A SINOPSE — Capítulo IV (Ignacio Resende)

Tendo sido expedidos os convites para as autoridades religiosas e as redes de televisão, o Professor Hasselman e o Mestrando Otávio tinham, agora, a grande tarefa de
(i)    Continuar as pesquisas no Rio e em Petrópolis em busca de informações que pudessem dar maior consistência às importantes descobertas;
(ii)    Escrever a sinopse que seria analisada pelas autoridades religiosas e que, depois de consistida, seria entregue à melhor proposta financeira que viesse a ser apresentada por uma das redes de televisão convidadas.
As suas pesquisas tanto no Museu da Quinta da Boa Vista quanto na Biblioteca Nacional levou-os a novas informações, notadamente, as que se seguem:
a)    Foi encontrado um novo caderno, tão envelhecido como o anterior, contendo em sua capa o título “Busca do Mestre Antonio e Decifração das Tabuinhas 12 a 20”;
b)    Na Biblioteca Nacional, uma biografia do Rei Pedro III, com inúmeras anotações sobre a vida palaciana, as intrigas, as obras, as conquistas, as navegações, e um capítulo que tratava do “Desentendimento com o Papa sobre as Descobertas de Harã”.
Esses documentos foram lidos e à falta de tempo para novas pesquisas passaram a dedicar-se à Sinopse, agora, com apenas três dias para que fosse escrita e submetida à apreciação do Reitor Angelo Tavares.
A responsabilidade que pesava em seus ombros deixava-os tensos e muito preocupados com a fidelidade e a qualidade do que lhes cabia informar. Sentiam-se como “arautos” de verdades que os fascinava e que, ao mesmo tempo, exigiam que fossem apresentadas de modo a que mantivessem o constante interesse dos leitores durante toda a narração. Depois de várias tentativas concluíram que a Sinopse teria o título:
 “As Cem Tabuinhas de Harã e seu Testemunho do Período Pré-Diluviano”; “Autor: Abraão, filho de Terá, descendente de Noé”; “Abrangência: da Criação do Homem ao Dilúvio (1.656 anos)”.

1.    Os Patriarcas

Seguramente seu pai Lameque e seu avô Matusalém estariam com Noé na arca, pois, eram homens justos e retos. No entanto, morreram cinco anos e no ano do dilúvio, respectivamente, conforme declarou Noé na tabuinha número 19. Noé era grande admirador deles, com os quais manteve inumeráveis conversas e nas quais ouviu muito a respeito dos Patriarcas, pois, acompanharam a maioria das suas vidas, uma vez que Matusalém conviveu com Adão nos seus últimos 243 anos.
Abraão escutava Noé da mesma forma que este escutara seu pai e seu avô. E anotava tudo em sua mente prodigiosa. Aliás, os Patriarcas foram dotados de uma inteligência intrigante, a partir da perfeição com que Adão foi concebido e criado pelo próprio Deus, embora, tenha sofrido certa redução por causa do pecado! E Abraão, recebera de Deus mente tão prodigiosa quanto à de seus ancestrais!
Em uma das tabuinhas, a de número 13, dentre as que já haviam tido acesso, através da decifração empreendida pela equipe do Professor Rodolfo, foi possível conhecer algumas características da notável inteligência de Adão, de Eva, e de seus descendentes. Enumerá-las todas nesta Sinopse seria antecipar os fatos, diante de que está sendo escrita com o único propósito de informar as revelações já disponíveis e, ainda, faltam muitas tabuinhas para que seja conhecido todo esse período ainda tão obscuro.
Podem ser citadas:
a)    Os nomes dados aos animais por Adão não foram aleatórios e, sim, relacionados ao seu modo de vida, o que exigia observação e profundo conhecimento linguístico; como exemplo: “hipopótamo” significa “cavalo dágua” e esse é, realmente, um animal forte e esse é o seu modo de vida;
b)    O sistema de numeração que utilizavam era sexagesimal, o qual foi trazido por Noé e que foi amplamente usado pelos babilônios e, hoje, como remanescente, é usado na medida de horas e de ângulos;
c)    A engenharia de construção de embarcações somente foi superada no século XVIII da era cristã, quando foi construído um navio maior que a arca de Noé;
Na metalurgia dominaram a obtenção do ferro, do cobre, do estanho e das ligas como o bronze, esta uma liga que exigiu inúmeras experiências até que fosse encontrada a proporção exata de cobre e de estanho para a obtenção das características que chegaram aos dias de hoje!

