Por uma questão de herança familiar ou de adaptação cultural, nem sempre o planejamento faz parte de nossas pré-ocupações.
Se isto é verdade, também é verdade que o desejo de realizar faz parte até daqueles que não têm a cultura do planejamento. Tornou-se comum, em várias culturas, usar-se a palavra “sonho” para este tipo de desejo, seja ele comum, como ter algo (como um carro ou uma casa), seja ela incomum (como escalar uma montanha íngreme ou voar sobre os mares). O “sonho” é algo tão comum que até os bancos não são mais bancos, como promete um deles: “incentivar sonhos faz parte de nosso dia a dia”.
Uma boa equipe esportiva é chamada de “time de sonho”. E como se faz um “time de sonho”? Um treinador de um time assim começava suas palestras de preparação com estas palavras duras: “Eu estou aqui para levar vocês a fazerem o que não querem para alcançarem o que querem”. (Cf. AZEVEDO, Israel Belo de. Academia da alma. Rio de Janeiro: Convicção, 2007, p. ). O que o técnico dizia é que um sonho não se torna realidade por si mesmo, mas que demanda um conjunto de ações.
Jesus disse a mesma coisa, usando outra imagem: a de uma torre.
“Qual de vocês, se quiser construir uma torre, primeiro não se assenta e calcula o preço, para ver se tem dinheiro suficiente para completá-la?
Pois, se lançar o alicerce e não for capaz de terminá-la, todos os que a virem rirão dele, dizendo:
— Este homem começou a construir e não foi capaz de terminar.
Ou, qual é o rei que, pretendendo sair à guerra contra outro rei, primeiro não se assenta e pensa se com 10 mil homens é capaz de enfrentar aquele que vem contra ele com 20 mil? Se não for capaz, enviará uma delegação, enquanto o outro ainda está longe, e pedirá um acordo de paz”.
(Lucas 14.28-32)
O sonho de todo homem da antiguidade bíblica incluía ter uma torre bem alta em sua propriedade. O profeta Isaías nos ajuda a entender os sonhos (sonhos de consumo, como se diria hoje) de sua época: “Cantarei para o meu amigo o seu cântico a respeito de sua vinha: Meu amigo tinha uma vinha na encosta de uma fértil colina. Ele cavou a terra, tirou as pedras e plantou as melhores videiras. Construiu uma torre de sentinela e também fez um tanque de prensar uvas” (Isaías 5.1-2a). O elogio ao rei que lhe era contemporâneo era vazado nos seguintes termos: “Uzias construiu torres fortificadas em Jerusalém, junto à porta da Esquina, à porta do Vale e no canto do muro. Também construiu torres no deserto e cavou muitas cisternas, pois ele possuía muitos rebanhos na Sefelá e na planície. Ele mantinha trabalhadores em seus campos e em suas vinhas, nas colinas e nas terras férteis, pois gostava da agricultura” (2Crônicas 26.9-10). As épocas mudam, mudam os sonhos, mas os desejos permanecem. É da condição humana e é esta condição que faz o homem se superar. Com estas informações entendemos melhor o sonho de Babel, quando os homens disseram: “Depois disseram: “Vamos construir uma cidade, com uma torre que alcance os céus. Assim nosso nome será famoso e não seremos espalhados pela face da terra” (Gênesis 11.4). Depois da experiência de Babel, inúmeras vezes Deus mesmo é comparado a uma torre. Davi, o poderoso guerreiro, cantava assim: “o meu Deus é a minha rocha, em que me refugio; o meu escudo e o meu poderoso salvador. Ele é a minha torre alta, o meu abrigo seguro. Tu, Senhor, és o meu salvador, e me salvas dos violentos” (2Samuel 22.3). Entre o povo corria um ditado de confiança: “O nome do Senhor é uma torre forte; os justos correm para ela e estão seguros” (Provérbios 18.10).
Jesus, como sempre parte da condição humana. Todos sonhavam em ter uma propriedade em que houvesse uma vinha, de onde poderia extrair o alimento da oliveira e da videira, e uma torre, a partir da qual a sentinela poderia avisar do perigo que se avizinhasse.
Até hoje as torres, conquanto por razões diferentes, são símbolos de empresas e países. As “torres gêmeas” de Nova York foram destruídas no 11 de setembro pelo símbolo (riqueza, luxo, superioridade) que representavam. Em vários países do mundo, os hotéis estão envolvidos num campeonato por altura. O mais alto dele, que fica no Dubai, tem 512 metros de altura, com 141 andares, mas o projeto é chegar a 700 metros.
