ERASMO- um protestante em cima do muro (Ivone Boechat)

Desiderius Erasmus Roterodamus era filho “ilegítimo” do padre Gerard e da filha de um médico de Aldeia. Nasceu, provavelmente, em 1469, em Roterdã, Holanda e, muito jovem ainda, entrou para o convento agostiniano, em Steyn. Mais tarde, já dominando a língua latina, desejoso de ampliar seus estudos, impressionado pelo humanismo e pela maravilhosa imprensa de Johann Gutemberg, mudou-se para a França.
Aos 30 anos, Erasmo, persuadido por um de seus alunos mudou-se para a Inglaterra. Foi lecionar na Universidade de Cambridge, onde suas idéias pouco ortodoxas fizeram o maior sucesso. Lá, estudou o grego antigo, explorou os sótãos de mosteiros à procura de pergaminhos intocáveis. Inspirado por tantas descobertas feitas nos empoeirados depósitos de livros, escreveu Adágios ou “Provérbios”, um dos livros mais lidos na antiguidade. São de Erasmo os “ditados”: “A cavalo dado não se olham os dentes”, “Dar nome aos bois”, entre tantos outros.
A elite intelectual temia a Erasmo, porque se alguém ousasse discordar de suas idéias, o adversário era transformado em algum personagem cômico de suas peças  teatrais reunidas no “Colóquios”, uma coleção muito popular de textos que tratavam de comportamentos do cotidiano.
Aos 50 anos, Erasmo, não exitou e pediu ao Papa a dispensa do uso da batina, embora continuasse padre. Era um padre consciente dos desvios do catolicismo que se afastava, cada vez mais, das práticas sãs e puras da fé sincera dos Apóstolos. Ele sabia que uma reforma na sua igreja era necessária, principalmente, desde o dia em que concluíra a leitura dos textos sagrados, no original. Foi dele a produção da primeira Bíblia impressa na língua grega. Com toda a sua autoridade, já denunciara a Vulgata latina, “com  erros e passagens obscuras”.
Martinho Lutero, contemporâneo de Erasmo, era um atento leitor de seus textos e, baseou-se grandemente na sua obra prima – a Bíblia impressa no grego- para traduzir o Novo Testamento para o alemão. Erasmo e Lutero, segundo registra a história, nunca se encontraram, pessoalmente. Admiravam-se, à distância. Ambos queriam a mesma coisa: a Reforma, porém com metodologias diferentes. Erasmo a queria dentro da igreja e Lutero, se não fosse dentro ( era impossível) que fosse por fora e já.
Em carta escrita por Lutero, pedindo apoio, porque sabia que suas idéias coincidiam, Erasmo declarou: “Mantenho-me neutro” . Claro! Erasmo vivia custeado por uma pensão dada pelo Arcebispo de Canterbury. Todavia, a imagem de Erasmo estava comprometida, junto à sua igreja, tanto que na Universidade Católica de Louvain, na Bélgica, era chamado de herege.
Erasmo foi pressionado pelo Rei Henrique VIII da Inglaterra e o Papa Adriano VI- seu compatriota holandês- a fazer um manifesto contra Lutero. Ordem é ordem e ele o fez, divulgou um impresso com o maior estardalhaço, sob o título: Do Livre-Arbítrio. Lutero não perdeu tempo e respondeu também num manifesto: Do Livre-Arbítrio Sem Liberdade. Bastou para que a imagem de Erasmo se arranhasse novamente entre os católicos. Alguns diziam até que “Erasmo pôs o ovo que Lutero chocou”.
Erasmo mudou-se para a Basiléia, cidadela da cultura clássica. Passou ali oito anos, tranqüilo, longe do barulho da Reforma, até que essa cidade se tornasse ativamente protestante.E houve quem pusesse a culpa nele. Teve que se mudar para Freiburg.
  Mais tarde, sofrendo as mazelas da velhice precoce, Erasmo voltou a Basiléia, onde passou seus últimos dias. Em julho de 1536, morreu, evidentemente, sem receber a extrema unção, abandonado pelo clero.

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