Manifesto da Igreja Presbiteriana do Brasil sobre o acordo firmado entre a República Federativa do Brasil e a Santa Sé

A IGREJA PRESBITERIANA DO BRASIL, representada pelo Presidente do seu
Supremo Concílio, diante do momento atual, em que forças organizadas
da sociedade manifestam sua preocupação pela aprovação do texto do
Acordo que vem labutar contra a laicidade do Estado Brasileiro e
cercear a liberdade religiosa através de manifesta preferência e
concessão à Igreja Católica Apostólica Romana de privilégios por parte
do Estado Brasileiro, em face dos termos do Acordo entre a República
Federativa do Brasil e a Santa Sé, firmado no dia 13 de novembro de
2008, vem a público, considerando que:

I. – O Vaticano, embora um Estado Soberano e Pessoa Jurídica de
Direito Público Internacional, é a sede política e administrativa da
religião Católica Apostólica Romana e, portanto, um Estado Teocrático.
Todo acordo entre Ele e o Brasil que contemple matéria envolvendo
assuntos referentes à dimensão da fé e não a assuntos temporais agride
o princípio da separação entre Estado e Igreja, que é uma conquista
obtida pela nação brasileira e se constitui na base da nossa
República;

II. – Para Igreja Católica Apostólica Romana, as demais religiões e
seus ritos próprios são apenas “elementos de religiosidade”
preparatórios ao cristianismo verdadeiro, do qual ela é exclusiva
detentora: “Com efeito, algumas orações e ritos das outras religiões
podem assumir um papel de preparação ao Evangelho, enquanto ocasiões
ou pedagogias que estimulam os corações dos homens a se abrirem à ação
de Deus. Não se lhes pode, porém atribuir à origem divina nem a
eficácia salvífica ex opere operato, própria dos sacramentos cristãos.
(DECLARAÇÃO “DOMINUS IESUS” SOBRE A UNICIDADE E A UNIVERSALIDADE
SALVÍFICA DE JESUS CRISTO E DA IGREJA);

III. – A identidade jurídica peculiar do Vaticano, a apresentar-se ora
como Estado, ora como Religião, facilita a tentativa de ingerência e
pode confundir administradores sobre os limites das concessões, quando
tratam de assuntos que transcendem aqueles meramente administrativos e
temporais. E, por ser o Vaticano um Estado, não pode impor ao Estado
Brasileiro a aceitação de sua religião e da Igreja que representa para
a obtenção de privilégios e vantagens diferenciadas;

IV. – É inegável que tal Acordo é flagrantemente inconstitucional,
pois fere a Constituição da República, que destaca em seu artigo 19:
“É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-las,
embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus
representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na
forma da lei, a colaboração de interesse público; (..); III – criar
distinções entre brasileiros ou preferências entre si”. Ora, o Estado
do Vaticano é o REPRESENTANTE da Igreja Católica Apostólica Romana. O
ACORDO, portanto, é INCONSTITUCIONAL e não pode prosperar num Estado
Democrático de Direito, pois fere a cláusula pétrea da Constituição da
República no caput do Artigo 5º, ou seja, o princípio Constitucional
da ISONOMIA;

V. – Que o referido Acordo Internacional nos artigos 7º, 10º e,
principalmente, 14º, impõe DEVERES ao Estado Brasileiro para com a
Igreja Católica Apostólica Romana nos planejamentos urbanos a serem
estabelecidos no respectivo PLANO DIRETOR, que deverá ter espaços
destinados a fins religiosos de ação da Igreja Católica Apostólica
Romana, contemplando a referida Igreja com destinação de patrimônio
imobiliário;

VI. – O termo católico após a expressão “ensino religioso”, contido no
Acordo, afronta a previsão do § 1º do artigo 210 da Constituição da
República, que preceitua: “O ensino religioso, de matrícula
facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas
públicas de ensino fundamental”. O Acordo com a Santa Sé consignou no
§ 1º do artigo 11 que: “O ensino religioso, católico e de outras
confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina
dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental…”.
Trata-se de evidente discriminação religiosa;

VII. – a aprovação pelo Congresso Nacional do referido Acordo conferiu
privilégios históricos à Igreja Católica Apostólica Romana em nosso
País reconhecendo-os como direitos, constituindo norma legal, uma vez
que acordos internacionais, conforme a Constituição de 1988, têm força
de lei para todos os fins. Aquilo que a história legou, a cultura vem
transformando e o Direito não pode aceitar por consolidar dissídio na
sociedade brasileira, que tem convivido de forma tolerante com o
legado, mas não o admitirá como imposição contrária ao direito à
liberdade de consciência, de crença e de culto, amparado pela Carta
Magna e pelo Direito Internacional;

VIII. – De igual forma, o Projeto de Lei n.º 5.598/2009 e o PLS
160/2009 denominado “Lei Geral das Religiões”, já aprovado pela Câmara
Federal e pelo Senado, mero espelho do Acordo, incorre nos mesmos
equívocos de inconstitucionalidade e desprezo à laicidade do Estado
Brasileiro, estendendo as pretensões da Igreja Católica Apostólica
Romana a todos os demais credos religiosos. O nivelamento no
tratamento pelo Estado às religiões não pode ser amparado por
fundamentos manifestamente inconstitucionais que agridem a soberania
do Brasil e retrocede-nos ao indesejável modelo do “padroado” no
Império.

Ante o exposto, em consonância com a Palavra de Deus, sua única regra
de fé e prática, e com a sua doutrina, a IGREJA PRESBITERIANA DO
BRASIL manifesta-se contra a aprovação do Congresso Nacional do
referido Acordo Internacional ou de qualquer norma legal que
privilegie determinada religião/denominação em detrimento de outras;
não considerando a cidadania dos ateus e agnósticos também presentes
no Brasil, consagrando ingerência de Estado Estrangeiro sobre o Estado
Brasileiro e afrontando a separação entre o Estado e a Igreja,
preservada em todas as Cartas Constitucionais da República Brasileira.

A IGREJA PRESBITERIANA DO BRASIL reitera sua submissão e intercessão
em favor das autoridades constituídas, mas não abre mão de seu
ministério profético nesta geração a denunciar todo e qualquer desvio
contrário ao Estado de Direito e à Lei de Deus.

Brasília – DF, outubro de 2009
Rev. Roberto Brasileiro Silva
Presidente do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil