O encantador o salmo 116 comove pelo seu começo, que dá o dom de toda a experiência do poeta: “Amo o Senhor”.
Só então ele enuncia suas dificuldades.
O modo como principia mostra que ele enfrenta os seus problemas na perspectiva da fé. Tudo o que ele diz parte desta convicção primeira. Neste salmo, esta é a mensagem central. Os versos que se seguem são ilustrações desta paixão.
Ele ama a Deus em função de quem o Senhor é e por causa da sua experiência com Ele.
Se não recebe dEle o que espera, Deus continua sendo Senhor e vai continuar a ama-lO. Deus não precisa provar que é Deus. Ele já o é e assim é amado. Se Deus faz um milagre, ele o ama. Se Deus intervém, ele o ama. Se Deus não resolve o problema, ele o ama.
Porque o ama, oferece-Lhe sacrifícios de louvor, mas atenção: a palavra “sacrifício” não significa mais sacrifício. O velho sacrifício era para pagar uma falta cometida; o novo sacrifício é para agradecer o favor já recebido. O velho sacrifício custava algo (ou dinheiro ou a morte de um animal); o novo sacrifício custa apenas uma abertura de sorriso de alegria diante de Deus. Não precisamos fazer algo para receber algo de Deus. Jesus interrompeu o fluxo do comércio. Recebemos sem ter feito algo para receber. Amor, puro amor.
Nossa maior dificuldade é que a nossa cultura (cultura universal e atemporal, porque presente ao tempo do poeta bíblico) não nos estimula a amar a Deus. Somos chamados a ter com Ele um relacionamento comercial. Nós somos ensinados a louvar a Deus para receber dEle o que precisamos. Depois que recebemos, nós O abandonamos. No entanto, o poeta diz: “Eu amo o Senhor”.
Nossa cultura nos estimula a fazer sacrifícios para Deus, pois, se o fizermos, receberemos dEle o que queremos. Deus é um ser estático, sem vontade alguma, como se fosse uma máquina que dispensa refrigerantes ou biscoito. Uma máquina destas não ama. Não preciso amar uma máquina: preciso apenas colocar o dinheiro na fenda certa. No entanto, o poeta diz: “Eu amo o Senhor”.
Quem ama ama até o fim.
ISRAEL BELO DE AZEVEDO