2Coríntios 12.1-10: A GRAÇA SUFICIENTE

A GRAÇA SUFICIENTE
2Coríntios 12.1-10

2006

1. INTRODUÇÃO
Há três áreas na vida com enorme potencial para nos destruir. Muitos já escreveram sobre eles: Richard Foster é um destes autores, colocando estas áreas no próprio título de um dos seus livros: “Sexo, poder e dinheiro” (Mundo Cristão).
Cada um de nós não é vulnerável em todas as áreas, mas em uma delas. Qual é a sua? Provavelmente, a de Paulo era o poder. E ele tinha seus motivos para se preocupar.

2. ESPINHO DESCONHECIDO, MAS PODEROSO
No início de sua vida cristã, Paulo teve uma série de arrebatamentos espirituais, onde viu e ouviu coisas tão extraordinárias que se calou sobre elas. Nunca as esqueceu, mesmo sabendo que não devia se gloriar nelas. Na verdade, ele lutou contra seu desejo de usar essas experiências para se sobrepor aos outros apóstolos, especialmente quando contestado.
Em meio a esta tensão, ele ganhou um espinho na carne, que o fustigava. Há algumas informações sobre este espinho que nos causam estupor e nos ensinam muito acerca da vida cristã.

2.1. O espinho paulino veio após uma grande vitória espiritual.
Lembremo-nos de Elias: depois de derrotar coraJosa e ousadamente o casal real Jezabel e Acabe e todos os profetas de Baal que eles remuneravam, ele teve medo, muito medo. Depois de sumir ao monte e liquidar os inimigos, Elias se afundou numa caverna, não apenas para fugir, mas para morrer.
Não desanimemos, mas um triunfo espiritual não garante uma caminhada sempre no altiplano. Depois da montanha pode vir a planície, para que queiramos voltar à montanha. Não desanimemos: precisamos nos colocar em nosso lugar: o lugar da dependência de Deus.
Se você está bem espiritualmente, não se ensorberbeça: você não alcançou nada sozinho; foi tudo dádiva de Deus. Não se acomode: dentro dos nossos corações, trava-se uma luta dura entre as forças das trevas e a força do Espírito; hoje a força do Espírito está vencendo; dê graças a Deus e continue lutando.

2.2. Para Paulo, este espinho representou uma novidade na sua vida. Não era uma herança, como seu caráter ou seu temperamento. É algo que repentinamente passou a lhe incomodar.
Como acontece conosco, somos, por vezes, tomados por sentimentos novos, experiências novas, dores novas, angústias novas, pelas quais não esperávamos. Nossa vida ia bem, mas de repente uma depressão, moderada ou profunda, se aloja dentro de nosso corpo, como se fosse para sempre, por mais que lutemos. Nossa vida ia bem, mas de repente um descontrole financeiro, provocado por má gestão ou despesas elevadas imprevistas, nos lança numa impotência tal que perdemos o sono e a paz. Nossa vida ia bem, mas de repente um vizinho ou um colega de trabalho, sem que saibamos por que ou sabendo por que, desfila uma inimizade que nos  desconserta. Nossa vida ia bem, mas de repente um filho se torna dependente de droga, sem aceitar nossa ajuda pela  recuperação. Nossa vida ia bem, mas de repente nosso cônjuge perde a cabeça por outra pessoa e sai de casa para viver com a outra. Nossa vida ia bem, mas de repente uma pessoa querida nos morre, fazendo-nos reféns de uma saudade impreenchível.
Como doem espinhos como estes.

2.3. O apóstolo não diz que espinho era esse; sabemos que estamos diante de uma metáfora; não se trata de um espinho de origem botânica, nem de um calo no pé. Se Paulo não informa como era este espinho, não nos cabe especular. Ao omitir a natureza deste espinho, no entanto, Paulo nos dá licença para incluir os nossos. Bendito Paulo, por nos omitir esta informação. Doía nele, pode doer nós.
Podemos incluir dificuldades pelas quais pensamos, estejam elas no campo patrimonial ou no território dos relacionamentos. Cabem, por exemplo, uma timidez, que nos  impede de alçar vôos altos; uma explosividade, que dificulta nossa aceitação por parte de outras pessoas; uma atitude legalista, sempre pronta a julgar, raramente a perdoar.
Podemos incluir as perdas que experimentamos, que nos chegam como tragédias e calamidades. Diante destas perdas, podemos fazer da tristeza nossa companheira. Quando a mandamos embora, ela calou tão fundo, que se transformou em depressão e se recusa a partir, por mais que peçamos, por mais que oremos.
Podemos incluir os insultos que sofremos, em forma de palavras, de gestos e de ações. Você cometeu uma bondade, mas o escorpião lhe feriu. Você defendeu um inocente, mas entrou no rol dos bandidos. Você dedicou parte de sua vida a uma causa, mas a causa não sabe seu nome. Você deu “bom dia”, mas o rosto saudado se virou para o outro lado.
 