2.    O surgimento das cidades

A Segunda Lei da Termodinâmica ensina que “o universo caminha de sistemas organizados para sistemas cada vez mais desorganizados”. Noé gostava muito de comentar sobre as primeiras cidades construídas, depois do dilúvio, e o seu primitivismo organizacional diante da perfeita concepção das cidades pré-diluvianas do primeiro período, construídas por iniciativa dos Patriarcas. Elas, em sua opinião, eram soberbas, pois, concebidas e discutidas antes que fossem iniciadas. Seu traçado básico era hexagonal, imitando os favos das colmeias. Sim, dizia, buscava-se para a vida cotidiana, a perfeição da criação! É claro que há necessidade de lembrar que houve dois períodos típicos: o primeiro, antes que a maldade se alastrasse completamente entre as pessoas e o segundo, depois que a humanidade se transformou atingindo um nível tal de maldade que levou a que Deus concluísse pela necessidade de sua extinção. Tomando como modelo o primeiro período em que houve urbanidade e no qual os descendentes dos Patriarcas viviam em excelente nível de relacionamento, podem ser enumerados os seguintes princípios gerais que norteavam a construção de qualquer cidade, fosse à beira-mar, junto a um rio ou a um lago:
(i)    Geograficamente, a cidade era instalada em terreno plano, mesmo que em um planalto;
(ii)    A população era limitada a cerca de 25.000 habitantes e essa limitação era rigorosamente observada para evitar que o seu entorno perdesse a capacidade de produzir alimentação em qualidade e quantidade de modo que não existisse fome. Vale lembrar que todos eram vegetarianos;
(iii)    As construções eram de um único pavimento, admitindo-se dois pavimentos no “favo” onde se instalavam os prédios administrativos e de ensino;
(iv)    Os postos de trocas de mercadorias e de animais distavam entre si cerca de dois mil côvados (um côvado tem em média 45 centímetros e equivale à distância entre o dedo indicador e o cotovelo de um homem adulto) evitando-se, assim, grandes circulações de pessoas e de animais;
(v)    Cada favo habitacional com cinquenta côvados de cada lado do hexágono permitia que vivessem doze famílias ou até sessenta pessoas. Assim, a cidade era composta de no máximo quinhentos favos ou uma colmeia de seis mil côvados de cada lado, quando quadrada;
(vi)    O interior de cada favo permitia espaço adequado à vida coletiva das famílias e proporcionava área para o desenvolvimento físico e relacional das famílias;
(vii)    Para a sobrevivência dessas vinte e cinco mil pessoas o seu entorno era destinado à agricultura e à pecuária e, portanto, necessitava de uma área mínima de cinco vezes a dimensão da cidade. Assim, as cidades deviam afastar-se umas das outras cerca de sessenta mil côvados;
(viii)    As áreas para preservação dos rios e lagos e para a manutenção das necessidades de suprimento de madeira e vida de animais não domesticados era vinte vezes maior que a destinada à agricultura. 

3.    A Administração

Adão, segundo Matusalém, manteve certa reserva sempre que perguntado sobre a vida no Éden. No entanto, um ou outro comentário seu permitia concluir-se que fora muito feliz, mas, desprezara a vida eterna que lhe fora assegurada, mediante a desobediência a uma condição definida por Deus. Dizia não se lembrar de qualquer período em que não se sentisse adulto. As suas conversas com Deus que lhe falava como a Eva, sempre que juntos, eram “boca a boca”. Não viam Deus, mas, ouviam sua voz. Costumava comentar que a voz de Deus era doce como o mel. Com Deus aprendera o que sabia. Em resumo ouviu diretamente de Deus que:

i)    Olhem o céu: verão muitas luzes. Cada luz que veem é uma estrela. Elas foram criadas em grande quantidade (bilhões): algumas poucas vocês veem, a maioria não veem. Poderão ver um dia, com o auxilio de poderosos instrumentos, os quais permitirei que a ciência vá desenhando ao longo das gerações. Elas foram criadas para a minha glória e as conheço a cada uma delas pelo seu próprio nome! Experimentem dar nomes aos grãos de um punhado de areia, um a um, depois os misture e procurem reconhecer cada um deles pelo nome que recebeu!

ii)    Olhem as arvores: elas são diferentes umas das outras. Algumas oferecem frutas boas para comer; dentre as que estão neste jardim em que vivem que construí para vocês e seus descendentes; uma delas, embora com frutos de boa aparência, não podem ser comidos, pois, se comerem morrerão; outras produzem madeira para diversos usos, por exemplo, esta cabana que ensinei vocês a construir foi da arvore a que deram o nome de gofer: ela é de grande durabilidade, leveza, baixa porosidade e ideal para as construções seja de casas como de embarcações; outras produzem flores que perfumam o ar para que se agradem de as buscarem e assentarem aos seus pés;

iii)    Olhem as montanhas, os rios, os animais, os minerais, etc.: para cada olhar era apresentada a descrição da beleza da criação, de sua finalidade e de sua função para glorificar ao Senhor.

