O DOM QUE HÁ EM TI
(2 Tm 1.6-11)
1. INTRODUÇÃO
Neste texto, que integra a última obra de Paulo, o apóstolo faz um resumo do Evangelho. Ele recomenda a Timóteo manter-se forte numa civilização em colapso.
Em certo sentido, nosso contexto é o mesmo: estamos tendo o privilégio de viver numa sociedade onde convivem tensamente o velho, que se esgotou, e o novo, que nos assusta por não sabermos em que vai dar.
Timóteo era uma pessoa de saúde física e emocionalmente fraca. Ele sofria de dores no estômago (talvez uma gastrite ou algo mais grave) e de desânimo, talvez por sua pouca idade e pela enormidade dos desafios.
Os cristãos não são superhomem, sem problemas. Nós estamos sujeitos às mesmas dificuldades que os outros. Em nome da defesa do Evangelho, vendemos uma imagem (felizes tipo sorriso <ii>colgate<fi>) que não condiz com a realidade de nossas vidas e muito menos com a natureza do Evangelho. Há muitas pessoas que sofrem por causa deste estoicismo estranho à Bíblia. Paulo mesmo, ao longo de suas cartas, fala naturalmente de seus sofrimentos. Jesus não escondeu sua angústia ante à iminência da morte.
2. O QUE HOUVE COM TIMÓTEO?
O que estava acontecendo com Timóteo?
Paulo não apresenta detalhes, mas estava preocupado. Pelo que sentia, Timóteo precisava reavivar o dom que recebera de Deus.
O verbo aqui empregado (despertar/reavivar; desperte/reavives) significa manter a chama do fogo incandescente. Para despertar seu dom, Timóteo precisava reacender o fogo que estava se apagando. Por alguma razão, Timóteo estava se esquecendo que o Espírito Santo habitava nele (v. 14). Por algum motivo, Timóteo estava se esquecendo que recebera um dom de Deus, simbolicamente transmitido pela imposição de mãos.
Como esquecemos da alegria de nossa conversão! Como esquecemos da felicidade do batismo! Como permitimos que essas lembranças prazerosas, feitas de risos ou lágrimas, se apaguem, às vezes completamente de nossas memórias..
Não sabemos por que isto aconteceu com Timóteo.
Talvez a sua saúde frágil o tenha enfraquecido globalmente. De tanto lutar contra suas dores no estômago, talvez estivesse cansado de viver. Talvez, nos momentos de crise, ele tenha orado para que Deus viesse em seu socorro e pusesse fim à sua aflição; e, como Deus não lhe respondesse do modo como queria, talvez Timóteo estivesse desanimado, quem sabe decepcionado!, com Deus.
Uma adolescente brasileira foi passar um ano nos Estados Unidos como parte de um programa de intercâmbio. A sua família ficou muito feliz porque seus hóspedes eram cristãos. Quando chegou lá, soube de algo trágico. A única filha deles tinha morrido. Daí em diante, aquela família brigou com Deus. Toda manhã de domingo, seus pais hospedeiros levavam a brasileira até à porta da igreja deles, mas não entravam. Naquele ano, nunca entraram.
Recentemente, uma família carioca perdeu a sua filha em circunstâncias trágicas. Uma senhora crente foi consolar o pai dela. Sua resposta foi:
— Eu não quero saber de Deus. Tudo o que Deus podia fazer pela minha filha, que era preservar a sua vida, Ele não fez. Agora, nada mais interessa, nem mesmo Ele.
Há muita gente decepcionada com Deus.
Paulo estava preocupado com Timóteo, temeroso que seu filho adotivo estivesse entrando num processo de desânimo ou que já estivesse desanimado. Por isto, o apóstolo lhe pede para não esquecer, fossem quais fossem as circunstâncias, que o Espírito Santo habitava nele.
A recomendação vale para cada um de nós. O Espírito Santo habita em você. Por isto, você pode guardar o depósito da fé em Deus até o final de sua vida.
3. O QUE ESTÁ ACONTECENDO CONOSCO?
E nós: por que permitimos que o dom se apague? Por que nos esquecemos que o Espírito Santo habita em nós?
