"Tu és o Deus que me vê". — Hagar (Gênesis 16.13 — NVI) "A oração começa onde nosso poder termina". (Abraham Joshua Heschel) [http://www.goodreads.com/quotes/show/390721] Diante de mim, no segundo banco da igreja, Luiz interrompeu meu estudo sobre os atributos de Deus. — Para mim, disse ele, Deus é o Deus da vista. Como fiz um silêncio de curiosidade, ele abriu a Bíblia, que estudávamos naquela noite, na história da fuga da Hagar (ou Agar) da casa de Abrão (o futuro Abraão), de quem estava grávida. Na versão que usava, o atributo divina brilhava aos olhos: "E ela [Hagar] chamou o nome do SENHOR, que com ela falava: 'Tu és Deus da vista', porque disse: 'Não olhei eu também para aquele que me vê?'" (Gênesis 16.13 — ARC) Leiamos a história toda: Gênesis 16 (1) Ora, Sarai, mulher de Abrão, não lhe dera nenhum filho. Como tinha uma serva egípcia, chamada Hagar, (2) disse a Abrão: — Já que o Senhor me impediu de ter filhos, possua a minha serva; talvez eu possa formar família por meio dela. Abrão atendeu à proposta de Sarai. (3) Quando isso aconteceu, já fazia dez anos que Abrão, seu marido, vivia em Canaã. Foi nessa ocasião que Sarai, sua mulher, lhe entregou sua serva egípcia Hagar. (4) Ele possuiu Hagar, e ela engravidou. Quando se viu grávida, começou a olhar com desprezo para a sua senhora. (5) Então Sarai disse a Abrão: — Caia sobre você a afronta que venho sofrendo. Coloquei minha serva em seus braços e, agora que ela sabe que engravidou, despreza-me. Que o Senhor seja o juiz entre mim e você. (6) Respondeu Abrão a Sarai: — Sua serva está em suas mãos. Faça com ela o que achar melhor. Então Sarai tanto maltratou Hagar que esta acabou fugindo. (7) O Anjo do Senhor encontrou Hagar perto de uma fonte no deserto, no caminho de Sur, (8) e perguntou-lhe: — Hagar, serva de Sarai, de onde você vem? Para onde vai? Respondeu ela: — Estou fugindo de Sarai, a minha senhora. (9) Disse-lhe então o Anjo do Senhor: — Volte à sua senhora e sujeite-se a ela. (10) Disse mais o Anjo: — Multiplicarei tanto os seus descendentes que ninguém os poderá contar". (11) Disse-lhe ainda o Anjo do Senhor: — Você está grávida e terá um filho, e lhe dará o nome de Ismael, porque o Senhor a ouviu em seu sofrimento. (12) Ele será como jumento selvagem; sua mão será contra todos, e a mão de todos contra ele, e ele viverá em hostilidade contra todos os seus irmãos. (13) Este foi o nome que ela deu ao Senhor que lhe havia falado: "Tu és o Deus que me vê", pois dissera: "Teria eu visto Aquele que me vê?" (14) Por isso o poço, que fica entre Cades e Berede, foi chamado Beer-Laai-Roi. (15) Hagar teve um filho de Abrão, e este lhe deu o nome de Ismael. (16) Abrão estava com 86 anos de idade quando Hagar lhe deu Ismael. (Gênesis 16,1-26 — NVI) O "Deus da vista" lhe fazia sentido porque, naquela semana, ele seria operado dos olhos por causa de uma catarata. Essa era a sua busca: a certeza de que Deus, que supre todas as nossas necessidades (Filipenses 4.19), supervisionaria sua cirurgia. A experiência do Luiz faz parte da família dos sentimentos de homens e mulheres de fé, como Hagar, a segunda mulher de Abraão, desde os tempos em que seu nome escrito com dois A e não com três. Segundo a Bíblia, ele estava com quase 86 anos de idade e vivia com Sarai (ainda com este izinho no final). Eles viviam o drama de não terem filhos, numa época em que isto era uma condição inaceitável para o casal, tanto que a Bíblia está cheia de relatos de infertilidade, como, por exemplos, as mães do guerreiro Sansão (Juizes 13.2) e dos profetas Samuel (1Samuel 1.5) e João Batista (Lucas 1.7). Como nos dias de hoje, muitos casais que não conseguem engravidar pedem uma intervenção de Deus, para fazer "com que a mulher estéril habite em família e seja alegre mãe de filhos" (Salmo 113.9). O problema com Sarai e Abrão é que eles viviam o drama da infertilidade (Gênesis 11.30), agravado por uma promessa feita por Deus há dez anos de que formariam uma grande família. Com o tempo se passando, resolveram tomar uma atalho e contrataram uma moça egípcia, que cuidava das coisas da patroa, para servir de barriga de aluguel. Assim, pensavam, a promessa de Deus se cumpriria. Afinal, os anos se passavam e o berço continuava vazio. As coisas deram certo, mas nem todas. Acontece que Hagar, a "doméstica egípcia", assim que ficou grávida, começou a debochar de Sarai, que, furiosa, chegou para a Abrão com aquele típico ultimato de mulher. O velho preferiu ficar com Sarai, que expulsou imediatamente a moça de casa (tenda, naquela época). Perambulando pelo deserto, assentou–se perto de uma fonte de água, quando um anjo, enviado por Deus, a encontrou e mandou que voltasse para casa dos patrões, onde nasceria Ismael. É neste momento que Hagar ora. Sabemos pouco sobre esta prece, da qual temos apenas uma frase, mas que frase! "Tu és o Deus que me vê". Esta é a primeira oração da Bíblia. Antes dela, temos diálogos diretos, feitos de corpos presentes, entre Deus, que fala da terra (por meio de um mensageiro) ou do céu (por meio de uma voz audível), e o ser humano. Aqui não, o anjo e Hagar conversam e, em meio ao sofrimento e às conversas, Hagar ora. A primeira oração da Bíblia é apresentada por uma mulher, por uma mulher humilhada na sua condição de mulher. A primeira oração da Bíblia é de uma escrava, privada de todos os direitos, tendo apenas o dever de trabalhar, trabalhar, trabalhar, inclusive na cama do seu patrão. A primeira oração é de uma mulher maltratada por outra mulher, com a conivência do marido, e que, por isto, foge para