ORACÃO E TEMPERAMENTO

1. Vamos esculpindo nossas vidas em função do nosso temperamento, que é o nosso jeito de ser (ou nossa personalidade ou nosso temperamento).

 

2. Nosso temperamento é formado por vetores (heranças boas-ruins des-conhecidas, influências benéficas-maléficas recebidas-oferecidas, experiências doces-amargas vividas) e desembocado em gostos in-discutíveis, hábitos in-definidos e estilos in-característicos.

 

3. Temperamento tem a ver como nos relacionamos com o mundo exterior (uns somos introvertidos; outros, extrovertidos), como reunimos informações (uns somos principalmente intuitivos; outros usamos um dos sentidos: olfato, paladar, tato, visão, audição), como processamos as informações (uns nos guiamos mais pelas emoções, outros mais pela reflexão) e como re-agimos diante das informações (uns somos rápidos para decidir, outros somos mais lentos). Por isto, podemos ser caracteristicamente mais práticos ou racionais ou independentes ou idealistas. E Deus não prefere nenhum destes tipos.

 

4. Felicidade tem a ver com temperamento e com oração. Vive bem quem tem seu temperamento e sua vida de oração concorrendo para o seu bem.

 

5. Cada um de nós tem um jeito de ser e este jeito de ser determina o seu jeito de orar e não há nisto nenhum problema. Cada um de nós ora em função do seu jeito de ser. Cada um de nós precisa desenvolver seu jeito de ser em beneficio do desenvolvimento de uma vida de oração.

 

6. Os homens de oração da Bíblia não eram perfeitos. Que consolo. O mesmo Jacó que passou uma noite diante de Deus em oração era um trapaceiro que gostava de levar vantagem em tudo, mas tinha a capacidade de reconhecer a presença de Deus em sua vida e se deixou moldar por Esta pressenca. O mesmo Davi, cujo coração transbordava Deus, de quem tirava a força para a sua vida no tempo de deserto, tinha sangue nas mãos, sangue que Deus limpou quando reconheceu o seu pecado e pediu perdão por ele. O mesmo Elias que falava com todo poder em nome de Deus que parecia o próprio Deus falando era vulnerável em suas emoções. O mesmo Pedro que, pela fé, mandava que os coxos olhassem para ele e orava por eles para serem curados, e eram, tinha dificuldade em amar quem não fosse de sua nacionalidade, até que entendesse que o Evangelho era universal, o que aconteceu a partir de uma experiência de oração no terraço de uma casa. O mesmo Paulo que, de tão íntimo, foi arrebatado ao terceiro céu, demorou muito a desenvolver a virtuda da paciência em relação a seus colaboradores, como demonstra sua atitude com relação a João Marcos.

 

7. Nossa forma de orar reflete o nosso temperamento. Orações mais emocionais (com lágrimas) ou mais racionais (com palavras bem articuladas) têm mais a ver com temperamento e menos com fé. Nosso desejo por orar tem a ver mais com a nossa fé e menos com o nosso temperamento. Nossa in-disciplina para orar tem a ver com a nossa fé e com o nosso temperamento.

 

8. Por causa do seu temperamento, uns gostam de orar de joelhos, outros assentados, outros com as mãos levantadas, outros enquanto caminham por um lugar ermo ou por um lugar habitado, mas nenhum destes modos (mesmo que se tornem modo no interior de um grupo) revela mais ou menos vigor espiritual.

 

9. Por causa do seu temperamento, uns são mais capazes do que os outros em se concentrar por mais tempo que os outros em oração. (Para quem detesta o silêncio, cinco minutos “duram” cinco horas…) Seja qual for o nosso temperamento, precisamos gostar de gastar cada vez mais MAIS tempo em oração. Nosso modelo é Jesus Cristo, que passava horas em oração, não os discípulos que não agüentaram alguns minutos.

 

10. Nossa vida de oração tomará a forma de nosso temperamento, mas Deus se comunica conosco como nós somos, não com quem ainda seremos (e devemos cuidar para ser o que Ele quer que sejamos, com seus planos de bem e de paz para nós – Cf. Jeremias 29.11).

 

11. Precisamos aprender a orar no interior de nosso jeito de ser, mas com abertura suficiente para sermos moldados, como Paulo que tendia para decisões racionais, mas foi transformado pela audição de uma voz extraordinária que ninguém viu (Atos 9.4) e foi transportado pelo Espírito Santo até o terceiro céu, onde viu o inefável (2Coríntios 12.4). Nosso temperamento certamente é um filtro, mas não pode ser um dique ao Espírito Santo.