Certas coisas acontecem conosco — o desânimo, a descrença, a falta de compromisso com a santificação, a falta de envolvimento no projeto de Deus para o mundo — porque nos esquecemos que o Espírito Santo mora em nós. Ah! se nos lembrássemos! Nossas vidas seriam mais felizes! Que religião é esta em que o Deus — que nas outras religiões habita em lugares diferentes e exige tantas voltas no acesso a ele — habita com/nas pessoas? Será que Ele é um Deus fácil demais? Será que não estamos querendo um Deus difícil, ao qual, por exemplo, só se pode ter acesso uma vez por ano e não a toda hora ou a todo domingo?
Então, comecemos por oferecer algumas respostas a esta pergunta: o que tem apagado o nosso dom, que está precisando ser reaceso? Eis quatro delas:
3.1. As pressões da vida
Não tem sido fácil viver. Os pobres, os da classe média e os jovens têm sido muito sacrificados.
Os pobres têm sofrido com a indigência dos serviços públicos básicos nas áreas da saúde, da educação e da segurança, bem como com as crônicas dificuldades de alimentação e de moradia.
Os da classe média têm perdido acesso a bens e serviços, com seus salários congelados, diante de preços que continuam subindo em áreas que lhe são importantes. Pagar todas as contas no mês em que vencem é privilégio de poucos.
As maiores vítimas — e isto tem muito a ver com Timóteo — são os adolescentes e os jovens. Eles têm um mundo para conquistar, mas não conseguem emprego. Quando conseguem um estágio remunerado, que deveria ser automático em suas vidas, soltam foguetes, que espantam os que ficaram de fora na fila. Para muitos, o horizonte é sair do país.
Nestas condições, somos chamados a dar testemunho acerca do poder de nosso Senhor (v. 8). Nós, que estamos precisando de alento, é que temos que confortar os outros. Nós, que queríamos ver este poder, é que temos de falar dele. Vem destas circunstâncias parte de nosso desânimo, especialmente quando nós vemos o que o salmista viu: o ímpio prosperando (Sl 37). Ai! como dói ver o incrédulo prosperar!
Essas pressões vão além do plano material e alcançam o plano moral. Penso, de novo, nos adolescentes e jovens.
Uma menina feliz com seus pais anda triste porque não tem um namorado. Falta algo em sua vida. Na Igreja não tem ninguém que se interessa por ela e ela não se interessa por ninguém. Ela tem amigos na escola, mas não participa dos seus programas. Então, ela resolve se aproximar um pouco mais. Os garotos também se aproximam. As conversas são um pouco estranhas, mas ela se mantém firme nas suas convicções. Um encontro aqui, outra festa ali, um passeio em outro dia. Um rapaz chega mais perto. Ela até o leva em sua casa. Ele, então, se abre: não fala em amor, mas fala em sexo. Ela se afasta, mas a história se repete com outro rapaz. Moral da história: ela não faz parte da turma. Não é melhor fazer parte? Será que não vou ficar sozinha para sempre? Será que estou certa nos meus valores?
A pressão é enorme e, às vezes, apaga o dom, e isto se aplica aos solteiros e às solteiras que querem construir uma família, aos viúvos e às viúvas que não querem ficar sozinhos, aos separados e às separadas que querem recompor suas vidas afetivas. A solidão machuca, abafa e abala.
3.2. Os sofrimentos da vida
Nosso dom se apaga quando experimentamos aquilo que consideramos o silêncio de Deus, quando oramos e não ouvimos a resposta. Por algum tempo nos consolamos com o ensino de que Deus tem o seu tempo. Depois, nos cansamos de esperar.
Sabemos que precisamos orar pelo nosso filho, afastado de Deus, mas por quanto tempo?
Um dia desses ouvi a história de uma filha que nunca desistiu de orar pelo seu pai, afastado da família e de Deus. Ela orou muitos anos seguidos. Um dia desses eu me encontrei com este homem, que pediu perdão aos seus e ao seu Senhor e está sinceramente disposto a começar a viver e a permitir que sua família também viva em harmonia.
Sabemos que precisamos orar pela saúde das pessoas queridas, mas até quando? Oramos pela saúde de pessoas e elas morrem. Oramos pela recuperação de pessoas e elas continuam sofrendo. Isto nos cansa e nos debilita. Afinal, nossa fé é para todas as áreas da vida. Deus não é só para a vida religiosa, mas para a vida toda.
A pergunta inevitável é: vale a pena servir a um Deus dEste? Paulo, como que para testar seu filho-na-fé, faz-lhe um convite, ele que sofria a prisão: vem sofrer comigo, Timóteo (v. 8).
