1João 2.1-10 — PERMANECENDO

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Recebi de um amigo a seguinte pergunta:
“Sabendo que somos humanos e pisamos na bola o tempo todo, eu me pergunto:
por que nós cristãos, filhos de Deus, remidos pelo sangue de Jesus, frutos do seu amor,
não podemos nos amar entre irmãos e dar bom testemunho?
Por que não cristãos dão bom esse bom testemunho que deveria ser quase que uma marca distintiva nossa?”
 

PERMANECENDO 

(1João 2.1-10)
 
Recebi de um amigo a seguinte pergunta:
“Sabendo que somos humanos e pisamos na bola o tempo todo, eu me pergunto: por que nós cristãos, filhos de Deus, remidos pelo sangue de Jesus, frutos do seu amor, não podemos nos amar entre irmãos e dar bom testemunho? Por que não cristãos dão bom esse bom testemunho que deveria ser quase que uma marca distintiva nossa?”
 
Começo por afirmar que tudo mudou, mas nada mudou.
As pessoas são as mesmas, com os mesmos ideais e as mesmas dificuldades, as mesmas suficiências e as mesmas carências.
Deus não mudou. O Evangelho não mudou. Nós não mudamos. Mudaram as coisas, não as pessoas.
 
Não mudou o fato que somos pecadores, porque o somos, por mais que usemos outros termos, que suavizem as nossas culpas (ou responsabilidades, para sermos mais corretos politicamente).
Não mudou o fato que Jesus nos perdoa dos nossos pecados, quando nós, arrependidos, confessamos nossos erros, com a disposição de não os praticar mais.
Não mudou o fato que as pessoas esperam que os cristãos mostrem, pelo exemplo, aquilo que dizem crer, como um critério de validação desta fé.
 
Não mudaram os convites para que pequemos, quando seduzidos por resultados aparentemente bons.
Não mudaram os mandamentos de Jesus para nós, embora sejam bem antigos (1João 2.7 — “não lhes escrevo um mandamento novo, mas um mandamento antigo”). Os desafios para vivermos esses mandamentos são diferentes do tempo em que Jesus viveu, mas são os mesmos, como são mesmas as dificuldades que os primeiros ouvintes e nós temos para os seguir.
Não mudaram as oportunidades de levarmos a sério os mandamentos de Jesus.
 
As orientações de 1João 2.1-10 foram escritas para mostrar que tudo mudou, mas nada mudou.
 
(1) Meus filhinhos, escrevo-lhes estas coisas para que vocês não pequem. Se, porém, alguém pecar, temos um intercessor junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo. 
(2) Ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos pecados de todo o mundo. 
(3) Sabemos que o conhecemos, se obedecemos aos seus mandamentos. 
4. Aquele que diz: “Eu o conheço”, mas não obedece aos seus mandamentos, é mentiroso, e a verdade não está nele. 
(5) Mas, se alguém obedece à sua palavra, nele verdadeiramente o amor de Deus está aperfeiçoado. Desta forma sabemos que estamos nele: (6) aquele que afirma que permanece nele, deve andar como ele andou. 
(7) Amados, não lhes escrevo um mandamento novo, mas um mandamento antigo, que vocês têm desde o princípio: a mensagem que ouviram. 
(8) No entanto, o que lhes escrevo é um mandamento novo, o qual é verdadeiro nele e em vocês, pois as trevas estão se dissipando e já brilha a verdadeira luz. 
(9) Quem afirma estar na luz mas odeia seu irmão, continua nas trevas. 
(10) Quem ama seu irmão permanece na luz, e nele não há causa de tropeço. 
 
A ARTE DE PERMANECER EM CRISTO
O autor está preocupado com a falta de conexão entre o que se diz sobre o Evangelho de Jesus Cristo e o que se vive, coisa do seu tempo, coisa do nosso tempo. Ele não recomenda que paremos de dizer o que Jesus Cristo faz, mas que prossigamos dizendo para indicar claramente qual é o ideal de nossas vidas. Ele pede mais: que vivamos as nossas palavras sobre o amor de Deus. Segundo João, se queremos viver o que pregamos, precisamos permanecer. Ou: se permanecemos em Jesus, vivamos como Jesus viveu. “Permanecer” — este é o verbo (“aquele que afirma que permanece nele, deve andar como ele andou” —  1João 2.6).
Permanecer em Cristo é permanecer com Cristo. É viver em comunhão com ele. Esta comunhão inclui um relacionamento diferente, porque não é entre pessoas iguais, mas entre pessoas diferentes. Um é Deus e o outro é homem; um (Deus) propõe mandamentos; o outro (o homem) obedece. Nosso relacionamento com Deus é entre o limitado e o transcendente. Sem obediência, não acontece. Obediência é uma necessária, porque é uma palavra concreta. Ou a gente obedece ou não obedece. 
 
