Usando instrumentos no culto (publicado originalmente na Revista Louvor – JUERP – 2011) – Revisado com acréscimos.
“Eu já sei tocar todas as notas, agora em um solo procuro a ausência delas” (Miles Davis).
“Sem silêncio não tem música. No terceiro milênio, se não reencontrarmos este instante, não conseguiremos nunca chegar à música dos nossos dias.
Porque o homem do nosso tempo, não sabe, realmente, o que significa o silencio. Estamos cercados de um ruído constante, voluntário e provocado. Ao chegar em casa, cansado, o homem estressado ligará imediatamente a televisão. Quase que de forma automática.” (ZIGGIATTI, Lea. Recursos acústicos e estéticos de um contrabaixo. Correio Popular. Campinas, 29 out. 2002. – Diretora do conservatório Carlos Gomes)
ARRANJO
Definição: Arranjo, em música, é a preparação de uma composição musical para a execução por um grupo específico de vozes ou instrumentos musicais.
Observação:
A cada culto preparamos uma média de sete músicas, portanto, sete arranjos e a cada semana, a tendência é que, no mínimo, cinco destas não se repitam consecutivamente. – É muito importante que trabalhemos a cultura da escrita e alfabetização musical. É inviável confiar somente na memória para a execução de um repertório tão vasto.
PLANEJAMENTO ESTRUTURAL DO ARRANJO
Para que será o arranjo?
1. Utilização no culto
2. Tema para eventos (retiros, festivais, congressos, etc.)
3. Musical especial (natal, páscoa, etc.)
4. Evangelização
5. Faixa etária do publico alvo.
Estas perguntas são importantes pois servem de guia para definirmos o teor estético do arranjo. A música poderá ser mais solene ou menos solene, poderá ser tocada com instrumentos eletrônicos, ou somente ao piano ou órgão, etc.
ELEMENTOS DO ARRANJO
1. FORMA DO ARRANJO
Todo arranjo precisa ter definido a sua forma. É muito comum a equipe de apoio ao culto ficar perdida e não saber para qual parte da música vai, confiando somente na memória.
Exemplo de forma:
VIM PARA ADORAR-TE (Tim Hughes)
Luz das nações que dissipa as trevas
Abre os meus olhos pra ver A
Lindo tu és eu só quero adorar-te
Dar os meus dias a ti
Vim para adorar-te vim para prostrar-me
Vim para dizer que és meu Deus B
Totalmente amável, totalmente Digno
És maravilhoso para mim
Rei sobre todos tu és exaltado
Entronizado nos céus A’
Humildemente viestes à Terra
Se entregou por amor
Não saberei o quanto custou
Ver meus pecados lá na cruz C
Luz das nações que dissipa as trevas
Abre os meus olhos pra ver
Forma: ||A B | A’ B | C C B B| Coda e fim||
2- SESSÃO RITMICO-HARMÔNICA
Definição
“A base ou centro do som do conjunto ou da orquestra é o que os músicos chamam de “levada” rítmica, onde se mesclam os instrumentos de percussão ( inclusive a bateria),
por um lado e os instrumentos harmônicos ( teclados, violões, guitarras, vibrafone, contrabaixo, etc.), por outro, formando a seção rítmico-harmonica. Essa combinação sonora a tal ponto depende do bom gosto na mistura dos elementos tímbricos, rítmicos e harmônicos que os músicos lhe conferiram o apelido carinhoso de “cozinha, local notório dos ingredientes bem dosados” (Ian Guest)
CONTRABAIXO
• O contrabaixo é o instrumento que executa os sons mais graves dentro da orquestra
• “Encarregado de tocar os baixos dos acordes e notas de passagem” (GUEST, 1996 p.69).
• Pode usar salto de notas livremente. Passeando principalmente pelas notas de acorde.
• Procure sempre pensar no que está mais inside do que está mais outside .
• Deve-se sempre estar imbuído desse “sentimento de acompanhamento” para que o contrabaixo exerça sua função, que é intermediária entre o ritmo e a harmonia, sendo então um instrumento com uma função de equilíbrio dentro da música.
• Sintonize-se com a bateria.
OUTROS INSTRUMENTOS DA SESSÃO RITMICO-HARMÔNICA
• Guitarra
• Violões ( 6,7, 10, 12 cordas)
• Piano acústico, elétrico, teclados, sintetizadores, órgão
• Acessórios de percussão, vibrafone, carrilhão, etc.
