ACADEMIA DA ALMA 6 — Na Íntegra

ENCONTRO 1

REFLEXÃO: VIVER VALE A PENA?

 

PARA MEDITAR

"Já aprendi a estar contente, a despeito das circunstâncias. Fico satisfeito com muito ou com pouco. Encontrei a receita para estar alegre, com fome ou alimentado, com as mãos cheias ou com as mãos vazias. Onde eu estiver e com o que tiver, posso fazer qualquer coisa por meio daquele que faz de mim o que eu sou" (Apóstolo Paulo, em Filipenses 4.12-13 – A MENSAGEM)

 

PARA PENSAR

"Adoramos nos conformar (ou nos resignar) às expectativas que mais nos afastam de nossos sonhos" (CONTARDO CALIGARIS).

 

PARA VIGIAR

NÃO  deixe de desejar.

 

PARA ALCANÇAR

Apesar de mim e das minha circunstâncias, quero a vida que Jesus prometeu, com alegria completa.

 

PARA MEMORIZAR

"O SENHOR, tenho-o sempre àminha presença; estando ele àminha direita, não serei abalado. Alegra-se, pois, o meu coração, e o meu espírito exulta; até o meu corpo repousará seguro. (…) Tu me farás ver os caminhos da vida; na tua presença há plenitude de alegria, na tua destra, delícias perpetuamente" (Salmo 16.8-11).

 

***

 

RENÚNCIAS ERRADAS

Comecemos por entrelaçar duas provocações de psicanalistas brasileiros.

 

Francisco Daudt registra o seguinte diálogo com seu filho, de seis anos de idade:

— Pai, qual é o sentido da vida?

— Filho, qual é o sentido da pedra? Nenhum? Pois então, tanto a pedra quanto a vida são fenômenos da natureza, e eles não têm nenhum sentido.

(DAUDT, Francisco. O sentido da vida, parte dois. Folha de S. Paulo, 6.9.2011. Equilíbrio, p. 2)

Em seguida, Daudt vaticina: "embora a vida não tenha sentido algum, somos nós, os donos dela, que lhe damos sentido e graça, por meio de uma misteriosa e inconsciente força motriz: o desejo". Assim, "quando o desejo, esta constelação de memórias ligadas ao impulso, se manifesta (…) e encontra seu objeto de satisfação, a vida ganha sentido, brilho e intensidade, mas é um sentido saído de nós".

 

Contardo Caligaris observa que "dedicamos mais energia à tentativa de silenciar os nossos sonhos do que à tentativa de realizá-los" e conta ouvir muitos dizerem que "desistiram de sonhos dos quais os pais não gostavam por medo de perder o amor deles". Ele propõe uma espécie de enigma: na verdade, "somos complacentes com as expectativas dos outros" desde que "elas nos convidem a desistir de nosso desejo. (…) Adoramos nos conformar (ou nos resignar) às expectativas que mais nos afastam de nossos sonhos. Aparentemente, preferimos ser o romancista potencial que foi impedido de mostrar seu talento a ser o romancista que tentou e revelou ao mundo que não tinha talento. Desistindo de nossos sonhos, evitamos fracassar nos projetos que mais nos importam".

Então, ele adverte: "A vida comporta poucas traições radicais de nós mesmos e de nossos desejos, e muitas soluções negociadas, espúrias, pelas quais a gente busca conciliar desejos diferentes com acasos, oportunidades e outros acidentes, reinventando-se a cada dia". (CALIGARIS, Contardo.  É fácil desistir de nossos sonhos. Folha de S. Paulo, de 7 e 14.7.2011, Ilustrada, p. 12)

 

A vida tem sentido. A fruição deste sentido tem inimigos e amigos.

Há um sentido externamente atribuído. Por "externamente", leia-se, na verdade, "divinamente". Não fomos postos na história por uma decisão do acaso, mas por uma decisão radical de Deus, para louvarmos a glória da Sua graça.

Pelo menos é o que o apóstolo Paulo diz na linda oração indireta que lemos na carta aos Efésios 1. John Pipper fez deste moto toda a sua teologia e toda a sua vida. Para ele, nós vivemos para dar alegria a Deus, no que ele chama de hedonismo cristão. (PIPER, John. Em busca de Deus. São Paulo: Vida Nova, 2007. 296p.) O outro hedonismo é tirar o máximo de prazer da vida. O hedonismo cristão visa, então, dar o máximo de prazer a Deus.  Assim, Deus nos criou para dar prazer a Ele. É mais ou menos como alguns têm filhos ou animais de estimação…

A razão não dá, com razão, razão a este raciocínio, a menos que tenhamos uma outra maneira de o compreender. E é possível uma conciliação, se caminharmos na seguinte direção. Nós vivemos para o louvor da glória de Deus, entendido que Deus se alegra no nosso bem-estar, razão pela qual nos ofereceu dois presentes para viabilizá-lo: Ele enviou Seu Filho para mostrar a inteireza do Seu amor para conosco, amor que restabelece nossa comunicação quebrada pelo pecado, e também nos legou a Bíblia Sagrada, com instruções que não são pesadas (1João 5.3), mas visam nos ensinar a viver de um modo prazerosamente sábio, santo e saudável.

Não somos como as pedras, vazias de sentido. No entanto, tendo um sentido para as nossas vidas, por Deus dado, precisamos tornar este sentido o nosso sentido. Neste sentido, somos nós quem atribuímos sentido à vida.

Atribuir sentido à vida (e vamos juntando os dois psicanalistas) há que ser a principal manifestação do desejo. São, portanto, graves as advertências de Caligaris.

Dizemos que dedicamos toda a nossa energia para realizar nossos desejos mas, na prática, gastamos mais tempo silenciando-os.

Culpamos pessoas e circunstâncias de nos impedirem de realizar nossos desejos mas, na verdade, fomos derrotados pelo medo de fracassar.

 

O PROJETO DE DEUS

Todo o projeto de Deus visa o nosso bem-estar, a que a Bíblia chama de "shalom", uma palavra polifônica para indicar harmonia (ou ausência de conflito), saúde (ou inteireza), prosperidade (não necessariamente material) e bem-estar (plenitude de vida). Compreendemos bem este significado (aparecendo ou não a palavra "shalom" ou "eirene"), lendo, entre tantos, as seguintes perícopes bíblicas:

 

. "Há muitas pessoas que oram assim: 'Dá-nos mais bênçãos, ó SENHOR Deus, e olha para nós com bondade!' Mas a felicidade que pões no meu coração é muito maior do que a daqueles que têm comida com fartura. Quando me deito, durmo em paz, pois só tu, ó SENHOR, me fazes viver em segurança" (Salmo 4.6-8).

Nosso conceito de felicidade tende a ser fortemente influenciado pelos valores predominantes em nossa época. Nossa época rejeita um estilo de vida simples (como o proposto por Jesus em Mateus 6), quando deveríamos buscar aquilo que nos faz feliz e não aquilo que nos impõem que nos faz feliz. Nosso tempo manda que tomemos remédio também para as dores da alma, quando deveríamos fazer isto só em último (nunca em primeiro) caso, no caso do sofrimento emocional insuportável, tendo falhado o autoaconselhamento, o aconselhamento ou a terapia. Umas noites para dormir podem demandar um remédio, mas não todas as noites.

 

. "Vocês construirão casas e morarão nelas, farão plantações de uvas e beberão do seu vinho. Não construirão casas para outros morarem nelas, nem farão plantações de uvas para outros beberem do seu vinho. O meu povo viverá muitos anos, como as árvores, e todos terão o prazer de aproveitar as coisas que eles mesmos fizeram.Todo o seu trabalho dará certo, e os seus filhos não acabarão na desgraça; pois eles e os seus descendentes serão a raça que eu abençoarei para sempre. Antes mesmo que me chamem, eu os atenderei; antes mesmo de acabarem de falar, eu responderei. Os lobos e os carneirinhos pastarão juntos, os leões comerão palha como os bois, e as cobras não atacarão mais ninguém. E no meu monte santo não acontecerá nada que seja mau ou perigoso. O SENHOR falou" (Isaías 65.21-25).

Nosso conceito de prosperidade tem a ver com acumular. O conceito divino tem a ver com justiça (no caso, igualdade de oportunidade para todos) e paz (fazendo com o o leão e o cordeiro, dentro e fora de nós, convivam respeitosamente). Ser próspero é ter os ouvidos abertos para ouvir a palavra de Deus.

 

. "Tenham sempre alegria, unidos com o Senhor! Repito: tenham alegria! Sejam amáveis com todos. O Senhor virá logo. Não se preocupem com nada, mas em todas as orações peçam a Deus o que vocês precisam e orem sempre com o coração agradecido. E a paz de Deus, que ninguém consegue entender, guardará o coração e a mente de vocês, pois vocês estão unidos com Cristo Jesus" (Filipenses 4.4-7 — NTLH).

O conceito bíblico de felicidade inclui alegria (interior e exterior, se assim podemos dizer), amabilidade (afabilidade) no trato com os outros, serenidade, esperança em Deus, gratidão a Deus pela vida e uma sensação de bem-estar).

 

. "Eu estou dizendo isso para que a minha alegria esteja em vocês, e a alegria de vocês seja completa" (João 15.11 — NTLH).

Jesus veio para que tivéssemos prazer em viver. Quando nos deixou (fisicamente), pensou nisto e orou por nós.

 

. "Deixo com vocês a paz. É a minha paz que eu lhes dou; não lhes dou a paz como o mundo a dá. Não fiquem aflitos, nem tenham medo" (João 14.27).

A paz do mundo tem um nome: medo. A paz de Deus é coragem.

 

O projeto de Deus para nós é vida plena, mas há muitos inimigos.

 

***

ACORDE

1. Faça um inventário pessoal,perguntando-se: "Já aprendi a arte do contentamento com o que sou?". (AUTOCONHECIMENTO)

2. Confesse o seu pecado,porque ainda espero a alegria da salvação (Salmo 51.12), eu já recebi, mas tenho deixado os ladrões me furtarem (CONFISSÃO)

3. Ore  especificamente, pedindo discernimento em relação aos desejos, buscando realizar os legítimos e não ter os ilegítimos (ORAÇÃO)

4. Medite sobre a natureza de uma vida que valha a pena, longe dos padrões vigentes que geram competição e enfermidade, sabedor que a graça de Deus é melhor do que a própria vida [Salmo 63.3] (REFLEXÃO)

5. Decida viver de modo transbordante. Há renúncias a ser feitas. Faça a renúncia certa. (DECISÃO)

6. Empenhe-se para persistir.Vigie para não desistir. Antes: deseje, decida, discipline-se. (ESFORÇO)

 

PARA LER

AZEVEDO, Israel Belo de. Academia da Alma. Rio de Janeiro: Convicção, 2007, p. 75-106.

PIPER, John. O sorriso escondido de Deus. São Paulo: Shedd, 2002.

 

ISRAEL BELO DE AZEVEDO

 

 

ENCONTRO 2

AUTOAVALIAÇÃO: EM QUE PONTO ESTAMOS

 

PARA MEDITAR

"Não estou querendo dizer que já consegui tudo o que quero ou que já fiquei perfeito, mas continuo a correr para conquistar o prêmio, pois para isso já fui conquistado por Cristo Jesus. É claro, irmãos, que eu não penso que já consegui isso" (Filipenses 3.12-13a — NTLH)

 

PARA PENSAR

"Nossas bênçãos reais muitas vezes nos vêm em forma de dores, perdas e desilusões, mas, se tivermos paciência, logo veremos essas coisas em suas devidas proporções" (Joseph Addison — 1672-1719)

 

PARA VIGIAR

NÃO  pare na autoavaliação, seja ela francamente negativa ou claramente positiva, ao final.

 

PARA ALCANÇAR

Pelo menos uma vez por ano, verificarei como ando nas mais diversas áreas da vida, para ver ser avancei ou retrocedi.

 

PARA MEMORIZAR

"Investiga minha vida, ó Deus,

descobre tudo a meu respeito.

Interroga-me, testa-me;

assim, terás uma ideia clara de quem sou.

Vê por ti mesmo se fiz alguma coisa errada

e, então, guia-me na estrada que conduz à vida eterna"

(Salmo 139.23-24 — A MENSAGEM)

 

***

 

O PRIMEIRO PASSO

Como conferimos a nossa vida real com a vida ideal (prometida)?

A vida tem sentido. A vida tem sentido e devemos buscá-la. A transbordância (paz) é possível. É uma caminhada, para toda a nossa vida.

Esta caminhada se faz com os pés da sabedoria.

Viver se aprende.

Um dia destes uma mulher sábia me disse:

— Israel, parece que a gente não aprende.

 

Pressupondo que queremos aprender, pela simples razão que queremos viver uma vida que vale a pena, o primeiro passo é o de uma honesta autoavaliação.

Geralmente, começamos cada ano prometendo (a nós mesmos, a Deus ou uma pessoa querida) alcançar algumas metas. Certamente, isto aconteceu com você, a menos que viva a esmo.

Vejamos.

Talvez você tenha-se comprometido em dedicar mais tempo à sua família.  É hora de perguntar: tem feito isto?

Talvez você tenha prometido cuidar mais do seu corpo, para ser mais qualidade de vida. É hora de medir (não só a cintura) suas conquistas ou fracassos.

Talvez você tenha manifesto o interesse em compreender e praticar a oração sem cessar ou em ter a Deus sempre diante de si, nos desejos e decisões. É hora de meditar: tem avançado, ao ponto de poder dizer que sua comunhão com Deus aumentou?

Talvez você tenha olhado para a sua própria vida e decido alargar as fronteiras, na área profissional. É hora de responder: que passos efetivamente deu para romper o quadro dos seus limites?

Suponhamos que você esteja indo bem. Se avaliar sua trajetória, poderá fazer melhor o percurso que falta e se superar.

Suponhamos que você não esteja indo bem. Só o saberá, se fizer uma avaliação.

Este é o convite para este momento. Quando leio as cartas de Paulo, vejo um homem cheio de projetos. Embora não nos tenha legado uma autobiografia, há elementos autobiográficos em suas correspondências. Nesses elementos, notamos suas propostas e o modo como se avaliava.

Aos romanos (Romanos 1.13) afirma que era seu propósito colher frutos entre eles. Aos coríntios, prometer passar uma boa temporada com eles (1Coríntios 16.7). Aos gálatas e filipenses garante que não será distraído com coisas que não importam  (Gálatas 6.17), para prosseguir para o alvo da soberana vocação que é Jesus Cristo (Filipenses 3.12). Aos colossenses mostra que se esforça para proclamar a salvação em Jesus (Colossenses 1.28-29).

 

Neste processo, é importante tornar objetiva esta autoavaliação.

Dois questionários podem ser muito úteis, como seguem.

 

UM QUESTIONÁRIO PARA UMA AUTOAVALIAÇÃO DA VIDA

 

De 0 a 5 que nota você dá para os seguintes aspectos de sua vida?

 

1. Alegria em estar com outras pessoas, além dos familiares

2. Avanço na realização dos seus projetos pessoais (se não os tem, marque 0)

3. Capacidade de se relacionar com outras pessoas

4. Certeza de ser amado/amada por Deus

5. Coerência entre o que crê e faz

6. Competência em organizar o próprio tempo (trabalho, comunhão, lazer, meditação)

7. Coragem em se autoavaliar e admitir os próprios erros

8. Cuidado com a própria saúde (alimentação, prática de exercícios físicos, sono, etc)

9. Desejo em comunicar o Evangelho a outras pessoas

10. Disposição em perdoar os que magoam

11. Gosto pela leitura da Bíblia

12. Interesse em ajudar o próximo

13. Mansidão diante dos comportamentos (fala e ações) que considera inadequados nos outros

14. Melhoria nas suas condições financeiras

15. Paixão em conhecer e fazer a vontade (como expressa na Bíblia) de Deus para a sua vida

16. Prazer (alegria) em viver

17. Progresso na sua carreira profissional

18. Satisfação em participar das atividades da igreja (adoração, estudo e comunhão)

19. Tempo gasto em oração intercessória (por outras pessoas)

20. Vontade de se superar (seja na área emocional, profissional ou espiritual)

 

Some, por favor, as notas, cujo máximo é 100 e reflita sobre o total alcançado

Se desejar, responda o "por que" de cada nota autoatribuída.

Não fique muito contente com os resultados, se tirou mais de 70 pontos, e nem desesperado, se ficou abaixo dos 50 pontos.

Dentro de algumas semanas, refaça o preenchimento e depois faça uma comparação.

Uma vida que vale a pena demanda sabedoria, com a coragem de olhar para dentro de si mesmo e para aquilo que os seus músculos estão fazendo.

 

UMA PERGUNTA PARA UMA AUTOAVALIAÇÃO

Faça a você mesmo a seguinte pergunta:

 

Quais são os seus inimigos para uma vida plena.

(Pegue, por favor, um papel e preencha, colocando um item por linha.)

 

Possivelmente, aparecerão itens de natureza moral (como: Orgulho, Preguiça, Intolerância, Inveja e Ganância), de percepção objetiva (como: Dinheiro, Falta de objetividade, Indisciplina, Uso do tempo [falta, excesso de trabalho, desorganização],  Saúde e Família [filhos, esposa], de fundo espiritual (Falta de confiança em Deus, Falta de entendimento de Deus, Desobediência a Deus, Falta de intimidade com Deus e Falta de oração e leitura da Bíblia), e e de fragilidade emocional (Medo, Conformismo [Covardia], Desânimo, Ansiedade, Expectativas muito elevadas [Frustrações], Insegurança, Instabilidade emocional, Baixa autoestima (perfeccionismo), Indecisão e Impaciência,

(Veja ANEXO)

 

O SEGUNDO PASSO

O segundo passo é a oração, processo em que pedimos duas coisas essenciais.

Salomão pediu sabedoria, a necessidade primordial.

Ele orou:

 

"Dá-me sabedoria para que eu possa governar o teu povo com justiça e saber a diferença entre o bem e o mal" (1Reis 3.9).

 

Ele o fez porque reconheceu que não tinha sabedoria. Sem ela, disse, não teria como governar o povo, esta a tarefa que lhe fôra confiada. Por isto, pediu-a.

 

Davi pediu que Deus o examinasse (Salmo 139.23-24). É como se tivesse lido Jeremias. Na verdade, ele sabia do que o seu coração era capaz. Estava sempre diante dele, como uma flâmula a tremular, o que tecera, do desejo à ação, para conquistar Bate-Seba, sem sentir sequer remorso até ser confrontado contundentemente pelo profeta Natã. Nós somos capazes da mesma coisa.

Pedimos palmas para Jesus nos cultos, mas, no fundo, podemos estar a pedi-las para nós.

Podemos cantar "tudo para glória de Deus", desde que venha um pouco dela para nós.

Podemos piratear um CD argumentando que a indústria fonográfica é cúpida.

Podemos trair nosso cônjuge porque não fomos correspondidos.

Podemos deixar de dar o dízimo por acharmos que o dinheiro não é bem aplicado.

Podemos ter certeza que a nossa tristeza vem do que alguma pessoas nos fez e não do que fizemos a nós mesmos.

Meditemos nesta outra oração de Davi:

"Faze-me justiça, SENHOR, pois tenho andado na minha integridade e confio no SENHOR, sem vacilar. Examina-me, SENHOR, e prova-me; sonda-me o coração e os pensamentos. Pois a tua benignidade, tenho-a perante os olhos e tenho andado na tua verdade. Não me tenho assentado com homens falsos e com os dissimuladores não me associo" (Salmo 26.1-4 — ARA).

Você sabe se tem sido íntegro diante de Deus.

Você sabe se realmente confia em Deus.

Você sabe se tem andado na verdade de Deus.

Você sabe com quem tem se associado no dia a dia.

 

***

 

ACORDE

1. Faça um inventário pessoal,perguntando-se: "Estou satisfeito com o que sou?". (AUTOCONHECIMENTO)

2. Confesse o seu pecado,em não fazer uma autoavaliação profunda de sua vida, visando novos passos. (CONFISSÃO)

3. Ore  especificamente, pedindo sabedoria para governar sua própria vida, como fez Salomão para governar o povo. (ORAÇÃO)

4. Medite sobre a necessidade da autorreflexão.Concentre-se na conclusão paulina: "Não penso que jáconsegui" [Filipenses 3.13a]. (REFLEXÃO)

5. Decida solicitar que outras pessoas avaliem você.(DECISÃO)

6. Empenhe-se para permitir que o Espírito Santo molde a sua vida.  (ESFORÇO)

 

PARA LER

AZEVEDO, Israel Belo de. Academia da Alma 5 (2010), temas 2 e 3. Disponível na internet.

