O adjetivo “cristão” acompanha muitas expressões religiosas. No entanto, perguntemos: todos os credos que se afirmam cristãos, de fato, o são?
Existe possibilidade de uma resposta efetiva a esta pergunta ou o território é completamente livre? Cristão é quem diz que é cristão? É “cristão” o credo que recusa o Novo Testamento, aceito ao longo dos séculos ou o reinterpreta de um modo negado pela tradição?
As perguntas são necessárias diante da afirmativa do espiritismo, uma vez que ele se apresenta como cristão. Na verdade, segundo Allan Kardec (1804-1869), o formulador do credo espírita, o espiritismo é “o reflexo do mais puro Cristianismo”, razão pela qual “o verdadeiro espírita e verdadeiro cristão são uma só e a mesma coisa, pois todos aqueles que praticam a caridade são discípulos de Jesus, qualquer que seja o culto a que pertençam”. (KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo, p. 176. Disponível em http://www.espirito.org.br/portal/download/pdf/ese/o-evangelho-segundo-o-espiritismo.pdf. Doravante, todas as citações de Kardec serão do “O evangelho segundo o espiritismo”, a menos que haja indicação de outra fonte.)
Na percepção de Kardec, o espiritismo “não ensina nada em contrário ao que o Cristo ensinou, mas desenvolve, completa e explica, em termos claros para todos, o que só foi dito sob forma alegórica. Ele vem cumprir, no tempo anunciado, o que o Cristo prometeu e preparar a realização das coisas futuras. É, portanto, obra do Cristo, que o preside e que igualmente preside ao que anunciou: a regeneração que se opera e prepara o Reino de Deus na Terra”. (p. 37) A fórmula é: “Moisés começou, Jesus continuou, o Espiritismo concretizará a obra”. (p. 40)
A pretensão do espiritismo de ser cristianismo, no caso, o cristianismo em seu estágio mais avançado, suscita três questões indiretas, que merecem uma consideração preliminar. Ei-las.
TRÊS QUESTÕES PRELIMINARES
Se pudéssemos aceitar todas as expressões religiosas como sendo aceitáveis, numa espécie de universalismo sem fronteiras, concluiríamos que todas são verdadeiras, mesmo que seus ensinos sejam contrários entre si. Neste caso, por exemplo, é verdadeira a religião que afirma a existência de um só Deus (monoteísmo), bem como é verdadeira aquela que afirma que há vários deuses (politeísmo)
Se pudéssemos tomar nossas decisões no campo espiritual tendo como critério a moral, talvez teríamos que aceitar todas as expressões religiosas como válidas, porque todas pretendem propor ações para o bem comum. Neste caso, quanto mais ética a religião maior a sua legitimidade.
Se pudéssemos eleger como o único legítimo o critério das experiências pessoais de fé, navegaríamos subjetivamente de experiência em experiência, mesmo que uma fosse radicalmente oposta à outra. Neste caso, uma religião é apenas a codificação de experiências, podendo mudar a cada instante em função das experiências.
Se a nossa visão é universalista, podemos acrescentar aos nossos credos a “doutrina espírita”, que não se pretende exclusiva e recomenda que nenhuma o faça: “O Espiritismo, de acordo com o Evangelho, admitindo que se pode ser salvo seja qual for a crença, contanto que se observe a Lei de Deus, não diz: ‘fora do Espiritismo não há salvação’ e, como ele não pretende ensinar ainda toda a verdade, também não diz: ‘fora da verdade não há salvação’, o que dividiria ao invés de unir e tornaria eternos os antagonismos, isto é, as rivalidades”. (p. 175)
Se o critério da moral fosse tomado como preponderante, precisaríamos aderir ao espiritismo, pela sua ênfase ao cuidado dos que sofrem, a partir de uma de suas máximas: “Não podendo amar a Deus sem praticar a caridade para com o próximo, todos os deveres do homem se encontram resumidos neste ensinamento moral: Fora da caridade não há salvação”. (p. 174) Sim, a preocupação com o bem-estar do próximo é algo muito louvável no espiritismo.
Se entronizamos a experiência como rainha, nós a buscaremos e dela faremos a nossa referência. Estarão legitimadas as experiências da comunicação com os mortos, mesmo que condenadas nas Escrituras.
TRÊS VALORES ESPíritas
Precisamos apresentar os ensinos essenciais do Cristianismo, como forma de nos prepararmos para aceitar ou recusar este ou aquele credo, no caso o espírita, como cristão.