Jesus não avaliza esta corrida, mas parte da condição humana.
Aprendemos neste dito de sabedoria de Jesus como devemos proceder para construir nossas torres ou, em outras palavras, para tornar reais os nossos sonhos.
1. DESEJE UMA TORRE.
Uma das marcas de nossa época é a volatilidade dos sonhos. Vivemos um paradoxo, especialmente para adolescentes e jovens, com um excesso de oportunidades, difíceis de serem agarradas, em parte pelo excesso.
Outra marca de nossa época é a submissão ao dinheiro, com o seu poder. Há pessoas que escolhem carreiras, não em função de seu ideal ou do prazer que possam dar, aliado ao sustento que possam trazer, mas tão somente pelo dinheiro que parecem prometer.
Jesus nos ensina: deseje construir uma torre.
Conheci um menino que tinha um sonho: ser motorista de caminhão, como seu tio. Com cuidado, seu pai conseguiu que o sonho fosse alterado e ele passou a desejar ser um engenheiro mecânico. Depois, ganhou dois livros (um de poesia e outro de ficção) e desejou construir não mais automóveis, mas livros. Hoje, na meia idade, escreve livros, publicados em papel ou veiculados pela internet. E feliz porque está sempre sonhando com outras torres. Quem deseja construir torres é feliz.
A imagem de torre para os nossos sonhos é boa porque indica algo concreto (desculpe o trocadilho) e robusto, logo visível e alcançável.
Que torre você quer construir?
Qual é o ideal de sua vida?
Deseje construir torres, não torres de Babel, mas torres trançadas com desejos legítimos, construídas com valores legítimos e com material (concreto) que as tornem visíveis.
2. PROJETE SUA TORRE.
Há pessoas que vivem deixando a vida lhes levar e ainda reclamam para onde estão indo…
Aí estão os desaninados porque seus planos não se realizam. Para estes, vale o convite à persistência, olhando sempre para o Alto. Deus ainda tem planos para você. Ele lhes diz:
“Porque sou eu que conheço os planos que tenho para vocês, (…) planos de fazê-los prosperar e não de lhes causar dano, planos de dar-lhes esperança e um futuro” (Jeremias 29.11).
Aí estão os preguiçosos, que não querem pagar o preço dos seus sonhos. Para estes, vale uma palavra dura: “Até quando você vai ficar deitado, preguiçoso? Quando se levantará de seu sono? Tirando uma soneca, cochilando um pouco, cruzando um pouco os braços para descansar, a sua pobreza o surpreenderá como um assaltante, e a sua necessidade lhe sobrevirá como um homem armado” (Provérbios 6.9-11).
Jesus nos ensina: para construir torres, precisamos projetá-las.
Como a queremos? Com que altura? Que largura terá? Com que material será feita? O que haverá no seu interior? Quanto custará?
O que Jesus nos diz é: planeje a construção de sua torre.
A Bíblia está cheia de recomendações indiretas e diretas sobre o valor do planejamento. Uma delas garante, como um eco à palavra de Jesus:
“Os planos bem elaborados levam à fartura; mas o apressado sempre acaba na miséria” (Provérbios 21.5)
Deus mesmo, tão poderoso que poderia fazer tudo na hora, sem nada planejar, faz planos. Um profeta o reconhece:
“Senhor meu Deus! Quantas maravilhas tens feito! Não se pode relatar os planos que preparaste para nós! Eu queria proclamá-los e anunciá-los, mas são por demais numerosos!” (Salmo 40.5)
A vinda mesma de Jesus foi parte de um plano (Efésios 3.11). Ele veio na plenitude dos tempos (Gálatas 4.4). João Batista foi enviado para preparar os últimos detalhes. Ao final de sua vida, próximo da morte, Jesus exclamou: “Está consumado”. Junto com o Pai, Ele compartilhava um projeto, do qual a cruz fazia parte. A cruz era sua torre e Ele a construiu.
Nesta caminhada, precisamos de orientações, dadas por conselheiros sábios e santos. Na verdade, “os conselhos são importantes para quem quiser fazer planos (Provérbios 20.18a). Segundo a Bíblia, “os planos fracassam por falta de conselho, mas são bem-sucedidos quando há muitos conselheiros” (Provérbios 15.22).
Sobretudo, precisamos consagrar ao Senhor tudo o que fazemos. Se o fizermos, nossos “planos serão bem-sucedidos” (Provérbios 16.3).