João não explicita que mandamentos são estes, mas fica claro que não se tratam dos dez mandamentos (do Antigo Testamento). Antes, esses mandamentos que são singularizados têm a ver com o mandamento do amor, vale dizer, o mandamento de amar. Jesus nos manda que amemos. Não há nada de novo nisto (1João 2.7). No entanto, nossa dificuldade em amar leva João a aplicar a velha verdade (“amem-se”) a uma área concreta: a obediência esperada a Deus se expressa no amor ao próximo, próximo conhecido — pertencente à família da fé — e próximo desconhecido — espalhado do pelo mundo (2João 2.2). O mandamento é antigo: saiu da boca de Jesus. O mandamento é novo, porque ainda não o praticamos em sua inteireza e precisamos sempre praticá-lo. O amor precisa se renovar.
Em que devemos permanecer?
A pergunta nos põe em dois campos: no teológico e no pratico.
Teologicamente falando, permanecer é saber que, embora sido redimidos, ainda pecamos. Esta é uma nota triste, mas é uma descrição da realidade. Esta nota triste é acompanhada de uma nota de consolo: temos um intercessor (um defensor, alguém a quem Deus ouve) junto ao Pai, que continua a nos perdoar, se pedimos perdão. 
A graça (que nos concede o perdão) não pode nos levar a banalizar o pecado. Não há perdão sem arrependimento, como não há manhã sem noite. A satisfação com a graça não pode se transformar numa autossatisfação com o pecado. O pecado tem que ser visto como algo horrível. Quando pecamos, não podemos nos perdoar a nós mesmos. Quem nos absolve é Jesus Cristo.
 
Permanecer é saber que Jesus perdoa os nossos pecados, bem como os pecados de todas as pessoas. Disto sabendo, devemos comunicar este perdão (que torna livres os homens) a todos, em todos os lugares. A comunhão com Jesus tem, portanto, uma dimensão missionária.
 
Permanecer é conhecer os mandamentos de Jesus. Estes mandamentos estão nos Evangelhos. Podemos lê-los em busca de palavras de salvação, e fazemos bem. Podemos examina-los em busca de palavras de conforto, e fazemos bem. Podemos também abri-los para conhecer os mandamentos de Jesus a que precisamos obedecer.
 
ANDANDO COMO JESUS
Mais que estas dimensões teológicas, importantes mas insuficientes, há a dimensão prática, que confirma ou desmente as convicções de fé. Neste sentido, fé é o que se faz, não o que se diz. 
Assim, permanecer em Jesus é obedecer aos mandamentos de Jesus. Obedecer aos mandamentos de Jesus significa andar como Ele andou.
Quando andamos como Jesus andou, o amor de Deus se aperfeiçoa em nós (1João 2.5). Quando Jesus andou por aqui, Deus desceu do céu. Quando amamos, o amor de Deus desce à terra.
Quando andamos como Jesus andou, as trevas se dissipam (1João 2.8). Quando andamos como Jesus, à nossa volta se forma um arco de luz. Vamos andamos e as trevas vão desaparecendo. Nossa presença na noite vai anunciando a manhã. Quem anda como Jesus andou é um facho de luz, como um farol em que se pode mirar.
Quando andamos como Jesus andou, o nosso testemunho é aceito como digno de aceitação pelos homens (1João 2.9-10). Nossa vida é testemunho. A questão é saber de que? Ou melhor: de quem? Testemunhamos de Jesus? Não temos como esconder nossa vida.
 
Termino, como comecei, comentando o desafio de um amigo que me provocou assim.
“Sabendo que somos humanos e pisamos na bola o tempo todo, eu me pergunto: por que nós cristãos, filhos de Deus, remidos pelo sangue de Jesus, frutos do seu amor, não podemos nos amar entre irmãos e dar bom testemunho? Por que não cristãos dão bom esse bom testemunho que deveria ser quase que uma marca distintiva nossa?”
 
A melhor resposta é a que cada um de nós der, do fundo do seu exame de consciência.
Você, cristão, filho de Deus, remido pelo sangue de Jesus, fruto do amor de Jesus, ama ao seu irmão, dando bom testemunho?
Você, cristão, filho de Deus, remido pelo sangue de Jesus, fruto do amor de Jesus, tem no bom testemunho a marca distintiva da sua vida?
ISRAEL BELO DE AZEVEDO