VEM PARA A VIDA (Marcos 3.1-6) As cidades do antigo mundo judeu tinham sinagogas (literalemte, assembleias), os lugares separados para adoração, ensino e serviço. No caso dos judeus, templo só havia um, em Jerusalém, e a partir do ano 70 depois de Cristo, nenhum. Jesus foi algumas vezes ao templo (onde se ia em ocasiões especiais, como todos os judeus) e muitas, muitas vezes à sinagoga, todos os sábados de sua vida, como fazem judeus crentes e cristãos, sobretudo evangélicos, ao redor do mundo. Ao tempo de Jesus, como ele, as pessoas iam à sinagoga para adorar, aprender e servir. Jesus habitualmente ensinava nas sinagogas (Lemos que "ele percorreu toda a Galiléia, pregando nas sinagogas e expulsando os demônios" — Marcos 1.39; cf. Mateus 4.23). Numa dessas vezes em que Jesus foi à sinagoga, foi também um homem que tinha a mão (a mão direita, segundo Lucas 6.6) atrofiada (ressequida, mirrada), o que impedia ao homem de trabalhar e assim levar uma vida normal. Possivelmente, a atrofia foi conseqüência de algum acidente (talvez com uma faca). Na triste teologia predominante na época, sua mão atrofiada era conseqüência dos seus pecados. Assim, era visto como uma pessoa a ser evitada. Muito provavelmente aquele homem era um freqüentador assíduo daquela sinagoga, onde não havia milagres. Ele ia em busca de consolo para sua condição e, quem sabe, de auxilio material para minorar a escassez que a mão atrofiada produzia. Sua presença incomodava: era pecador demais para estar ali. JESUS NOS INCOMODA A presença de Jesus também incomodava. Provavelmente, a sinagoga se localizava em Cafarnaum, onde Jesus vivia com sua família (Maria, sua ame, e os irmãos e as irmãs), quando não estava pregando, ensinando e curando pela região. A presença de Jesus incomodava os fariseus, homens crentes que tinham transformado a religião num sistema opressivo, com regras rígidas que poucos podiam cumprir. Eles não suportavam Jesus. Jesus começou o seu ministério ensinando que, para ser salva, uma pessoa precisava se arrepender (Marcos 1.15). Os fariseus ensinam que, para ser salva, uma pessoa precisava seguir as regras da lei, para o culto e para a vida. Jesus chamava homens simples, sem preparo intelectual e sem currículo moral para serem seus discípulos (1.16-20), quando os fariseus eram muito exigente. Não era qualquer um que podia fazer parte do seu círculo. Jesus tinha poder sobre Satanás e libertava as pessoas do seu poder. Fizera isto naquela mesma sinagoga um pouco (Marcos 1.23.28). Os fariseus não tinham poder para expulsar demônios. Os fariseus gostavam de se comparar com os outros e sempre saiam aprovados e os outros, reprovados. Com Jesus, eles se sentiam ameaçados. Jesus tinha o hábito de orar, nunca em lugares públicos, para não chamar atenção sobre si, mas em lugares ermos onde não podia ser visto (Marcos 1.35-37). Os fariseus gostavam de orar em público, em pé e em lugares onde sua fé pudesse ser admirada e elogiada. Jesus tinha poder para curar os leprosos (Marcos 1.40-45), mantidos à margem de tudo e todos pela lei que os fariseus guardavam, interpretavam e aplicavam. Jesus não se importava que o interrompessem, que atrapalhassem seu ensino, se uma vida fosse transformada, como fez no caso do paralítico descido ao centro da reunião quando pregava (Marcos 2.1-12). Os fariseus cultuavam a ordem. Ninguém podia atrapalhar um culto. Jesus participava de festas com pessoas de moral duvidosa, não porque aprovasse sua conduta mas, convidado, queria que fossem alcançados para o reino de Deus (Marcos 2.15-17). Os fariseus achavam que Deus era Deus dos bons e dos santos, porque os outros não mereciam ser salvos. Jesus achava que a religião devia ser uma expressão alegre, celebrada com roupas alegres e comida gostosa (Marcos 2.18-22). Os fariseus gostavam de jejuns e roupas de luto. Jesus prezava os sistemas, mas prezava mais a vida e não tinha dúvida em quebrar as regras, para socorrer pessoas, para salvar pessoas, para curar pessoas, ficando assim dentro do espírito da lei (Marcos 2. 23-28). Os fariseus viviam para o sistema, que consideravam o bem maior da vida, mais que a própria vida, agarrados à letra da lei. Como lemos em Marcos 3.1-6, "Jesus voltou ao local de reuniões [sinagoga] e encontrou um homem com uma mão aleijada. Os fariseus tinham os olhos em Jesus para ver se ele iria curá-lo, na esperança de pegá-lo em uma infração de sábado. Ele disse ao homem da mão aleijada: — Fique aqui, onde podemos ver você [no meio do salão]. Depois, falou ao povo: — Que tipo de ação serve melhor o sábado: fazer bem ou fazer mal; ajudar as pessoas ou deixá-las desamparadas? Ninguém disse uma palavra. Ele olhou nos olhos, um após o outro, com raiva agora, furioso com a sua religião de cheiro ruim. Ele disse ao homem: — Estenda sua mão. Ele a segurou-se como nova! Os fariseus saíram o mais rápido que puderam, bolando sobre como poderiam juntar forças com os seguidores de Herodes e arruiná-lo". (Marcos 3.1-6 — THE MESSAGE) JESUS NÃO SE CALA Nas igrejas de hoje há pessoas com mãos atrofiadas. Graças a Deus. Graças a Deus, as igrejas recebem os diminuídos pela vida, sejam nos seus corpos, nas suas mentes, nos seus corações. Graças a Deus, a nossa igreja recebe enfermos (físicos e mentais), atende a classe média e os pobres em suas necessidades, ouve os certinhos e escuta os erradinhos. Assim deve ser uma igreja, uma comunidade que acolhe os diferentes e abençoa os feridos. Que aqui nenhuma pessoa de mão atrofiada (símbolo de todas as formas de incapacitação) seja rejeitada e desamparada, mas esta é — infelizmente — uma possibilidade. Jesus está aqui, mas isto não impede que aqui também estejam os fariseus, os que não se importam com os necessitados, os que olham os miseráveis como merecedores de sua miséria, não de misericórdia. Mesmo onde Jesus está, não fica impedida a ação daqueles que, vendo as coisas não funcionando do jeito deles, tomam o lugar de Deus, falando o que