2.4. Paulo, e esta é uma informação essencial, recebeu este espinho diretamente de Satanás. Parece haver uma ambigüidade aqui, mas não há: fica claro que Deus nunca é o pai de nossas dores; esta é a obra de Satanás no mundo, com o fito de nos destruir. Tiago nos ensina: “Quando alguém for tentado, jamais deverá dizer: `Estou sendo tentado por Deus’. Pois Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém tenta” (Tiago 1.12).
As adversidades da vida são usadas por Satanás para nos derrubar. Acima de Satanás, Deue está. Assim, o espinho é, ao mesmo tempo, obra de Satanás para nos destruir e obra de Deus para nos salvar. Mesmo onde Satanás está atuando, Deus está agindo soberanamente, porque nada Lhe escapa; nada O vence.

Qual é o seu espinho? Não importa: o que importa é que você faça como o apóstolo Paulo: receba-o como mensageiro de Satanás, que aproxima você da graça.

3. BENDITOS ESPINHOS
Sem os espinhos, nós tornamos presas fáceis de outros inimigos da graça em nossas vidas.
Menciono alguns, mas você pode ficar com um só ou ampliar a lista.

3.1. O bem-estar
Quando estamos bem espiritual, emocional ou financeiramente, nós nos sentimos fortes. E quando estamos fortes, achamo-nos desnecessários da graça. A graça é força para os fracos.

3.2. A ansiedade
Os ansiosos, que são aqueles que pretendem fazer o que só Deus pode fazer, que são aqueles que  não aceitam a velocidade dos ponteiros do relógio da sua vida, que são aqueles que têm como horizonte de suas experiências o controle sobre fatos, coisas e pessoas, não conseguem crer que a graça lhes seja suficiente.

3.3. O pragmatismo
Se o meu Deus faz tudo o que eu quero, não recebo o que melhor tem para mim: sua graça.
Se minha religião é mágica, e eu faço coisas que funcionam e eu oro de modo que o resultado fica de antemão garantido e eu estou certo que ficarei próspero por causa da minha retidão e da minha fidelidade, numa espécie de galardão em vida, não preciso da graça: precisão de prosperidade, não de graça.

4. GRAÇA OU DESGRAÇA
Faça com que seu espinho aproxime da graça, porque em muitos afastam dela.
Eis algumas atitudes:

4.1. Olhe para Deus.
Não perca de vista a majestade de Deus. Não tem como não olhar para o seu espinho, porque dói, mas olhe para Deus. A sarça está se queimando sem se consumir; não é uma miragem, não é loucura sua. É Deus chamando por você.
Deus, como aprendemos na história de Jó, é maior que Satanás. Não olhe para Satanás, com seu poder vencido; olhe para Deus, com seu poder triunfante. A solução de nossos problemas não substitui a graça de Deus.

4.2. Considere o espinho como uma oportunidade.
Deus não tem prazer em nosso sofrimento, mas nosso espinho fere. Logo, Deus permite o espinho para nos levar a um propósito maior. No caso de Paulo, e certamente no nosso, Deus permitiu o espinho para levar o apóstolo à humildade. A humildade que vem da dor é mais importante que livramento da dor. Só há  glória na glória de Deus, mas na glória de Deus mesmo.
É a graça que nos ajuda a fazer nosso caminho longe da tristeza, mesmo que conseqüência natural diante das perdas; do ódio, mesmo que justificado em função da agressão recebida; da amargura, mesmo que os abusos ainda povoem nossa memória;

4.3. Agradeça pelo seu espinho.
Vou lhe dizer o que acontece comigo?
Eu oro menos quando meu corpo está 100% e nada nele me incomoda. Quando eu me levantou e meus artrosados joelhos doem, eu logo me ajoelho; quando não doem, logo me levanto e deixo a oração para depois. Bendita dor.
Eu oro menos quando meu saldo bancário está positivo. Quando está negativo, eu oro para que Deus me oriente. Quando está positivo, agradeço rapidinho e pronto.
Eu oro menos quando minhas idéias fluem suavemente. Quando os planos não funcionam, as palavras tardam, eu oro por mais inspiração e por mais sabedoria.
Ademais, se Satanás lhe enviou um espinho, é porque você o está incomodando.

4.4. Aja com graça para com os outros.
Recebeu um insulto? Responda com outro insulto ou se deixe alcançar pela graça de Deus antes de responder.
Está vendo algo errado? Condene logo ou se deixe alcançar pela graça de Deus para julgar com graça. Julgue, mas julgue com graça.
Está vendo alguma necessidade, que um gesto seu ou uma palavra sua poderia suprir? Às vezes, seu gesto será apenas uma palavra. O mundo vive pela Palavra. O mundo vive de palavras. Como tem sido a sua palavra?

5. GRAÇA SUFICIENTE
A graça de Deus nos basta porque:
. é certeza de vida, mesmo que nossos ossos estejam virando pó.
. é companhia constante, mesmo naqueles lugares que imaginamos Deus não poderia estar, mas está, em sua discreta e poderosa majestade
. é braço que nos aponta feliz um futuro diferente do presente.
. é sopro soprando vida onde a decepção tornou-se uma caveira que nos contempla.
. é força para nos ajudar a resistir à fraqueza, não poder para nos permitir fugir da fraqueza.
. é milagre que nos tira do fundo do poço.
. é muro onde podemos nos firmar, na certeza de que o muro está ali e estará ali, firme sempre, sempre firme.
. é palavra de consolo, mesmo que a desolação pareça o único cenário.
. é presença em forma de brisa que vence o vendaval.