UM NOME QUE SE MANTÉM
Apocalipse 2.12-17
(Da série: Carta à Igreja, 3)
Pregado na Igreja Batista Itacuruçá, em 31.12.1999.
1. INTRODUÇÃO
Nesta terceira carta imaginária de Jesus Cristo, Ele destaca o valor da Verdade e da Santidade diante de um universo de idéias e práticas, nem sempre de acordo com a Sua Palavra.
2. A QUEM SE FALA
A epístola é dirigida aos crentes de Pérgamo (hoje Bergama), localizada a 90 km de Esmirna. A cidade era conhecida por seus muitos templos aos deuses pagãos e aos imperadores romanos.
A preocupação do autor pode ter um outro sentido. Pérgamo era grande produtora de pergaminho. Feito de pele de animal, o pergaminho, inventado, segundo a tradição, pelo rei de Pérgamo, Eumenes II (195-158 a.C.), era o papel da época, meio pelo qual as idéias se difundiam.
Nela estava o trono de Satanás. Possivelmente, a partir do contexto do livro, a expressão decorre do fato de a cidade ser a capital do culto ao imperador em todo o Império. De certo modo, a cidade deu início a este tipo de culto e o mantinha junto com outras idolatrias, como a adoração ao deuses Esculápio e Zeus. O primeiro templo dedicado a um imperador (Augusto) foi edificada nesta cidade em 29 a.C. Esta era, sem dúvida, a grande ameaça aos cristãos, como vimos no contexto de Esmirna (Policarpo), pelo uso da força que se faria para a preservação do culto.
Os pontos de encontro com a nossa época são imensos. Também vivemos numa cultura em que se cultuam diversos deuses pagãos, embora sem o título de deuses, mas assumindo tal função. Igualmente, nosso tempo é de exacerbação das idéias, com o desenvolvimento intelectual sendo colocado no panteão da mentalidade humana contemporânea.
Neste sentido, podemos repetir as palavras de João, segundo o qual o mundo jaz no maligno (1Jo 5.19). Sim, nosso mundo prefere os valores opostos aos valores de Deus. Isto foi verdade no século 20 e o será no século 21.
3. QUEM FALA
Isto diz aquele que tem a espada aguda de dois gumes: Sei onde habitas. (v12b, 13a)
3.1. Quem fala é Jesus Cristo, “Aquele que tem a espada aguda de dois gumes” (12b)..
Entendemos melhor a expressão, lendo Apocalipse 1.17, onde somos informados que, na visão que João teve, saía da boca de Jesus uma espada de dois gumes.
Espada de dois gumes é a imagem bíblica para a Palavra que sai da boca de Deus. Ela tem dois gumes, um para cortar o crânio e alcançar a mente e outro para penetrar o coração e tocar as emoções. É pela Palavra de Deus que nossas mentes aprendem a verdade que jamais seriam capazes de alcançar. Por ela, nós vemos as coisas como as coisas são. É ela que nos motiva a agir. (Stedman)
Neste sentido, ela não volta vazia; ele corta a nossa mente, se o que nos afasta de Deus, é a razão; ela corta o nosso coração, se o que nos afasta de Deus são as emoções. Deus ainda fala hoje, por muitos meios, mas especialmente por sua Palavra impressa. Se Ele nos fala por meios outros, temos que cotejar todas as verdades com a Verdade da Sua Palavra impressa. Ele não a fez imprimir para ficar guardada na poeira de uma estante, mas para ser gravada, versículo após versículo, no interior de cada um de nós.
Por meio da Bíblia, Deus nos fala à mente e ao coração. Não precisamos ter medo dela, embora ela nos corrija. Antes, devemos nos fundamentar nela, se queremos conservar a verdade de Deus conosco. Devemos meditar nela, se queremos que Deus nos fale à alma.
Deixemo-nos penetrar pela espada de dois gumes. Leiamos a Bíblia, começando por amanhã.
3.2. Quem fala é Jesus, Aquele que sabe onde e como vivemos.
Sei onde habitas (v.13a).
Quem fala é Aquele que sabe que travamos uma guerra espiritual contra os pelotões do mal. Ele nos vê na trincheira lutando por Sua verdade, que abraçamos como nossa. Deus conhece o mundo em que vivemos. Ele sabe o quão difícil é ser fiel a Ele. Este “sei onde habitas” quer dizer: “Não fique apavorado, pensando que está sozinho, porque eu estou ao seu lado. Eu sei onde você mora e sei que a barra é pesada. Firme-se em mim”.