Podemos usar estes instrumentos de forma melódica ou de forma harmônica. Ian Guest trata o assunto da seguinte forma: “Podem tocar a linha melódica, individualmente ou combinados entre si, ou ainda com outros instrumentos” e anda reitera: “Combinações entre si no uníssono, na oitava ou em bloco: guitarra/contrabaixo, guitarra/piano, vibrafone/guitarra e grande variedade de dobramentos com teclados eletrônicos” (GUEST, 1996 p.74).
Harmonicamente, podemos utilizar esses instrumentos utilizando a escrita de cifras.
VIOLÃO – instrumento harmônico, melódico e percussivo
• Ajuda na sustentação harmônica e, por vezes, rítmica.
• Em grupos pequenos: Procure acrescentar dinâmica, varie os ritmos, não use somente uma levada. Estude padrões rítmicos dedilhados e técnicas de comping.
• Em uma banda: Toque para a equipe, às vezes não é necessário segurar a base. Quando isso ocorrer, explore as sonoridades diminuindo o numero de levadas, inverta e sobreponha acordes, use fragmentos de arpejos e escalas etc.
• Conhecimento e domínio técnico é imprescindível.
TECLADO – Instrumento harmônico, melódico
• Existem outros instrumentos harmônicos na banda?
• A equipe tem contrabaixo? Tem bateria? Tem violão? Guitarra?
• Quanto mais instrumentos a equipe tiver, menos você vai tocar.
• Se houverem outros instrumentos harmônicos procure fazer aberturas e/ou tocar em regiões diferentes para que seu som não fique redundante
• Se no arranjo o seu instrumento ficar responsável pela levada, procure timbres como o do piano. Deixe que os outros instrumentos preencham os espaços.
• Deixe a musica “respirar”
• Se já tiver contrabaixo na sua banda, não faça os baixos, você pode chocar com o baixista. Deixe o baixo pra ele. Use sua mão esquerda para ajudar a preencher acordes da região mediana para cima.
GUITARRA – Instrumento harmônico e melódico.
• Considerando que a equipe tenha baixo + piano + bateria + violão… o guitarrista deve fazer o acompanhamento numa região do braço diferente da que o violonista esteja usando.
• Exemplo de como esse acompanhamento pode ser feito: uso de tensões disponíveis, inversões de tríades, inversão de tétrades, uso de fragmentos de escala junto com acordes, variações rítmicas, etc.
• Assinatura – Assinatura é composta de fragmentos melódicos que ornamentam e dá uma marca à música.
• O uso de efeitos exige bom senso. Geralmente os efeitos são usados em pequenas quantidades.
• O uso de distorção e overdrive são aceitáveis, mas deve – se ter bom senso sempre. Qual é a proposta da música? Onde a dinâmica cresce? O volume está alto?
Quanto à guitarra sempre existe aquela pergunta entre os iniciantes… “qual pedaleira comprar?”. Antes de pensar em uma pedaleira, é importante ter uma guitarra boa e um amplificador muito bom. O que vier além disso, é lucro. Há uma exceção no que diz respeito aos simuladores de amplificadores existentes no mercado. Os que são de primeiríssima linha possuem uma relação custo x benefício muito interessante para aqueles que não dispõem de grandes recursos financeiros.
BATERIA – Instrumento Percussivo.
“Por que, você pode perguntar, deveríamos ter espaço para baterias em nossa organização? Para muitos, bateria e percussão são extravagâncias barulhentas que se tornam obstáculos à adoração. A visão tradicional de um baterista, eu poderia dizer, é de alguém que ouve música muito alta, que vive babando, que não consegue tocar outro instrumento e que tem um par de baquetas e um carro bem grande para poder
carregar seu equipamento.” (Calum Rees é baterista da South West London Vineyard. Ele é professor de bateria e músico profissional. Participou dos álbuns da Vineyard Music UK: Come Now Is The Time, Hungry e Surrender, todos disponíveis no Brasil:
aqui )
• Para muitos a bateria é um instrumento que atrapalha e é barulhento.
• O baterista tem a função de dar suporte rítmico. (Levadas e Grooves).
• Valorize a nitidez da levada.