3.3. O cansaço da igreja
<II>Por vezes, na igreja sobram línguas, para criticar destrutivamente, e faltam braços, para fazer.
<FI>Precisamos de um ministério específico para casais, especialmente para jovens casais, de solteiros e casados. Temos procurado motivar pessoas e vamos começar um programa em agosto. Certamente, quando começarmos, não faltarão aqueles que dirão que fariam diferente, aqueles mesmos que nunca se apresentaram para fazer. Os que estiverem fazendo terão que ter muita convicção para não permitirem que o dom seja apagado.
<IS=SL>Veja como está você e se aliste no grupo que usam seus braços para trabalhar, nunca a língua para destruir.<FS>
<II>Por vezes, na igreja sobram dedos, para apontar os erros dos outros, e faltam ombros para sustentar os que querem ficar firmes.<FI>
A tendência humana competitiva também grassa na igreja, de modo que o fracasso de um é discretamente comemorado. Quando se confirmam as direções dos nossos dedos, em lugar de chorar, preferimos dizer: “não falei?”.
Se uma pessoa errou no passado é porque vai continuar errando. É triste saber que há pessoas que têm de trocar de igreja para recomeçar suas vidas. Deus já as perdoou, mas, muitas vezes, nós não perdoamos.
<IS=SL>Veja como está você e seja um ombro para quem precisa.<FS>
<II>Por vezes, na igreja sobram olhos, para ver as brechas, e falta disposição, para tapar uma dessas brechas.<FI>
Em outras palavras, por vezes, na igreja sobram lépidas pernas, para escorregar dos compromissos, e falta vigor para se por a caminho. Nós somos capazes de fazer belos diagnósticos, identificando os problemas da igreja. No entanto, nós nos esquecemos que, quando não nos empenhamos na solução dos problemas, nós somos os problemas.
<IS=SL>Veja como está você e se disponha a se pôr na brecha, para ser usado por Deus, para reparar a iniqüidade.<FS>
<II>Por vezes, na igreja sobra cérebro, para discutir temas irrelevantes, e falta inteligência e criatividade, para encontrar soluções novos para um tempo novo que tem as carências de sempre.<FI>
Como perdemos tempo com coisas sem importância!
<IS=SL>Veja como está você e empregue sua inteligência para discutir soluções criativas para os problemas da igreja no alcance ao mundo.<FS>
Enfim, <II>por vezes, na igreja sobram palavras, palavras de compreensão e entendimento, e faltam ações, ações de compreensão e entendimento<FI>.
Jesus recomenda (Mt 18.15) que, quando tivermos alguma informação sobre um irmão, nós temos que ir a ele, para saber o que está acontecendo e ajudá-lo, se for possível. No entanto, achamos que a maneira de ajudar este irmão é espalhar a informação que temos dele a um amigo mais íntimo, que o divulga para outro irmão mais íntimo, que pede oração a um grupo intimo. Quando o irmão-vítima fica sabendo, ele esclarece que não é nada daquilo, mas já não é mais possível recolher as penas lançadas do alto da montanha…
Este irmão, certamente, será um que terá que lutar muito com Deus para que o dom não seja apagado por um cristianismo teórico demais nas intenções boas e prático demais nas realizações más..
<IS=SL>Veja como está você e se integre no exército dos que se empenhar em entender, compreender e amar.<FS>
Por isto, e por outros fatores, há muita gente cansada de igreja, gente que logo ficará cansada de Deus, gente que logo se afastará de Deus, às vezes, irremediavelmente.
Há gente cansada por ter feito muito e acabou sufocada pela incompreensão e pela crítica. Há gente cansada por não ter feito nada. Há gente que se cansou de sua própria acomodação.
Há gente cansada de esperar atitudes coerentes.
3.4. Cansaço de Deus
Há gente cansada de Deus, embora raramente o confesse, porque o acesso a Ele é fácil demais.
Nosso Deus está disponível 24 horas por dia. Não há qualquer exigência para se falar com Ele. Não há um local especial em que se fala com Ele. Jonas falou de dentro de um peixe. Elias falou com Ele do interior de uma caverna. Moisés falou com Ele do centro de um deserto.