DAMBERG, Carlos F. A oportunidade dos 40. São Paulo: United Press, 2011.

 

ANEXO 1

RESULTADO DE UMA AUTOAVALIAÇÃO

 

ASPECTOS MORAIS

1. Orgulho

2. Preguiça

3. Intolerância

4. Inveja

5. Ganância

6. Egoísmo

7. Uso da língua

9. Falta de higiene

8. Falta de submissão

9. Irresponsabilidade

10. Outras (Vingança, Deslealdade, Falta de compromisso)

 

ASPECTOS OBJETIVOS

1. Dinheiro

2. Falta de objetividade

3. Indisciplina

4. Tempo (falta, excesso de trabalho, desorganização)

5. Saúde

6. Família (filhos, esposa)

7. Obesidade (e falta de atividade física)

8. Internet (uso)

9. Saúde

10. Outras (Cansaço físico ou mental, Prioridades erradas, Frustração profissional [profissão errada], Limitação intelectual)

 

ASPECTOS ESPIRITUAIS

1. Falta de confiança em Deus

2. Falta de entendimento de Deus

3. Desobediência a Deus

4. Falta de intimidade com Deus

5. Falta de oração

6. Limitação espiritual (Instabilidade espiritual)

7. Pouca leitura da Bíblia

8. Pecado

9. Dificuldades em testemunhar

10. Falta de oportunidade para colocar as dúvidas e opiniões nos estudos bíblicos

 

ASPECTOS EMOCIONAIS

1. Medo

2. Conformismo (Covardia)

3. Desânimo

4. Ansiedade

5. Expectativas muito elevadas (Frustrações)

6. Insegurança

7. Instabilidade emocional

8. Baixa autoestima (perfeccionismo)

9. Indecisão

10. Impaciência

11. Dificuldade de convivência

12. Culpa

13. Tristeza (com tragédias; tristeza pelas mudanças nos cultos)

14. Mágoa

15. Solidão

16. Outras (Agressividade, Auto-sabotagem, Brigas, Comparações pessoais, Falta de perdão, Formalidades exageradas, Mal humor, Rejeição, Saber perdoar, Teimosia, Traumas)

 

ANEXO 2

UM QUESTIONÁRIO PARA UMA HETEROAVALIAÇÃO DA VIDA

 

Peça a uma pessoa querida que dêpara vocêuma nota, de 0 a 5, para os seguintes aspectos de sua vida?

 

1. Alegria em estar com outras pessoas, além dos familiares

2. Avanço na realização dos seus projetos pessoais (se não os tem, marque 0)

3. Capacidade de se relacionar com outras pessoas

4. Certeza de ser amado/amada por Deus

5. Coerência entre o que crêe faz

6. Competência em organizar o próprio tempo (trabalho, comunhão, lazer, meditação)

7. Coragem em admitir os próprios erros

8. Cuidado com a própria saúde (alimentação, prática de exercícios físicos, sono, etc)

9. Desejo em comunicar o Evangelho a outras pessoas

10. Disposição em perdoar os que magoam

11. Gosto pela leitura da Bíblia

12. Interesse em ajudar o próximo

13. Mansidão diante dos comportamentos (fala e ações) que considera inadequados nos outros

14. Melhoria nas suas condições financeiras

15. Paixão em conhecer e fazer a vontade (como expressa na Bíblia) de Deus para a sua vida

16. Prazer (alegria) em viver

17. Progresso na sua carreira profissional

18. Satisfação em participar das atividades da igreja (adoração, estudo e comunhão)

19. Tempo gasto em oração intercessória (por outras pessoas)

20. Vontade de se superar (seja na área emocional, profissional ou espiritual)

 

Em seguida, compare item por item com o mesmo questionário de autoavaliação que vocêpreencheu.

 

 

ENCONTRO 3

CONHECIMENTO: VOCÊ SABE QUANDO NASCEU?

 

PARA MEDITAR

"Por causa do sacrifício do Messias, que derramou seu sangue no altar da cruz, somos um povo livre: estamos livres das punições decorrentes das nossas maldades. E a verdade é que somos totalmente livres! Ele pensou em tudo e providenciou tudo de que precisamos, e fomos incluídos nos planos que ele teve tanto prazer em executar. Ele fez tudo isto antes de nós, em Cristo, um plano de longo alcance, em que tudo está ajustado e centralizado nele, nos mais altos céus e na terra". (Apóstolo Paulo, em Efésios 1.7-10 — A MENSAGEM)

 

PARA PENSAR

"O homem não passa de um caniço, o mais fraco da natureza, mas é um caniço pensante. Não é preciso que o universo inteiro se arme para esmagá-lo: um vapor, uma gota de água bastam para matá-lo. Mas, mesmo que o universo o esmagasse, o homem seria ainda mais nobre do que quem o mata, porque sabe que morre e a vantagem que o universo tem sobre ele; o universo desconhece tudo isso. Toda a nossa dignidade consiste, pois, no pensamento. Daí que é preciso nos elevarmos, e não do espaço e da duração, que não podemos preencher.Trabalhemos, pois, para bem pensar; eis o princípio da moral. Não é no espaço que devo buscar minha dignidade, mas na ordenação de meu pensamento. Não terei mais, possuindo terras; pelo espaço, o universo me abarca e traga como um ponto; pelo pensamento, eu o abarco". (BLAISE PASCAL — 1623-1662).

 

PARA VIGIAR

NÃO se deixe a aprisionar por compromissos que não celebrou.

 

PARA ALCANÇAR

Ficarei firme na verdade absoluta de que Deus me ama, na importa a minha história, não importa o meu corpo.

 

PARA MEMORIZAR

"Lembrai-vos das coisas passadas desde a antiguidade: que eu sou Deus, e não há outro Deus, não há outro semelhante a mim; que anuncio o fim desde o princípio e, desde a antiguidade, as coisas que ainda não sucederam; que digo: o meu conselho será firme, e farei toda a minha vontade" (Isaías 46.9-10).

 

***

 

A caminho de uma vida plena (este projeto para a existência toda), temos vários inimigos.

Um deles é uma compreensão errada a nosso próprio respeito. Sabemos quem somos segundo a Bíblia, que nos representa como Deus nos vê. Contudo, outras visões vão se agigantando diante de nós.

1. Fomos criados por Deus à Sua imagem e semelhança (Gênesis 1.27). Assim mesmo, uma predisposição da ordem da natureza, sozinha ou acompanhada de experiências de negação, derruba esta autoestima para o nível do subsolo. Com a autoestima neste lugar, nada vale a pena.

2. Deus nos brindou também com o prazer de viver (Eclesiastes 3.11), que os traumas, as autocríticas sem autocompaixão, as frustrações formuladas pelos contextos dos lugares de nossa jornada e as enfermidades físicas e emocionais vão fazendo minguar.

3. Deus continua trabalhando em nosso favor (João 5.17), pois está conosco e estará até o final dos tempos (Mateus 28.20), para vivermos de modo que valha a pena, que é a alegria dEle (Efésios 1.12). Assim mesmo, fatores aparentemente alheios à nossa vontade nos oferecem a solidão e o desamparo como as únicas alternativas possíveis. E assim vamos colhendo as daninhas ervas do medo.

4. Deus deseja que sejamos vencedores, na verdade, mais que vencedores (Romanos 8.37). Para tanto, lega-nos Ele um conjunto de promessas e cuidados neste sentido. Mais que isto, Ele luta as nossas batalhas (2Crônicas 20.15b) e nos supre em todas as necessidades (Filipenses 4.19). Todavia, escutamos as vozes da derrota que se aninham em nossos ouvidos e dali penetram para dentro de nós e ali se alojam.

 

1

ANTES DE NASCERMOS

Apesar de Deus e Sua Palavra, que deviam ser absolutos, outras verdades vão se entronizando no coração de nossas mentes, levando-nos a, entre outras realidades, uma visão errada a nosso próprio respeito.

Precisamos de uma visão adequada a nosso respeito, que inclua os fatores que nos precedem em nossa formação.

Meu pai foi também protético boa parte de sua vida. Um de seus trabalhos era fundir metais para fazer alianças ou moldar peças para a boca. Ele pegava um cadinho, colocava ali os materiais, aquecia o cadinho até alcançar uma alta temperatura e girava, com o auxílio de uma alça, todo o conteúdo no ar, até haver a fusão. Depois, quebrava o material externo e lá dentro estava a peça fundida, resultante de materiais dispersos por ele ajuntados.

No cadinho de nossas vidas, participam muitos materiais, difíceis de serem percebidos em suas distinções.

(Veremos hoje o material recebido antes de nosso nascimento. No próximo encontro, consideraremos o material que nós mesmos vamos constituindo, desde nossa infância.)

 

LAÇOS TRANSGERACIONAIS — Portanto, nascemos antes de virmos ao mundo. Somos parte de uma história que começou a ser escrita séculos antes, tenhamos ou não conhecimento disto.

A psicóloga L           êda de Alencar Araripe e Andrade conta que seu pai, à mesa das refeições, falava de seu sonho de "viver, pescar, nadar e caminhar" nas "areias brancas" de alguma ilha do Oceano Pacífico. Ela, menina, mergulhava junto. Adulta, esqueceu tudo e nunca o mencionou aos seus filhos. Contudo, seus filhos cresceram. "Cada um se dirigiu sem qualquer combinação prévia para uma ilha distante. Dois foram para ilhas do Oceano Pacífico. Um deles chegou mesmo a conhecer boa parte daquelas ilhas paradisíacas. As ilhas do meu pai…". Ela pergunta: "Como pode acontecer esta comunhão de destinos idealizados e desejos jamais expressados?" Ela responde: "Minha hipótese é que meus filhos captaram de alguma maneira misteriosa este desejo de mar, de ilha, de lugar longínquo, e concretizaram o que as duas gerações anteriores ansiaram e não realizaram". Sua conclusão é que "somos todos uma mistura de nossos pais e mães. Eles estão nos nossos genes, no aprendizado pela convivência e pelas ausências, nos modelos reproduzidos e na partilha da herança familiar". (ARARIPE E ANDRADE, Lêda de Alencar. A família e suas heranças ocultas. Fortaleza: Edição da Autora, 2008, p. 18 e 29.)

Estamos diante de "lealdades ocultas no seio das famílias", numa espécie transmissão psíquica (intergeracional ou transgeracional, dependendo do caso). O fato é que essas lealdades (em que nos propomos a viver os papéis dos outros) tendem a nos impedir de viver hoje e de modo independente a nossa vida.

O pressuposto nestas situações é que "o inconsciente de cada indivíduo leva a marca, na sua estrutura e nos seus conteúdos, do inconsciente de um outro, e, mais precisamente, de mais de um outro". Em outros termos, o material da vida psíquica é algo que se torna passível de ser transmitido, no interior de uma família, entre e inter gerações. E o que se transmite é preferencialmente aquilo que não se contém, "aquilo que não se retém, aquilo de que não se lembra: a falta, a doença, a vergonha, o recalcamento, os objetos perdidos, e ainda enlutados". (KAES, R. Citado por GOMES, Isabel Cristina Gomes, ZANETTI, Sandra Aparecida S. Transmissão psíquica transgeracional e construção de subjetividade: relato de uma psicoterapia psicanalítica. Disponível em < http://www.revistasusp.sibi.usp.br/scielo.php?pid=S1678-51772009000100006&script=sci_arttext. Outro artigo útil é: GOMES, Isabel Cristina. Transmissão psíquica transgeracional e violência conjugal: um relato de caso. Disponível em

<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S0006-59432005000200005&script=sci_arttext>)

 

Estes achados nos ajudam a entender o mecanismo da bênção e da maldição, bem como dos padrões positivos e negativos.

Por alguma razão, não temos muitas perguntas sobre bênçãos e padrões positivos. Quando não encontramos explicação para certos comportamentos, tendemos a atribuí-los a gerações passadas. Entre alguns cristãos, fala-se em maldição hereditária e, entre os espíritas, em carma. Nenhum deles tem o respaldo da revelação divina.

Quanto à maldição hereditária, até parece ter. Temos muitas bênçãos (desejos de bem para os outros) na Bíblia. Deuteronômio 29 nos fala de maldições, mas de maldições que resultarão "naturalmente", não "espiritualmente", do pecado. As bênçãos são incondicionais. As maldições é que são condicionais. Elas podem ser dadas e pendem sobre nós, que as fazemos despencar ou não sobre as nossas cabeças. Jabez recebeu um nome (sofrimento) amaldiçoante, mas o recusou (Crônicas 4.10). Raquel deu ao seu segundo filho o nome de Benoni (filho da minha dor), mas Jacó, o pai, o rejeitou, mudando o nome para Benjamim (filho da minha mão direita), certamente para sua alegria (Gênesis 35.18). Eu devia me chamar Er (Gênesis 38.7), mas meu avó não aceitou, preferindo Israel. Ainda bem.

Mais sérios são os padrões, sobretudo os negativos. A mentira, por exemplo, pulsava no  clã de Abraão. Seu neto (Jacó) o repetiu, enganando o irmão. O tio de Jacó mentiu também.

A liberdade, condicionada ao nosso conhecimento de nossas limitações e possibilidades, é que nos permite repetir o padrão ou recusá-lo, aceitar a herança ou não.

Diante destes laços, precisamos clarificar a lealdade invisível estabelecida, identificar as pressões e redefinir nosso lugar no grupo, "libertando-nos para viver nossa própria vida sem as amarras de lealdades aprisionoadoras". (ARARIPE E ANDRADE, op. cit., p. 60)

 

UM CORPO QUE (NÃO) FUNCIONA — Além deste material psíquico, também nascemos com o nosso corpo. Somos um corpo, que é, na verdade, um sistema complexo (e Deus não é complexo?), constituído a partir de um material genético e desenvolvido na história. É parte deste sistema o nosso aparelho psíquico, invisível mas sensível.

Este corpo tem uma história e o seu desequilíbrio pode ter origem na biologia ou na historia a partir dos relacionamentos.

Este corpo tem uma história e o seu desequilíbrio pode ter origem na biologia ou na historia a partir dos relacionamentos.

Entendemos bem a riqueza deste sistema, que inclui as emoções, quando ficamos deprimidos. A doença (que não pode ser confundida com tristeza) muito provavelmente é provocada por um desequilíbrio bioquímico nos neurônios, que regulam o humor. Este desequilíbrio torna o indivíduo mais vulnerável aos fatores desencadeadores, como traumas (acontecimentos que ficaram guardados) e pressões estressantes, que disparam a depressão. O ambiente familiar e extrafamiliar durante a infância também são predisponentes.

Se não entendemos esta dinâmica, ao ficarmos deprimidos, passamos a fazer perguntas que reforçarão a doença.

Em outras palavras, nosso corpo nem sempre, por razões variadas, internas e externas, funciona bem.

Nós separamos no corpo duas partes: aquela que é tangível (como os músculos) e aquela que é intangível (nosso aparelho psíquico). Se temos um problema de audição ou de postura, compreendemos, mesmo que nos provoque limitação ou dor. Entendemos que estes assuntos devem ser levados a um médico. Ele intervém e, às vezes, resolve. Quando não resolve, reclamamos e convivemos.

Quando a dificuldade é em nosso cérebro, temos alguma resistência, mas, superando-a, buscamos um neurologista para um diagnóstico. E aí precisaremos conviver com este diagnóstico (uma enxaqueca, uma labirintite, por exemplo), se ele não for reversível.

O drama é quando nosso aparelho psíquico não funciona adequadamente, dentro de padrões considerados "normais". Tendemos a incorporar o estigma social e nos recusamos a admitir que estamos emocionalmente doentes.

Precisamos saber que o transtorno psíquico nos tira a capacidade uma vida plena, facilmente entrecortada, quando, não, interrompida,

Além dos nossos esforços para um corpo-músculo saudável, precisamos nos empenhar para ter um corpo-mente igualmente saudável. E, as vezes, somos relapsos nos dois polos.

Perdemos muitos de nós mesmos quando nos recusamos a buscar a ajuda profissional no processo de compreensão e cura do nosso corpo-mente.

 

2

A NATUREZA DA VIDA

Estas percepções nos mostram que as vidas das pessoas são diferentes. As oportunidades não são iguais. Nossos corpos não são os mesmos. Nossas mentes não são as mesmas. (E isto já não seria suficiente para nos livrar da desgraça da comparação?)

Estas percepções também nos mostram que a vida nem sempre pode ser comparada a uma mala leve. Muitas vezes, por razões também alheias à nossa vontade, a mala pode ser pesada. Cabe-nos aliviar o seu peso.

E nós o fazemos quando entendemos a dinâmica da vida.

Recordo uma mensagem que preguei, na qual disse:

"A rota da liberdade incluía a tragédia do deserto. Não dava para acampar em Etã, sem que se partisse de Sucote (Êxodo 13).

 

Não dá para fugir de uma prisão, sem que se cave longamente um túnel insalubre, incerto e inseguro.

Não dá para escapar de uma embarcação, sem que se enfrente as ondas do mar e as embarcações da polícia marítima.

Não dá para sair de um oásis, sem que se caminhe pelo deserto, onde o sol é inclemente, o vento é cortante e a areia é paralisante.

O problema é que a vida é  dura.

A vida é dura por causa de nossos corpos que não resistem às bactérias e vírus.

A vida é dura por causa de nossas heranças, sejam elas genéticas, patrimoniais ou psicológicas.

A vida é dura por causa de nossas escolhas, especialmente as erradas.

A vida é dura por causa das escolhas dos outros, especialmente aquelas que nos alcançam.

A vida é dura por causa de nossos pecados, especialmente aqueles cujas conseqüências conhecemos.

A vida é dura por causa dos pecados dos outros, especialmente aqueles que se traduzem em criminalidade, corrupção e crueldade.

Por que a vida é dura, o deserto é necessário. Por isto, Deus leva seu povo para o deserto, mesmo sob protesto. Vendo o que Deus fez, penso nos pais, naqueles que amedrontam seus filhos e evitam que vivam, naqueles que protegem seus filhos, dourando-lhes a vida, e a vida não é dourada.

Penso naqueles que se sentem abandonados porque Deus os levou ao deserto. Não se ache abandonado. Deus não julga o verbo "abandonar".

Não se pergunte porque foi para o deserto. Ocupe-se em como sair de lá. É isto que importa: o que importa é como você vai sair de lá". (Leia o texto todo em AZEVEDO, Israel Belo. O fácil não existe. Disponível em <http://www.prazerdapalavra.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=664;odo-1317-22-o-fcil-ni-existe&catid=141;capitulo-13>)

 

Alguns depois, uma pessoa que ouvira a mensagem me disse, casualmente, que aquela mensagem lhe levara a mudar os rumos da vida, que sempre achava que era leve, mas não era.

Precisamos de uma compreensão correta da vida.

Perdemos muitos de nós mesmos quando nos recusamos a lançar mão dos recursos (comunhão com Ele e comunhão uns com os outros) que Ele nos põe no processo de compreensão e cura de nosso ser.

 

3

AJUDA E VISÃO

Neste caminho, precisamos de duas atitudes (que nascem de duas percepções).

 

AJUDA — A primeira é pedir ajuda a uma pessoa próxima para nos avaliar, numa espécie de contraponto à nossa autoavaliação.

Jesus fez uma intrigante pergunta a seus discípulos:

— Quem sou eu? (Mateus 16.15)

Temos que fazer pergunta semelhante.

Podemos ter uma autoimagem que não corresponde ao que os outros veem. Precisamos que estas lentes se aproximem.

Como escreveu um especialistas em recursos humanos, "é muito mais comum do que se pensa as pessoas formarem uma imagem muito profunda de si mesmas, e dificilmente solicitarem — ou mesmo aceitarem — contribuições de terceiros". Por isto, "para um processo de reflexão sobre quem você realmente é, torna-se fundamental a opinião dos que com você convivem". (DAMBERG, Carlos F. A oportunidade dos 40. São Paulo: United Press, 2011, p. 50)

Tenha a coragem de pedir a opinião dos outros a seu respeito. (Jesus fez isto, quando mandou seus discípulos fazerem uma enquete sobre o que as pessoas pensavam a respeito dele — Marcos 8.27.)

