BOM DIA: A última sexta-feira

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Era sexta-feira.
Lá em cima o sol marcava 13 horas. Se brilhava, o que imperava nos corações era a sombra.
Daqui a poucos as famílias iriam se reunir para lembrar que o povo fora tirado da escravidão 1400 anos antes.
Sua mãe não estava em casa. Estava ali. Alguns amigos também.
Ele estava cravado numa cruz, ao lado de dois bandidos, como se fosse um.
Pendurado e pregado, com sede e com fome, só não tinha vergonha da sua condição porque era inocente.
Com o sangue esguichando pelos canais da fraqueza, perguntou tão fraquinho que poucos ouviram:
— Pai, porque me desamparaste?
Aquele que disse que nunca nos abandonaria se sentia desamparado. O pastor estava ferido e precisava de conforto.
Então — ninguém ouviu — o Pai sussurrou-lhe ao ouvido:
— Estou aqui, ao seu lado. Este era o nosso plano. Lembra-se?
Tanto se lembrou que respondeu, com dolorido sorriso nos lábios, antes de pender a cabeça pela última vez:
— Sim, eu me lembro: tudo agora está consumado.
O peso do mundo sobre nossos ombros nos faz sentir abandonados.
Era sexta-feira.
O sábado, às portas de chegar, parecia dar razão ao sentimento.
Quando o domingo nascesse, a verdade brilharia como o sol das 13 horas: Deus jamais nos desampara.
 
ISRAEL BELO DE AZEVEDO