PARA LER O LIVRO DE GENESIS

 

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Os hebreus deram ao livro de Genesis o título “Bereshith”, devido a sua primeira frase no original hebraico: “No princípio”.

Os tradutores da Septuaginta chamaram-no de “Gênesis” (Origem), em virtude de ele relatar a origem do Universo e do homem na obra criativa de Deus.

Por
CHRISTOPHER MARQUES

 
Título: Introdução ao Gênesis
Capítulos: 50
Versículos: 1533
Tempo aproximado para leitura: 3 horas
 
Os hebreus deram ao livro de Genesis o título “Bereshith”, devido a sua primeira frase no original hebraico: “No princípio”.
Os tradutores da Septuaginta chamaram-no de “Gênesis” (Origem), em virtude de ele relatar a origem do Universo e do homem na obra criativa de Deus.
Gênesis foi provavelmente redigido durante a primeira parte da perseguição pelo deserto, enquanto procurava instruir Israel sobre as verdades fundamentais divinas e o programa da aliança de Deus para com a nação. Neste sentido, o livro pode ser datado com aproximação em 1446 a.C. A tradição afirma que Moisés é o autor do livro.
 
ESTRUTURA
A estrutura, a seguir demonstrada, facilitará a sua leitura. Você visualizará os capítulos e os seus acontecimentos, de modo que, a sua memorização de todo livro será possível.
 
I. A HISTÓRIA PRIMITIVA DA RAÇA HUMANA (1 – 11)
a. A Narrativa da Criação (1 – 2)
1. Narrativa de toda a criação (1)
2. Narrativa especial da criação do homem (2)
 
b. A Narrativa da Queda (3 – 6)
1.  Entrada do pecado (3)
2.  Avanço do pecado (4 – 6)
 
c.  A Narrativa do Dilúvio (6 – 8)
1.  Causa do dilúvio (6)
2.  Vinda do dilúvio (7)
3.  Conseqüência do dilúvio (8)
 
d.  A Narrativa da Nova Geração (9 – 11)
1.  Novo começo com Noé (9 – 10)
2.  Nova rebelião em Babel (11)
 
II. A HISTÓRIA PATRIACAL DA RAÇA HUMANA (12 – 50)
a.  A Vida de Abraão – Aliança Prometida (12 – 24)
1.  Princípio da fé na aliança (12 – 14)
2.  Teste da fé na aliança (15 – 21)
3.  Aperfeiçoamento da fé (22 – 24)
 
b.  A Vida de Isaque – Aliança transmitida (21 – 26)
1. Nascimento e casamento (21 – 24)
2. Benção concedida (25 – 26)
 
c. A Vida de Jacó – Aliança prosseguida (27 – 36)
1. Bênçãos materiais conseguidas (27 – 30)
2. Bênçãos espirituais malogradas (31 – 36)
 
d. A Vida de José – Aliança exercitada (37 – 50)
1. Treinamento por provações (37 – 40)
2. Triunfo pela confiança (41 – 50)
 
PROPÓSITO DO LIVRO
Existem duas possibilidades de compreender o propósito de Gênesis, são elas:
 
1. Tem o propósito de mostrar a singularidade histórica da narrativa sobre a criação do homem ao ser criado por Deus.
Relata a importância da criação (natureza) aos olhos de Deus.
Descreve a queda e as suas conseqüências. Por sua vez, aponta para a introdução do Reino de Deus. É planejada a redenção de toda a criação.
 
2. Este propósito, por sua vez, tem o cunho teológico. Salienta a soberania de Deus sobre toda a criação. Destaca a responsabilidade do homem para com Deus, o próximo e a criação.
 
3. Outra leitura é que o livro mostra os dois caminhos: graça e desgraça. Graça para com aquele que obedece e tem o livramento. Desgraça é para aquele que sofrerá o julgamento por sua rebeldia.
 
SÍNTESE TEOLÓGICA
Desde que um estudioso chamado Baruch Spinoza insinuou em 1671 a possibilidade de seu autor ter sido Esdras, muitas teorias apareceram sobre o assunto. A questão toda gira em torno da pluralidade de empregos diferentes ao nome de Deus, dos estilos literários e a enumeração de diferentes fases do desenvolvimento do culto.
Os estudos realizados não colocam sob hipótese alguma a autoridade do texto bíblico. A sua inspiração divina permanece inalterada. Cristo e os escritores do Novo Testamento afirmam ser Moisés o autor dos cinco livros conhecidos como “A Lei” (João 1:17; 5:47; 7:10; Romanos 10:5, 19). O reconhecimento de que Moisés usou no processo seletivo vários documentos antigos disponíveis é compatível com a inspiração divina, pois outros autores bíblicos procederam da mesma forma (Lucas 1:1-3).
 