Disponha-se a ouvir, então, impressões surpreendentes (negativas e positivas) a seu respeito.

Pegue o mesmo formulário que você mesmo respondeu e peça a, pelo menos, uma pessoa conhecida (pode ser um amigo, um colega ou seu cônjuge) para preenchê-lo. A seguir, compare os resultados. (FORMULÁRIO 2)

 

VISÃO — A segunda é ter a visão que Deus tem a nosso respeito.

Recordemos estas verdades essenciais:

 

1.    Fomos criados por Deus à Sua imagem e semelhança (Gênesis 1.27). Deus nos estima bem. Devemos nos estimar bem.

2. Deus nos brindou também com o prazer de viver (Eclesiastes 3.11). Devemos aceitar este propósito divino para nós.

3. Deus continua trabalhando em nosso favor (João 5.17). Alegremo-nos e também trabalhemos.

4. Deus deseja que sejamos vencedores, na verdade, mais que vencedores (Romanos 8.37). Fiquemos firmes nesta promessa, apesar da história que a nossa família escreveu antes de nascermos e do corpo limitado que somos.

 

***

 

ACORDE

1. Faça um inventário pessoal,perguntando-se: "Que histórias sei da minha família antes de eu nascer?". (AUTOCONHECIMENTO)

2. Confesse o seu pecado,  de não cuidar do seu próprio corpo-mente, de não aceitar ajuda quando precisa. (CONFISSÃO)

3. Ore especificamente, pedindo conhecimento de sua história e de seu corpo. (ORAÇÃO)

4. Medite sobre a natureza de uma vida que valha a pena, longe dos padrões vigentes que geram ansiedade e enfermidade, sabedor que o Senhor nos dá o pão enquanto dormimos (Salmo 127.2) ou três refeições diárias (Mateus 6.11), que é o que precisamos. (REFLEXÃO)

5. Decida viver de modo transbordante.Decida cuidar da sua história. Decida cuidar do seu corpo. (DECISÃO)

6. Empenhe-se para persistir, mesmo que a sombra do medo cubra o seu corpo-mente. (ESFORÇO)

 

PARA LER

ARARIPE E ANDRADE, Lêda de Alencar. A família e suas heranças ocultas. Fortaleza: Edição da Autora, 2008.

AZEVEDO, Israel Belo. O fácil não existe. Disponível em <http://www.prazerdapalavra.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=664;odo-1317-22-o-fcil-ni-existe&catid=141;capitulo-13

 

 

ENCONTRO 4

MEMÓRIA: AI! O QUE FIZERAM CONOSCO DEPOIS QUE NASCEMOS

 

PARA MEDITAR

"Isaque cresceu e foi desmamado. Nesse dia em que o menino foi desmamado, deu Abraão um grande banquete. Vendo Sara que o filho de Agar, a egípcia, o qual ela dera à luz a Abraão, caçoava de Isaque" (Gênesis 21.8-9 — ARA)

 

PARA PENSAR

"Nenhuma experiência é a causa do sucesso ou do fracasso. Não sofremos por causa de nossas experiências chamadas de traumas, se fazemos com que se encaixem em nossos propósitos". (Alfred ADLER)

 

PARA VIGIAR

NÃO esquecerei que foram necessários vários anos para aprender a ser a pessoa que eu sou, de modo que não mudarei da noite para o dia. [1]

 

PARA ALCANÇAR

Tomarei o controle da minha vida, contra ou a favor de minha história de infância.

 

PARA MEMORIZAR

"Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, pensava como menino; quando cheguei a ser homem, desisti das coisas próprias de menino" (1Coríntios 13.11 — ARA)

 

***

 

ENCONTRO

Quem sou eu? Quem é você?

Cada um de nós é alguém formado ao longo de uma história única, que foi construída pelos seus desejos em diálogo com a sua natureza e dos seus relacionamentos, sobretudo os travados na infância. É durante esta fase da vida que vivenciamos experiências marcantes.

Até hoje, por exemplo, meu coração dispara, como se, menino de sete ou oito anos, estivesse correndo pela rua principal do meu bairro (Campo Grande, na região metropolitana de Vitória, ES) em direção à praça, onde mataram o Alemão. Nunca soube quem e porque ele foi morto, mas o filme se passa diante (posso dizer: todos os dias) dos meus olhos (posso dizer:) todos os dias. Seu corpo estava estirado no chão de barriga para cima e do buraco à altura do seu coração, o sangue fluía e se misturava com a areia do chão. Ainda estou vendo aquela cena. Só lembro da cena. De mais nada.

Que impacto teve sobre mim?

Não sei. Talvez venha daí meu absoluto horror a qualquer tipo de violência, especialmente porque o outro rolo do filme, que passa sempre junto, antes ou depois, conta uma história de quatro anos antes, quando um homem foi arrastado (vivo? morto?) ladeira acima, amarrado numa corda, por um cavalo montado. E meus olhos viram.

Eu sou também estas duas experiências, tanto as sou que nunca as esqueci, e só lembramos o que nos forma.

 

ENCONTRO

Precisamos prestar atenção às histórias que lembramos, porque eles nos mostram quem somos.

O psicólogo cristão Kevin Leman insiste, com razão, que as experiências da infância das quais nos lembramos — e a maneira específica em que as lembram — revelam quem nós somos". [2] Essas lembranças têm a ver com a lógica particular — um conceito de Alfred Adler — de cada um de nós, através da qual nos enxergamos a nós mesmos, buscamos atenção dos outros e lidamos com os conflitos da vida. "Sua lógica particular é moldada tanto por quem você era por natureza ao nascer quando pela pessoa em que se tornou em contato com seu ambiente familiar". [3]

Somos moldados, portanto, por nossa natureza, pelo convívio com nossos pais, irmãos, amigos e pele pelo que ouvimos, assistimos e lemos. Se nascemos num ambiente (familiar e extrafamiliar) opressivo (como o de uma ditadura), isto se refletirá no modo como vivemos, não necessariamente nos tornando opressores. Se nos formamos num ambiente permissivo (onde é proibido proibir), isto se refletirá no modo como vivemos, não necessariamente sendo permissivos. Não é antológica a reação dos pais de hoje que procuram dar aos seus filhos tudo o que não tiveram quando crianças? Mas também não conhecemos casos em que os pais de hoje tentam recriar o ambiente hostil em que viveram?

Nós tratamos as pessoas como aprendemos a tratá-las. Eugene Peterson registra, em suas memórias, como seu pai tratava os clientes do seu açougue: sempre com o máximo respeito, não importavam as suas condições econômicas ou sociais. Quando chegavam as duas prostitutas da cidade para comprar carne e os risinhos começavam, ele as servia com toda a consideração. Numa das vezes em que o menino Eugene estava e a cena se repetiu, ele esperou que saíssem e disse que, na loja dele, elas deveriam ser respeitadas como qualquer cliente. Peterson nunca se esqueceu e, ao longo da vida, o padrão de respeito ao próximo, mesmo o mais diferente, integrou a sua personalidade. [4]

 

FOCO DE MISÉRIA

Nem sempre aprendemos (vendo) coisas boas em casa.

Nem sempre somos amados na família. Ou: nem sempre somos amados do modo certo.

E é bom que acrescentemos: pais, nem sempre ensinando (com a vida) coisas bons. Pais, nem sempre amamos a nossa família mais que a nós mesmos. Pais: nem sempre amamos do modo certo. Por isto, pais, escutemos: a lembrança que estamos "criando hoje pode muito bem ser aquela que vai durar uma vida inteira". [5]

Ha muitas mentiras que nos contam, quando crianças, nas quais acreditamos a vida toda.

Eis o que, tristemente, por vezes, aprendemos,

 

1. depois de um erro (ou, mais provavelmente, de uma irritação que involuntariamente provocamos):

— Você não vai dar nada na vida.

 

2. depois que falhamos mais uma vez na mesma coisa:

— Você SEMPRE falha. Não posso confiar em você.

 

3. depois que os pais brigam:

— Você só veio trazer problemas aqui em casa.

 

4. quando surge alguma dificuldade:

— Os problemas de nossa família são de nossa família. Ninguém precisa ficar sabendo.

 

5. quando os conflitos se agravam:

— Nossa família é a melhor família do mundo. Não há ninguém melhor do que os da nossa família. Nós somos os melhores.

 

6. quando você fracassa numa matéria na escola:

— Você é burro. (Eu ouvi isto. E o pior é que era verdade… naquela matéria que não me interessava)

 

7. quando querem nos estimular em alguma área da vida ou, simplesmente, nos fazer orgulhosos:

— Você é o melhor filho do mundo. 

 

8. quando consideram você muito sincero:

— Você não tem que ser verdadeiro. Diga às pessoas o que elas querem ouvir. Nunca pareça fraco.

 

9. quando as coisas não vão bem:

— Seu problema é o casamento que você tem. (Ou: os pais que você tem)

 

10. quando acham você muito ingênuo:

— Jamais confie em alguém. [6]

 

11. quando querem ensinar a como viver:

— "competir pelo dinheiro (…) é a única maneira inteligente de viver". [7]

 

12. quando acham que interpretam corretamente os mandamentos de Deus:

— Você precisa ser moralmente impecável, para ser amado por Ele.

 

Três histórias nos atestam o poder operacional destas ilusões.

 

A MALDIÇÃO DO FRACASSO — Quando fez 50 anos, Adolfo fechou a sua vida.

Tivera uma infância difícil, mas conseguiu dar a volta, amealhou algum patrimônio, casou-se, teve filhos e filhas. Quem conheceu Adolfo estranhava o seu jeito de ser: calado e soturno. Sua esposa disse que jamais contou uma piada. Um de seus filhos, no seu funeral, aos 78 anos de idade, lamentava que nunca brincara com ele ou com os irmãos.

Conheci Adolfo aos 55 anos. Tinha vendido seu negócio e vivia dos rendimentos, que começavam a escassear. Ele estava apavorado, achando que logo não teria mais recursos para sustentar sua família (ele e a esposa).

Ele cantava em dois coros, mas me disse que cantava porque a esposa o obrigava. Quando a igreja reunida cantava, não via a melhor graça naquilo e estranhava o entusiasmo e duvidava que fosse verdadeiro.

Quando me procurou, queria ajuda para entender o que se passava na sua mente, porque não via nenhum sentido para a sua vida. Perguntou-me se morresse naquela tristeza, iria para o céu. Depois me disse que pensava em se separar porque estava sendo um peso. Sempre que podia, repetia que era um fracassado.

Uma vez lhe perguntei porque era um fracasso se ele não era um fracassado. Então, ele me disse:

— Até hoje eu escuto meu pai dizer, quando minha mãe morreu, que eu era um peso para ele e que não sabia como cuidar de mim. Como eu chorava muito, ele me pegou pelos cabelos e gritou: homem não chora, seu fracassado! Desse jeito, você não vai dar em nada na vida.

Adolfo acreditou nesta mentira (de que não daria nada na vida) e a transformou na sua verdade.

 

O DESTINO IMPOSTO — Antonio tinha outros irmãos, mas seu pai, que era engenheiro civil bem-sucedido em Pernambuco, decidiu que ele também será engenheiro. O pai, então, o enviou para o Rio de Janeiro para estudar na mesma Universidade onde se formou, por ter o melhor curso do país. Antônio concordou. No entanto, a sua paixão sempre foi a música. Nunca se rebelou com o pai e buscou, mesmo a contragosto, fazer a vontade dele. Ser cantor sempre foi o sonho de sua vida. Mudou-se para o Rio e, embora parecendo que estudasse, a cada vestibular (foram vários) era reprovado. No quarto vestibular, seu pai veio estar com ele e disse:

— Esse é o seu último vestibular para engenharia. Se não passar neste, vai  ter que se virar na vida.

Antônio estudou muito naquele. Afastou-se das atividades da igreja, para poder se concentrar no vestibular. Publicado o resultado, foi reprovado mais uma vez.

Tornou-se cantor. Abandonou a igreja. Desapareceu dos amigos, fazendo novos, ligados ao seu campo da sua arte.

Enquanto esteve na igreja, alguns puderam observar nele que tinha dificuldade de dizer "não" aos convites que recebia e que atrapalhavam seus estudos. Precisava ser sempre querido. Era sempre agradável com as pessoas.

Ele demonstrou também que não terminou nenhum projeto que começou. Tudo o que planejava fazer era sempre muito grande, mas que redundava em nada.

Jamais namorou. Sua companhia, jovem que era, eram meninas a quem tratava como irmãs e assim se protegia de qualquer relacionamento sério.

Antônio teve sobre si o peso de expectativas que não formulou. Ao mesmo tempo, vivia para agradar seu pai e, por extensão, aos líderes musicais da igreja, aos quais jamais queria desagradar. Antônio tinha horror a qualquer relacionamento que fosse além da superficialidade.

Nunca se livrou da imposição do seu pai, mesmo quando ela foi retirada. É possível que carregue a frustração de não ter realizado o sonho do pai, que talvez carregue a mesma frustração ou a culpa de ter imposto ao filho o que não se pode impor.

 

AS FORMAS DA AUSÊNCIA — Antônia decidiu ter um filho "independente", como se dizia na época. Orgulhava-se de criar seu filho sem pai e nunca apresentou os dois. Na certidão, só há o nome da mãe. John (em homenagem a John Lehnon) sempre teve tudo, menos a presença da mãe, menos o carinho da mãe, nunca o exemplo do pai, que jamais conheceu. Tinha um bom emprego e nele ficava o dia inteiro e parte da noite. O garoto viveu a infância sozinho. Sua vida era escola-casa-igreja.

Na igreja, John foi muito ativo desde a adolescência. No entanto, ele não era amado. Ele era suportado, porque a convivência com ele era muito difícil. Mentiroso e fofoqueiro, quando alguém o questionava, ele chorava, reclamando pelos cantos que não era aceito.

Para piorar, tinha um modo de falar e vestir que muitos julgavam efeminados. Na juventude, a situação ficou ainda mais constrangedora. Se alguém procurava a sua mãe para sugerir um acompanhamento profissional, ela reagia:

— Ele é assim mesmo. Ele vai crescer e superar estas coisas de criança.

John, o inseguro, era o produto de pais ausentes: a mãe assoberbada pelo trabalho, o pai impedido de existir.

Vítima, aceitou o papel, sem saber o que é vida abundante.

 

NEGANDO A MENTIRA

Se estas histórias nos soam próximas, como que fazemos com as nossas vidas?

Melhor: o que fazemos com estas mentiras?

A primeira coisa é reconhecer que você acredita nelas. (Isto quer dizer que você também se tornou um mentiroso.)

A segunda é perceber o mal que estas mentiras têm feito a você. (E talvez você tenha feito a outras pessoas.)

A terceira é decidir viver a verdade, e tão somente a verdade, sempre em amor.

A quarta é pedir ajuda a Deus para não acreditar nas mentiras, certos de que foram formuladas pelo Diabo, o pai da mentira (João 8.44), para lhe roubar (o prazer de viver), matar e destruir (João 10.10a).

A quinta é saber quem você é uma pessoa amada por Deus. Defina-se radicalmente desse modo. "Esse é o seu eu verdadeiro. Qualquer outra identidade é ilusão". [8] Logo, não precisa viver na solidão. Não precisa ser amarga. Não precisa exigir demais de você mesmo. Não precisa comprar o amor dos pessoas. Não precisa ter medo de viver.

Lembre-se que você passou toda a sua vida ouvindo (e acreditando) estas mentiras como se fossem verdades. Elas não virar mentira de uma hora para outra. O processo é longo.

Colocar sua mente no padrão da verdade é muito mais complexo que reeducar seu corpo (através de longas sessões de fisioterapia).

 

UM NOVO CAMINHO

Encontros e desencontros, verdades e mentiras, pressões e silêncios permissivos, ideais e frustrações moldam nossas atitudes, que são tributárias de nosso sentimento, nosso temperamento e nosso caráter. E este processo levou anos, sem que se percebesse uma direção clara, como se não houvesse um plano (e não). Vamos nos tornando o que somos (ou achamos que somos).

Juntemos esta história com nossa natureza e temos a fórmula. Então, somos afetuosos ou secos; tímidos ou expansivos; calmos ou explosivos; honestos ou golpistas.

A natureza e o meio nos educaram, sem nos dizer que estavam nos modelando, de modo que tudo correu muito natural. Eis que, num dado momento, ficamos diante de uma câmera fotográfica e nos entristecemos com o autorretrato. Gostaríamos de beijar as pessoas, mas… ficamos duros na frente delas. Não gostaríamos de explodir violentamente a algo que nos desagrada, mas… já reagimos. Gostaríamos de não tremer diante de um compromisso ou de uma pessoa poderosa, mas… suamos frio. Gostaríamos de viajar o mundo sem medo de avião, mas… ficamos em casa. Gostaríamos que jamais a "lei de gerson" fosse a nossa, mas… já agimos para levar vantagem.

Enfim, perdemos o controle de nossas vidas.

O que podemos fazer, depois de termos denunciado as mentiras em que sempre acreditamos, para reescrever nossas histórias?

 

1. Preciso decidir tomar o controle da minha vida. O peso das mentiras ou das verdade não vai fazer que meu corpo se encurve ainda mais. Observarei daqui em diante "o nível de controle que eles terão" sobre a minha vida". Sei que a mudança do meu comportamento implica em mudar minha lógica particular, a maneira como enxergo a vida — "e essa é uma das coisas mais difíceis de mudar". [9]

 

2. Preciso saber como foi minha infância, porque as experiências daquela época definem a minha identidade, logo: meu presente e meu futuro.

 

3. Preciso recusar qualquer sentimento de autorrejeição, certo de que "a maior armadilha de nossa vida não é o sucesso, a popularidade ou o poder, mas a autorrejeição. Sucesso, popularidade e poder podem representar grandes tentações, mas a qualidade sedutora em geral provém de como se integra à tentação bem maior: a autorrejeição. Quando chegamos a acreditar nas vozes que nos nos chamam de indignos e inamáveis, então, o sucesso, a popularidade e o poder são facilmente percebidos como soluções atraentes. (…) Assim que alguém me acusa ou me critica, assim que sou rejeitado (…) me pego pensando (…) que não nada de bom, [que] mereço ser rejeitado e abandonado. A autorrejeição é o maior inimigo da vida espiritual porque contradiz a voz sagrada que nos chama de amados. Ser o amado constitui a verdade essencial de nossa existência. [10]

 

4. Preciso esperar as mudanças acontecer. Estou lembrado que foram necessários vários anos para que eu aprendesse a ser quem sou, de modo que a mudança que desejo não ocorrerá num passe de mágica. [11]

 

5. Preciso acertar as contas com a minha família. Sei que "todos compartilhamos da mesma necessidade de ser amados e aceitos por nossa família, de contribuir com ela de uma maneira que nos ajude a sentir que fazemos parte dela e de provar somos competente em alguma coisa na vida que nos diferencie de nossos irmãos e irmãs. Para alcançar isto, disputamos a atenção daqueles que são mais importantes em nossa vida: nossos pais. O impulso inato da criança de encontrar um lugar no coração de seus pais é tão forte quanto sua necessidade de respirar. (…) E para nos colocarmos a parte da 'concorrência' (…) aprendemos a abrir nosso próprio caminho". [12] Neste processo, preciso ter uma clara visão das contribuições (negativas e positivas) dos meus familiares para meu estilo de vida.

 

 

***

ACORDE

1. Faça um inventário pessoal,perguntando-se: "Que traços da minha vida relaciono com fatos ocorridos na minha infância?". (AUTOCONHECIMENTO)

2. Confesse o seu pecado de ter ignorado sua própria história (CONFISSÃO)

3. Ore  especificamente, pedindo a Deus para não mais acreditar nas mentiras que lhe fizeram aceitar ao longo de sua vida, impedindo-o a viver a vida transbordante prometida para os que amam a Deus. (ORAÇÃO)

4. Medite sobre a natureza de uma vida que valha a pena, de modo que o seu passado, recordado, não seja um fantasma a assustá-lo, mas um recurso para a autocompreensão e autossuperação (REFLEXÃO)

5. Decida viver de modo transbordante. Há descobertas a ser feitas. Use-as para viver melhor. (DECISÃO)

6. Empenhe-se para persistir.Vigie para prosseguir, mesmo que as lembranças possam primeiramente trazer desconforto. (ESFORÇO)

 

PARA LER

LEMAN, Kevin. O que as lembranças de infância revelam sobre você. São Paulo: Mundo Cristão, 2011.