Não há uma posição para se falar com Ele. Pode ser em pé. Pode ser deitado. Pode ser ajoelhado. Pode ser com as mãos para cima. Pode ser com as mãos para baixo. Podemos falar com Ele olhando para o céu. Podemos falar com Ele olhando para o chão.
Banalizamos Deus por ser Ele gracioso demais! Que contra-senso, como se preferimos um deus aterrador e pavoroso!
Isto alcança os convertidos em idade adulta e alcança os que nasceram no Evangelho, com o passar do tempo. Parece que alguns que nasceram no Evangelho sentem saudade de um tipo de vida que nunca tiveram. Há quarentões ou cinqüentões adolescendo! É ridículo, mas acontece.
Há gente esquecida de sua salvação e de sua santa vocação (v. 9). Há muita gente triste com a sua salvação, por estranho que pareça. Se somos salvos e estamos cansados, é porque esquecemos que somos salvos ou porque a salvação produz tristeza em nós. Na verdade, na linguagem do salmista, falta a muitos a alegria da salvação (Sl 51.12), alegria que produz uma adoração vibrante, alegria que produz uma vida ativa porque cheia do dom.
<IS=SL>Veja como está você e pare de banalizar a Deus. Viva-o como um Deus compassivo e também zeloso da Sua santidade e da santidade dos seus seguidores.<FS>
4. A NATUREZA DO DOM
<II><FI>Que dom é este, de que fala o preocupado apóstolo Paulo?
4.1. Dom e espírito
Há aqui duas palavras essenciais: dom e espírito.
O dom (<ii>carisma<fi>) é uma concessão (dádiva) de Deus ao homem. É a transferência de parte de seu caráter ao ser humano. Nós temos o carisma de Deus.
Este dom nos capacita com o espírito de poder, amor e moderação.
Espírito, aqui, sempre no singular, não tem nada a ver com um certo uso, em que se fala em “espírito da preguiça”, “espírito da doença X”.
A palavra espírito (<II>pneuma<FI>) se refere ao sopro de Deus sobre nossas vidas, capacitando-nos para fazer aquilo que o dom de Deus necessita para se exercitar em nós.
O apóstolo Paulo fala também em imposição das mãos, experiência pela qual Timóteo passou havia alguns anos. Não foi um gesto mágico, a partir do qual o rapaz passou a ser outra pessoa. Ao contrário, mesmo tendo recebido o dom, este dom precisava ser reavivado. Os gestos formais são apenas símbolos do que acontece no interior. Todos quantos aceitaram a Cristo como Senhor e Salvador têm o dom de Deus, dom que pode ter se transformado num carvão apagado ou num fogo incandescente.
4.2. O dom que nós queremos
Há uma contradição entre o poder, o amor e a moderação que o dom de Deus nos sopra (<II>pneuma<FI>) e o poder, o amor e a moderação que nós queremos que Ele sopre.
O PODER que nós naturalmente queremos é o poder de fazer Deus fazer o que nós queremos, não o de fazermos o que Ele quer. Religião não é magia. Nós podemos orar, mas não podemos fazer o que só Deus pode fazer.
Um dia desses, fui procurado por uma pessoa com um agudo problema de saúde. Ele queria que eu o curasse. Chegou a oferecer dinheiro, o quanto fosse necessário, para que ficasse bom. Eu, então, lhe disse:
— Eu não posso curá-lo. Eu posso pedir a Deus que o cure. Eu não tenho poder para curá-lo. O poder é de Deus. É Ele quem decide.
Já pensaram se eu tivesse este poder? No domingo seguinte, eu chegaria aqui, todo falsamente humilde, e diria:
— Devemos dar graças a Deus porque Ele operou na vida de uma pessoa que me procurou. Eu orei e a pessoa foi curada. Louvado seja Deus, irmãos.
Eu diria assim, mas no fundo, eu pensaria: “Como eu tenho poder!”. Os irmãos pensariam de mim: “Como eu gostaria de ter este poder que o nosso pastor tem!” Se eu tivesse esse poder, esse templo iria transbordar de gente.
Graças a Deus, eu não tenho este poder de fazer Deus fazer.
O AMOR que nós naturalmente queremos é o amor centrado em nós, não aquele de Jesus, auto-esvaziado de si mesmo.
Pensamos neste dom do amor como o dom de sermos amados, nunca como o dom de amar. Sempre pensamos no amor como uma flecha que vem em nossa direção.