Antes, precisamos registrar três valores de valor no espiritismo, entre outros. Um é o valor que o Espiritismo dá ao estudo, à pesquisa, à ciência. Deve decorrer disto o interesse que desperta entre pesquisadores e cientistas. Para Kardec, “a Ciência e a Religião são as duas alavancas da inteligência humana”. Os dois campos, por terem “o mesmo princípio, que é Deus, não podem contradizer-se, visto que, se uma contrariar a outra, uma terá necessariamente razão enquanto a outra não a terá, já que Deus não destruiria sua própria obra. A falta de harmonia e coerência que se acreditou existir entre essas duas ordens de idéias baseia-se num erro de observação e nos princípios exclusivistas de uma e de outra parte”. (p. 38) O Espiritismo se apresenta até como uma ciência. (p. 38, 131)
Outro valor é o respeito nutrido por outras expressões religiosas. O espiritismo é também um campeão pela liberdade religiosa. Escrevendo em defesa do direito do espírita ser espírita, Kardec defende, com toda a razão, que “de todas as liberdades, a mais inviolável é a de pensar, que compreende também a liberdade da consciência. Amaldiçoar aqueles que não pensam como nós é reclamar essa liberdade só para si, e recusa-la aos outros é violar o primeiro mandamento de Jesus: o da caridade e do amor ao próximo. Persegui-los, por causa de sua crença, é atentar contra o direito mais sagrado que todo homem tem de acreditar no que lhe convém, e de adorar a Deus como ele o entenda”. (p. 295).
O terceiro valor espírita a ser valorizado é o convite que faz à coerência entre a fé e a vida, o elogio que faz ao amor ao próximo e a insistência no desenvolvimento moral, individual e coletivo, como nesta exortação: “O verdadeiro homem de bem é aquele que pratica a lei de justiça, de amor e de caridade, na sua maior pureza. Questiona sua consciência sobre seus próprios atos, perguntará se não violou essa lei, se não fez o mal, se fez todo o bem que podia, se negligenciou voluntariamente uma ocasião de ser útil, se ninguém tem queixa dele, enfim, se fez aos outros tudo o que gostaria que lhe fizessem”. (p. 192)
A valorização do espiritismo à ciência torna-o cristão?
A defesa espírita ao direito à liberdade religiosa eleva-o a condição de cristão?
O convite a uma vida moralmente irrepreensível faz do espiritismo uma doutrina cristã?
Esses valores estão presentes em praticamente todas as religiões, inclusive a cristã. O critério é outro. Os critérios são outros. Tratemos de os pôr:
Qual é a fonte dos ensinos?
Qual o lugar de Jesus Cristo?
As doutrinas são bíblicas, no sentido de desenvolvidas a partir da Bíblia?
O CRITÉRIO DA FONTE
A primeira pergunta a qualquer credo que se pretenda cristão é: Qual a fonte dos seus ensinos? Entre outras palavras: de onde vêm suas afirmativas sobre a vida em geral e a fé em particular?
O cristianismo deriva seus ensinos da Bíblia Sagrada (Antigo e Novo Testamentos), um conjunto de livros recebidos pelos cristãos como inspirados por Deus para orientar as pessoas em todas as questões da vida. A inspiração pode ser entendida como um processo, através do qual Deus atuou para nos legar objetivamente a Sua vontade. Na Bíblia está toda a orientação que uma pessoa precisa, em qualquer lugar e em qualquer tempo, para viver. Embora tenha normas, são os seus princípios que regem as vidas dos cristãos, pois que as normas são temporais, enquanto os princípios são eternos.
O que se poderá perguntar é se as questões do século 21, nos campos da economia, da moral e bioética (como aborto, eutanásia, transplantes, pesquisas com células-tronco) estão respondidas na Bíblia. A resposta é “não” e “sim”. Não, no sentido que não há orientações específicas, porque, se houvesse, seriam respostas superadas, uma vez que formuladas há dois milênios ou mais. Não, no sentido, que no futuro estas não serão as questões, porque surgirão outras. Não, porque o homem é livre para escolher. No entanto, quando lemos a Bíblia, encontramos nela os princípios que nos orientam em todas as áreas da vida. Nossa dificuldade não é, na verdade, em interpretar, mas em viver. A dificuldade em viver nos pode levar a interpretar de um modo favorável ao que pensamos e a como vivemos. Nosso programa deve ser sempre deixar a Bíblia falar, mesmo que isto nos incomode. Portanto, as questões do nosso tempo estão respondidas na Bíblia, direta ou indiretamente. Há temas de nossa cultura que não estiveram presentes nas culturas da Bíblia. No entanto, os princípios inspirados por Deus para aquele tempo se aplicam ao nosso tempo, a qualquer tempo.