MANNING, Brennan. O impostor que vive em mim. São Paulo: Mundo Cristão, 2006.

 

ISRAEL BELO DE AZEVEDO

 

FORMULÁRIO 3

2.    Qual é a primeira lembrança que lhe vem quando recua até sua infância?

3.    Pergunte a um familiar mais antigo (pais ou irmãos) qual foi o fato mais marcante de sua infância, na visão deles?

3. Quais os fatos na vida do país no dia/ano em que nasceu?

4. Na infância o que lhe dava prazer?

5. Qual o maior medo que sentiu?

 

 

ENCONTRO 5

ATENÇÃO! A VIDA NÃO É ISTO!

 

PARA MEDITAR

"Saibam que o lugar em que vocês mais desejam estar é perto do seu tesouro, e é lá que acabarão indo parar. (…) Se Deus dá tanta atenção às flores do campo — e muitas delas nem sequer são vistas — não acham que ele irá cuidar de vocês, ter prazer em vocês e fazer o melhor pro vocês? Quero convencê-los a relaxar, a não se preocuparem em adquirir. Em vez disto, procurem dar, correspondendo, assim, ao cuidado de Deus. (…) Orientem sua vida de acordo com a realidade, a iniciativa e a provisão de Deus. Não se preocupem com as perdas e descobrirão que todas as suas necessidades serão satisfeitas". (Mateus 5.19-33, partes — A MENSAGEM)

 

PARA PENSAR

"O contexto cultural em que estou imerso requer, ao menos de mim, uma vigilância incansável para preservar minha vocação dessa poluição cultural tão perigosamente tóxica para as pessoas que desejam seguir a Jesus de um modo que ele não deixe de ser Jesus. Eu queria que minha vida, tanto minha vida pessoal quanto profissional, fosse modelada por Deus, pelas Escrituras e pela oração". (Eugene PETERSON [13])

 

PARA VIGIAR

NÃO viverei a vida dos outros.

 

PARA ALCANÇAR

Quero que a minha vida seja modelada pelo Espírito Santo, por meio das Escrituras e da oração.

 

PARA MEMORIZAR

Senhor, "tu criaste o íntimo do meu ser

e me teceste no ventre de minha mãe.

Eu te louvo porque me fizeste

de modo especial e admirável".

(Salmo 139.13,-14a — NVI)

 

***

 

Quando fiz nove anos de idade (podendo estar errado na data), ganhei um livro. Na verdade, por essa época ganhei três livros (pela ordem decrescente de importância): "Caçadas de Pedrinho" (de Monteiro Lobato), "Canções da Primavera" (de Avelino de Souza) e um sobre Plácido de Castro na conquista do Acre. Tornei-me escritor por causa dos dois primeiros e por todos aqueles da biblioteca do meu pai.

Esta passagem sobre mim mesmo nos ajuda a compreender que nós somos nosso Corpo, nosso Contexto e nossos Compromissos.

Nascemos um corpo num contexto cultural, dado por nossa família e pelos nossos outros círculos de convivência (na rua, na escola e na igreja), demarcados inicialmente por nossos pais.

Assim, somos a saúde (física e mental) que habita o nosso corpo.

Também somos a família que nos formou e a sociedade em que vivemos, ambas com seus valores, que, quando incorporados, transformam-se em compromissos.

Somos, portanto, modelados por nosso corpo, nosso contexto e nossos compromissos.

O entrelaçamento destes vetores oferecem vários convites ao nosso estilo pessoal de ser, dos quais três soam bastante fortes: a comparação, a competição e o consumo.

 

COMPARAMOS E NOS COMPARAMOS, EMBORA QUEM É ÚNICO SEJA INCOMPARÁVEL

Por que, quando ganhamos, crianças, um presente (uma roupa, uma bicicleta ou uma boneca), saímos a rua? Para brincar? Para exibir? Para dizer que o nosso presente é melhor? Por que perguntamos ao nosso amigo o que ele ganhou?

É como se precisássemos de espelho para saber quem somos.

Na verdade, somos carentes de aceitação (precisamos ser amados), comparamo-nos com o(s) outro(s) para saber se somos tão amados quanto o(s) outro(s). Só que, além de amor, queremos justiça: queremos que os afetos sejam distribuídos de modo justo, esquecidos que afetos (amores) têm memórias, que produzem recompensas, que, subjetivos, ignoram a razão.

Crianças ainda olhamos para o que os nossos amigos têm. Olhamos, da distância em que nos encontramos, para os pais dos nossos colegas e eles nos parecem mais ricos do que os nossos, mais carinhosos do que os nossos, mais felizes do que as nossas famílias. Ele passeiam mais. Ele brincam mais.

Não queremos ser felizes: queremos ser felizes como os nossos vizinhos.

E pelo resto da vida, comparamos, embora nos achemos únicos.

Quando comparamos, deixamos de ser nós mesmos. Queremos o carro que o vizinho tem. Trocamos de carro porque o vizinho trocou o dele. Queremos a casa de um artista que uma revista exibiu. Ao nos compararmos, queremos ser iguais achando que assim seremos diferentes.

A comparação — esta celebração do egoismo — é uma perda de tempo (e energia) que drena a alegria de viver, ao fazer sedimentar no coração dos petardos, entre outros: a autocomiseração e a inveja. Quem desenvolve a moléstia da autocomiseração pensa assim: "Como não sou igual a outro, ou eu lhe sou inferior ou lhe sou superior. Se eu lhe for inferior, nunca lhe serei igual. Se eu lhe sou superior, nunca lhe serei igual. Quem me fez desgraçadamente assim? Ah, se me fosse dada outra vida". Snif!

Golias se comparou com Davi (mais fraco) e perdeu. Davi não se comparou com Golias e venceu.

Quem cai no pecado da inveja deseja ser o que imagina o que o outro é ou tem. O outro se torna sua referência. A comparação faz com que o modelo (o outro com que se compara) fique cada vez mais distante. A tentativa frustrada de o alcançar gera ressentimento e rancor. É neste sentido que se diz que a inveja mata. Deus a chama de podridão dos ossos (Provérbios 14.30) e nos aconselha a quem não abriguemos no coração (Tiago 3.14-16), mas quem pode resistir à inveja (Provérbios 27.4). Um dos mandamentos foi precisamente que não devemos invejar, que é pôr o coração em coisas que pertencem ao próximo (Êxodo 20.17).

Ajuda-nos a lembrança que Goethe nos sugere: "Os homens não se conhecem uns aos outros com facilidade, ainda que ponham nisso o melhor da sua vontade e das suas intenções. Porque há que contar sempre com a má vontade que tudo distorce. Conhecer-nos-íamos melhor uns aos outros se não estivéssemos sempre a querer comparar-nos uns com os outros". [14]

Sobretudo deve nos inspirar num caminho anticomparativo esta quadra do lindo Salmo 139:

 

Senhor, "tu me moldaste por dentro e por fora;

tu me formaste no útero da minha mãe.

Obrigado, grande Deus — é de tirar o fôlego!

(…) Sabes exatamente como fui feito: aos poucos;

como fui esculpido: do nada até ser alguma coisa"

(Salmo 139.13,14 e 16)

 

Compararmo-nos é abrir mão de nossa singularidade.

Para quem estas moléstias tem deixar se (se) comparar faz muito bem.

 

COMPETIR É GUERREAR

Ficamos horrorizados com a guerra, aquela estampada na capa dos jornais.

No entanto, queremos vencer a discussão com o nosso cônjuge (para que assim nós o submetamos), queremos ganhar o debate travado com os colegas (para que assim sejamos mais elogiados), queremos que os aplausos a nós dirigidos dure mais do que o outro maestro (para ficar evidente que somos melhores), queremos que o nosso livro venda mais do que os outros autores (porque escrevemos melhor), queremos que a nossa igreja esteja mais cheia do que as outras (de modo que possamos cantar que nela o poder de Deus é maior).

Eis o que queremos, mas não achamos que isto seja guerra.

Mas o que é guerra, senão a busca por mais espaço, tirado do outro, pela derrota do outro? Somos moldados pela ideologia da guerra, como se fosse o motor do crescimento pessoal.

Por isto, há pessoas que precisam inventar uma guerra, em que tudo é justificado (até matar) para continuar sobrevivendo. Por isto, há pessoas que inventam doenças para, lutando contra elas, continuar sobrevivendo.

E essas mesmas pessoas criticam a violência no mundo. Muitos pais ensinam aos seus filhos que primeiro devem bater, antes que batam neles. E esses mesmos pais reclamam da insegurança das ruas.

Gostamos tanto dos esportes, pela dimensão saudável da competição. E é porque pode ser o território da trapaça (é preciso vencer, a qualquer custo) ou da violência (é preciso vencer, preferentemente massacrando o adversário tornado inimigo) que o esporte tem regras. Nem sempre esportistas e torcedores não o entendem. Quantas vezes nos decepcionamos quando, terminada a partida de futebol, o atacante e o zagueiro se abracem. Eles entenderam o que é o jogo. Os que nos decepcionamos, não. Um jogo é o que é: um jogo, talvez uma simulação de uma guerra, mas não uma guerra; deve haver um vitorioso no jogo, mas não um derrotado.

Na vida profissional, se a competição for apenas um elemento do jogo, não de nossa personalidade, ela pode nos ajudar a compreender os nossos papéis. A competição na vida, emulando a do jogo, pode ser saudável. Por causa de nossa natureza, se não tiver regras, transforma-se em veia aberta para a violência.

Sucesso não é se realizar. Sucesso é derrotar aquele que se imagina inimigo. A sociedade nos obriga a participar da guerra. Os postulantes a um curso ou a um emprego precisam estudar o suficiente para derrotar os inimigos, mesmo que alguns tenham crescido com eles. Não importa: ali são inimigos a vencer.

Fico pensando que o temperamento dito explosivo de uma pessoa não advém da certeza que ela vai perder. Como vai perder, quem sabe terá alguma chance se bater primeiro. Nos termos da psicologia, "o agressivo se adianta a uma possível experiência de rejeição, tendo a certeza de que alguém fatalmente irá contrariar suas expectativas". [15] É por isto que os fracos são violentos, não importa a face que  tome: irar-se, esmurrar a mesa, bater a porta, elevar o tom da voz, argumentar perfidamente para ferir o antagonista em seu ponto vulnerável, [16] emburrar, debochar, ironizar, chutar, empurrar, esbofetear, gritar, atirar

A violência é intrínseca à condição humana, mas pode ser desarmada.

A violência também se aprende, mas a espiral pode ser desfeita. Aprendemos que os conflitos, próprios de nossas diferenças, não devem ser administrados. Eles devem ser eliminados — apreendemos — com a sujeição do outro. A paz também se aprende, por isto são felizes os que a promovem (Mateus 5.9).

Podemos resolver nossos conflitos sem agredir. Quando estamos mergulhados nele, nós os resolvemos quando entendemos que os dois lados precisam vencer.

Precisamos descobrir que somos interdependentes. Nós precisamos um do outro.

Os casais que continuam juntos são ou, infelizmente, aqueles em que um dos cônjuges se sujeitou (isto é: foi sujeitado) ou, felizmente, aqueles que descobriram a sujeição mútua (Efésios 5.21).

Somos chamados a viver em paz com todos, na medida do possível. Somos convidados a não reagir com violência. Conhecedor de nossa natureza, Deus nos diz: deixem a vingança comigo, porque eu não peso a mão como vocês quando estão cheios de ódio (Romanos 12.18-19).

 

O PRAZER DE TER

É na ideologia do consumo (ou simplesmente: no consumo) que o peso da cultura se torna praticamente irresistível.

É no consumo que a comparação encontra terreno propício para dominar.

É no consumo que a competição desabrocha sem culpa.

Então, deixamos de ser cidadãos para nos tornarmos consumidores.

O consumo precisa de nós mas dá um jeito de convencer que precisamos dele. Suas profecias estão nos meios de comunicação e sabemos em geral que os anúncios são anúncios. Seus controles estão nos olhares do grupo de que fazemos parte; só lhe pertencemos, se consumimos o que ele consome.

O consumo não é o consumo, mas uma ideologia.

Consumir não é satisfazer uma necessidade. O consumo se satisfaz em si mesmo.

O consumo já é o ideal. O consumo se vende como um projeto de vida.

Ao nos seduzir, o consumo se torna parte do nosso estilo de vida.

O consumo se torna um padrão, como uma estrada a ser naturalmente percorrida.

É divertido consumir.

A ideologia do consumo pervade todos os desejos, todas as práticas e todas as instituições.

Precisamos comer; o consumo nos sugere o cardápio e o restaurante.

Precisamos dormir; o consumo nos estabelece o tipo e a marca do colchão.

Precisamos morar; o consumo nos conforma a arquitetura.

Precisamos nos vestir; o consumo nos dita o modelo e a marca.

Precisamos trabalhar; o consumo nos orienta qual a profissão.

Precisamos estudar; o consumo nos impõe o método e a escola. (Ou: nos impõe a escola, que nos impõe o método.)

Precisamos cultuar; o consumo nos informa o estilo de culto e a igreja.

Precisamos ler; o consumo nos apresenta o autor e a editora.

Precisamos nomear nossos filhos; o consumo nos oferece a restrita lista dos nomes bonitos.

Precisamos viajar: o consumo nos dá o roteiro.

Precisamos nos divertir; o consumo nos define o espetáculo.

Precisamos nos recolher, mas o consumo nos garante que ainda precisamos acelerar.

Podemos ir no nosso ritmo, mas o consumo fixa a velocidade, que tentamos seguir, mesmo que além do nosso fôlego. Como nos dizem que todos estão indo, como não iremos para lá também?

Já amealhamos o suficiente, mas o consumo nos amedronta dizendo que é pouco.

Dizemos que as pessoas são o que elas são, mas o consumo nos traz à realidade de que as pessoas são o que elas compram.

Diziam-nos que consumíamos para viver, mas agora nos dizem que vivemos para consumir.

Ouvimos Jesus dizer que não devemos andar ansiosos para fazer aquilo que precisamos fazer, mas o consumo retruca ("garanta já" o que você quer) e ficamos confusos.

 

Contrapontuemos.

Um mentor espiritual acolheu várias pessoas em voluntária busca de equilíbrio, num lugar elevado e insulado numa extasiante montanha verde.

Durante alguns dias, os reunidos oraram, cantaram, ouviram e, especialmente, foram orientados a ficar em silêncio por horas seguidas.

Aprenderam novas maneiras de pensar e amar.

Quando foi se aproximando a hora de descerem para o vale, alguns começaram a lamentar que, daqui a pouco, teriam que voltar ao mundo real.

O mentor os ouviu e proferiu seu último aforisma:

— Não pensem que vocês voltarão para o mundo real. Na verdade, ao saírem daqui, vocês estarão deixando o mundo real. A vida vivida aqui, nestes dias, é que é a vida real. A vida lá embaixo, feita de comparações, competições e consumismos, é que é falsa.

 

Tem razão o mentor?

Vivemos vidas que não deveríamos viver. Estas não são vidas boas. Não deveriam as nossas vidas.

Consumir não pode ser nosso projeto de vida. Precisamos nos desintoxicar da dependência a estes padrões.

Vivamos na certeza que, "à luz das Escrituras, nossa vida é dom de Deus, tesouro incomparável a nós confiado, potencial que devemos cultivar e defender para que produza frutos. Deixar-nos aniquilar, esmagar as aspirações que Deus pôs em nosso coração, calar nossas convicções, renunciar a nossa personalidade, permitir que o outro decida quais são os nossos gostos e imponha sua vontade e seus conceitos significa enterrar nossos talentos como faz o servo da parábola (Mateus 25.14-30). É desobedecer a Deus por medo dos homens". [17]

Para não desobedecer, precisamos vigiar. Só prestando muita atenção, preservaremos nossa vocação livre da poluição cultural de nossa sociedade e seguirmos Jesus de um modo que ele continue sendo Jesus e nós caminhemos na direção que ele quer, moldado pelas Escrituras e pela oração (conforme a sugestão de Peterson [18]).

Somos chamados para esta jornada de santificação, em que nos enchemos menos das coisas e mais de Deus.

 

***

ACORDE

1. Faça um inventário pessoal,perguntando-se seriamente: "Para que eu vivo?". (AUTOCONHECIMENTO)

2. Confesse o seu pecado de ter ido na onda, negando-se a si mesmo, tornando ainda mais conspurcado o quadro original da imagem-semelhança de Deus.(CONFISSÃO)

3. Ore  especificamente, pedindo a Deus para não mais comparar e não mais se comparar. (ORAÇÃO)

4. Medite sobre o que se tornou a sua vida, reconhecendo como a competição e o consumo se tornaram destrutivamente seus padrões, com pouco ou nenhum espaço para o recolhimento, que "nos liberta de nossas reações naturais" e "nos leva a reconhecê-las e a experimentar constantemente, novas manifestações da graça de Deus". [19] (REFLEXÃO)

5. Decida viver de modo livre das opiniões a seu respeito e dos estilos de vida dos outros, mesmo que lhes pareçam perfeitos. (DECISÃO)

6. Empenhe-se para vigiar sempre porque os demônios, quando voltam, retornam ainda mais fortes, como aprendemos com Jesus em Mateus 12.43-45. (ESFORÇO)

 

PARA LER

TOURNIER, Paul. Os fortes e os fracos. São Paulo: ABU, 1999.

YANCEY, Philipe. Rumores de outro mundo. São Paulo: Vida, 2005.

 

ISRAEL BELO DE AZEVEDO

 

 

ENCONTRO 6

CUIDADO! A BÍBLIA ADVERTE: MUITAS VERDADES DIVINAS SÃO MENTIRAS HUMANAS

 

PARA MEDITAR

"Vocês se dedicam a estudar as Escrituras porque acham que vão encontrar ali a vida eterna. Mas vocês olham para a arvore e não veem a floresta! Afinal, as Escrituras falam de mim! E aqui estou, diante de vocês, e vocês não querem receber de mim a vid que afirmam desejar" (João 5.39-40 — A MENSAGEM)

 

PARA PENSAR

“A cura profunda da alma não reside nas relações fracas nem nas fortes, depende de solução real do conflito íntimo existencial e não pode ser encontrada senão no plano espiritual. Foi Deus quem nos deu o instinto de vida, assim como a consciência moral.É por isso que ambos são indestrutíveis. Deus é o único que pode harmoniza-los e o faz quando o homem decide obedecer-lhe”. (PAUL TOURNIER [20])

 

PARA VIGIAR

NÃO direi que a Bíblia diz o que ela não diz.

 

PARA ALCANÇAR

Desejo escrever minha vida a partir das Escrituras, longe da tentação de as escrever.

 

PARA MEMORIZAR

"Afaste-se de histórias tolas que se disfarçam de religião".

(1Timóteo 4.7 — A MENSAGEM)

 

***

 

Só temos uma vida.

E nossa vida é afetada (positiva e negativamente) por vários fatores.

Um deles é a teologia.

Cada um de nós tem uma teologia, que será pior ou melhor conforme lemos a Bíblia e nos relacionamos com o Deus nela revelado.

É através da teologia que o cristão vê Deus e o mundo e com eles se relaciona. Se temos uma teologia errada, temos um deus errado e um mundo errado e uma vida errada. Nosso retrato de Deus, dado pela Bíblia, determina o retrato do mundo, fotografado pela Bíblia.

Nossa teologia advém de várias fontes, como a religião/denominação a que estamos integrados, os princípios apreendidos na família, os valores que povoam o mundo, nossas experiências de vida e os nossos temperamentos.

A pergunta que se levanta é: qual o papel da Bíblia em nossas visões teológicas? Idealmente, ela deveria ser a fonte autorizada de tudo o que pensamos. Na prática, porém, nós a lemos com as lentes que nos deram. Nossas experiências com Deus têm, na prática, mais a ver com as nossas experiências do que com a revelação que nos legou.