Os cristãos que merecem este nome estão sitiados pelo mundo. No entanto, Jesus visita as suas igrejas e as conhece, como conhece as sociedades em que vivem. “Sei onde você habita” quer dizer: “Conheço a trincheira onde você está lutando por mim e você não lutará sozinho. Continue na luta!”.
Quem fala é Aquele que sabe quais são as nossas necessidades. Por estes dias, uma irmã se lembrou de uma mensagem proferida aqui. Nela eu mencionava que uma pessoa me perguntara se Deus se interessava por nossos problemas quotidianos enquanto estourava uma guerra fratricida na Bósnia. Quando essa nossa irmã passou por uma dificuldade, ela disse que Deus lhe ajudaria a superar a adversidade, ao que uma pessoa fez a mesma observação. A irmã, então, me disse que se lembrou desta referência. Eu lhe perguntei como terminou a história. O problema foi resolvido.
Embora não seja muito racional um Deus se preocupar com nossos problemas, o fato é que Ele se ocupa. A Bíblia nos diz que Ele se importa. Nossa experiência de vida confirma que Ele se interessa.
4. O QUE SE FALA
4.1. Positivamente
Sei onde habitas, que é onde está o trono de Satanás; mas reténs o meu nome e não negaste a minha fé, mesmo nos dias de Antipas, minha fiel testemunha, o qual foi morto entre vós, onde Satanás habita (v. 13).
As duas qualidades dos cristãos de Pérgamo eram reter o nome de Deus e manter a fé mesmo na adversidade. O próprio enunciado destas virtudes indica o caráter de Deus e o nosso: Deus reconhece nossos méritos e não somos uma nulidade. Ele nos fez como os mais lindos poemas de sua grande criação (Sl 8.5; Ef. 2.10).
Aqueles cristãos retinham (conservavam) o nome de Jesus. Seu nome é Ele mesmo. Diante do perigo próximo, Pedro negou conhecer a Jesus. Há várias formas de negação do nome de Jesus. Ao tempo pós-apostólicas, uma é ser traditore. Um dos testes que os romanos pediam a um cristão era entregar ou destruir porções (geralmente cartas e evangelhos) da Bíblia. Quem negava era chamado de traditore (traidor), mas recebia das autoridades um certificado de que não era seguidor de Jesus. Que triste certificado. Ainda hoje há pessoas que parecem portar este certificado. Suas palavras e ações jamais indicam que é um cristão. Quando alguém fica sabendo, é uma enorme tristeza. Quem procede assim está negando ao seu Senhor.
Os cristãos de Pérgamo foram aprovados no teste, não no teste romano, mas no teste de Cristo. Como eles, você retém o nome de Deus? Você merece receber de Cristo este elogio?
Aqueles cristãos se mantinham fiéis. Eles assim procederam mesmo quando passaram por uma enorme perseguição, de que Antipas era um exemplo dessa fidelidade. Segundo a tradição, este cristão foi assado vivo sobre um touro incandescente. Este foi o preço que ele pagou.
Certamente muitos achavam ridícula a sua fé em Jesus como Senhor e Salvador, estranhas as suas convicções éticas, fanático o seu apego à verdade. Ele, entanto, se manteve fiel. Os seguidores do culto imperial o condenaram à morte, esperando com isto dissuadir os cristãos do seu caminho, mas não conseguiram: eles permaneceram fiéis.
Precisamos hoje desta coragem, não só neste tipo de adversidade, mas em todos os outros tipos, até mesmo naquelas de caráter mais pessoal.
Que fazer diante de uma bênção tão esperada e não recebida? Abandonar a fé, porque ela não vale a pena? Que fazer diante de uma derrota no plano profissional? Abandonar a Jesus, porque ele não o socorreu? Que fazer diante de uma doença insistente e persistente? Abandonar a Deus, porque Ele não foi o médico dos médicos? Que fazer quando a tristeza parece a única certeza da vida? Abandonar o Deus de paz, porque a sua esperança não se fez concreta na vida?
Não. O que devemos fazer é manter a fé nEle, crendo que Ele agirá, mesmo contra as nossas vontades, mas sempre para nossa felicidade. Mesmo que não aceitemos o que Ele faz conosco, mantenham a fé nEle. Mesmo que Ele permita que se vá de nós uma pessoa querida, tragada pela morte absurda, mantenhamos a fé nEle. Mesmo que não compreendamos Seu método e Seu tempo, mantenhamos a fé nEle. Mesmo que não queiramos que Ele nos queira no seu trabalho, mantenhamos a fé nEle. Mesmo que lutemos muito para viver segundo os seus padrões de verdade e santidade para nós, mantenhamos a fé nEle. É isto que aprendemos com os irmãos de Pérgamo.