Deseje uma torre e planeje a sua construção.
Não importa o que deseja: planeje. Planeje sua vida, incluindo trabalho, casamento, aposentadoria, férias e até mesmo a morte.
Pode ser que o plano precisa de revisões constantes. Só pode revisar um plano quem tem um plano, quem não vai deixando a vida levá-lo.
Deixe-me ser um pouco desagradável. Tem gente que vive como se não fosse adoecer e nem morrer. Tem gente que dispõe de recursos financeiros, mas não tem um plano de saúde. Tem gente que não faz um plano funeral, que custa muito pouco, apenas porque acha que o assunto é desagradável. A vida inclui a morte.
3. CONSTRUA SUA TORRE
Depois de desejar e planejar, construa sua torre.
Depois do projeto, ponha os alicerces. Jesus fala como deve ser a nossa vida: com alicerces firmes. Quando cair a chuva, transbordarem os rios, soprarem os ventos e derem contra aquela casa, nossa vida não vai ruir, porque seus alicerces foram estabelecidos na rocha (Mateus 7.27).
Continue construindo, mesmo que tenha que adaptar o projeto à realidade, como aconteceu com o rei referido por Jesus na mesma parábola (versos 31-32). Adapte seu projeto à realidade, mas não mude da decisão de ter uma torre, embora possa até mudar de projeto. Devemos adaptar nossos desejos à realidade, para não termos expectativas irrealizáveis. Nunca devemos desistir, embora por vezes tenhamos que recuar.
Lembre-se que há torres construiveis sozinho. Mãos à obra.
Lembre-se que há torres construiveis em família. Eu me lembro que, ainda menino, participei da construção de uma casa, onde moraríamos. Meu trabalho era encher um carrinho de terra num morro próximo e levar até o nosso terreno. Era trabalho duro, mas eu me alegro deste sacrifício, pela casa que nos trouxe e pelo aprendizado que me legou.
Em nossas construções, sacrifícios serão necessários. Ninguém realiza o seu projeto sem sacrifício. Inexiste esta possibilidade. Num programa esportivo estavam dois campeões brasileiros: Jadel Gregório, recordista sul-americano no salto triplo, e Jade Barbosa, medalhista de ouro na ginástica artística no Pan-Americano de 2007. Em busca de novos recordes, responderam do mesmo modo a uma mesma pergunta: se sentiam dores nos treinamentos. Ambos disseram que sim e acrescentaram que não é possível uma carreira esportiva de sucesso sem sacrifício e mesmo sem dor, dor física.
Cada estágio de vida em que nos encontremos ou cada condição em que nos achamos demanda a sua torre.
Para quem é um estudante, sua torre se construirá com estudo, com muito estudo. Está enganado quem diz que estudar não vale a pena. Deseje a sua torre; isto é, deseje uma carreirã; desenhe esta carreira; construa sua carreira. Esta é a sua torre agora. Tenha um ideal e se sacrifique por seu ideal. Aqueles que já estão em outros estágios em sua vida poderão voltar aos bancos escolares ou à educação a distância. Conhecer é muito bom.
Para quem é um profissional, sua torre se construirá com trabalho, muito trabalho. Desenhe ou redesenhe sua carreira e busque torná-la a sua realidade, a torre que você pode ver, que sua família pode ver. Sacrifique-se por seu ideal.
Quem deseja adquirir algo, projete bem. Corte hoje o que for necessário para ter amanhã a sua torre. Sacrifique-se hoje para sorrir amanhã.
CONCLUSÃO
A graça de Deus não nos autoriza a viver de modo que não considere a sabedoria de nossas atitudes.
Por isto, quem é sábio consulta o Senhor Deus, tanto retrospectivamente (lendo a Bíblia e praticando os conselhos nela apresentados) quanto prospectivamente (orando, para receber outras orientações), para tomar decisões corretas, para planejar o que vale a pena, sem arrogância, sem cobiça, com humildade, com justiça. Não seja como o ímpio que, “em sua arrogância (…) persegue o pobre, que é apanhado em suas tramas. Ele se gaba de sua própria cobiça e, em sua ganância, amaldiçoa e insulta o Senhor. Em sua presunção o ímpio não o busca; não há lugar para Deus em nenhum dos seus planos” — Salmo 10.2-4). Feliz é aquele que permite que o Senhor Deus lhe determine os passos (Provérbios 16.9).
É por isto que Jesus nos deixa conselhos como estes. Não permita que a vida lhe leve. Sua tarefa é construir torres.