EIS A DIFERENÇA!
Romanos 8.28
2006
Romanos 8.28 tem tido varias traduções, sendo a mais conhecida em língua portuguesa esta: “Sabemos que todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito”.
O sentido é sempre o mesmo. Por exemplo, a palavra no grego para contribuem ou concorrem ou cooperam é “sinergia”, que um dos nossos dicionários define como sendo uma “ação associada de dois ou mais órgãos, sistemas ou elementos anatômicos ou biológicos, cujo resultado seja a execução de um movimento ou a realização de uma função orgânica” (Houaiss). A definição está de acordo com sua etimologia (sim + ergo = conjunto + trabalho).
No grego ainda, a condição do amor a Deus vem primeiro. Desse modo, preferimos a seguinte tradução: “Sabemos que, para aqueles que amam a Deus, todas coisas convergem para o bem” (American Standard Version)
Dada esta seqüência, optamos por estudar palavra por palavra desta promessa.
1
SABEMOS
A Bíblia o diz. As promessas de Deus na Bíblia, por instruções e por experiências de homens e mulheres que o amaram, mostram como terminam as agruras de agora: no nosso bem.
Nossa memória o diz. Nossas experiências anteriores em que passamos por dificuldades mostram como elas terminam: no nosso bem.
Se a sua memória anda obstruída, desobstrua-a com a Palavra de Deus.
Veja o que aconteceu com Ismael, abandonado pelo pai no deserto para morrer, mas cujo choro chegou aos ouvidos do Pai celestial que o salvou.
Veja o que aconteceu com Jacó, odiado pelo irmão, que o recebeu com festa por causa da oração.
Veja o que aconteceu com José, vendido pelos irmãos mas tornado primeiro-ministro do Egito.
Veja o que aconteceu com Josué tendo à frente uma cidade inexpugnável para vencer e a venceu.
Veja o que aconteceu com Davi, perseguido implacavelmente por um rei, a quem sucederia magistralmente.
Veja o que aconteceu com Elias, deprimido numa caverna, mas chamado para novos projetos proféticos.
Veja o que aconteceu com Ezequias, condenado à morte pelos médicos, mas cuja vida foi prolongada pelo médico dos médicos.
Veja o que aconteceu com Pedro, o discípulo-traidor tornado líder-criador.
Veja o eunuco da rainha da Candace, que foi a Jerusalém buscar o que não encontrou, mas encontrou quando o Espírito Santo enviou Felipe ao seu encontro já no caminho de volta para casa.
Veja o que aconteceu com João Marcos, tirado da equipe de Paulo e depois restabelecido.
Veja o que aconteceu com Paulo e Silas, trancafiados na prisão até um terremoto os libertar.
Veja o que aconteceu com João, degredado numa ilha, onde teve visões maravilhosas acerca do céu e que até hoje nos inspiram.
Leia a genealogia de Jesus, onde tudo se encaixa, até mesmo adultérios.
2
AMAM A DEUS
Ao ler esta promessa, eu me pergunto se ela é condicional ou incondicional?
Penso que é incondicional e condicional. Explico.
Deus não ama apenas os que O amam; seu amor não cabe nesta limitação.
No entanto, este amor só é fruído pelos que O ama. Esta é a diferença. Quem não ama a Deus não sabe amado por Ele, não pode ter certeza de todas as coisas convergem para o seu bem, não sabe como vai terminar a história.
Quem ama a Deus já conhece o final do jogo da vida; sabe-se amado por Deus e isto lhe dá uma confiança extraordinária para enfrentar suas batalhas. É muito bom amar a Deus. Quem ama a Deus sabe que é amado por Deus.
3
TODAS AS COISAS
Deus é Senhor de todas as todas as situações que alcançam nossas vidas, sejam advindas de:
. acertos próprios (um rapaz que escolhe uma profissão promissora e triunfa na vida)
. acertos dos outros (uma mulher que adota uma criança deixada na roda)
. erros próprios (uma moça que abandona um curso superior e não consegue mais retomá-lo)
. erros dos outros (um motorista bêbado que atravessa um sinal vermelho, causando ferimentos e até mortes na sua [nossa] família)
. pecados próprios (um adolescente que resolve experimentar a droga e se torna escravo dela)
. pecados dos outros (uma filha que lhe dá um neto antes ou fora do casamento)
Todas estas situações podem ser alteradas por Deus. Não há nada que Ele não possa alterar.
4
CONVERGEM
Deus faz as coisas trabalharem juntas. Uma rocha com que Moisés devia falar era o próprio Jesus Cristo jorrando água para dessedentar uma multidão.
Deus faz os animais cooperarem para o bem do ser humano. Ele fez a jumenta falar para Balaão se arrepender.
Deus faz as pessoas trabalharem juntas, mesmo que não saibam. Artaxerxes concordou que Neemias voltasse para reconstruir Jerusalém.