Quanto à leitura da Bíblia, lembremo-nos que ela é uma coleção de 66 livros, contendo diversos gêneros literários. Assim, um poema deve ser lido como um poema. Uma carta deve ser lida como uma carta e mesmo dentro da carta há gêneros, como reproduções de pensamentos, poemas e cânticos. Um conto deve ser lido como um conto. Um texto apocalíptico deve ser lido como tal. O autor do livro de Apocalipse, o último dos 66, fala de “quatro anjos em pé nos quatro cantos da terra, retendo os quatro ventos, para impedir que qualquer vento soprasse na terra, no mar ou em qualquer árvore” (Apocalipse 7.1). Os fenômenos descritos não poder tomados como de ordem natural, como se a terra fosse quadrada, mas como da ordem da imaginação, para descrever o poder de Deus.
Então, quando ela prediz, por exemplo, o que todas as pessoas vão se curvar diante de Jesus “nos céus, na terra e debaixo da terra”, não fala que haja habitantes “debaixo da terra”, mas salienta que TODOS os seres humanos, não importam onde estejam e de onde sejam, vão reconhecer quem é Jesus, o rei do universo.
A Bíblia é um livro para ser lido e interpretado, jamais cortado, editado ou complementado. A Bíblia está pronta, cabendo-nos interpretá-la e aplicá-la. A interpretação exige conhecimento da própria Bíblia, bem como das regras de interpretação, como acontece com qualquer outro livro.
Tomemos um caso. Pouco antes de sua morte, Jesus confortou os seus discípulos com as seguintes palavras:
“Não se perturbe o coração de vocês. Creiam em Deus; creiam também em mim. Na casa de meu Pai há muitos aposentos [ou moradas]; se não fosse assim, eu lhes teria dito. Vou preparar-lhes lugar. E se eu for e lhes preparar lugar, voltarei e os levarei para mim, para que vocês estejam onde eu estiver. Vocês conhecem o caminho para onde vou”. (João 14.1-4)
A leitura destes versos e dos outros antes e depois mostra que Jesus se referia ao fato que, próxima a sua morte, estava indo para o céu, onde esperaria por seus discípulos. Esta esperança lhes devia encher de paz.
No entanto, Allan Kardec usa o texto para dizer o seguinte: “A casa do Pai é o Universo. As diferentes moradas são os mundos que circulam no espaço infinito e oferecem aos Espíritos que neles encarnam as moradas apropriadas ao seu adiantamento. Independentemente da variedade dos mundos, estas palavras também podem ser entendidas como o estado feliz ou infeliz do Espírito na erraticidade, conforme seu grau de pureza e se ache liberto dos laços materiais, o ambiente onde se encontre, o aspecto das coisas, as sensações que experimente, as percepções que possua, podendo tudo isso variar ao infinito”. (p. 47)
Tomemos outro tipo de uso dos evangelhos pelo fundador (codificador, na terminologia interna) do espiritismo. O texto de Jesus é sobre a humildade: “Pois todo o que se exalta será humilhado, e o que se humilha será exaltado”. (Lucas 14.11). A conclusão kardecista é a seguinte: “O Espiritismo vem confirmar os ensinamentos [de Jesus] exemplificando-os e mostrando-nos que os grandes no mundo dos Espíritos são os que foram pequenos na Terra, e freqüentemente são bem pequenos lá aqueles que foram os maiores e os mais poderosos na Terra”. (p. 93)
O espiritismo toma textos do Novo Testamento, sobretudo dos evangelhos, e os interpreta de tal modo que passam a guardar pouca relação com os textos originais. A interpretação lhes dá outros significados. Os textos evangélicos na obra de Allan Kardec já não são mais evangélicos, são espíritas. O Espiritismo não parte do Evangelho, porque apenas o usa. O Espiritismo se apresenta como uma revelação, no mesmo nível da Bíblia. Escreve Allan Kardec: “A Lei do Antigo Testamento, a primeira revelação, está personificada em Moisés; a segunda é a do Novo Testamento, do Cristo; o Espiritismo é a terceira revelação da Lei de Deus. O Espiritismo não foi personificado em nenhum indivíduo, pois ele é o produto do ensinamento dado, não por um homem, mas pelos Espíritos, que são as vozes do Céu, em todos os pontos da Terra, servindo-se para isso de uma multidão incontável de médiuns”. (p. 37)