 

Nossa história nos forma mais que a própria Bíblia. Deveria ser diferente, mas nem sempre o é. Muitas vezes, cremos e fazemos com que a Bíblia autorize o que cremos. (A Bíblia que se encaixe!)

 

TEOLOGIAS QUE MATAM

Assim, acabamos esposamos conceitos que achamos que são bíblicos, mas que não são.

Nossa preocupação não é desvendar este ou aquele ensino que julgamos herético, mas trazer a tona alguns ensinos enraizados em nossas mentes e que nos afastam de Deus.

 

1. Devemos crer que Deus tem um plano pré-determinado para cada um de nós. Ai de nós se não o cumprirmos.

Um atacante marca um gol que faz seu time vencedor; na entrevista, ele diz que o gol foi da vontade de Deus. Não precisamos tomar cuidado com o uso da expressão?

Muitos pensamos que a vontade de Deus é um plano geral pré-determinado por Deus para cada um de nós. Nossa felicidade depende de conhecer este roteiro pré-fixado e segui-lo a risco. Como escreveu Eugene Peterson, "a expressão 'vontade de Deus' talvez seja um dos termos mais sombrios do vocabulário cristão. (…) Normalmente usamos 'vontade de Deus' como nada mais um clichê desprovido de conteúdo", levando-nos "a um mergulho perplexo num redemoinho de ansiedades". [21]

Ficamos, então, ansiosos se esta (ou aquela) decisão que tomamos (ou estamos para tomar) é da vontade de Deus.

Precisamos compreender que Deus não nos dotou de liberdade e, em seguida, laçou nosso pescoço com um cabresto, para irmos apenas onde nos puxa ou empurra.

Não há um destino (como criam os gregos em seu fatalismo) para cada um de nós.

Precisamos entender que a vontade de Deus brota da sua soberania, mas se realiza num relacionamento conosco que é fraternal e dinâmico por natureza. Esta vontade está delineada em sua Palavra, onde estão lavrados os princípios para uma vida santa, sábia e saudável. Por isto, canta o poeta: "agrada-me fazer a tua vontade, ó Deus meu; dentro do meu coração, está a tua lei" (Salmo 40.8).

Vontade de Deus tem a ver com relacionamento, logo está menos para conhecimento e mais para obediência, Por isto, Jesus mesmo garante: "qualquer que fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe" (Marcos 3.35). O apóstolo Paulo deixa claro que a vontade de Deus é que todos vivemos de modo santo (1Tessalonicenses 4.3), modo que está claramente apresentado na Bíblia.

Não existe, então, vontade de Deus? No sentido de plano obrigatório a ser seguido, não.

No sentido de que há decisões boas e ruins, sim. Neste caso, devemos ler a Bíblia onde está todo o conselho de Deus. Devemos, ao mesmo tempo, orar em busca de orientação e aguardar a sua resposta, que pode vir por alguma maneira sobrenatural mas que geralmente vem através de sinais e placas, como aquelas das ruas e estradas que percorremos, sempre em consonância com a Palavra de Deus já dada e jamais contraditada.

 

2. Precisamos saber que, se orarmos de modo correto, Deus nos atenderá no que pedirmos. A resposta da oração está em nossas mãos.

Outro "terror" que assombra as pessoas de fé é a ansiedade pela maneira "correta" com que deve ser feita a oração.

É como se Deus estivesse numa caverna, esperando que, do lado, de fora digamos o abra-cadabra certo, ou fosse um cofre que tem um segredo cheio de letras que precisamos manejar até encontrar a combinação certa, ou uma máquina que dispensa dinheiro ou refrigerante que espera que apertemos o botão certo que faz cair a bênção, desculpe, o produto, ou um aladim na garrafa a ser libertado com palavras mágicas.

Um deus assim não é senhor, mas escravo, a quem damos ordens. Um dos pregoeiros da chamada oração de confissão positiva ensina: "Tendo recebido a alegria divina em nosso coração, não precisamos mais esperar para que sejamos abençoados, mas somente crer e determinar que a obra seja feita". [22]

Além desta visão sem base bíblica, há outras que nos levam a pensar que há uma maneira correta para o corpo se postar na oração, e parece que Deus prefere aquela feita de joelhos ou com as mãos levantadas.

De igual modo, se termos a nossa oração "em nome de Jesus", ele vai nos atender.

Orar é mergulhar numa atmosfera de mistério. Devemos orar, bater, insistir até e esperar sempre. Deus tem uma vontade (desejo), que se cumprirá. Apresentamos a nossa, mas é a dele, sempre melhor para nós, que acontecerá.

Não existe um modo correto de orar, mas deve haver um coração contrito na oração.

Se não fomos atendidos, não precisamos nos angustiar fazendo perguntas que não têm respostas. Não precisamos subir em montes (não é de lá — onde moravam os deuses pagãos) que vem o socorro. Não precisamos jejuar, para ser ouvidos, embora devamos jejuar, para conhecermos mais de Deus. Não precisamos decorar orações respondidas para sermos atendidos; devamos nos derramar diante dEle conscientes de Sua presença.

O modo correto da oração é, portanto, a espera.

 

3. Precisamos estar convencidos que, se formos justos, Deus nos protegerá. Deus é fiel a quem lhe é fiel.

Fonte de frustração é a ideia que Deus impede que a injustiça prevaleça na vida dos justos. Quando então a doença mais dura alcança um homem ou uma mulher de Deus, ficamos perplexos. Quando um homem ou mulher sem compromisso com Deus se dá bem, entramos em crise.

Como nos lembra Larry Crabb, ensinaram-nos que, se queremos, por exemplo, um bom casamento, devemos conhecer e seguir o modelo bíblico para o casamento; se queremos bons filhos, basta que os ensinemos no caminho em que devem andar. Quando colhemos o que plantamos, confirmamos a lei da semeadura. Quando colhemos espinhos que não plantamos, ficamos confusos, adoecidos, revoltados. Em lugar da linearidade ("A" certamente produz "B"), devemos seguir o princípio da liberdade: "os que vivem esse novo caminho se aproximam como estão. Não se banham antes de chegar a Deus. Vão a Deus para se banharem nele. Não se sentem pressionados a mudar apenas a vida interior ou a exterior, mas desejam mudança em ambas as esferas. Estão interessados em criar a oportunidade para a mudança, mesmo que isto signifique mergulhar sete vezes num rio lamacento ou marchar ao redor do muro de um inimigo durante sete dias e soprar trombetas. Eles vivem o desejo mais sincero de seus corações: conhecer a Deus e satisfazer–se nele. Não vivem para uma vida melhor neste mundo". [23]

Cremos no cuidado de Deus. Cremos e devemos crer. Este cuidado se realiza quando "B" é o produto de "A" e também quando "A" não dá os resultados que imaginamos. A injustiça no mundo (e não apenas com os que creem nele) é um atentado contra a Sua justiça, mas nem assim Ele deixa de ser soberano. Gostaríamos que fosse diferente, mas o sol nasce para todos, a chuva também, como ensinou Jesus (nosso "Pai celeste… faz nascer o seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos" — Mateus 5.45 — ARA)

Deus manifesta sua glória quando nos livra da morte e também quando nos leva para ele. Realiza-se o lindo paradoxo de Mauro Israel Moreira (repetido por Manuel dos Santos Xavier), quando lutava contra o câncer que o levou: "Se Deus me curar, vocês verão a glória de Deus; se Ele não me curar, eu verei a sua gloria".

Também passamos por aflições, com todas as pessoas. Se formos em outra direção, cairemos num outro tipo de autossuficiência:  Deus resolve os nossos problemas sem que precisemos de alguém para nos ajudar. Esta teologianos isola das ciências, sobretudo as da saúde.

Assim, acham alguns que, por cremos em Deus, não devemos procurar um psicólogo ou psiquiatra. "Meu psicólogo é Deus", dizem alguns.

Então, pomos nas costas de Deus o que deveria estar nas nossas, para ser carregado com a ajuda dEle.

Devemos considerar estes perigos no modo como vemos a morte, porque tendemos a recusar a noção de que ela faz parte da vida.

Abro, então, aspas para o cronista Carlos Heitor Cony, de formação católica e agnóstico:

"De certa forma, somos todos terminais desde que nascemos, uns mais, outros menos. (…) Sei que a expectativa de vida vem aumentando, mas volta e meia, como no caso dos terremotos, desabamentos, desastres de carro ou avião, balas perdidas e homicídios em geral, de nada valem as perspectivas modernas que nos garantem uma vida mais longa.

De qualquer forma, a medicina e a tecnologia conjugadas não apenas aumentam as condições de vida como se esforçam para dar dignidade ao ato de morrer". [24]

Diante destas palavras do cronista, um leitor avocou o filósofo alemão Martin Heidegger, que, com furor teutônico, "declara que a morte é constitutiva da existência.(…)

Estamos à morte desde que nascemos, não só quando vamos para a UTI".

Cony cita ainda Agostinho:"A vida não é mortal, a morte é que é vital". [25]

Estou plenamente de acordo.

Lemos o salmista cantar que a morte dos santos é preciosa para Deus (Salmo 116.15), mas achamos a vida mais preciosa que a morte. Ouvimos o apóstolo externar o seu sentimento que, para ele, a morte e a vida têm o mesmo valor (Filipenses 1.21), mas fazemos outra hierarquia: a vida vale mais

Precisamos conformar nossos sentimentos à Palavra de Deus. Não estou dizendo que a morte seja boa. É péssima. Embora péssima, precisamos nos preparar para sua chegada. Precisamos louvar a Deus pela vida. Precisamos louvar a Deus pela morte.

Precisamos desta reconciliação, porque nem a morte nos separa do amor de Deus.

Esta reconciliação não implica em abandonar o prazer de viver ou de descuidar do nosso corpo. Deus nos dá a vida para fruí-la. E uma maneira de fruí-la é cuidar do nosso corpo, através de uma alimentação saudável, da organização do nosso tempo para evitar desperdício e estresse, da prática de exercícios para a mente e para o corpo e um diálogo firme com nossas emoções, pelo poder vital e letal que tem.

 

4. Não podemos esquecer que Deus castiga os que falham. Precisamos ter medo de Deus.

Em nossa infância, Deus nos foi apresentado sempre que erramos diante dos nossos pais. Quando nos deparamos com o Salmo 139, ficamos assustados:

 

"Para onde me ausentarei do teu Espírito?

Para onde fugirei da tua face?

Se subo aos céus, lá estás;

se faço a minha cama no mais profundo abismo, lá estás também;

se tomo as asas da alvorada e me detenho nos confins dos mares" …

(Salmo 139.7-9)

 

Sim, nós nos assustamos se não acompanhamos o fim do raciocínio do poeta:

 

… "ainda lá me haverá de guiar a tua mão,

e [ainda lá]a tua destra me susterá".

(Salmo 139.10)

 

Crescemos mas Deus continua do tamanho dos nossos infundados temores infantis.

Desde então, imaginamos que Deus olhos que tudo vêem, de modo que o nosso pecado não se lhe escapa. Adultos, acabamos percebendo Deus como possuidor de um poderoso radar que busca motoristas em excesso de velocidade, pois Seu prazer é nos multar.

Diferentemente aprendemos sobre outro Deus até mesmo no Antigo Testamento. Quem diz que "os olhos de Deus estão sobre os caminhos do homem e vêem todos os seus passos" (Jó 34.21) não é um Jó confiante, nem um Deus poderoso, mas Eliú, no interior de sua teologia. Praticamente todas as expressões na Bíblia contendo "olhos do Senhor" são para promover a fé saudável, não para impor o medo de Deus. Esdras como que canta quando recorda que "os olhos de Deus estavam sobre os anciãos dos judeus, de maneira que não foram obrigados a parar, até que o assunto chegasse a Dario, e viesse resposta por carta sobre isso" (Esdras 5.5). O salmista descansa por estar sob estes olhos:

 

"Eis que os olhos do Senhor estão sobre os que o temem,

sobre os que esperam na sua misericórdia,

para livrar-lhes a alma da morte

e, no tempo da fome, conservar-lhes a vida".

(Salmo 33.18-19)

 

Apesar disto, podemos desenvolver a ideia de que Deus está mais interessado em nossa santidade do que em nossa felicidade.

Não inventamos esta ideia. Ela pode ter origem nas "boas" intenções dos nossos pais que, para nos "educar" inocularam em nós o medo do castigo de Deus até por coisas com as quais Deus não se importa (como piercing ou jogo de futebol).

Essa ideia pode estar na maneira como lemos o Antigo Testamento. De fato, o antigo testamento é bilateral; o testador (Deus) está desobrigado a cumprir a sua parte se o testado falhar nas condições fixadas previamente. Quando percorremos as páginas do Antigo Testamento, vemos que, apesar da falha de Israel, Deus continuou a amá-lo; o testamento continuou em vigor. Tanto que o novo testamento não anulou o antigo, porque o aperfeiçoou. A aliança era condicional, mas Deus continuou incondicional em sua fidelidade.

A despeito desta clareza, nem sempre presente em leituras isoladas de versículos isolados, o legalismo se tornou uma tentação muito abraçada, e tão massivamente que Jesus passou parte do seu tempo desconstruindo furiosamente o farisaísmo, cujos mestres ensinavam que nós nos tornamos mais aceitáveis para Deus obedecendo os seus mandamentos. Para eles, Jesus, então, desagradava ao Pai ao comer com pecadores (publicanos) e andar com pecadoras (prostitutas).

Para os legalistas (que raramente se assumem como tais [26] ), Deus é totalmente contra os prazeres e absolutamente a favor de regras e obrigações. Para os legalistas, todos os nossos problemas (como as doenças e os desempregos) advêm de nossos pecados.

Os legalistas se deliciam com as passagens que falam do "temor do Senhor" (27, na ARA, e 26, na ARC) ou "temor de Deus" (11, na ARA, e 6, na ARC), que imaginam ser "medo do Senhor". A expressão quer, melhor, dizer levar Deus a sério ou manter comunhão com Deus ou ter Deus no centro da vida. A tradução feita por Eugene Peterson para Provérbios 1.7 capta bem a essência da proposta bíblica: "Tudo começa com o Eterno — ele é a chave de tudo". (A MENSAGEM)

Deus não quer ter amizade (comunhão) com pessoas que tenham medo dele. Na verdade, não há medo entre amigos. Deus quer ter amizade com pessoas que o levem a sério e o amem.

Assim, felicidade e santidade andam juntas. Deus não está mais interessado numa coisa e menos em outra, porque elas não podem ser separada. Não podemos ser santos e infelizes ao mesmo tempo. [27]

Fomos alcançados pela graça, que nos salvou e nos põe no caminho da santificação.

Não fomos salvos pelos nossos meritos, mas pelos de Cristo.

 

5. Devemos nos alegrar com a realidade que, como Deus nos ama, podemos fazer o que quisermos, que isto não afetará o nosso relacionamento com ele. Graça é liberdade plena.

Não é fácil entender a dinâmica da graça. Seu compasso ora é regulado pelo nomianismo (legalismo), que a nega, ora pelo antinomianismo (libertinismo), que também a nega. Em termos do dia a dia de boa parte dos cristãos, cada um deve se guiar por sua consciência, como se ela fosse segura.

A prática já estava no Novo Testamento e levou Judas escrever estas duras palavras:

"Certos indivíduos se introduziram com dissimulação, os quais, desde muito, foram antecipadamente pronunciados para esta condenação, homens ímpios, que transformam em libertinagem a graça de nosso Deus e negam o nosso único Soberano e Senhor, Jesus Cristo (Judas 4 — ARA).

Os legalistas negam o valor da atenção aos mandamentos legados na Bíblia para a salvação e para a vida do cristão. O que importa é a consciência de cada um.

Como resume Sproul, "os antinomianos cultivam aversão pela lei de várias maneiras. Alguns acreditam que não têm obrigação de obedecer às leis morais de Deus porque Jesus os libertou da lei". Outros "insistem em que a graça não só liberta da maldição da lei de Deus, mas também nos liberta da obrigação de obedecê-la". Assim, a graça "se torna uma licença para a desobediência". [28]

Devemos ficar firmes na noção que os princípios do Antigo Testamento estão presentes no Novo, onde lemos claramente: "Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama; e aquele que me ama será amado por meu Pai, e eu também o amarei e me manifestarei a ele. (…)  Se alguém me ama, guardará a minha palavra; e meu Pai o amará, e viremos para ele e faremos nele morada. Quem não me ama não guarda as minhas palavras". (João 14.21,23 e 24 — ARA).

Jesus, portanto, aboliu as leis cerimoniais e os regulamentos, mas, sobretudo, enterrou a ideia de que nossas obras, por mais meritórias que sejam, nos salvam.

"Os mandamentos de Deus devem ser vividos, mas agora, como filhos de Deus, não mais como um peso". Assim, "não somos salvos por obedecer aos mandamentos divinos, mas somos salvos para vivermos segundo os mandamentos divinos. Não somos salvos para viver licenciosamente, mas para viver uma nova vida em Cristo". [29]

Assim, se o legalista acredita que a obediência à lei faz com que sejamos aceitos por Deus, o libertino propõe que os cristãos não precisam regular suas vidas pelos mandamentos, já que os recursos da graça são suficiente para os guiar pela vida. Por isto, acham que, não estando debaixo da lei e estando na posse do perdão divino, podem viver como quiserem, que a salvação está garantida.

De um lado, lembra J.I. Packer, "o legalista exalta de tal modo a lei que chega a excluir a graça" e, de outro, "o antinomiano é fascinado pela graça ao ponto de perder de vista a lei, como uma regra de vida".

O antídoto para o legalismo é a doutrina bíblica da graça gratuita e soberana. Corretamente compreendida, esta doutrina humilhaa soberba dos legalistas, que se acham justos, e "condena a lassidão preguiçosa e irresponsável dos antinomianos". Na verdade, a compreensão da graça "gera uma jubilosa segurança e uma incansável energia no serviço de nosso Salvador". Com certeza, "no Novo Testamento, a doutrina é a graça, a ética é a gratidão". Atentos às palavras de Jesus (Lucas 7.40ss), compreendemos que "a pessoa que mais ama é aquela que é mais consciente do amor por ela demonstrado". [30]

Têm razão os que lembram que “ocristianismo não é um monte de normas sobre o que fazer e o que não fazer. Não é uma lista de regras”. Como aprendemos nas Escrituras, o Cristianismo, em sua essência, "é um relacionamento pessoal com o próprio Cristo. Não obstante, o cristianismo também não é destituído de regras. O Novo Testamento claramente inclui alguns 'faça e não faça'. O cristianismo não é uma religião que sanciona a idéia de que todos têm o direito de fazer o que acharem melhor aos próprios olhos. Ao contrário, ele nunca dá a alguém o 'direito'de fazer o que é errado". [31]

Em outras palavras, "a graça de Deus não nos libera da obrigação de obedecer às leis morais de Deus. A graça não é uma licença para a desobediência, mas a porta que Deus nos abre para a possibilidade de vivermos uma vida santa diante dEle". [32]

Não permitamos que a nossa teologia da graça nos atrapalhe, pelos valores elevados que coloca (alegria e justiça) e pela expectativas altas que gera (santidade e eternidade)

 

6. Precisamos acreditar que Deus quer que sejamos saudáveis e ricos. Devemos reivindicar o que é nosso.

Segundo outra tanato-teologia, Deus nos abençoa necessariamente com coisas, como saúde, dinheiro, emprego, casa e carro. Afinal, o cristão nasceu para ser cabeça e não calda, bastando-lhe apenas tomar posse da bênção.

 

Um dos autores (Benny Hinn) faz um roteiro dos dez passos a serem dados para se ter uma oração respondida: [33]

 

"1. tenha a fé de Deus;

2. diga o que você quer;

3. não limite Deus;

4. recuse duvidar; declare o que você acredita;

5. acredite que o que você pede será dado;

6. acredite que está concedido;

7. seja impositivo;

8. acredite que o que você diz na oração é a vontade de Deus;[34]

9. nunca diga “se” quando Deus o prometeu;

10. tenha um coração e uma vida limpos com Deus e com o homem".