A MENSAGEM DE GÊNESIS
A CRIAÇÃO DO MUNDO — O reconhecimento do mundo como criação e como dom de Deus suscita no ser humano crente a oração de graças e de louvor. Este reconhecimento da criação como dom de Deus traz consigo a experiência de uma profunda comunhão com as criaturas qualitativamente diferente do conhecimento meramente objetivante a serviço da posse e do domínio. Nesta experiência, o ser humano descobre uma dimensão básica da sua vida, a saber, o seu caráter “eucarístico” (palavra que se refere a agradecer): o ser humano é chamado a agradecer e louvar a Deus, certamente em nome próprio, mas também como representante das criaturas. É mediante o ser humano, sacerdote da criação, que os seres criados expressam o agradecimento e o louvor ao Criador. O ser humano, na qualidade de imagem de Deus que cria, mas também repousa, caracteriza-se não só pelo trabalho, mas igualmente pelo descanso e pela celebração da criação como dom de Deus.
 
O DRAMA HUMANO — Gênesis demonstra claramente que o Criador não criou o pecado. A causa não estava na serpente, no ambiente ou no fruto. A causa estava no uso egoísta da vontade humana de rejeitar a proposta de vida de Deus.
A descrição tem uma lista imensa das distorções que a queda gerou na vida de toda a criação: a relação homem-mulher que deveria ser vivida na solidariedade e na mútua reciprocidade fica deturpada em dominação e sujeição de um pelo outro. A alegria de dar à luz uma nova vida humana vem acompanhada de sofrimentos. A relação entre o homem, por sua parte, e a terra e os animais, por outra, que deveria ser harmoniosa, não é de fato. O trabalho que deveria estar a serviço da alegre realização do homem, freqüentemente se torna um esforço duro e penoso. O desejo de viver existente no homem corresponde à amarga certeza da própria morte. Até a relação com Deus que deveria estar penetrada de profunda esperança e da resposta jubilosa e agradecida do homem acaba sendo vivenciada como encolhimento mentiroso e medroso.
 
PARA LER DEVAGAR
Requer um processo de ruminação. Para tanto, indico que você gaste tempo nas seguintes passagens:
Gênesis 1.31 — “Deus viu tudo o que tinha feito: e era muito bom (…)”. Isto significa duas coisas para nós. A obra de Deus é boa como a manifestação incomparável da vontade de Deus. Mas é boa apenas no sentido de que, como criatura, pode ser boa porque o Criador a vê, a reconhece como sua e diz dela: É boa.
Gênesis 9.12 — “Disse Deus: Este é o sinal da minha aliança que faço entre mim e vós, e entre todos os seres viventes que estão convosco, para perpétuas gerações”. Esta aliança não estava sendo estabelecida entre Deus e o homem somente, mas entre Deus e toda a criatura vivente.
 
O TEXTO QUE MAIS TOCOU MEU CORAÇÃO
O livro de Gênesis é uma lição de vida. Nele encontramos as quatro grandes palavras do cristianismo: criação, queda, redenção e restauração. Por isso, é praticamente impossível que nenhum texto fale ao coração. O coração, porém,  se desarma diante do texto que diz: “Enoque andou com Deus 300 anos” (5.22). Isto mostra a fidelidade na comunhão com o Senhor. No tempo de Enoque havia pecado, miséria, sofrimento e desordem. Mas sobretudo Enoque permaneceu no prazer que há na companhia de Deus. 
Outro texto é 9.1-17. Destaco os versículos 13-15. Deus revela o poder da sua aliança. Graciosamente esta aliança não é bilateral, mas unilateral. Não depende de mim a sua durabilidade. Deus é o mantenedor e sustentador da aliança.
José nos ensina a maior lição do perdão humano em toda a Bíblia (45.1-15). José derramou lágrimas de ternura e forte afeto.
 