Não há no espiritismo lugar para a idéia de uma Bíblia inspirada. Em outro dos seus livros, depois de comentar que a informação bíblica não condiz com os fatos, Allan Kardec pergunta: “Dever-se-á daí concluir que a Bíblia é um erro? Não; a conclusão a tirar-se é que os homens se equivocaram ao interpretá-la”. (KARDEC, Allan. O livro dos espíritos, questão 59, página 97. Disponível em ) A propósito, um seguidor brasileiro de Kardec, José Herculano Pires (1914-1979), diz que o seu “Livro do Espíritos”, escrito em 1857, “é seqüência histórica e desenvolvimento natural da Bíblia”. (HERCULANO PIRES, J. Visão espírita da Bíblia, p. 24. Disponível em )
Um dos primeiros continuadores do pensamento de Allan Kardec, Léon Denis (1846-1927), deixou claro que a Bíblia apresenta um “Deus quimérico” e “não poderia a Bíblia ser considerada ‘a palavra de Deus’ nem uma revelação sobrenatural. O que se deve nela ver é uma compilação de narrativas históricas ou legendárias, de ensinamentos sublimes, de par com pormenores às vezes triviais”. Quanto aos evangelhos, eles estão cheios de contradição. O bom deles seria o seu lado secreto, cujo significado a igreja primitiva possuía, mas preferiu dissimula-lo “cuidadosamente; pouco a pouco veio ele a se perder”. (DÊNIS, Leon. Cristianismo e Espiritismo. Disponível em )
Embora Allan Kardec cite e comente frases de Jesus Cristo, ele seleciona textos de seu interesse, expondo-os isoladamente. E quando os expõe, ele o faz a partir de uma leitura tão livre (alegoricamente) que não encontra respaldo na lógica do texto e nem na história da interpretação deste texto. Nenhum leitor de hoje não tem o direito de transtornar o texto original para faze-lo falar o que não falou. Se alguém faz uma interpretação da Bíblia, deve interpreta-la, não nega-la dizendo que a afirma. Se a Bíblia é legendária, para que cita-la tanto?
A questão existencial, contudo, é outra: O que fazemos com a Bíblia? Havendo contradição entre os ensinos do espiritismo e a Bíblia, com quem ficamos? A dificuldade de conciliar os ensinos bíblicos e os espíritas se mostra clara quando comparamos esses ensinos. A comparação demanda uma decisão: pela qual viveremos, já que as duas se contradizem. É este o campo da batalha.
Um testemunho recente pode nos ser útil na compreensão do dilema. Um brasileiro, espírita, professor de espiritismo em sua seara, começou a estudar a Bíblia com os cristãos para enriquecer seu ensino. Diz ele:
“Fui designado para ministrar aulas da parte evangélica e senti que elaborar os ensinamentos apenas com base no livro ‘O Evangelho Segundo o Espiritismo’ estava sendo insuficiente. Tentei robustecer as explicações com os textos da Bíblia, mas tive um pouco de dificuldade de entender, por causa da sua linguagem, que me parecia um tanto complexa.
Desde os primeiros estudos da Bíblia, sempre escutei atento e em silencio, não apenas para evitar entrar em polêmicas ou questionamentos, mas também porque queria estar afastado de qualquer conceito preconcebido. Tinha, com efeito, a intenção sincera de ouvir, refletir e aprender, antes de pretender discordar de alguma interpretação que destoasse dos fundamentos espíritas. No entanto, após dois meses de aulas, comecei a perceber conflitos entre os textos bíblicos e os ensinamentos da doutrina espírita. Isso nada tinha haver com interpretação, mas com a própria essência dos princípios. Sentia-me um tanto desconfortável, pois era difícil compreender e aceitar a existência de tais conflitos. Afinal, não e fácil abalar convicções formadas ao longo de 16 anos, calcadas na certeza da plena sintonia entre o espiritismo e a Bíblia.
A principio, tentei me convencer de que a Bíblia teria uma linguagem figurada, agora complementada ou explicada pela doutrina espírita. No entanto, as divergências, como eu disse, atingiam o fundamento, o cerne, não comportando interpretações, mas apresentando conceitos opostos. O que estaria certo?