Como é bom saber que somos amados por Deus. Esta é uma verdade que ninguém nos pode tirar, nem mesmo a tristeza. Ele nos amou tanto que tomou a ridícula decisão de morrer por nós numa cruz mal trançada de madeira vagabunda, sobre um morrinho de nada. A morte dele não foi, como deveria ser, uma superprodução. Ele não contratou Steve Spielberg para produzir sua morte. Ele morreu longe dos holofotes, para poder alcançar nossos corações.
Como é bom saber que somos amados por Deus que nos dá o Seu Espírito para ser nosso intérprete e consolador. Por causa deste amor, podemos até não saber pedir, que Ele transforma nossos pedidos mal formulados em pedidos claros. É por causa deste amor que este Espírito habita nos nossos corações. Que verdades cheias de calor.
Este é o amor que queremos, mas este amor só vai funcionar quando ele for uma usina que gera energia para fora de nós. A retenção deste amor faz com ele vá se apagando, às vezes na velocidade da luz de uma estrela.
A MODERAÇÃO que nós naturalmente queremos é a moderação de sermos julgados pelos outros, não a de os julgar.
Agimos como na frase de um político mineiro:
— Para os amigos, tudo; para os adversários, a lei.
Queremos ser julgados como amigos, mas queremos julgar como se julga a inimigos. Para nós, exigimos moderação. Em relação aos outros, nós nos sentimos livres exercer nosso juízo sem moderação.
4.3. O dom que Deus nos oferece
O espírito de Deus é espírito de poder e amor e moderação:
. espírito de poder para viver, apesar das adversidades, e para testemunhar, apesar das pressões e nós mesmos;
. espírito de amor
. e espírito de moderação para reagir com emoções adequadas às situações, para ser inteligentemente objetivo nas ações.
O ESPÍRITO DE PODER (<II>dunamis<FI>) que Deus nos dá é o poder para viver, apesar das adversidades, e para testemunhar, apesar das pressões e de nós mesmos.
O dom de Deus nos capacita com o poder de enfrentar as ondas de dificuldades da vida. O poder de Deus não se manifesta necessariamente em tirar os problemas de nossa frente, mas principalmente em nos fazer triunfar sobre eles.
O dom de Deus nos capacita com o poder de superar nossas próprias limitações, principalmente a limitação da covardia, do medo e da timidez. Os tímidos, inclusive no plano psicológico, precisam receber o poder de Deus para explodir. Enquanto não receberem esta dinamite espiritual, não vão sair das cavernas que são suas vidas, para os montes em que deveriam ser.
O dom de Deus nos capacita com o poder da coragem para ousar o que deve ser ousado, tanto no plano espiritual quanto no plano profissional. Não tenhamos medo, que não provém de Deus. Muitos crentes têm medo de usar seus dons, e assim testemunhar de Deus, porque receiam o ridículo, a zombaria, a crítica, a oposição e a violência. Deus nos equipa e seu equipamento não inclui o medo. Se estamos ansiosos, se estamos apavorados, estes sentimentos não vêm de Deus a quem chamamos de “Pai”.
O Espírito Santo nos infunde o espírito do poder quando começamos a testemunhar (viver por/para Cristo), nunca antes. Para que ter poder, para ficarmos silenciosos acerca de Cristo?
O ESPÍRITO DE AMOR <ii><fi>que Deus nos dá é o amor-<II>ágape<FI>, que surge na mente e na vontade e se realiza nas emoções. Este tipo de amor é um dom de Deus, porque só Ele o tem naturalmente, nós o recebemos dEle sobrenaturalmente. Só Ele o tem, mas Ele no-lo dá.
Sua primeira manifestação, portanto, é receptiva. Deus nos dá o espírito de ser amado por Ele. A timidez age aqui também sobre nós, impedindo que aceitemos este amor.
Este amor em nós é produtivo, no sentido que nos impulsiona para fora de nós mesmos, em direção a Deus e ao outro. O amor que Deus nos dá é o amor que se esvazia de si mesmo, como Seu Filho fez. É o amor que não existe na troca (dar-receber). Isto está contra a nossa natureza, contra os nossos genes.
É este amor-entrega a Deus que faz o servo de Deus se dispor a sofrer as conseqüências do poder do Evangelho em sua vida.
