A MULHER QUE ESQUECIA LIVROS (Maria Ignez Menegatte)

  Era uma senhora de voz pausada, elegante, gentil e sempre tinha nos lábios um sorriso suave, marca registrada do seu jeito de ser. Todos os vizinhos a conheciam como “a senhora que gosta de ler”.
Conversar com àquela jovem senhora era como abrir um Atlas e fazer uma viagem: nuances de culturas diversas, povos, moedas, línguas, formas de governo, cultura popular, economia, artes,  particularidades de algumas culturas, tudo isso fazia parte das conversas entabuladas com a senhora, quer fosse no seu trabalho, numa roda de amigos ou mesmo na sala de sua residência.
Interessante que a nossa amiga, com tantos conhecimentos, gentileza e simpatia,  sabia dosar o falar e o ouvir: era capaz de aprender com uma criança, um jovem, um idoso e nem de longe tinha ares de presunção, o que deixava a todos de sua convivência ainda mais admirados   com tamanha sabedoria de vida.
Para os que conheciam a mulher dos livros, mas não desfrutavam de sua intimidade, havia a curiosidade de conhecer sua casa, que, estes a imaginavam um palacete, com uma biblioteca suntuosa, móveis da era vitoriana, coisas assim. Na realidade sua residência não era nenhuma mansão, mas uma casa singela com instalações modestas em um bairro popular da cidade, tendo uma pequena instante na sala, com pouquíssimos livros. A essa altura você também deve estar a se perguntar: e onde ela guardava as centenas, os milhares de livros que adquiria, seu único investimento, livros na maioria edificantes, enriquecedores, textos encorajadores, livros para aquecer a alma e despertar muitos sonhos. Onde, onde ela os depositava depois que os lia? 
Em qualquer lugar por onde àquela mulher andasse: na mesinha da sorveteria ou do restaurante, barzinho, café, no balcão das lojas de roupas, sapatos, presentes, no banco do trem, metrô, ônibus, nas salas de espera do dentista, dos médicos, nos bancos da praça, na sala dos amigos, em qualquer lugar.
Seus livros não tinham nome, nenhuma identificação, eram de quem tivesse a felicidade de encontrá-los. Socializar seus livros, dividir seus tesouros era mais uma qualidade daquela mulher fantástica. Por isso, a nossa protagonista era uma pessoa que amava ler, porém, algo mais notável ainda é que ela era a mulher que esquecia livros.
Acabo de ter uma idéia muito boa com essa história, e você?    

 

Maria Ignez da S. Menegatte