecer ao nosso Deus por fazermos parte de seu plano e principalmente pelo fato de termos sido alcançados pelo seu amor grandioso e pela sua graça que é maravilhosa.

Concluindo, o plano de Deus é espetacular; logo, não temos que nos preocupar ou nos apavorar, pois nós fazemos parte desse magnífico plano. Que a nossa preocupação seja a de anunciar a glória de Deus, através da manifestação da graça divina em todo o nosso viver.

Ao nosso Deus toda glória, honra e louvor para todo sempre. Amém!

 

 

PARA MEMORIZAR

“Pois todos pecaram e carecem da glória de Deus”. (Romanos 3.23)

“Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor”. (Romanos 6.23)

“Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito”. (Romanos 8.28)

“Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou”. (Romanos 8.37)

“Assim, pois, não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia”. (Romanos 9.16)

“Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém!” (Romanos 11.36).

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BARTH, Karl. Carta aos Romanos. São Paulo: Novo Século, 1999.

Bíblia de Estudo de GENEBRA. São Paulo e Barueri: Editora Cultura Cristã e Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.

CALVINO, João. Romanos. São Paulo: Edições Parakletos, 2001.

HENDRIKSEN, William. Romanos. São Paulo: Cultura Cristã, 2001.

STOTT, John R.W. A mensagem de Romanos. São Paulo: ABU, 2000.