É este amor-auto-esvaziado que nos impulsiona a amar as pessoas, mesmo os inimigos.
Se alguém pudesse me interromper, gritaria:
— Alto lá, pregador. Você está sendo teórico demais, poético demais.
Pois eu respondo, não temos amado deste modo, mas nós temos o poder de amar assim, porque Deus no-lo deu. Não é Ele o teórico: somos nós.
E só não somos práticos porque temos medo, embora saibamos que o Pai não nos legou com o espírito da covardia. Não precisamos ter medo de amar, porque temos o dom de amar como o Pai nos ama, como Seu Filho nos ama, como Seu Espírito nos ama.
O ESPÍRITO DE MODERAÇÃO (<II>sofronismou<FI>) que Deus nos dá pode ser pensado em muitas direções. Temos a força e temos o amor. O que nos falta?
Falta-nos sabedoria para pôr o poder e o amor em ação. <IS=SL>Faltava<FS>, porque Deus também nos deu este espírito de sabedoria, moderação, equilíbrio.
Ser moderado é controlar as emoções, quando devem ser controladas, é liberar as emoções, quanto devem ser liberadas. Ser moderado não é ser contido, mas ser equilibrado. Ser equilibrado não é ser fechado, fleugmático, para dentro; é ser aberto; é ser capaz de caminhar por entre os extremos.
Moderação também é a capacidade que Deus nos dá para julgar os outros do mesmo modo que queremos ser julgados. Como gostamos de julgar! Como achamos corretos os nossos julgamentos! Como gostamos de não ser julgados! Como achamos que os julgamentos dos outros sobre nós não são corretos! Por isto, precisamos do espírito de moderação.
Moderação é ainda a capacidade que Deus nos dá para discernir o tempo e as coisas, de modo a poder decidir e agir com prudência, na hora certa e sem precipitação. Como é difícil a moderação! Como é fácil falar na hora de calar! Como é fácil comprar na hora de poupar! Como é fácil calar na hora de falar! Como é fácil guardar na hora de gastar! Precisamos do espírito de moderação.
Moderação é também a capacidade que Deus nos dá para persistir nas causas que abraçamos, sejam elas profissionais, familiares ou eclesiásticas. Na cultura do fácil, desistimos quando o bom é difícil e duro, esquecidos que o melhor é sempre o mais difícil. Precisamos de disciplina própria, que nos faça ter método e paciência para alcançar os alvos que elementos para nossas vidas. Graças a Deus que Ele nos dá o espírito da moderação.
Assim, quem tem poder (força), amor (que é derramamento) e moderação (que é sabedoria de vida), de que mais precisa?
5. COMO REAVIVAR O DOM
Em relação aos dons, há três tipos de crentes:
. há os que mantém o entusiasmo do dom, palavra que, no original antigo, significa ter Deus dentro de si. Esses cristãos têm o dom, sabem que têm o dom e vivendo segundo o poder deste dom.
. há os que diminuíram a força do dom. Esses cristãos têm o dom, sabem que têm o dom, mas têm mantido o fogo do dom em chama branda. Seu calor é o calor de uma estrela distante, da lua noturna, nunca do sol radiante.
. há os que permitiram que o seu dom fosse apagado. Esses cristãos têm o dom, mas já não sabem que o têm. É como se não o tivessem mais.
Quem está com o dom aceso ore para que Deus mantenha o seu calor, como uma usina que gera energia e luz.
Quem está com o dom em banho-maria ou apagado peça a Deus para seja reaceso. O crente não pode deixar que seu fogo se apague.
Como reavivar o dom?
Há dois tipos de compromissos para a manutenção do nosso dom. Um no plano da memória e outro no plano da disposição.
5.1. Projeto-memória
No plano da memória, precisamos:
. lembrar que um dia recebemos o dom de Deus (v. 6).
Quando nos salvou, Deus nos deu parte do seu caráter. Na conversão, nós fomos separados para viver segundo a vontade de Deus, não mais segundo a nossa. E isto não aconteceu por causa de nossas ações, mas apesar delas. O dom nos foi concedido segundo o propósito e a graça de Jesus Cristo (v. 9). Não foi algo que conquistamos e do qual podemos abrir mão. Nós é que fomos conquistados por Quem não abre mão de nós. Deus <II>se manifestou<FI>, em nossas vidas, <ii>pelo aparecimento de nosso Salvador Cristo Jesus, o qual destruiu a morte e trouxe à luz a vida e a imortalidade pelo evangelho.<fi>
Não podemos esquecer disto. Se esquecemos, permitimos que o dom se apague. Se lembramos, permitimos que o dom continue aceso.
