Catástrofe é um termo utilizado para definir uma desgraça pública, um acontecimento terrível que geralmente surpreende causando a destruição de vidas e bens em qualquer parte do globo terrestre. Nos últimos anos, temos acompanhado várias catástrofes em variados níveis de gravidade ao redor do mundo: furacões, tsunamis (ondas gigantes), terremotos, contaminações, transbordamento de rios etc.
Quando testemunham tais catástrofes, as pessoas geralmente se perguntam: Onde está o ser Onipotente que não livrou tantos do sofrimento? Por que não interveio neste acontecimento letal que de forma atroz interrompeu a vida de milhares de pessoas? Como confiar em um Deus que não nos socorre quando precisamos? São estas as indagações que surgem diante das calamidades.
Interessante notar que a sociedade pós-moderna cada vez mais distanciada do Todo-Poderoso, que tenta neutralizar seus princípios em todas as instâncias possíveis, que não O procura quando deveria fazê-lo, que descarta a realidade de Sua existência, que banaliza a necessidade de um relacionamento com Ele, é a mesma sociedade que exige respostas diante das fatalidades. Cobra respostas do Ser em quem não crê. Denuncia Aquele que não consegue aceitar como pessoal e ridiculariza Sua não ação.
Percebemos que existe um “estranhamento” do mundo no que se refere ao Deus que é propagado como amoroso e que, aparentemente, não intervém nas calamidades. No entanto, este “estranhamento” se dá por falta de conhecimento e intimidade com o próprio Deus antes da catástrofe. Para compreendê-lO na catástrofe se faz necessário conhecê-lO antes dela. Não que isto signifique a obtenção de todas as respostas para os fatos da história contemporânea. Não! Isso porque temos limitações e somos incapazes de perceber os detalhes da atuação de Deus na história, e, por estarmos envolvidos em um processo histórico que nos faz ver somente alguns pontos. Assim, alguns porquês continuarão sem respostas se formos honestos, o que não diminui a açã o e o poder do Altíssimo.
Vivemos uma modernidade classificada por Zygmunt Bauman, como modernidade líquida[1], termo usado como metáfora para caracterizar esta fase da modernidade. Obviamente nesta fase da modern idade constamos transformações em vários níveis. A saber: consumo exacerbado, valorização do prazer imediato com a realização instantânea, nova percepção de tempo e espaço, liberdade sem precedentes, novas formas de competição pela sobrevivência, moralidade indiferente às consequências das ações humanas e o desenvolvimento do que foi classificado por “desencantamento” (expressão de Max Weber – 1864-1920), aludindo ao fato de que no devido tempo a modernidade faria a sociedade deixar o mundo do encantado, referindo-se ao relacionamento ou à necessidade de um Deus, pensamento traduzido no neo-ateísmo propagado nos dias atuais ao redor do mundo como resultado do processo de secularização. Tratando deste tema R. Albert Mohler afirma que “os novos ateístas são, à sua própria maneira, evangelistas em suas intenções e ambiciosos em suas esperanças. Veem o ateísmo como a única cosmovisão lógica para o nosso tempo, e a fé em Deus como tremendamente perigosa – um produto do passado, que não podemos mais tolerar ou, muito menos, estimular”.[2] Esta postura da pós-modernidade exclui a realidade de um Deus antes dos principais dramas da vida, o que desautoriza seu questionamento após estes mesmos dramas. É estranho mantê-lO isolado e depois fazê-lO responsável pelo sofrimento humano.
Somente através do conhecimento de Deus antes das tragédias que enfrentamos como hóspedes temporários neste mundo é que O compreenderemos após os dramas que possam nos envolver. Conhecê-lO antes das tragédias é reconhecer a própria limitação. Conhecê-lO antes das tragédias é entregar a vida em Suas mãos. Conhecê-lO antes das tragédias é vê-lO como Ser pessoal e capaz de se relacionar com o ser humano. Conhecê-lO antes das tragédias é possuir uma convicção de fé, a qual está firmada na revelação de Cristo e que não se dilui mesmo diante daquilo que não se pode compreender.
Mesmo que não entendamos tudo que nos sobrevém, que seja difícil contemplarmos o sofrimento alheio, que testemunhemos o flagelo, ainda assim, devemos conhecer a Deus. Este caminho envolve humildade, rendição, compromisso e persistência. Palavras desafiadoras para uma sociedade presunçosa, que valoriza o poder, que revela falta de comprometimento e continuidade.
As tragédias não devem colocar Deus em xeque, mas trazer uma compreensão de nossa limitação, de nossa fragilidade em todos os momentos, de nossa carência espiritual e de nossa incapacidade para resolver os dilemas mais íntimos. Conheçamos Deus antes das catástrofes para que não O estranhemos depois, caracterizando-O como um Deus irresponsável e cruel. Afinal, Ele permanece sendo Deus antes, durante e depois dos flagelos que se manifestam na humanidade. Como disse J. Packer: “A diferença primordial e fundamental entre o Criador e suas criaturas é que elas são mutáveis e sua natureza admite mudança, ao passo que Deus é imutável e nunca pode deixar de ser o que é”.[3]
Pr Evaldo Rocha
Auto do livro: Vivendo de Forma Equilibrada – o alfabeto da vida saudável
www.evaldorocha.com
[1] Zygmunt Bauman. Modernidade líquida, Ed Zahar, p.107-149
[2] R. Albert Mohler Jr . Ateísmo Remix . Fiel, p.16
[3] J. I. Packer. O conhecimento de Deus. Mundo Cristão, p.91-92.