Deus faz impérios trabalharem juntos, mesmo sem o saberem que estão preparando a terra para receber o Messias.
Todas as coisas que nos acontecem contribuem para o nosso bem.
E aquela tragédia que nos ocorreu? Também ela concorrerá para o nosso bem, mas na perspectiva de Deus, que é a perspectiva da eternidade. Todo o capítulo 8 de Romanos é a história como Deus a vê se desenrolando.
Se tudo converge para o nosso bem, até o que fazemos de errado converge para o nosso bem? Podemos viver então sem pensar nas conseqüências dos nossos atos?
Apenas excepcionalmente Deus nos livra das conseqüências de nossos atos. A razão é simples: Deus respeita a nossa liberdade, o que inclui arcar com o ônus de nossos atos. Se Deus nos eximisse das conseqüências do exercício de nossa liberdade, não seríamos autenticamente livres.
Sendo práticos: a vida é feita de leis. Quebrando-as, pagamos o preço. Se avanço um sinal e vem outro carro, há uma colisão, com ou sem feridos. Poderia Deus agir para que nada nos acontecesse? Sim, e a prova é que, às vezes, raramente (milagre é coisa rara), o faz, mas geralmente não o faz, para que eu seja livre.
À medida em que vamos amadurecendo, vamos entendendo isto. Quando crianças, achamos que podemos tudo. Vamos crescendo, e percebemos que não podemos quase nada. O mesmo se dá na vida com o nosso Deus. Há pessoas que acham que Ele nos livra de tudo, até das conseqüências da liberdade humana, nossa e dos outros, mas Ele não nos livra, e também para o nosso bem.
Em todos estes casos também, Deus está em ação. Como traz uma das traduções, “sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o amam” (NVI). Por traz da liberdade humana, está a soberania amorosa de Deus.
Por causa de Sua soberania amorosa, Deus MANTÉM SITUAÇÕES, MAS LHES DÁ UM NOVO SIGNIFICADO por causa da Sua presença.
Davi orou e seu bebê morreu, não porque fora filho do adultério, mas porque nascera doente. O que Davi disse desta experiência é um verdadeiro curso sobre o luto (2Samuel 2.12.15-23).
Um amigo, muito querido, perdeu um filho. Estive no primeiro aniversário deste menino. No funeral, este meu amigo, pastor, para meu escândalo à época, dizia, como Jó: “O Senhor o deu, o Senhor o tomou! Bendito seja o nome do Senhor”. E com isto se consolou. Depois, Deus lhe deu dois filhos, um menino, que está estudando para ser pastor como o pai, e uma menina, que está terminando seu curso de medicina. Não sabemos porque o primeiro menino morreu, mas sabemos que seus pais foram consolados e abençoados.
Por causa de Sua soberania amorosa, Deus SUAVIZA AS CONSEQÜÊNCIAS DE NOSSOS ERROS E MESMO DOS NOSSOS PECADOS.
Quando estava na terra do Faraó, Abraão mentiu, dizendo que Sara era sua irmã. Em lugar de matá-lo, como seria a regra, o Faraó o perdoou e mandou-o ir. Deus entrou em ação e suavizou as conseqüências do pecado de Abraão.
Um casal de namorados adolescentes se envolveu em pecado, e a menina fica grávida. As dores das famílias e dos amigos da igreja dele foram intensas. Resolveram casar-se. Meses depois, a menina perdeu o bebê. Seus pais lhes perguntaram se ainda queriam casar: queriam e se casaram. Tiveram muitas lutas. A vida profissional do rapaz ficou bastante atrasada, com muitos desencontros. Muitos anos depois, nasceu a primeira filha do casal (hoje com três anos), que vive muito bem há dez anos. Eles tiveram a atitude certa diante do pecado, arrependendo-se do que cometeram, sem banalizar o seu erro; eles foram acompanhados pelas orações de seus pais e amigos; eles foram apoiados pelos seus pais e amigos; a moça, que não era cristã, converteu-se e foi batizada. Deus suavizou o erro dos meninos, que amavam a Deus, porque os que amam a Deus também erram, mas não se alegram com o pecado, não querem ser protegidos no seu pecado.
Na convergência que Deus produz, o pecado seguido de arrependimento pode ter como conseqüência um avivamento espiritual profundo, com ampla abrangência para o indivíduo, sua família, sua comunidade.
Por causa de Sua soberania amorosa, Deus REVERTE SITUAÇÕES, mesmo que não seja do modo que desejamos, mas sempre para melhor.
Moisés matou um homem e teve que fugir. Assim mesmo Moisés não perdeu a sua vida. Um dia Deus o encontrou e o chamou para libertar o seu povo, transformado em líder e no homem mais manso da terra.