CONTEXTOS E TEXTOS DIFÍCEIS
A ORDEM DA CRIAÇÃO — Agostinho não defendia os seis dias. Para ele Deus criou, isto basta. Não importa o “como”, mas sim a informação bíblica de que Deus criou. Para Agostinho, Deus criou todas as coisas simultaneamente, e as criou todas num único dia, que se repetiu por sete vezes. A necessidade desta revelação em dias é para se ajustar àqueles que não conseguem compreender a criação simultânea. Isto significa, em outras palavras, que Deus acomodou-se a capacidade dos intelectualmente mais fracos e revelou a criação como se fosse um processo. Sendo assim, a ordem da criação em seis dias não apresenta intervalos de tempos, mas conexão de causas.
 
RESHIT — O autor do texto, ao escolher o termo “reshit” para iniciar a narrativa de Gênesis ao povo no período da caminhada do deserto, se refere a um momento único, um princípio de segundos, décimos de segundo, ou a um período indeterminado de tempo que pode durar um segundo, ou um minuto, um dia, um ano, enfim, qualquer período de tempo? A resposta se torna difícil uma vez que o uso do termo não é abundante na literatura do Pentateuco.
 
PRESSUPOSIÇÃO DO CAOS – A palavra grega “aoratos” é utilizada para traduzir o hebraico “tohu” (“sem forma”). Ora, “aoratos” significa “invisível”, algo que ainda não se vê. Esta idéia está fortemente presente na cosmogonia platônica, na qual o ideal é criado na mente e depois executado. Filon de Alexandria (25 a.C. – c. 50) explica dessa forma Gênesis 1.2: a palavra “bohu” (“vazia”) é traduzida como “akataskeuastos” e significa “não formado”. Esse invisível não formado é interpretado como “caos”, algo imperfeito.
 
VIVENDO OS ENSINOS DE GÊNESIS
O livro de Gênesis mostra a liberdade do homem nas suas escolhas. O ser humano optou pelo pecado. O autor de Gênesis aponta para a responsabilidade do homem e a sua conseqüência. O homem é um ser de decisões. Gênesis mostra que em todo momento o homem é chamado a se decidir.
A primeira declaração de Deus ao homem e a mulher (1.26-28) é o tema central de Gênesis. Deus deixa claro que criou o homem e a mulher para abençoá-los e a fim de que pudessem exercer domínio em lugar dele sobre a criação. A desobediência humana ameaçou o propósito de Deus para a humanidade expresso na criação. Deus respondeu chamando a Abraão, por meio de quem a benção divina triunfaria por fim. É preciso admitir que essa interpretação do tema deriva não apenas, se é que em alguma medida de Gênesis, mas da teologia bíblica como um todo.
 
EIS, PORTANTO, O QUE APRENDEMOS, PARA VIVER:
O autor do livro quer ensinar que Deus é o Senhor de toda a história da criação e da vida humana. Não somente da macro, mas da micro-história. Cada detalhe da vida lhe é conhecido. Deus intervém na vida, nos acontecimentos e no destino de indivíduos (Abraão, José). Isto nos ensina a descansar na providência divina.
Gênesis é um convite de Deus ao homem. Deus cria e chama o homem para um relacionamento. O destaque está na intervenção de Deus na história do homem. É o Deus que cria, mas que interage na criação. Ele participa da história humana e de todos os seus dilemas e revezes. A presença e a atuação de Deus são experimentadas em todo tempo e em todo lugar: Deus está no centro da realidade toda.
 
PARA MEMORIZAR
“Abrão creu no Senhor, e isso lhe foi creditado como justiça” (Gênesis 15:6).
“Abraão deu aquele lugar o nome de ‘O Senhor Proverá’. Por isso até hoje se diz: No monte do Senhor se proverá” (Gênesis 22:14).
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ELLISEN, Stanley A. Conheça Melhor o Antigo Testamento. São Paulo: Vida, 2000.
HENRY, Matthew. Comentário Bíblico do Antigo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD, 2003.
MYATT, Alan & FERREIRA, Franklin. Teologia Sistemática: uma análise histórica, bíblica, e apologética para o contexto atual. São Paulo: Vida Nova, 2007.
RUBIO, Garcia A. Unidade na pluralidade: o ser humano a luz da fé e da reflexão cristã. São Paulo: Paulus, 2006.