Você conserva a fé nele mesmo em meio à adversidade?
4.2. Negativamente
Entretanto, algumas coisas tenho contra ti; porque tens aí os que seguem a doutrina de Balaão, o qual ensinava Balaque a lançar tropeços diante dos filhos de Israel, introduzindo-os a comerem das coisas sacrificadas a ídolos e a se prostituírem.
Assim tens também alguns que de igual modo seguem a doutrina dos nicolaítas. (vv. 14-15)
. Contra estes fiéis irmãos, no entanto, Jesus tinha uma advertência muito dura. Alguns deles (não todos, mas alguns em quantidade suficiente para serem notados e manchar a reputação de todos) tinham se desviado. O autor da carta lhes traz à lembrança o desvio.
Sim, Jesus nos lembra os nossos pecados, porque nem sempre somos capazes de reconhecê-los e pedir perdão a Deus por eles. Que bom que Deus nos convence do pecado! Se não, seríamos apenas pecadores e não pecadores perdoados e reconciliados.
. De que lhes lembrou Jesus na carta?
Jesus lhes repreendeu por permitirem que em seu meio permanecessem, como se fossem mais uma opção, os balaamitas ou nicolaítas (aqui vistos como sinônimos), que ensinavam uma ética que não era cristã, mas pagã, especialmente com relação ao corpo. Ainda hoje somos assaltados por essas éticas, segundo a qual, por exemplo, tudo é lícito, desde que feito com amor, até o sexo fora do casamento. O importante é o prazer.
Parece que em Pérgamo o problema era que alguns cristãos achavam que podiam participar das festas celebradas nos templos pagãos em honra aos deuses pagãos ou imperadores romanos, sem que isto significasse que aceitavam esses deuses. Achavam esses cristãos que podiam participar tranqüilamente destas festas. Não viam problema em participar de uma festa em que se afirma que César era Senhor, embora testificam que só Cristo era Senhor.
O outro problema era a prostituição física, que para os gregos e romanos não eram um problema. Havia, e isto desde os tempos do Antigo Testamento, entre os povos vizinhos de Israel a prostituição cultual, como nos recorda a história de Balaão.
Segundo lemos Números 25.1-13 e 31.16, Balaão recomendou aos moabitas que seduzissem os israelitas para participar de suas festas idolátricas (onde se comiam carnes sacrificadas a ídolos) e imorais (onde se pratica a prostituição nas proximidades ou mesmo nos átrios dos templos).
Entre os pergameses, alguns começaram a achar essas coisas normais. Casar para que, se podemos viver juntos? Esperar para que, se nós nos amamos? O que tem eu ir a uma festa regada a álcool, se eu não bebo?
Ainda hoje Balaão atua em nosso meio, mas Jesus nos adverte contra ele e seus ensinos, aos quais o Senhor chama de tropeços. O tropeço é a mentira com a capa de verdade. Precisamente por esta sua característica, é muito fácil tropeçar. Se o diabo tivesse a cara que os retratos trazem, ninguém iria na dele…
5. O CONSELHO
Arrepende-te, pois; ou se não, virei a ti em breve, e contra eles batalharei com a espada da minha boca.
Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas. Ao que vencer darei do mana escondido, e lhe darei uma pedra branca, e na pedra um novo nome escrito, o qual ninguém conhece senão aquele que o recebe. (vv. 16-17)
Somos convidados ao arrependimento.
Jesus não tem prazer em ver vidas se gastando fora dos seus padrões. Como está a sua vida?
Se você se arrepender, ele virá ao seu encontro para lhe ajudar a viver no padrão que Ele requer, que é bom para você. O preço a pagar pela obediência é muito mais suave que o preço a pagar pela desobediência.
Se você não se arrepender, e continuar vivendo segundo os ensinos dos balaamitas e dos nicolaítas, escravo do seu próprio corpo e não senhor dele, Jesus promete que vai batalhar contra você com a sua espada de dois gumes, para convencer sua mente e convencer suas emoções, de que vale a pena segui-lO.
A história de Balaão é instrutiva aqui. Em certo momento de sua vida, Deus se apresentou, em forma de um anjo, a Balaão, que não o viu. Sua jumenta viu e ouviu. Este “se não” nos remonta a esta história. Temos todas as regras de Deus, mas por vezes não as queremos ouvir.
Será que Ele precisará permitir que “jumentos” (sofrimentos, dificuldades, ensinos) nos falem, para que nos curvemos? Muitos sabemos o caminho de Deus, mas estamos esperando que a jumenta de Balaão nos fale.
Você sabe a verdade.
6. CONCLUSÃO
Convite a um compromisso com a Verdade e com a Santidade.