 

12. Nosso temperamento é para ser controlado pelo Espírito Santo, não por nosso humano espírito, e este controle deve ser um dos desejos de quem deseja viver uma vida de oração.

 

13. Se nosso temperamento nos leva a pecar, precisamos colocá-lo diante de Deus para não pecarmos mais.

 

14. O tímido (ou introvertido) ora (em particular e em público) de modo tímido e isso o satisfaz?  Como ora um tímido (em particular e em público), se orar é entrar com ousadia na sala do trono de Deus (cf. Hebreus 10.19)? A qualidade da vida de oração será a qualidade da vida.

 

15. O extrovertido ora (em particular e em público) de modo expansivo (com eloqüência e clareza), mas isto revela intimidade com Deus? A extroversão não será perda se não perder a meta da intimidade com Deus.

 

16. Como ora a Deus uma pessoa independente na tomada de decisões, se oração é dependência de Deus? A auto-confiança não precisa negar a confiança. O auto-confiante precisa saber que não pode fechar uma janela por fora (cf. a experiência de Noé, com a arca sobre as águas, fechada por fora por Deus – cf. Gênesis 7.16).

 

17. Como ora um ansioso, se o ansioso é ansioso porque não entrega e oração é sobretudo a entrega de quem confia? O ansioso sabe apenas na teoria (não na prática) Quem é Deus; por isto, não se aquieta.

 

18. Se oração é silêncio, como ora o agitado? Será que o agitado sabe que Deus descansou no sétimo dia e que Jesus apreciou a quietude de Maria, embora sem depreciar o empenho de Marta (cf. Lucas 10.38-42)  

 

19. Não somos escravos do nosso temperamento. O Espírito Santo pode controlá-lo e isto se dá num processo, que tem várias etapas: a. auto-conhecimento (eu me conheço, estou me conhecendo e percebo que algo em mim precisa ser mudado),
b. desejo (eu desejo ser mudado),
c. oração (eu oro pela mudança),
d. coragem (tenho coragem de ser mudado),
e. perseverança (eu persisto em oração durante a mudança)

 

20. A oração é um processo que (não necessariamente nesta ordem e nem com todos estes elementos numa mesma oração) inclui: a. ouvir Deus falar (pela leitura ou repetição de textos da Bíblia, onde está o convite: “Lembrem-se disto, gravem-no na mente, acolham no íntimo, oh rebeldes. Lembrem-se das coisas passadas, das coisas muito antigas! Eu sou Deus, e não há nenhum outro; eu sou Deus, e não há nenhum como eu. Desde o início faço conhecido o fim, desde tempos remotos, o que ainda virá. Digo: `Meu propósito permanecerá em pé, e farei tudo o que me agrada'" — Isaías 46.8-10; diante desta verdade, outro não pode ser nosso desejo: "Bendito sejas, Senhor! Ensina-me os teus decretos"  — Salmo 119.12; cf. Salmo 119.68: "Tu és bom, e o que fazes é bom; ensina-me os teus decretos")

 

b. meditar na palavra de Deus (dita ao nosso coração durante a leitura ou recordação da Bíblia), que nos traz satisfação e nela meditamos dia e noite (Salmo 1.2)

 

c. falar a Deus para:
. exaltar Seu amor ("O teu amor é melhor do que a vida! Por isso os meus lábios te exaltarão" — Salmo 63.3);
. confessar nossos pecados ("Confesso a minha culpa; em angústia estou por causa do meu pecado" — Salmo 38.18; "Então reconheci diante de ti o meu pecado e não encobri as minhas culpas. Eu disse: `Confessarei as minhas transgressões ao Senhor e tu perdoaste a culpa do meu pecado`. — Salmo 32.5);
. agradecer Sua bondade ("Lavo as mãos na inocência, e do teu altar, Senhor, me aproximo cantando hinos de gratidão e falando de todas as tuas maravilhas" — Salmo 26.6-7);
. interceder pelo bem do próximo (o apóstolo Paulo recomenda que façamos "súplicas, orações, intercessões e ações de graças por todos os homens" — 1Timóteo 2.1);
. suplicar Sua graça para nós mesmos ("Não andem ansiosos por coisa alguma, mas em tudo, pela oração e súplicas, e com ação de graças, apresentem seus pedidos a Deus" — Filipenses 4.6).

 

d. contemplar Deus ("O Senhor é o Espírito e, onde está o Espírito do Senhor, ali há liberdade. E todos nós, que com a face descoberta contemplamosa a glória do Senhor, segundo a sua imagem estamos sendo transformados com glória cada vez maior, a qual vem do Senhor, que é o Espírito" — 2Coríntios 3.17-18)

 

ISRAEL BELO DE AZEVEDO