• Dinâmica – Deixe a música soar da maneira como ela pede.
• Qual a necessidade percussiva para o momento?
• Sua função pode, por vezes, ser somente a de “percussionista ornamental”.
• O mais importante são as mensagens a serem passadas pela letra da música, por isso, não abafe os cantores.
• Aprenda um instrumento harmônico. Estude harmonia e percepção. Fique por dentro da linguagem musical.
• Estude com o auxilio do metrônomo; ele é nosso amigo.
SESSÃO MELÓDICA (Metais, flautas, violinos, sax, etc.).
• Definir e escrever as partes de solos e/ou ornamentações e/ou assinaturas (etc). – Tudo precisa ser bem delimitado procurando um bom balanço entre os instrumentos.
• Não toque o tempo todo pois existem trechos específicos para tocar, assim você mantém o frescor do som de seu instrumento.
• Pode ser que não necessite usar seu instrumento em determinada música, precisamos ter maturidade para saber não tocar.
DICAS PARA A ELABORAÇÃO DOS ARRANJOS
Estas dicas foram adaptadas com base no texto de Ian Guest. Vale a pena conferir o material que ele publicou sobre arranjos. Arranjo 1, 2 e 3 da editora Lumiar.
• Varie os timbres explorando os instrumentos. Colocando e retirando suas participações no arranjo. Varie as técnicas utilizadas. (Legatto, staccato, forte, fraco, contraponto, arpejos, etc.) Crie contraste.
• Valorize a dinâmica e as respirações da música. A música fala através de frases. Precisamos respeitar a parte fraseológica.
• Procure dar descanso a cada um dos instrumentos, pois o silêncio traz frescor à sonoridade.
• Ian Guest fala com muita propriedade: "Ao surgir dúvida quanto à técnica a ser empregada, escolha sempre a mais simples".
• Não se acomode, esteja preparado para corrigir a música e se aperfeiçoar;
• Procure escrever os arranjos, estude música.
• Limpeza nos sons, clareza na escrita, nas formas e nos efeitos são fundamentais.
• Na execução, preocupe-se em ter instrumentos de qualidade.
• Certifique que os instrumentos estão muito bem afinados.
•
Tenha uma percepção aguçada do equilíbrio sonoro entre todos os intrumentos e o vocal. Os intrumentos não podem ficar muito altos, mas as vozes também não. Certifique que o som dos cantores não estejam abafando o canto da congregação. Lembremo-nos que não o culto não é um show.
Se você é um líder, esteja 120% preparado. Estude o arranjo antes de ensaiar. Saiba o que dizer aos liderados. Saiba que som você deseja como resultado final. Evite criar arranjo na hora do ensaio pois isso pode gerar perda de foco e consequentemente aumento de dispersão e perda de tempo.
“Alargue o lugar de sua tenda, estenda bem as cortinas de sua tenda, não o impeça; estique suas cordas, firme suas estacas” (Isaías 54.2).
Para ter uma boa música na igreja, não existe fórmula mágica. Não existe toque fácil muito menos aprenda rápido, etc. Vivemos em uma sociedade imediatista, mas nosso aprendizado se faz por meio de dedicação de tempo e prática de estudo. Muita organização e capacidade de gerenciamento é necessária, porém sem esquecermos que as pessoas são muito mais importantes do que os eventos e as coisas. Não seja um líder opressor, procure agregar valor aos seus liderados.
Quanto à técnica…Pratique, pratique, e pratique… estude muito, busque informações, tenha bons professores e se aperfeiçoe. Este texto de Isaías nos impulsiona a expandirmos nossos limites. Alargue sua tenda, não se acomode, amplie seus conhecimentos, firme suas estacas, se você é bom músico, seja mais, se você é um cristão de valor, seja mais, se você é servo, seja mais. Vamos crescer, vamos caminhar para a excelência com amor, humildade e focados em Jesus Cristo.
Ramon Chrystian A. Lima
www.letrasonora.com.br
obs: Inside – termo usado para aquilo que está mais dentro do contexto harmônico (diatônico) ; Que faz parte do acorde e harmonia do momento. Outside– termo usado para designar notas e intenções que estão fora do contexto harmônico (diatônico) do momento.
Bibliografia
GUEST, Ian. Arranjo Método Prático Vol I. Rio de Janeiro: Lumiar, 1996.