. lembrar o conteúdo deste dom, que é de poder, amor e moderação (v. 7)
Quando nos sentirmos fracos, lembremos que temos o espírito de poder (força) de Deus, apesar dos escombros dentro de nós e ao nosso lado.
Quando nos sentirmos sós, lembremos que temos o amor desinteressado de Deus por nós a nos fazer companhia.
Quando nos sentirmos desorientados, lembremos que temos o espírito de moderação, que nos capacita à caminhada na vida, em meio a tantas decisões graves e urgentes.
5.3. Projeto-disposição
No plano da disposição, precisamos:
. nos dispor a viver intensamente a vida cristã, pois esta é a nossa santa vocação (v. 9).
Todos somos chamados ao testemunho. Timóteo era pastor. Paulo era pregador, apóstolo e mestre (v. 11). E você, é o que?
A maioria dos crentes não sabe quais são seus dons. Por isto, precisam ler e praticar o ensino de Paulo, como indicado em Romanos 12.3-8; 1 Coríntios 12.4-11; Efésios 4.7-16. Nestes textos, temos várias listas, nunca exaustivas, nem conclusivas, todas para lembrar que sem o exercício dos dons não há dons. No Novo Testamento, aprendemos que os dons espirituais são os dons com que o Espírito Santo equipa o crente para seu ministério no mundo.
Qual é o seu dom? Quais são os seus dons? O que você tem feito com ele(s)?
Se você é um crente, você tem pelo menos um dom. Trate de descobri-lo(s) e aceita-lo(s), como um dever e um privilégio.
. nos dispor a trabalhar pelo Evangelho, que é a forma de experimentarmos o poder de Deus.
O convite do apóstolo ao filho foi preciso: Timóteo, <II>participa comigo dos sofrimentos do evangelho segundo o poder de Deus<FI><FI> (v. 8) É como Paulo lhe estivesse passando a tocha olímpica. Por isto, posso perguntar aos mais velhos: Que Cristianismo estão passando aos mais jovens?
Posso também perguntar aos mais jovens: Que disposição tem vocês para de levar a tocha do Evangelho de Cristo?
. nos dispor a mudar de um estilo apagado para um estilo vibrante; de um estilo dependente de si mesmo, para um estilo dependente de Deus. Como escreveu C.S. Lewis, não existe felicidade e paz independentes de Deus.
A vida cristã tem que ser um brado de vitória, porque a vida cristã começa com o brado de vitória sobre as trevas, trazendo-nos a luz, sobre a morte, trazendo-se a imortalidade (v. 10). Não podemos permitir que as trevas e morte cantem vitória sobre nós.
Ser cristão significa que somos pregadores de Deus, isto é, mensageiros de uma mensagem que não é nossa, mas de Deus. Anulamos o nosso dom, quando passamos a proclamar um e<IS=SL>u<FS>vangelho, não o Evangelho. Nosso fracasso decorre em esquecermos que somos portadores do poder de Deus, não do nosso. Nossa vitória decorre em depender de Deus, nunca de nós mesmos, jamais dos valores correntes do nosso tempo.
Ser cristão significa que somos enviados a pessoas que nós não escolhemos, a pessoas que Deus escolheu. A igreja fracassa quando ela se envia a si mesma, quando foi constituída para ser enviada por Deus ao mundo. Uma igreja, em que os seus membros trocam gentilezas e servem uns aos outros, não é uma igreja. É um clube. E clube ruim, porque envergonhado.
Ser cristão significa que somos comissionados como mestres, prontos a ensinar com dedicação, nunca com superficialidade, acerca do poder de Deus. Um evangelho superficial, que não incomoda os crentes e não desafia os descrentes, não é um evangelho. É uma filosofia. E filosofia ruim, porque desviada de sua rota e porque longe de sua raiz. Permita-se incomodar pelo Espírito Santo, seja para ser convencido do pecado, seja para ser capacitado por Ele para ser testemunha do poder de Deus.
6. CONCLUSÃO
Se você não está usando o dom de Deus, está desperdiçando sua vida.
ISRAEL BELO DE AZEVEDO