Diz-se que não há mais essa estrutura de “família com pai, mãe e filho(s)”, mas esta continua sendo a estrutura ideal.
“Pai, mãe e filho(s)” deixam de ser a estrutura da família real, por vários fatores. No entanto, o real não pode massacrar o ideal. De igual modo, não deve ser massacrada aquela família em que este padrão não esteja em vigor.
Contudo, o ideal deve ser sempre buscado. Se o ideal é inalcançável (por causa da morte de um cônjuge, por exemplo, ou por um divórcio sempre traumático), os que integram a família na estrutura real devem saber que ficarão lacunas, que precisarão ser, de um modo o outro, ser substituídas. Então, se, por exemplo, uma criança é cuidada por seus avós (por falecimento ou outra circunstância dos pais ou de um deles), devem eles tomar todos os cuidados, sobrecarregando-se muito, para que as carências sejam supridas, mesmo sabendo que pai/mãe é insubstituível.
Imagino como Eunice e Lóide devem ter ficado sobrecarregadas, se Timóteo ficou sem pai ainda menino, até ser adotado espiritualmente por Paulo.
Diz-se que a criança deve participar do mundo do adulto, mas se esquece que criança é criança, adulto é adulto.
Não podemos subestimar nem superestimar a criança. Uma criança tem uma estrutura física e psíquica ainda incompleta. Quando um bebezinho nasce prematura precisa passar uma temporada numa unidade neonatal para que alguns dos seus órgãos acabem de ser formados.
Alguns pais, no entanto, por ansiedade, querem que sua criança seja responsável e competitiva. Outros pais, por insegurança, gostam de comparar seu filho com outro, como se cada um não tivesse sua própria história. Como o adulto doentiamente se compara com outros adultos (achando-se melhor ou pior do que os outros), ele também compara a sua criança. Alguns pais se acham bem-sucedidos se o seu filho vai melhor do que o outro na escola. (A propósito: o que é “ir melhor”?)
Os pais não precisam comparar, mas que educar seu filho segundo as orientações do Livro-texto dos cristãos. O método pode variar, mas educação é educação e a criança precisa ser educada.
Neste processo de educação e convivência, deve a criança ser respeitada. Não se arranca um ramo do seu tronco; o tronco é a família. Não há flores a serem plantadas; há plantas a serem plantadas, para que dê flores. Jesus cresceu em todos os sentidos porque Maria e José cuidaram dEle. Se isto se aplica ao Deus-menino, como não se aplicará aos meninos mortais?
Diz-se que a criança é sempre pura, mas todos nascemos pecadores.
Não podemos idilizar a criança. Embora ela possa não ter toda a consciência dos seus atos, há gestos nela que são pecaminosas. Nem toda a brincadeira de criança é inocente.
Quando diz que o Reino de Deus é constituído de crianças, Jesus está se apropriando de algumas marcas da criança, como a dependência (em função de sua impotência relativa), a confiança nos pais (quando os pais dão evidência de que são confiáveis) e o sorriso. Criança é também símbolo do Reino de Deus porque ela é completa como criança, mas é incompleta como adulto, tal como Reino de Deus que nasceu completo, mas ainda não se completou.
Cabe aos pais (apoiados pela igreja) participar do processo de conversão do(s) seu(s) filho(s), dos quais são pastores em tempo integral. A oração e ação dos seus pais devem conter o desejo que um dia seu(s) filho(s) entenda(m) que, como seus pais, precisam ser gerados de novo pelo Espírito Santo. É claro que não compreenderá esta nossa linguagem adulta, mas é a essência desta síntese que precisará alcançar no interior de seus limites, que vão se expandindo com o tempo.
Diz-se que criança é discernir entre o que é certo e errado, o que leva seus pais não se preocuparem com o alcance de suas atitudes, incluídas as palavras.
Os pais devem saber que infância é para toda a vida. A adolescência passa, a juventude passa, a infância é para sempre. Foi por isto que Jesus pôs crianças no colo, não porque não tivessem pecado, não porque não precisassem se arrepender, mas porque guardariam para sempre a experiência do acolhimento. Uma criança tratada com carinho dificilmente não será um adulto que recebe e respeite seu irmão. Por seu turno, uma criança que se sinta rejeitada dificilmente superará esta violência, mesmo que silenciosa.
Diz-se que a criança de hoje é o adulto amanhã, o que faz com que alguns neguem à criança viver enquanto criança.
O presente de uma criança é ser o que ela é.
Ela não pensa no futuro. É cristalino que seus pais devem pensar no futuro, mas sem lhe negar o que é: criança.
A educação é para o futuro, mas deve ser também para o presente.
Haverá vida (no futuro), se houver vida no presente.
ISRAEL BELO DE AZEVEDO