 

Outro pregador da prosperidade, Kenneth Hagin garante que "as doenças e as enfermidades não são da vontade de Deus para o Seu povo". "Não é da vontade de Deus que fiquemos doentes. Nos dias do Antigo Testamento, não era da vontade de Deus que os filhos de Israel ficassem doentes, e estes eram servos de Deus. Hoje, somos filhos de Deus. Se Sua vontade era que nem sequer Seus servos ficassem doentes, não pode ser Sua vontade que Seus filhos fiquem doentes!" Por isto, "nunca diga a ninguém que a enfermidade é a vontade de Deus para nós. Não é! A cura e a saúde são a vontade de Deus para a humanidade". Sua lógica é que "se a enfermidade fosse a vontade de Deus, o céu estaria cheio de enfermidades e doenças".  [35]

A mensagem de alguns púlpitos sugere, ao estilo dos amigos de Jó, que se a vida um cristão não está prosperando, é porque ele está em pecado. De algum modo, sugere-se também, que se alguém está doente é porque não se acertou ainda com Deus. Afinal, doença não vem de Deus, mas do maligno. É infelizmente comum que pais, professoes destas correntes de teologia, retirem seus filhos dos hospitais para serem curados mediante a fé. Por esta razão, há hospitais que proíbem visitas dessas pessoas às alas dos enfermos nos domingos à tarde…

 

A teologia da prosperidade fica clara em algumas declarações do Robson Rodovalho:

 

. "Jesus veio para trazer libertação, salvação aos cativos. Ele veio pregar o Evangelho aos pobres. E para que? Para que os pobres fossem para o céu pobres?"

."Para mim, pregar que o crente deve ser feliz mesmo ganhando salário mínimo, é uma heresia, além de uma agressão ao ser humano".

. "Jesus tinha uma roupa tão bonita, tão cara, que os soldados disputaram para ver quem ficaria com ela. Outra coisa: Jesus era acompanhado por mulheres ricas que o serviam. Ele tinha seus doze discípulos e mais um grupo de 20 a 30 pessoas para alimentar diariamente. Quanto custo isto? (…) Eu não vejo Jesus pobre, mas vejo que ele demonstrava, no seu estilo de vida, excelência, tinha uma vida abençoada". [36]

 

Para nos ajudar no comentário à falácia da teologia pagã da prosperidade, vale a voz de um ex-adepto:

 

"A graça é um favor de Deus para nós. A graça do Senhor soberano sobre tudo e todos nos foi concedida. Imagine só! (…) Durante muito tempo minha vida foi aterrorizada pelo fantasma do merecimento, do legalismo e da autojustificação. Pensava que precisava fazer obras para me justificar diante de Deus e então passar a receber boas coisas da parte dEle. Pensava que os famosos sacrifícios, propósitos, votos, dos mais variados meios e formas, dos mais distintos valores, eram uma espécie de meio de troca dos favores de Deus para com o homem.

Até que um dia (…) pude contemplar a graça de Deus em minha vida. Compreendi que acima de quem sou ou faço o Senhor Excelso cuida de mim, zela por mim, provê em minha vida e me sustém em Sua mão. Confio nEle. Que Ele faça o que quer em mim e por mim. Sigo o exemplo de Cristo: faça Sua vontade Deus, e não a minha. A benção da graça precisa ser capturada pelo coração dos crentes. (…)

Somos mordomos daquilo que Ele nos concedeu e que se Ele quiser proverá coisas boas em nossas vidas, porém nunca nos deixaremos dominar pelo materialismo.Deus não é fantoche de ninguém e não pode ser manipulado por Suas criaturas". [37]

 

7. Precisamos admitir que todos os pecados são iguais.

Ha várias formas de banalizar o pecado, para nele continuarmos.

Uma é dizer que tudo é pecado. Nem tudo é pecado. Para usar os termos paulinos, há coisas lícitas e coisas ilícitas. Não é pecado usufruir os prazeres da vida; pecado é nos viciar em prazeres, que passam a nos dominar. Para usufruir as alegrias da vida, não precisamos pecar. Não pecamos quando exercemos nossa sexualidade no interior do casamento. Não pecamos quando nos alimentamos dos melhores pratos. Não pecamos quando giramos pelo mundo para conhecer lugares aprazíveis.

Outra forma de banalizar o pecado é negar que pecamos. Nem sempre esta negação contém palavras, preferindo gestos, um dos quais é não se importar com o pecado, não permitir que pese o coração diante do erro cometido. "Pecado" tornou-se uma palavra proibida, como se fosse coisa de rançosos e retrógrados.

Outra alternativa usada para negar o pecado é explicá-lo, atribuindo-o aos outros, as circunstâncias, às pressões, etc. Em todos os casos, devemos dar ao pecado o seu nome (pecado) e assumir a responsabilidade por o termos escolhido.

Também banalizamos o pecado quando afirmamos que todos os pecados são iguais. Temos aprendido que diante de Deus não há tamanho de pecados (como pecadinhos, pecados e pecadões). Sugiro que esta teologia mata.

Então sugiro que os pecados podem ser hierarquizados. Na linha superior estão os pecados cujas consequências envolvem destrutivamente mais pessoas, como o homicídio, o abuso sexual e o desvio de dinheiro público. Um tira a vida; outro, a alegria de viver; e outro, as oportunidades (pensamos num hospital público) para uma existência digna para centenas de pessoas.

Na mesma linha superior, estão aqueles pecados expressamente condenados por Deus como lhe sendo especialmente repugnantes, como a idolatria (Oseias 9.10) e a reclamação (Números 11.1).

No parte superior, estão ainda os pecados nos quais recaímos, por uma baixa vontade de não os cometer. Somos chamados, e às vezes, desobedientemente não atendemos, a fazer morrer a nossa natureza terrena, que produz abominações como "prostituição, impureza, paixão lasciva, desejo maligno e a avareza, que é idolatria" (Colossenses 3.5-7).

Atribuir uma hierarquia aos pecados nos ajuda a ficar longe deles.

 

8. A tradição é necessariamente boa.

Pode soar estranha neste elenco de tanato-teologias a inclusão de uma crítica à tradição, sobretudo pelo que ela tem de positiva. E tem.

Como cristãos, é bom saber que somos parte de uma grande nuvem de testemunhas, que começa a cobrir a terra antes mesmo de Jesus Cristo ser revelado como Salvador e Senhor. Graças à tradição, não precisamos reinventar a fé a cada geração.

No entanto, nossa inserção na tradição pode gerar um fechamento ao novo, capaz de refrigerar nossa compreensão da fé e iluminar nosso modo de comunicá-la aos sem-fé.

Além disso, o apego à tradição gera um lamentável tipo de restauracionismo, totalmente alheio à realidade histórica. O tradicionalismo se alimenta de uma miragem do passado, um passado inventado e idilizado. Assim, para sermos cristãos, precisamos resgatar as experiências do passado, esquecidos que o passado é irrepetível, uma vez que os contextos são diferentes e nós mesmos somos diferentes. O passado, real ou imaginado, não pode ser recuperado.

Quem respeita o passado deve respeitar as pessoas que o fizeram, já que o fizeram porque o seu tempo o demandou. Se queremos ser respeitosos para com os do passado, devemos fazer o que o tempo nos demanda fazer.

Devemos, antes, nos perguntar: por que fazemos o que fazemos? Faz sentido fazer o que fazemos?

Imaginemos um belo templo religioso um dia localizado num bairro acessível e populoso. Com o passar do tempo, o referido bairro ficou deserto e perigoso. Que sentido faz manter o templo ali? Não seria melhor mudar a igreja para outro local? A sabedoria pode ser impedida pelo apego à tradição ("nosso templo SEMPRE foi aqui!").

Imaginemos uma igreja numa região praiana. No entanto, na praia as pessoas apinham as praias pela manhã e os membros da igreja estão lá (nos restaurantes e nos hotéis, por exemplo) para os atender. Assim mesmo, a igreja insiste em celebrar cultos pela manhã, porque as igrejas evangélicas em geral celebram seus cultos nas manhãs e nas noites de domingo…

 

O fato de sempre termos feito de um certo modo não é motivo para continuarmos a fazê-lo.

Devemos tomar cuidado para não transformar a tradição em palavra de Deus, porque não passa de palavra de homem, que negligencia o mandamento de Deus (Marcos. 7.8).

Nossas práticas devem ter uma razão e a tradição não deve ser uma delas.

 

9. Precisamos ter consciência que orar é um projeto para o dia todo, pelo que não precisamos de um momento específico.

Quanto à oração, podemos classificar as pessoas em vários tipos.

Há o cristão que não ora.

Há o cristão que ora. Pouco uns. Bastante outros.

Há o cristão para quem a presença de Deus é tão viva que ele ora de modo curto vários momentos do dia.

O cristão que não ora deve orar, verbo que começa com o desejo da oração e se viabiliza na disciplina da oração.

Todos estes tipos precisam saber que precisamos de momentos de solitude com Deus. Jesus fazia assim. Ele tinha plena comunhão com o Pai, mas separava momentos para solitude com Ele. (Eis um relato destas experiências: "Tendo-se levantado alta madrugada, [Jesus] saiu, foi para um lugar deserto e ali orava" — Marcos 1.35).

 A comunhão permanente com Deus não exclui os momentos especiais de oração porque são estes momentos que alimentam a permanente comunhão.

Solitude, um tempo de leitura da Bíblia e meditação nas suas verdades, demanda dedicação, disciplina e método. A dedicação nasce da paixão por orar, a partir de um entendimento do seu superior valor. A disciplina nos ajuda a separar um tempo e um lugar para orar e meditar. Com método, anotamos os pedidos de oração, registramos nossas experiências, organizamos as leituras bíblicas a serem feitas, entre outros cuidados

 

10. Precisamos assumir que a fé não é suficiente para tudo na vida.

Nossa vida é multifacetada, sendo a fé uma destas (poderosas) facetas. Não podemos reduzir a vida apenas à fé. Mesmo que a fé seja (e deve ser) o fundamento da vida, a vida se espalha por outras (muitas) dimensões.

A fé não é suficiente quando nossa saúde é afetada por uma doença ou por um transtorno. A fé nos fortalece para lidar com os frutos de nossa humana fragilidade. A menos que um milagre se faça e ele vem como uma decisão soberana de Deus, precisamos orar e buscar os médicos, precisamos orar e buscar os psicoterapeutas, precisamos orar e nos submeter aos tratamentos indicados, sejam eles cirúrgicos, medicamentosos ou psicoterápicos.

A fé não é suficiente quando, no mundo do trabalho, precisamos oferecer os resultados que a empresa espera. A fé nos capacita a não olharmos o trabalho como sendo maior que a vida, a sermos excelentes em nossa atividade e a, se for o casso, não sermos cúmplices de sistemas que corrompem pessoas e organizações. Em outras palavras, além da fé, precisamos de empenho e competência. Neste ambiente, precisamos ser simples como as pombas e astutos como as serpentes, segundo conselho de Jesus Cristo (Mateus 10.16).

Tomemos um jogador de futebol entrando em campo. Cristão, ele se ajoelha antes de o jogo começar. Sua fé não fará dele um grande goleiro ou um habilidoso artilheiro. Além da fé, ele precisa ter real talento e treinar muito, para elevar seu potencial ao ponto de se tornar um verdadeiro vencedor.

Precisamos de uma teologia que parta da realidade de Deus e considere com seriedade o sonho e o drama do ser humano, para que não sejamos consumidores ingênuos de frases feitas, bem ou mal-intencionadas. (Ouçamos esta frase, repetida por aí: "Se a vida do irmão não prospera, pode crer, é porque o irmão está em pecado. Da mesma forma acontece na enfermidade: se o irmão está doente,é porque precisa se acertar com Deus, porque doença não é coisa e Deus, é do maligno". Escutemos também este testemunho: "Ouvi e acreditei: 'Crê em teus profetas e prosperarás'. Eu mesma já adoeci por profetadas deste tipo e ainda continuomatando um leão por dia por causa disso. Confesso: não tem sido fácil!")

Uma boa teologia considera os seguintes pressupostos, entre outros:

. No princípio, era Deus.

. Deus nos criou à sua imagem-semelhança ("imago Dei"), o que implica que temos algumas de suas virtudes, como: o desejo por termos intimidade uns com os outros, o imperativo para vivermos de modo santo e a vontade de nos assemelharmos com Ele, como visualizado em Jesus Cristo.

. Nossa "imago Dei" foi estilhaçada, de modo que as virtudes da imagem-semelhança ficaram manchadas pelo nosso pecado.

. Deus, para recompor em nós sua imagem-semelhança, se pôs em ação, sendo o envio de Jesus Cristo ao mundo sua maior e mais bela cartada, resultando num projeto, ainda em curso, por meio da igreja, de restauração de toda a humanidade.

 

Com uma boa teologia, podemos desenvolver uma fé madura.

É a fé que nos garante uma vida com Deus depois da história. É pela fé, e tão somente pela fé (no princípio protestante da "sola fide"), que somos alcançados para a salvação por meio de Jesus Cristo.

É a fé que nos orienta para uma vida transbordante agora, enquanto seguimos nossa jornada terrena.

É a fé que nos dá a certeza da companhia de Deus conosco, todos os dias e até o fim.

 

Para nos firmarmos numa fé madura e desenvolvermos uma teologia saudável, precisamos:

(1)  orar e cantar,

(2)  ler e refletir a Bíblia, cuidando para que ela não reproduza a nossa visão da vida, mas que cristifique esta visão, e

(3)  ler boasteologias, aquelas formulada por autores cuja principal fonte de autoridade seja mesmo a Bíblia, entre os quais merecem um lugar diante dos nossos olhos:

 

. "Maravilhosa graça", de Philip Yancey (editora Vida)

. "Transpondo muralhas", de Eugene Peterson (editorial Habacuc)

. "A volta do filho pródigo", de Henri Nouwen (edições Paulinas)

. "Ouça o Espírito, ouça o mundo", de John Stott (ABU editora)

. "Nas profundezas de Deus", de Calvin Miller (editora Vida)

. "Sexo, poder e dinheiro", de Richard Foster (editora Mundo Cristão)

 

 

***

 

Não precisamos espiritualizar tudo, porque tudo é espiritual.

Não precisamos espiritualizar tudo, porque tudo é secular.

 

ISRAEL BELO DE AZEVEDO

 

***

 

PERGUNTAS NUM FORMULÁRIO

 

1. Qual o livro mais interessante que já leu por seu conteúdo teológico?

2. Se pudesse resumir numa só frase, o que melhor define o cristianismo, o que escreveria?

3. Que pensamentos com aparência de verdade mas que são biblicamente falaciosas?

4. Que conselhos "bíblicos" já ouviu e que considera nocivos?

 

 

ENCONTRO 7

CONVITE: COMPROMISSO COM A PROFUNDIDADE

 

PARA MEDITAR

"Minha vida é esperar diante de Deus, meu Senhor.

Espero e vigio até o amanhecer.

Espero até de manhã"

(Salmo 130.6 — A MENSAGEM)

 

PARA PENSAR

"A superficialidade é a praga de nosso tempo. A desesperada necessidade de hoje não é de mais pessoas inteligentes ou bem dotadas, mas de pessoas profundas".

(FOSTER, Richard. A celebração da disciplina. São Paulo: Vida, * )

 

PARA VIGIAR

NÃO cederei à sedução da superficialidade.

 

PARA ALCANÇAR

Se eu tiver que cavar mais fundo, vou cavar mais fundo.

 

PARA MEMORIZAR

"Ó profundidade da riqueza, tanto da sabedoria como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis, os seus caminhos! 34 Quem, pois, conheceu a mente do Senhor? Ou quem foi o seu conselheiro?" (Romanos 11.33-34 — ARA)

 

***

 

"Todos pensam em mudar a humanidade, mas ninguém pensa em mudar a si mesmo"

(Leon Tolstoy)

 

 

Convido-lhe a trilhar comigo o caminho da beleza, para mostrar o prazer de uma vida em profundidade, junto com o poeta do salmo 130, pressuposto que "avida espiritual é o fundamento de tudo na vida. Não se trata de algo que aprendemose estudamos; é para ser vivido". [38]

 

 

1. A PROFUNDIDADE ÉPOSSÍVEL POR CAUSA DO PERDÃO DIVINO (versos 1-4)

Nossa vida cristãpode ser profunda, eis o convite.

 

Das profundezas clamo a ti, Senhor.

Escuta, Senhor, a minha voz; estejam alertas os teus ouvidos às minhas súplicas.

Se observares, Senhor, iniquidades, quem, Senhor, subsistirá?

Contigo, porém, está o perdão, para que te temam.

(versos 1-4)

 

A profundidade advém, não de nossa bondade, mas da percepção de nossa iniqüidade (verso 3) e da experiência do perdão (verso 4). Éo perdão divino que torna possível a profundidade humana, porque o perdão permite o encontro do homem com Deus.

O nome desta experiência é conversão, mas conversão verdadeira, com arrependimento verdadeiro, que tem pouco a ver com "conversões" espirituais, quem sabe produzidas por shows de música e testemunho triunfais, com pouco lugar para o arrependimento verdadeiramente, este sentimento de profundo mal-estar diante do pecado.

Quando pediu ao povo que se santificasse e subisse ao monte para se encontrar com Ele,Deus pôs limites (Êxodo 19.23-25) que não poderiam ser ultrapassados. Podemos pensar nestes limites, no entanto, como sendo móveis. O perdão divino vai enrolando as cordas e abrindo caminho para passarmos, até o próximo limite. Quanto mais Deus nos perdoa, mais nos aproximamos dEle. Quanto mais nos fechamos em nossos pecados, mas nos afastamos dEle. Nós sabemos que é esta a nossa escolha, por mais que fujamos dela.

O Senhor se dá a encontrar a quem afasta o sangue da sua mão (tendo expulso o ódio do seu coração, manifesto em forma de julgamentos raivosos, em palavras ásperas, em desejos de mal; ou em forma de cobiça e manipulação de coisas e pessoas; ou em forma de mentiras suaves ou pesadas). Deus observa as nossas iniquidades e quer observar também as disposições de nossos corações em mudar. Quando permitimos que o Espírito Santo nos convença do nosso pecado, habilitamo-nos a receber o perdão. Énele que a vida recomeça.

Podemos esconder o nosso pecado daqueles que nos cercam. Podemos nos enganar a nós mesmos, afirmando que os nossos padrões são válidos. Enquanto o fizermos, estaremos na superfície, a(pro)fundando-nos mais ainda numa vida que não vale a pena. Nós sabemos que não podemos esconder o nosso pecado de Deus e sabemos que, enquanto (nos) escondemos dEle, podemos até posar de santos, podemos até nos deixar fotografar como entusiasmados adoradores, podemos até fazer parecer que estamos muito bem, mas sabemos  que Deus estáànossa espera, espera que nos arrependamos, clamando das profundezas por Sua graça. Das profundezas do pecado. Do fundo do poço, só se pode sair com clamor e o clamor sóévalidado pelo arrependimento(verso 1).

Será que  precisamos passar pela experiência do sofrimento para clamarmos das profundezas ao nosso Deus? Será que a profundidade é filha do sofrimento?

Bom seria que não esperássemos sofrer para desejarmos um relacionamento de profundidade com o nosso Senhor. Aprendemos que a experiência do sofrimento nos mostra a nossa impotência e nos obriga a clamar das profundezas, indicando-nos a nossa necessidade de uma caminhada em profundidade. Sabemos que uma vida cristãsuperficial é inútil diante da realidade do sofrimento, tome ele a forma que tomar.

No furacão da dor ou na alegria de a ter vencido, a experiência de profundidade significa querer ser ouvido por Deus (verso 2). Isto implica em orar, de forma que vençamos o nível do ritual ou do protocolo ou da obrigação. Oremos para ser ouvidos, até sermos ouvidos. Não desistamos de orar até sermos escutados por Aquele que escuta.

Ao orarmos, estejamos conscientes que Deus vêa nossa iniqüidade (verso 3), mas, antes de nos aniquilar, espera misericordiosamente que peçamos perdão. Diferentemente de nós, paciência é algo natural nele, embora um esforço tremendo em nós, tremendo e, por vezes, frustrado.

Lembremo-nos que perdoar também faz parte do conjunto dos verbos de Deus (verso 4). Em nossa caminhada de profundidade com Ele, coloquemos o verbo "temer" em nosso acervo.

Se queremos uma vida cristãlonge da superficialidade, oremos como o salmista:

 

Eis-me, Senhor, habitante do escuro e sombrio poço do pecado.

E é daqui que eu te peço perdão por meu caminho errado.