Como o foco deste título do Sumário refere-se à Administração é importante ouvir as lições que o próprio Deus ofereceu sobre alguns aspectos muito enfatizados por Ele:

a)    O administrador deve clamar a Deus por sabedoria e àquele que ouvir habitará seguro, tranquilo e sem temor do mal;

b)    Porque o Senhor dá a sabedoria e de sua boca vem a inteligência e o entendimento;

c)    Ele reserva a verdadeira sabedoria para os retos; é escudo para os que caminham na sinceridade e guarda as veredas do juízo e conserva o caminho dos seus santos;

d)    Será bendito o seu manancial e alegra-se com a mulher da sua mocidade;

e)    O filho sábio alegra a seu pai e o insensato é a tristeza de sua mãe;

f)    A mão dos diligentes vem a enriquecer-se, pois, o Senhor não deixa ter fome o justo;

g)    Quem ama a disciplina ama o conhecimento;

h)    A mulher sábia edifica a sua casa, mas, a insensata, com as próprias mãos, a derruba;

i)    No temor do Senhor tem o homem forte amparo e isso é refúgio para os seus filhos;

j)    A resposta branda desvia o furor, mas, a palavra dura suscita a ira;

k)    O coração do homem pode fazer planos, mas, a resposta certa vem do Senhor;

l)    Melhor é um bocado seco e a tranquilidade do que a casa farta de cereais e de contendas;

m)    O vinho é escarnecedor e a bebida forte, alvoroçadora; todo aquele que por eles é vencido não é sábio;

n)    Mais vale o bom nome do que as muitas riquezas; o ser estimado é melhor do que a prata e o ouro;

o)    Não se fatigue para ser rico; não aplique nisso a sua inteligência;

p)    Para administrar um povo é necessário que o candidato seja analisado a respeito da maneira com que ele administra a sua família.

4.    Outros Aspectos Sociais, Culturais, Históricos e Geográficos

O “Achado de Harã” até agora conhecido através dos cadernos encontrados nos locais pesquisados, onde estão descritas traduções de várias das tabuinhas contidas nesse repositório de cultura pré-diluviana permitem, além do que foi descrito quanto aos Patriarcas, o Surgimento das Cidades e a Administração, que se estabeleçam informações seguras quanto a outros aspectos sociais, culturais, históricos e geográficos desse extenso período da vida humana tão pouco conhecido nos dias atuais. Assim, além dessa Sinopse, será entregue à rede televisiva que oferecer a maior soma para a continuidade dos estudos e a procura das informações que estão faltando, não limitado ao material já disponível, mas, ainda, os resultados que vierem a ser alcançados ao longo dos próximos anos.

5.    O Envelope Lacrado

Para cada representante credenciado pelas autoridades religiosas convidadas foi preparado um envelope lacrado contendo as informações retiradas da tabuinha nº 2.  O envelope com essas informações até, então, não reveladas com a mesma clareza nos livros da Bíblia deveria ser aberto, individualmente, e em isolamento, tendo sido sugerido que essa abertura se desse à noite, em cada quarto.
Depois de lidas as informações, cada representante decidiria sobre a divulgação do seu conteúdo no todo ou em parte, o que facilitaria as avaliações do grupo, no dia seguinte, às 10 horas, em reunião a “portas fechadas”, sem a presença de representante da Universidade de Petrópolis.
Debatidas as questões dogmáticas e as decisões de cada representante, caberá ao grupo concluir por uma única declaração para que seja anexada à Sinopse. Como a Sinopse, depois de avaliada pelos representantes das religiões abraâmicas, será encaminhada à rede televisiva que fizer a maior oferta, o encerramento da Sinopse conterá informações de grande relevância para as religiões envolvidas e, em consequência, para a humanidade.
O conteúdo da tabuinha nº 2, em sua íntegra, ficará lacrado e encerrado em urna guardada no cofre da Reitoria da Universidade de Petrópolis. As cópias, entregues em envelope lacrado, serão destruídas no incinerador da mesma Universidade. Para evitar que sejam copiadas será colocado um guarda à porta de cada autoridade religiosa e em seu quarto não poderá ter acesso a telefone, computador, internet ou outro meio de comunicação.
Dessa forma fica assegurado que o conteúdo global da tabuinha nº 2 somente poderá ser conhecido da humanidade pelo Reitor Angelo Tavares, pelo Professor Hasselman, pelo Mestrando Otávio, ou pelos representantes das religiões abraâmicas se vierem a declarar, em qualquer tempo, a respeito do que conheceram. Uma declaração de sigilo será assinada por cada um dos que tomaram conhecimento do conteúdo integral da tabuinha nº 2. Essas declarações serão encerradas na mesma urna em que será guardado o conteúdo da tabuinha nº 2.