Há muitos anos traduzi um livro de história do cristianismo; por minha sugestão, fui encarregado de escrever um capítulo latino-americano; escrevi-o, mas ficou longo demais. A editora o recusou, com razão, para minha tristeza. A solução foi melhor: um amigo me ajudou a publicá-lo à parte, no que seria meu primeiro livro (“As cruzadas inacabadas; introdução à história do Cristianismo na América Latina”). Deus transformou a decepção em vitória.
Por causa de Sua soberania amorosa, Deus NOS ENSINA A TER UMA COMPREENSÃO NOVA sobre as situações pelas quais passamos.
Pedro estava pronto para morrer por Jesus para salvar os judeus. No entanto, do lado de fora os gentios esperavam, mas Pedro resistia. Um dia teve uma visão terrível, em que recebeu a ordem para comer animais considerados impuros por sua religião. Logo após acordar, chegaram emissários de um destes gentios, que queria ouvir o Evangelho. Pedro entendeu o ensino e partiu, e o gentio, Cornélio, se tornou um cristão.
Gostamos de dizer que a vida ensina. Não é verdade; é Deus quem ensina através da vida. Sem Ele, não aprendemos nada com a vida.
5
BEM
Todas as coisas sinergizam para o nosso bem, mas o que é bom para nós?
Esta semana me encontrei, durante um funeral na família, com um primo com quem passei a minha infância. Este meu primo era forte e até me defendia na rua. Este meu primo, um ano mais novo que eu, não estudou e nunca teve um emprego razoável na vida. Eu era franzino e doente, por causa de uma otite. Durante nosso encontro, ali no santuário da igreja, ele fez uma revelação, de que eu não me lembrava:
— Enquanto nós brincávamos, você ficava lendo na varanda com os olhos compridos em nossa direção, sem poder sair de lá.
A saúde excelente do meu primo não foi o seu bem. A minhas saúde frágil foi o meu bem, embora eu invejasse o desempenho dos meus primos na corrida e no futebol.
O que é bem e o que é mal deve ser visto na perspectiva de Deus, a perspectiva da eternidade.
Muitos anos depois, tive que deixar a instituição de ensino onde atuava apaixonadamente no Rio de Janeiro. O clima interno era ruim e já não podia trabalhar com entusiasmo e liberdade. Um colega que saíra antes me chamou e fui trabalhar com ele em outro estado. Foram tempos difíceis, pela falta de amigos e pelas constantes viagens, para tristeza de minha esposa e de minha filha pequena, alérgica ao clima daquele lugar. Algum tempo depois, fui escalado para uma viagem, para substituir meu amigo e chefe. Sem tempo para me preparar, fui fazer uma série de palestras numa instituição de ensino em outro estado, ao sul. A contragosto, meu e de minha família, fui. Perto da cidade para onde fora, morava um ex-colega de organização trabalhando numa importante universidade. Fui visitá-lo. Ele me apresentou ao reitor, com quem conversei. Seis meses depois, estava em outra viagem, muito longe, e recebi um recado, de que aquele reitor queria conversar comigo pessoalmente. Voltei direto até lá e troquei de emprego, não tendo mais que viajar. Foram anos bons, mas, ao fim de seis anos, não havia para onde crescer. Um amigo foi me visitar. Conversamos sobre o desejo de voltar ao Rio de Janeiro. Alguns meses depois recebi o convite de uma universidade aqui do Rio para fazer algo que nunca fizera: dirigir um de seus cursos. Dois anos depois, recebi outra incumbência, completamente nova: dirigir toda a área acadêmica na mesma universidade. Bem, a história continua.
Posso imaginar outras histórias.
Uma família vai para a rodoviária para uma viagem a passeio. Por alguma razão, perdem o ônibus. Voltam para casa, cada um acusando o outro. Emburram-se todos os rostos. Como aquilo podia lhes acontecer? Como todas coisas convergem? No dia seguinte, chega um telegrama: um membro da família devia se apresentar no dia seguinte para um emprego há muito esperado. Agora, alegram-se os rostos.
Uma senhora olha para a sua vida. Sobre a mesa, há uma foto de sua família; ela e seus filhos. Ela recorda sua vida, uma vida conjugalmente feliz; uma vida profissionalmente feliz. Nem sempre foi assim. Na juventude, ela amargou duas reprovações para o curso que que desejava na universidade. Ganhou uma depressão severa. Perdeu muitos amigos. Conseguiu, fez um brilhante curso. Quando terminou, encontrou um excelente emprego e foi uma vitoriosa na profissão. Na mesma faculdade, no terceiro ano encontrou o amor de sua vida, com quem se casaria. A derrota da juventude não foi uma derrota, há muito ela o sabe, mas não sabia quando era jovem e sua vida se agitava.
O bem, para ser mesmo bem, não pode ser visto apenas na perspectiva do resultado imediato. Nós sequer sabem o que é bom para nós. É por isto que nem sempre pedimos como deveríamos pedir (Romanos 8.26).