Eu sei que os meus passos não são os teus,

como sei que teus olhos condenam os atos meus.

Mas daqui rogo a tua misericórdia, para notar,

esperançoso, as tuas mãos estendidas para me resgatar.

(versos1-4)

 

 

2. A PROFUNDIDADE ÉPOSSÍVEL QUANDO HÁ UMA DISPOSIÇÃO PARA A CAMINHADA COM O SENHOR (versos 5-6a)

A Bíblia deixa bem claro que um relacionamento de profundidade com Deus só se alcança na caminhada. Os verbos do desejo do poeta são claros e crescentes: aguardar, esperar, ansiar.

 

Aguardo o Senhor, a minha alma o aguarda; eu espero na sua palavra.

A minha alma anseia pelo Senhor mais do que os guardas pelo romper da manhã.

(versos 5.6a)

 

O que fazem os vigias de nossos prédios durante a noite? O que esperam as sentinelas nas guaritas militares? Eles aguardam chegar a manhã, para poderem descansar e dormir. Eles não pensam em outra coisa, senão no amanhecer. Quanto mais se aproxima a hora esperada, maior é o palpitar dos corações.

Éassim que devemos desejar a presença de Deus. Como os guardas da noite, devemos esperar em Deus para descansar.

Estamos acostumados apenas a orar, em momentos do dia, quando deveríamos estar desejosos de sentir a sua presença conosco, sim, sentir, porque conosco Ele sempre está, percebamos ou não. Talvez o poeta se referisse ao desejo de estar no templo para adorar, mas, graças ao Espírito Santo, podemos pensar no mundo como o cenário da oração e da adoração. Deus nos acompanha ao trabalho, e sua presença nos ajuda a tomar decisões, fáceis e difíceis. Deus passeia conosco no shopping, e sua presença torna aqueles momentos mais alegres. Deus se assenta conosco na carteira da escola, e sua presença nos faz ver o sentido de expressões e fórmulas. Deus pula conosco no mar, e sua presença nos ajuda a fruir a força da Sua criação. Deus toma banho conosco no banheiro, e sua presença nos põe de joelhos, levanta as nossas mãos ou aprimora as nossas vozes. Deus fica em pé conosco na fila do banco, e sua presença nos suaviza a irritação.

A esta presença Tiago chama de amizade.

 

De onde procedem guerras e contendas que há entre vós?

De onde, senão dos prazeres que militam na vossa carne?

Cobiçais e nada tendes; matais, e invejais, e nada podeis obter;

viveis a lutar e a fazer guerras.

Nada tendes, porque não pedis;

pedis e não recebeis, porque pedis mal, para esbanjardes em vossos prazeres.

Infiéis, não compreendeis que a amizade do mundo é inimiga de Deus? Aquele, pois, que quiser ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus.

(Tiago 4.1-4)

 

Jesus morreu para que nós pudéssemos chamá-Lo de amigo. (Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas chamei-vos amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos dei a conhecer — João 15.15). Paulo nos convida a sermos amigos de Deus, em lugar de sermos traidores, atrevidos, orgulhosos, amigos dos deleites (2Timóteo 3.4). Tiago nos põe como modelo a Abraão, que, por crer, foi chamado amigo de Deus (Tiago 2.23).

 

Se nós e Deus  somos amigos, não seremos escravos dos prazeres de nossa carne, porque experimentaremos os prazeres que Deus pode partilhar conosco. Se nós e Deus somos amigos, não cobiçaremos, não mataremos, não guerrearemos, porque sabemos que isto nada nos traz de realmente bom. Se nós e Deus somos amigos, saberemos pedir, e pediremos bem, sem nos deixarmos dominar por necessidades que não temos.

Temos querido a amizade de Deus ou temos preferido os amigos do mundo, por os acharmos mais palpáveis? Lembremo-nos que, para o guarda da noite, a manhãétão concreta quanto a arma que empunha. De igual modo, a presença de Deus pode ser palpável, viva e dinâmica, desde que nos disponhamos a buscá-la, a aguardá-la, a esperá-la. Uma vida cristãprofunda é possível por um relacionamento de amizade com o Senhor.

 

Eu sei, Senhor, que me levas a andar nos planaltos da vida,

como se o sorriso fosse eterno e o cântico estivesse sempre presente.

Senhor, eu sei que me deixas caminhar também com a alma ferida

pela dor da decepção e pela tristeza do corpo doente.

Mas o que espero, Senhor, não é a derrota distribuída

e nem, admito, sobre todas as coisas a vitória permanente.

O que busco mesmo é a tua presença de tal modo sentida

que diante de Ti vibre o meu corpo e descanse a minha mente.

(versos 5-6a)

 

 

3. A PROFUNDIDADE ÉPOSSÍVEL QUANDO SE TEM UMA VISÃO ADEQUADA DE DEUS (versos 6b-8)

Éa visão de Deus que nos sustenta na caminhada. O poeta bíblico nos ajuda nesta visão.

 

Mais do que os guardas pelo romper da manhã,

espere Israel no Senhor, pois no Senhor há misericórdia;

nele [há] copiosa redenção.

Éele quem redime a Israel de todas as suas iniqüidades.

(versos 6b.-8)

 

1. Deus é Aquele que nos redime.

Precisamos de uma visão de Deus como sendo Aquele onde há misericórdia e redenção. A sua misericórdia faz com que Ele olhe para nós como olha, com disposição para nos dedicar todo o seu afeto. Se não olhasse com misericórdia, nenhum de nós subsistiria (verso 3).

Precisamos de uma visão de Deus como Aquele em quem há misericórdia e copiosa redenção, isto é, redenção completa. O salmista entende redenção como livramento, no caso de todo tipo de mal, porque ele sabe que Deus livra a Israel de todos as maldades que comete (verso 8). Já nos tempos do Antigo Testamento, redenção era entendida também como pagamento de um resgate solicitado (Salmo 49.7-8). O Novo Testamento também usa o termo no sentido de libertação (Lucas 2.38), mas prevalece sua aplicação a Jesus Cristo. Na cruz, Ele nos resgatou, pagando o preço solicitado, seu próprio sangue (Romanos 3.24; Efésios 1.7; Colossenses 1.14; Hebreus 9.12). Com isto, Ele nos comprou da velha vida escrava do pecado para uma nova vida de liberdade na graça.

Este Deus da Bíblia é o Deus de hoje. Ele nos redime de todas as nossas iniqüidades. Só não há perdão divino, onde não há arrependimento humano. Arrependeu-se o homem, perdoou-o Deus. Éde graça.

 

2. Por nos comprar, Deus tem ciúme de nós.

Precisamos de uma visão de um Deus ciumento. Tiago pergunta: "Ou supondes que em vão afirma a Escritura: Écom ciúme que por nós anseia o Espírito, que ele fez habitar em nós?" (Tiago 4.5)

Eis aí uma estranha afirmação, mas está na Bíblia, sem que se trate de uma tradução inadequada. Claramente, eis o que Deus diz: "satisfarei em ti o meu furor, os meus ciúmes se apartarão de ti, aquietar-me-ei e jamais me indignarei" (Ezequiel 16.42).

Em muitas ocasiões em que Deus aparece como zeloso ou como Quem sente zelo em relação ao seu povo, o sentido é o mesmo.

 

"Atenta do céu e olha da tua santa e gloriosa habitação. Onde estão o teu zelo e as tuas obras poderosas? A ternura do teu coração e as tuas misericórdias se detêm para comigo!"

(Isaías 63.15)

 

"Com deuses estranhos o provocaram a zelos; com abominações o irritaram".

(Deuteronômio 32.16)

 

A zelos me provocaram com aquilo que não é Deus; com as suas vaidades me provocaram àira; portanto, eu os provocarei a zelos com os que não são povo; com nação louca os despertarei àira".

(Deuteronômio 32.21)

 

"Ou provocaremos zelos no Senhor? Somos, acaso, mais fortes do que ele?"

(1Coríntios 10.22)

 

Há mais de 100 expressões, todas mostrando o que Deus sente quando nos afastamos dEle para seguir o mundo que Ele criou.

Não estranhemos o uso da palavra ciúme e zelo. Elas são as mesmas, inclusive na língua portuguesa. No latim, ciúme vem de zelúmen.

Assim, nossa caminhada começa a ser significativa quando leva Deus a ter ciúmes de nós. Isto significa que, sem pecar, Deus quer todo o nosso coração. Ele exige exclusividade de amor no plano espiritual. Assim, culto só a Ele. Dependência, só dEle. Graça, só a dEle.

 

3. Em Deus nós podemos esperar.

Precisamos de uma visão de um Deus que redime, que tem ciúme e que, por isto, com Ele a gente pode contar. Se nossa visão de Deus for superficial, nossa religião será superficial também. Uma visão profunda de Deus produz em nós uma religião profunda.

Uma religião profunda é aquela embebida de espera e esperança. Quando cultuamos a Deus, seja na solenidade da igreja, seja na quietude do quarto, seja num assoviar discreto pela calçada, esperamos a Sua presença, escutando e falando. O encontro nos faz arfar. Não importa o conteúdo da sua fala: importa que fale. Não importa o conteúdo de nossa fala: importa que escute. A bênção é a bênção do encontro. O êxtase é o seu toque. Precisamos de um Deus que nos toque com as mãos de Deus, não com as mãos de homens; de um Deus que nos fale, não com o idioma dos homens, mas com os gemidos eternos. Esta é a dimensão da espera. Temos esperado que Deus se apresente assim?

Na dimensão da esperança, aguardamos a manifestação de Deus para resolver nossos problemas, para nos acompanhar em nossos problemas. Profundidade cristãtem a ver com sentir a presença de Deus conosco nas grandes realizações, nos grandes sonhos, fruindo as vitórias, mas também nos grandes fracassos e nas grandes tragédias de nossas vidas, permitindo-nos passar por elas na mesma força de Deus, que pode todas as coisas, inclusive nos fazer passar pelo vale das sombras das tristezas e das perdas. "Quão grandes são, o Senhor, as tuas obras! quão profundos são os teus pensamentos!" (Salmo 98.5), mesmo que não gostemos destas obras e não entendamos estes pensamentos. O Deus que é fiel para o artilheiro cristão é também fiel para o goleiro cristão que vêsuas próprias redes balançarem. Sim, oh profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus! "Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis os seus caminhos!"(Romanos 11.33). A esperança cristãnão é uma roupa nova para a ideologia do sucesso.

 

Este é o Deus que eu quero: um Deus que me redime

das escolhas infelizes que faz quem a Ele não teme,

porque me tomou como Seu por causa do Seu Filho sublime.

Sim, como o guarda da noite, olhos pesados, geme

àespera da guarda do dia, para o descanso que faz firme,

quero o Deus que de mim, este fraco, tenha ciúme.

(versos 130.6b-8)

 

 

***

Precisamos de profundidade, nunca de uma religião superficial capaz de alcançar milhares de quilômetros de extensão (de adeptos, por exemplo) e apenas alguns milímetros de profundidade.

Profundidade cristãnão tem nada a ver com "segunda bênção", mas com a Primeira Bênção da conversão, com arrependimento dos pecados e certeza da salvação. Profundidade cristãnão tem nada a ver com busca de "sinais e maravilhas", porque a regeneração é a Maravilha das Maravilhas, pois significar a conclusão em nós da obra completa do Espírito Santo. Profundidade cristãnão tem nada a ver com ser "ungido" por homensou melhores que liberam ondas de suas mãos, porque quem é verdadeiramente cristão já possui a unção do Espírito Santo e já conhece a verdade salvadora, como nos lembra a Bíblia ("E vós possuís unção que vem do Santo e todos tendes conhecimento" [1João 2.20]) [39]

Profundidade cristãtem a ver com desejar que Deus modele o nosso caráter, para que seja mais altruísta (despojados de nós mesmos) e menos interesseiro no relacionamento com Ele. Profundidade cristãtem com resistir ao mal com o bem, não dando, por exemplo, lugar àira. Profundidade cristãtem a ver com a redescoberta que nascemos e fomos renascidos para adorar a Deus. Quando tiramos da presença de Deus conosco o prazer maior de nossas vidas, estamos no caminho de experimentar as coisas excelentes.

 

***

Em resumo.

 

1

Convites à superficialidade. Onda.

1.1. Nosso tempo é superficial.

1.2. Nosso tempo cultua o ego (inclusive o músculo)

1.3. Nosso tempo adora acumular.

1.4. Nosso tempo ama pecar.

 

Vivemos no meio de um povo superficial

Vivemos em meio ao um povo que tem pressa

 

2

Marcas das superficialidade

2.1. desinteresse pela vida como um dom de Deus, como algo sagrado a ser vivido, como uma chamada

 

2.2. arrogância. O caso do militar norte-americano no Iraque. (Arrogância e superficialidade)

Foco apenas na imanência, sem a presença equilibradora da transcendência

 

2.3. foco na competição a partir da comparação.

Idolatria do sucesso.

Julgamento do outro.

 

2.4. ausência de compromisso. Está difícil, pega outra coisa.

 

2.5. desinteresse pela contemplação

 

3

Marcas da profundidade

A superficialidade nos prepara para os momentos difíceis da vida

Os momentos difíceis da vida nos encaminha à profundidade, se aprendemos com eles.

 

3.1. Rejeita sobre a sua vida o senhorio do pecado.

Não aceita o senhorio do pecado. (Individual, como o palavrão; social, como a pirataria). O pecado lhe entristece (tristeza segundo Deus — . 2Coríntios 7.10: "Porque a tristeza segundo Deus produz arrependimento para a salvação, que a ninguém traz pesar; mas a tristeza do mundo produz morte".

3.2. Tem prazer em adorar (particularmente e coletivamente)

3.3. Tem prazer em servir (aos outros — a religião cristão é social ou não é cristã). Implica em respeito pelo outro.

3.4. Tem prazer em orar.

3.5. Tem prazer em meditar. Leitura e estudo da Bíblia. Prática do silêncio. Leitura de bons livros. Pesquisar.

3.6. Faz planos de natureza espiritual para a sua vida.

A sacralidade da vida.

A graça faz parte da vida.

 

4

Para sermos profundos

4.1. Precisamos desejar a profundidade, sabendo-a uma jornada para a vida toda.

4.2. Precisamos evitar o que nos empurra para a superficialidade.

4.3. Precisamos definir nossas prioridade.

4.4. Precisamos nos por a caminho. – Leitura da Bíblia > Oração ? Meditação > Ação > Leitura da Bíblia

4.5. Precisamos ser mentoreados.

 

***

ACORDE

1. Faça um inventário pessoal,perguntando-se seriamente: "Onde vivo? na superfície ou mais em baixo?". (AUTOCONHECIMENTO)

2. Confesse o seu pecado de ter vivido na superfície, até mesmo evitando o caminho mais excelente, com medo do compromisso e da responsabilidade, alegre com as futilidades.(CONFISSÃO)

3. Ore  especificamente a Deus, pedindo um caminho feito com Ele, mesmo que seja como Abraão subindo ao monte Moriá. (ORAÇÃO)

4. Medite sobre o que se tornou a sua vida, sobretudo o que ela pode ser. (REFLEXÃO)

5. Decida buscar a profundidade, mesmo que na contramão, certo de que junto com Deus a caminha tem delícias perpetuamente (Salmo 16.11) (DECISÃO)

6. Empenhe-se para vigiar sempre, de modo a ter corações ardendo por causa do s sentimento da presença viva de Jesus. (ESFORÇO)

 

ISRAEL BELO DE AZEVEDO

 

 

ENCONTRO 8

AÇÃO: NOSSOS (ÚLTIMOS) DEZ ANOS DE VIDA

 

PARA MEDITAR

"Minha vida é uma oferta no altar de Deus.

É a única corrida que vale a pena disputar.

Tenho corrido com esforço até o fim,

conservando a fé por todo o caminho.

Tudo que existe atrás de mim agora é a ovação — o aplauso de Deus!"

(2Timóteo 4.6-7)

 

PARA PENSAR

"A verdadeira ação cristã — ortopraxia — é gratuita, livre de artifícios, livre de um espírito calculista, livre de contrato: faço isto para Deus e Ele faz isto para mim. A vida ortopráxica  Ee essencialmente espontânea. Com Jesus no coração, amamos por haver alguém necessitado e não para ganhar a aprovação de Deus ou receber os benefícios do ato cristão". (PAUL STEVENS [40])

 

PARA VIGIAR

NÃO permitirei que os ladrões me roubem a vida, o único dom que não posso recuperar.

 

PARA ALCANÇAR

Estabelecerei e realizarei com firmeza as prioridades da minha vida nos próximos dez anos, como se fossem os últimos.

 

PARA MEMORIZAR

"Eu me identifico totalmente com Cristo. De fato, fui crucificado com Ele. Meu ego não ocupa mais o primeiro lugar. Pouco me importa parecer justo ou ter um um conceito entre vocês: não estou tentando impressionar Deus. Agora, Cristo vive em mim. A vida que vivo não é `minha, mas é vivida pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim. E eu não volto mais atrás" (Gálatas 2.19-21 — A MENSAGEM)

 

***

 

"Assuma o comando, porque estou para morrer.

Minha vida é uma oferta no altar de Deus.

É a única corrida que vale a pena disputar.

Tenho corrido com esforço até o fim,

conservando a fé por todo o caminho.

Tudo que existe atrás de mim agora é a ovação — o aplauso de Deus!

Submeta-se a isso, pois Ele é um juiz honesto.

Ele vai fazer o que é certo não apenas para mim,

mas para todos os estão ansiosos por sua vinda".

(2Timóteo 4.6-8a — A MENSAGEM)

 

Soa-lhe macabro ler a declaração abaixo, de um mestre para seu discípulo?

 

Ela foi escrita, por volta do ano 64 d.C., por um cristão pioneiro de nome Paulo (anteriormente Saulo) de Tarso, enquanto aguardava (em Roma, cidade que muita desejara visitar…) seu julgamento numa prisão, na verdade, "um calabouço subterrâneo com um buraco no teto para a passagem de luz e de ar". [41] Ele morreria meses depois, condenado pelo "crime" de ser um seguidor de Jesus Cristo.

Paulo sabia aquilo que nós também sabemos: iremos morrer. E ele trata a morte como deve ser tratada: com maturidade. Quanto mais clara é a nossa percepção da fugacidade da vida (mesmo que vazada naqueles termos dramáticos de Eclesiastes), mais estamos colhendo os frutos da maturidade.

Por que nos recusamos a pensar na ideia de que morreremos e o comando da nossa família ou das nossas coisas (se guardamos algumas) ou das nossas idéias (se escrevemos algumas) ou dos nossos ministérios (no caso dos pastores de cajados longos) será passado a outro?

Deus não permite que saibamos quanto tempo viveremos (a exceção foi o rei Ezequials, no século 7 a.C., que soube de antemão que duraria mais 15 anos), mas nos faz saber (e nem precisaria!) que morreremos.

Por que não pomos os nossos olhos no que é presente e no que é futuro, se cremos, cristãos sendo, que, encerrada esta jornada terrena, já está inscrito na outra, totalmente eterna?

Se ignorarmos que passa rápido a vida, ela não só passará rápido, como é de sua natureza, como pouco realizaremos no seu período, curto período.

Uma boa maneira de viver bem a vida, considerada a realidade do seu fim, vale dizer, a morte, é organizá-la em projetos de até dez anos.

Pensar assim é imaginar que, a cada dez anos, o prazo de validade de nossa vida é renovado. Pensar assim é saber quedez anos passarão rápido. Pensar assim é, ao final do período, olhar para trás e dizerque valeu a pena.

Conquanto tenhamos toda uma vida, devemos dividi-la imaginariamente em período de dez anos.

 

Aceita a sugestão, o que fazer?

 

AÇÕES ANTES DA JORNADA

Algumas ações antes da jornada (e já são a jornada) devem estar no nosso horizonte.

 

1. Faça uma revisão de sua trajetória de vida até aqui.

Olhe para o seu corpo e veja como está a sua saúde.

Olhe para a sua família (a menos que seja sozinho) e veja se ela poderia ser mais do que é: em que você a tornou e em que você se tornou nela.

Olhe para os seus projetos e veja como está a conta corrente, marcando nas devidas colunas as realizações e as frustrações.

Olhe para o seu progresso no campo espiritual e veja se realmente cresceu.

Olhe para a sua vida educacional e veja se foi até onde poderia ter ido.

