AS MARCAS DOS BATISTAS BRASILEIROS (Rui Xavier Assunção)

 

Recentemente, o Pastor Israel Belo de Azevedo, da Igreja Batista Itacuruçá, no Rio de Janeiro, baseou seus sermões em Gálatas 6:17.
No culto da manhã  se restringiu à primeira parte do versículo:
“ Quanto ao mais, ninguém me moleste”  e, no da noite, falou sobre: “porque eu trago no corpo as marcas de Cristo.”
 
Passei vários dias a pensar sobre quais as marcas que nós, batistas brasileiros de hoje, deixaremos para os pósteros.
Entre as que recebemos de nossos antepassados podemos citar a fé, daquela que remove montanhas, ou do tamanho de um grão de mostarda. Embalados por esse sentimento deixaram a terra natal e vieram para o Brasil, nação continente que lhes era totalmente desconhecida. Outro idioma, outrra cultura, outros costumes. Aqui chegados verificaram a enormidade da tarefa que se propuseram realizar. Enormes distâncias a separarem os núcleos de habitantes. Difícil a comunicação entre as cidades e entre as provincias e elevado indice de analfabetismo. Para contornarem as primeiras dificuldades, imagino que adotaram  a idéia de igrejas independentes, autonomas e soberanas embora eles, os missionários da Junta de Richmond, não fossem independentes, nem autonômos  e nem soberanos.  Dependiam em tudo da Junta, cumpriam as ordens dela emanadas  e a ela prestavam contas de suas atividades.  A independência proposta para o  novo campo justificava-se, ou se impunha, face a imensidão territorial brasileira aliada às precárias comunicações.
Com a idéia de incentivarem o povo a ler a Bíblia, fundaram colégios e adquiriram enormes propriedades com essa finalidade, em várias partes do território nacional.
Estas são algumas das marcas que os pioneiros nos legaram.
Muitas das escolas por eles fundadas desapareceram, algumas afogadas em dívidas, juntamente com  o patrimônio imobiliário o qual, aqui e ali, está aos poucos sendo alienado para pagarmos dividas havidas por má administração, incompetência  e, não duvido, até por desonestidade.  
A Igreja Católica Romana, uma das maiores proprietárias de imóveis urbanos no Rio de Janeiro, raramente vende um. Quando o faz é para comprar outro maior, como ocorreu com a venda do Colégio São José, na rua Barão de Mesquita, e que estava cercado de prédios residenciais que impediam sua expansão. É só ler os jornais da época. Enquanto isso os batistas estão a fatiar a propriedade da rua José Higino, na Tijuca, para pagar dividas.  Estamos nos deixando cercar por prédios que, no futuro, impedirão a expansão e o desenvolvimento de nossos trabalhos. Ao contrario de Jabez  que clamou ao Senhor para lhe alargar as fronteiras, sendo atendido (1a. Crônicas 4:10) os batistas brasileiros da atualidade as estão encolhendo.
Há diversos educandários católicos em nossa cidade em pleno funcionamento.  Os batistas tinham dois. Um encerrou suas atividades há vários anos e o outro luta para superar a crise na qual estava mergulhado.
Na assembleia da Convenção Batista Brasileira realizada em São Paulo, no ano de 1936, o Dr. Shepard propôs a fundação da Universidade Batista no terreno da rua José Higino. A proposta foi rejeitada por aqueles assembleados. Está nos anais da CBB. É só conferir.
O clero, ao tomar conhecimento do assunto, agiu rapidamente e, em 1940, o padre Leonel França fundou a Pontificia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO), hoje referência no ensino superior do Brasil. E os batistas?… O sonho do Dr. Shepard está se transformando em pesadelo.
Há tempos ouvi renomado pastor batista, atuando no Rio de Janeiro, defender a venda da propriedade da José Higino porque, segundo ele, ninguém matriculará seus filhos em estabelecimentos com prédios tão antigos. Será que aquele irmão ignora que os grandes estabelecimentos de ensino da Europa e dos Estados Unidos utilizam prédios tão ou mais antigos do que os do  Shepard? 
Outro renomado pastor, também batista carioca, em data mais recente afirmou enfáticamente que o Shepard é inviável face a democracia batista brasileira. Observe-se que em qualquer regime democrático há um governo central que dita as normas, as quais são obedecidas pelos governados. Na democracia batista as coisas não funcionam dessa maneira e, assim, ficamos na curiosa situação de matarmos o boi para eliminarmos o carrapato, idéia que não passa pela cabeça de nenhum pecuarista, por mais obtuso que seja.
O projeto inicial do Governo do Estado   ao anunciar a construção do tunnel Lagoa/Barra, no inicio da década de 60, previa a divisão do campus da PUC. A noticia  provocou tal reação do Clero que o Estado teve de refazer seu  planejamento. Examinem os jornais da época.
Será que nós, batiistas, fariamos algo semelhante? Teriamos tutano para tanto? Duvido e muito porque a nossa independencia, soberania e autonomia não o permitiriam e ficariamos na expectative de que o órgão que nos representa o fizesse. O problema é que não o temos.  Ou esconder-nos-iamos atrás do preceito de que a denominação batista não se envolve em questões políticas?
Estas são algumas das marcas que legaremos para nossos descendentes.
Em nossos cultos buscamos louvar a Deus, o todo poderoso, criador dos céus e da terra.  Nossos púlpitos anunciam que do Senhor é a terra e a sua plenitude, o mundo e aqueles que nele habitam. A Ele pertence toda a prata e todo o ouro e tudo o que no mundo há. Ensinam que Deus é infinitamente capaz de realizar muito mais do que pedimos, almejamos ou sonhamos. Apregoamos que o Novo Testamento garante que tudo que pedirmos com fé, crendo, o receberemos.
Tudo isso é verdade e tem fundamento bíblico.
O problema reside no fato de, ao agirmos, não demonstrarmos nossa fé no poderio do Senhor. Fé do tipo que impulsionou os batistas do passado a nos legarem o que recebemos e estamos deixando escapar pelos vãos dos dedos.
Deus tenha piedade de nós.
 
Rui Xavier Assunção.
Igreja Batista Itacuruçá