Enfim, avalie como vive hoje cada dia, pesando o tempo e a energia dedicados ao sono, ao lazer, ao trabalho e ao seu projeto de vida. Talvez descubra hábitos bem desagradáveis. A evitar.

 

2. Dê graças a Deus pelos anos até agora vividos.

Foram presentes dele para você, mesmo que os tenha embrulhado com reclamação, esta soberba forma de não agradecer.

 

3. Asseste a posição de suas velas.

Prepare-se para começar. Para tanto:

 

. Acerte as contas que tem que acertar: com seu passado, com seus credores. Se não puder se livrar do fardo do passado, dialogue com ele para não lhe virar um fantasma; se não puder se livrar das dívidas, renegocie-as num modo que passa honrar os novos compromissos. Lembre-se: daqui a dez anos você morreu. Depois disto, não poderá fazer mais nada.

 

. Relacione-se bem com as suas emoções. Embora você seja as suas emoções, pense-as como algo que você não pode controlar, mas elas não lhe devem controlar. Veja suas limitações, sabendo do preço a pagar se as enfrentar sem as devidas provisões.

 

. Já que vai viajar, aprenda o idioma do Espírito Santo. Esta aprendizagem é como estar em outro país. A primeira língua que vem é a materna. Quando isto acontece, o falante do idioma como segunda língua precisa parar (descansar, se for o caso) e reprogramar seu cérebro para falar o novo idioma, o idioma dos guiados pelo Espírito Santo, aqueles cujos capítulos nos enchem a mente e o coração com coisas verdadeiras, nobres, respeitáveis, autênticas, úteis e graciosas, isto é, com o melhor, não com o pior, com o que é bonito não com o que é feio, com palavras que abençoam não que amaldiçoam (Filipenses 4.8-9). O idioma do Espírito Santo tem como seus vocábulos palavras como: afeto pelos outros, celebração da vida, serenidade, senso profundo de compaixão, bondade, perseverança, sacralidade da criação e das pessoas e autocontrole (Gálatas 5.22-23).

 

. Faça um balanço pessoal da sua saúde, pensado como "um estado de razoável harmonia entre o sujeito e a sua própria realidade". [42] Veja como estão sua aptidão física (decorrente de exercícios regulares e alimentação saudável), sua competência relacional (gestada na prática dos encontros), seu vigor intelectual (desenvolvido com estudo e reflexão) e sua força espiritual (vinda com dependência de Deus e meditação).

Como um alpinista, verifique os equipamentos. Como um motorista, verifique as condições do motor do veículo. Como um pesquisador, verifique suas fontes. Como um pregador, verifique seus joelhos.

 

. Dê "adeus" ao imediatismo.

 

. Mantenha o foco no prazer da missão.

 

4. Ponha seu ego em segundo lugar.

Nada melhor para baixar a bola do seu ego do que se lembrar da sua finitude.

O ideal é que seu ego vivesse na parte inferior da pirâmide, mas não se deve esperar muito da gente mesma…

 

5. Pare de viver para agradar aos outros.

O que lhe interessa é o que você realizou, não o que os outros realizaram.

Receba a opinião do outro a seu respeito como o que ela é: opinião. Aquela que lhe fizer sentido, guarde-a, para superá-la. Aquela que não for precisa, ignore-a, para não se tornar uma pessoa igualmente crítica.

Pare de impor uma imagem a seu respeito, que você sabe que não corresponda ao que você é, embora talvez corresponda ao que você deseja.

Ouvi, certa vez, de um amigo: "Durante toda a minha vida, eu projetei uma imagem. Agora, tenho vergonha, porque não sou nada disto que pensam a meu respeito. Nunca fui".

 

6. Pare de gritar.

Melhor: pare de achar que você vence no grito. Melhor ainda: pare de achar que o que você tem você o obteve no grito, sob a forma de palavrões, xingamentos, empurrões, socos e caneladas.

Saiba que “épreciso mais força para confessar a própria fraqueza do que para oculta-la como ruidosas manifestações de força”. [43]

 

7. Peça a Deus só o que você precisa para os próximos dez anos.

Peça saúde (como Ezequias), sabedoria (como Salomão [44]) e santidade (como Paulo).

Pare de ser um pedinte profissional, para se tornar um pedinte amador.

Peça menos a Deus. Exalte-o mais. Sirva-o mais.

Esteja sempre, como um adesivo diante de você, atento à recomendação bíblica:

 

"Honre e alegre-se no seu Criador enquanto você ainda é jovem.

Antes que os anos mandem a cobrança e o seu vigor se vá".

(Eclesiastes 12.1 — A MENSAGEM)

 

Ore assim:

 

"Senhor, Quero ser um santo.

Quero ser um sábio.

Quero ser saudável".

 

UM PROJETO PARA UMA JORNADA

Uma jornada é o que ela é: começa com o desejo (o imperativo do coração).

 

1. Faça um projeto para os próximos dez anos de vida.

São os seguintes os itens de um projeto de vida, entre outros:

> prioridades claras a ser alcançadas, começando pela mais importante; [45]

> alvos (ou metas) a serem buscados, que sejam mensuráveis; [46]

> recursos (humanos e financeiros) que serão movimentados para a realização do projeto

> cronograma de atividades (com indicações das datas de suas etapas, sobretudo o final, que deve orientar todas as fases).

 

2. Conceba seu projeto, com ênfase nas prioridades.

Não devem ser muitas as prioridades. Dez anos passam logo: não dá para fazer neles todas as coisas ainda não realizadas até então: só algumas.

Saiba onde você quer chegar. Não se vai a muitos lugares ao mesmo tempo.

 

3. Enumere as suas prioridades, começando pelo que é mais importante.

 

4. Transforme as prioridades (por exemplo: "escrever um livro") em alvos bem definidos (como: escrever um livro sobre TAL assunto, terminando-o até a data X").

 

5. Escreva seu projeto, parte por parte.

Escrever um projeto torna-se o objetivo. Se diretivo, objetivo. Se objetivo, verifcável.

 

6. Compartilhe seu projeto.

Se tiver parentes, conte-lhes. Se tiver amigos, compartilhe com eles. Se seu texto com as prioridades não lhe cobrar, os outros farão isto.

Com isto, você terá parceiros.

 

7. Consagre suas prioridade a Deus. Sim: só valem a pena as prioridades que possamos consagrar a Deus.

 

O PROJETO EM AÇÃO

Uma jornada é o que ela é: começa com o desejo (o imperativo do coração) e depois se faz com os outros membros do corpo.

 

1. Desenvolva o projeto

Tire o projeto do protegido plano das idéias (mesmo que escritas) para o por no perigoso território da prática. Viver é perigoso, como brincava Guimarães Rosa. Assim mesmo, pare de brincar de fazer projetos, como aqueles de final de ano.

 

2. Comece a dar corpo ao projeto.

Varra onde tiver que varrer. Corte onde tem de cortar.

Se o projeto o que que queremos e onde queremos chegar, por-se a caminho é ter claro o que faremos para chegar.

 

3. Organize seu tempo.

O tempo é neblina.

Para tornar o tempo um aliado e não um adversário, considere estas ações:

 

. Saiba o óbvio: o tempo é fixo: um dia só tem 24 horas.

Escute o conselho de Olavo Bilac:

 

"Sou o Tempo que passa, que passa,

Sem princípio, sem fim, sem medida!

Vou levando a Ventura e a Desgraça,

Vou levando as vaidades da Vida!

A correr, de segundo em segundo,

Vou formando os minutos que correm…

Formo as horas que passam no mundo,

Formo os anos que nascem e morrem.

Ninguém pode evitar os meus danos…

Vou correndo sereno e constante:

Desse modo, de cem em cem anos,

Formo um século, e passo adiante.

Trabalhai, porque a vida é pequena,

E não há para o Tempo demoras!

Não gasteis os minutos sem pena!

Não façais pouco caso das horas!"

 

. Esmurre o seu corpo.

Bata na sua desorganização. Não proteja sua preguiça. Talvez tenha que dormir menos. Você só tem dez anos de vida.

 

. Saiba que nem sempre se recupera o tempo que se perdeu.

Em certo sentido, nunca se recupera. Imagine o que poderia ter feito, se tivesse feito. O que fizer agora, podendo ter feito antes, tirará algo a ser feito depois.

 

. Saiba que você pode fazer mais e melhor no tempo que tem.

Pare de reclamar do tempo que tem. Você tem o tempo que você tem. Discipline-se para não perder tempo, para não fazer de novo o que deixou pela metade.

 

. Cruze a sua agenda com as suas prioridades.

O gabarito tem que "bater". Se não bater, você está enganando a si mesmo. Se eu digo, por exemplo, que minha prioridade é passar num concurso, mas a minha agenda não lhe dedica TODO o tempo tempo possível, a minha prioridade NÃO é passar no concurso.

 

. Identifique os ladrões do tempo em seu período. (Pode ser: o tempo gasto vendo televisão, falando ao telefone, jogando conversa fora, dormindo, não fazendo nada. Todas coisas importantes, desde que não nos controlem…) Por isto, se for desorganizado, faça um calendário diário de atividades e procure ser fiel.

 

. Alargue o seu tempo, diminuindo o desperdício e multiplicando suas realizações.

Tomemos o exemplo da leitura. Como ler mais e bem no mesmo tempo?

Primeiro: faça uma preleitura do livro.

Segundo: dadas as circunstâncias do livro, crie as condições (escolhendo o horário e o local ideais, bem como os recursos necessários, se for o caso, como dicionários e outros materiais) para que a leitura seja eficaz e prazerosa.

Terceiro: leia o livro, dividindo o tempo da atividade bibliófila em blocos, para não cansar, para aumentar o desejo, para registrar melhor o percurso.

Divida o dia em períodos. Divida cada período em subperíodos.

Coloque dentro de cada subperíodo o que pode e precisa fazer.

 

4. Celebre cada vitória.

Celebre cada dia (cada mês, cada ano, cada biênio, cada quinquênio) como um dom de Deus.

Celebre cada realização com um presente de Deus.

 

5. Revise seu projeto.

Melhor: compare o projeto com as realizações. Prepare autoavaliações que se pretendam honestas. Tenha a coragem de concordar que parte de nossas frustrações foi produzida por nós, com mínima participação de outras pessoas.

 

Faltou-nos um projeto claro.

Faltou-nos administrar um projeto.

Faltou-nos organizar nosso tempo.

Faltou-nos persistir no projeto.

Faltou-nos conhecer melhor nossas limitações e nossas potencialidades.

 

6. Não seja excessivamente duro com você, nem inconvenientemente permissivo com você mesmo.

Compreenda bem a leitura da semeadura:

 

"aquilo que o homem semear, isso também ceifará".

(Gálatas 6.7 — VBRAS)

 

ou

"aquele que semeia pouco também colherá pouco; e aquele que semeia em abundância também colherá em abundância.

(2 Coríntios 9:6 – VBRAS)

 

Seja cauteloso com a lei da semeadura. Ela é verdadeira, mas pode falhar.

Mas não a ignore. Ela é verdadeira e pode funcionar.

Nem tudo é mérito.

Creia a lei da semeadura, mas não seja legalista, cuja história desnuda o seu fracasso e nos revela o poder da graça.

 

7.  Não pare no tempo.

 

***

O que virá depois ao final dos dez anos de vida?

Mais dez anos, com um novo projeto.

É assim que você não trairá seus desejos.

Escreva, com Paulo:

 

 

"Minha vida é uma oferta no altar de Deus.

É a única corrida que vale a pena disputar.

Tenho corrido com esforço até o fim,

conservando a fé por todo o caminho.

Tudo que existe atrás de mim agora é a ovação — o aplauso de Deus!

(2Timóteo 4.6-7 — A MENSAGEM)

 

 

***

ACORDE

1. Faça um inventário pessoal,perguntando-se corajosamente: "Como tem levado minha vida: deixando-a me levar ou tomando o seu controle, sob a dependência de Deus?". (AUTOCONHECIMENTO)

2. Confesse o seu pecado de ter vivido a esmo, como se as vida não fosse um dom de Deus para ser desejado, exercido responsavelmente e vivido, com a ajuda dele e dos meus irmãos.(CONFISSÃO)

3. Ore  especificamente a Deus, pedindo-lhe recursos para viver de modo santo, saudável e sábio. (ORAÇÃO)

4. Medite sobre o que se tornou a sua vida, com foco no que ela pode ser. (REFLEXÃO)

5. Decida projetar seus próximos dez anos de vida, como um exercício que lhe permita realizar os desejos aprovados por Deus. (DECISÃO)

6. Empenhe-se para vigiar sempre, para não desistir de vivem bem na abundância da graça que custou a morte de Jesus. (ESFORÇO)

 

ISRAEL BELO DE AZEVEDO

 


[1] LEMAN, Kevin. O que as lembranças de infância revelam sobre você. São Paulo: Mundo Cristão, 2011, p. 16.

[2] LEMAN, Kevin, op. cit., 2011, p. 15.

[3] LEMAN, Kevin, op. cit., p. 23.

[4] PETERSON, Eugene H. Memórias de um pastor. São Pauo: Mundo Cristão, 2011, p. 48.

[5] LEMAN, Kevin, op. cit., p. 266.

[6] O que é bem diferente da seguinte orientação: "Abrir-se para outras pessoas, parar de mentir sobre sua solidão e seus medos, ser honesto a respeito de seus afetos e dizer aos outros quanto são importantes para você — esta receptividade é o triunfo da criança sobre o fariseu e um sinal da presença ativa do Espírito Santo". MANNING, Brennan. O impostor que vive em mim. São Paulo: Mundo Cristão, 2006, p. 105.

[7] PECK, M. Scott. O povo da mentira. Rio de Janeiro: Imago, 1992, p. 248.

[8] EAGAN, John. Citado por MANNING, Brennan, op. cit., p. 72.

[9] LEHMAN, Kevin, op. cit., p. 190 e 182, respectivamente.

[10] NOUWEN, Henri. Citado por MANNING, Brennan, op. cit., p. 26.

[11] LEMAN, Kevin, op. cit., p. 16.

[12] LEMAN, Kevin, op. cit., p. 68.

[13] PETERSON, Eugene. Memórias de um pastor. São Paulo: Mundo Cristão, 2011, p. 17.

[14] GOETHE, W. Máximas e reflexões. Citado em O Citador. Disponível em <http://www.citador.pt/textos/a-falacia-da-comparacao-johann-wolfgang-von-goethe>

[15] MENEZES, Celia. Agressividade – Aprendendo a Entender. Disponível em <http://www.viaseg.com.br/artigo/127-agressividade__aprendendo_a_entender.html>

[16] TOURNIER, Paul. Os fortes e os fracos. São Paulo: ABU, 1999, p. 199.

[17] TOURNIER, Paul, op. cit., p. 199.

[18] PETERSON, Eugene, loc. cit.

[19] TOURNIER, Paul, op. cit., p. 162.

[20] TOURNIER, Paul. Os fortes e os fracos. São Paulo: ABU, 1999, p. 35.

[21] PETERSON, Eugene H. A linguagem de Deus. São Paulo: Mundo Cristão, 2011, p. 195.

[22] SOARES, R.R. Quando a oração não funciona. Disponível em <http://iigdcascavel.com/quando-a-oracao-nao-funciona/>

[23] CRABB, Larry. Chega de regras. São Paulo: Mundo Cristão, 2003, p. 21.

[24] CONY, Carlos Heitor. O homem terminal. Folha de S. Paulo, 4.11.2011, p. E16.

[25] CONY, Carlos Heitor. Demasiadamente humano. Folha de S. Paulo, 8.11.2011, p. A2.

[26] Há um grupo adventista na Espanha francamente nomianista. Chama-se "movimento nomianista" e tem como alvo pregar "a mensagem adventista original NÃO trinitária pela fé de Jesus". Eles exaltam a lei de Deus e declaram que "pregam que não somente a lei está em vigor como o homem convertido pode guardá-la perfeitamente". Dizem mais: "Vemos Jesus como nosso Salvador por um lado e como nosso exemplo por outro. Como nosso Salvador, sofreu o castigo do pecador a fim de que este pudesse ser perdoado. Desta maneira, ganhou o poder para o pecador que o habilita para guardar a lei. Somos participantes deste poder através da justificação pela fé. (…) Como nosso exemplo, Jesus demonstrou que o homem caído pode guardar perfeitamente a lei de Deus através da graça". Cf. Adventistas del Único Dios verdadero, Heraldo del Sábado y de la Fe de Jesús. Disponível em <http://ministerio-nomianista.blogspot.com/2007/12/definicin-del-movimiento-nomianista.html>

[27] HUNT, Josh. Good preach and bad theology. Disponível em <http://www.joshhunt.com/mail380.htm>

[28] SPROUL, R.C. Antinomianismo. Disponível em <http://monergismo.com/?p=1225>

[29] DANIEL, Silas. A praga do antinomianismo. Disponível em <http://cpadnews.com.br/blog/silasdaniel/?POST_1_7_A+PRAGA+DO+ANTINOMIANISMO.html>

[30] PACKER, J.I. A Graça e a Lei. Disponível em <http://www.monergismo.com/textos/lei_evangelho/graca_lei_packer.htm>

[31] SPROUL, R.C. Antinomianismo. Disponível em <http://monergismo.com/?p=1225>

[32] SPROUL, R.C. Antinomianismo. Disponível em <http://monergismo.com/?p=1225>

[33] HINN, Benny. Rise and be healed. Citado por SILVEIRA, Marcelo. O Discurso da Teologia da Prosperidade em Igrejas Evangélicas Pentecostais: Estudo da Retórica e da Argumentação no culto religioso.São Paulo: 2007, p. 31. (Tese de Doutorado — USP)

[34] HINN explicita sua visão: "Nunca jamais, em tempo algum vão ao Senhor e digam: “Se for da tua vontade…” Não permitam que essas palavras destruidoras da fé saiam da boca de vocês. Quando vocês oram “se for da tua vontade, Senhor” a fé é destruída. A dúvida espumará e inundará todo o seu ser. Resguardem-se de palavras como essas, que lhes roubarão a fé e os puxarão para baixo, ao desespero". — HINN, Benny. The joy of answered prayer. Citado por SILVEIRA, Marcelo, Op. cit., p. 31.

[35] HAGIN, Kenneth. Redimidos da misérias, da enfermidade e da morte. SILVEIRA, Marcelo, op. cit., p. 32.

[36]RODOVALHO, Robson. "Deus não criou o ser humano para a pobreza". Entrevista a Enfoque, edição 109, 2005, p. 26.

[37] WERONKA, João R. Teologia da Prosperidade. Disponível em <http://www.internautascristaos.com.br/artigos-teologicos/teologia-da-prosperidade>

[38] MERTON, Thomas. Thoughts in Solitude. *

[39] Cf. MORRISON, Alan. De Profundis. The Scourge of Superficiality — and its Remedy. Disponível emhttp://www.prophecyfellowship.org/showthread.php?t=105182.

[40] STEVENS, R. Paul. Os outros seis dias. Viçosa: Ultimato, 2005, p. 208.

[41] HENDRIKSEN, W. Citado por STOTT, John. Tu, porém; a mensagem de 2Timóteo. São Paulo: ABU, 1982, p. 5.

[42] SEGRE, Marco, FERRAZ, Flávio Carvalho. O conceito de saúde. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0034-89101997000600016&script=sci_arttext>

[43] TOURNIER, Paul. Os fracos e os fortes. São Paulo: ABU, 2012, p. 254.

[44] Lemos as crônicas dos reis de Israel, notamos que faltou a Salomão pedir duas outras coisas essenciais: santidade e saúde. Ele pediu certo: "Se não for assim, como é que eu poderei governar este teu grande povo?". Mas lhe faltou pedir as duas outras.

[45] Exemplo: "Minhas prioridades de 2012 a 2022 são: tornar-me de fato guiado pelo Espírito Santo em todas áreas da minha vida; ser uma pessoa de oração; ter sempre no foco a missão recebida".

[46] Exemplo: "Entre 2012 e 2022, começarei e terminarei um curso superior (ou mestrado ou doutorado); em 2014, farei uma viagem ao Oriente Médio, incluindo Israel; assistirei presencialmente aos principais jogos da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016; tirarei férias no período da Copa e da Olimpíadas para fugir ao caos na cidade"