Tive de refletir bastante para chegar a seguinte conclusão: se a doutrina espírita estava alicerçada na Bíblia, então ao derrubar a vigência das palavras da Bíblia como fundamento da doutrina, isso derrubaria a própria doutrina. Seria como se tirasse o chão de onde a casa estava construída. Já a recíproca não era verdadeira, ou seja, renegar a doutrina espírita não implicava em abater a Bíblia, mas, ao contrario, dar-lhe a perfeita aplicação. (…) A principal mensagem que quero levar aos meus amigos espíritas é: “Estudem a Bíblia.” Como podem, assim como eu fiz, acreditar num livro chamado ‘Evangelho Segundo o Espiritismo’, se jamais estudaram o EVANGELHO, ou seja, o original que deu “base” ao derivado? Não precisam e nem devem simplesmente acreditar no que falo aqui, mas precisam e devem estudar (não apenas ler) a Bíblia”. (BRAGA, Maurício Carlos da Silva. Porque não sou mais espírita. Disponível em )
Allan Kardec escreveu que a ciência e a religião não podem se contradizer, já que têm o mesmo princípio: Deus. Seu argumento, irreprochável, é “que, se uma contrariar a outra, uma terá necessariamente razão enquanto a outra não a terá, já que Deus não destruiria sua própria obra” (p. 38). Aplicando a mesma lógica, podemos afirmar que os ensinos de Jesus Cristo e os de Allan Kardec não podem se contradizer. Se houver contradição, temos que tomar uma decisão: quem tem razão?
Uma vez que um espírita leia a Bíblia, considerando-a como a Palavra revelada de Deus, perceberá as contradições profundas e irreconciliáveis entre seu credo e o credo bíblico e terá que fazer uma escolha. Se, no entanto, achar que a Bíblia é um livro legendário e quimérico, continuará com Allan Kardec e seus seguidores.
Um cristão e um espírita poderão dialogar sobre suas crenças, desde que ambos considerem que a Bíblia seja a fonte da verdade. Sem este pressuposto, nenhum ouvirá o que outro tem a dizer. Para se tornar espírita, um cristão terá que abrir mão da Bíblia como a revelação de Deus para a sua vida. Para se tornar cristão, um espírita terá que abrir a Bíblia como a revelação de Deus para a sua vida e deixar Deus falar, e não nenhum outro homem, falar; na Bíblia, Deus fala diretamente, sem intérpretes. Os intérpretes (quaisquer intérpretes) podem ser úteis, mas precisam ser lidos criticamente. Não podem dizer o que a Bíblia não disse.
Podemos então, considerar as duas outras perguntas:
Qual o lugar de Jesus Cristo?
As doutrinas são bíblicas, no sentido de desenvolvidas a partir da Bíblia?
Obviamente elas só fazem sentido, se aceitamos que se, Cristo não contradiz Moisés, Kardec não pode contradizer Cristo. Cristo está por inteiro na Bíblia, que não se contradiz.
Jesus era um leitor das Escrituras (no caso o Antigo Testamento, obviamente). Diz ele que os que se enganam o fazem “porque não conhecem as Escrituras nem o poder de Deus!” (Mateus 22.29)
Aceito este pressuposto (da veracidade das Escrituras, por causa dAquele que a inspirou), podemos dizer o que a Bíblia diz sobre si mesma.
O valor da Bíblia é inestimável: “Pois tudo o que foi escrito no passado, foi escrito para nos ensinar, de forma que, por meio da perseverança e do bom ânimo procedentes das Escrituras, mantenhamos a nossa esperança”. (Romanos 15.4)
O conteúdo da Bíblia foi inspirado por Deus. Por isto, devemos saber que “nenhuma profecia da Escritura provém de interpretação pessoal, pois jamais a profecia teve origem na vontade humana, mas homens falaram da parte de Deus, impelidos pelo Espírito Santo”. (2Pedro 1.20-21)
O que aprendemos nela sobre Jesus Cristo? Ela mesma responde, pela voz do apóstolo Paulo: “Pois o que primeiramente lhes transmiti foi o que recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, 4. foi sepultado e ressuscitou no terceiro dia, segundo as Escrituras”. (1Coríntios 15.3)
A pedra de toque é colocada pelo mesmo apóstolo: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção e para a instrução na justiça, para que o homem de Deus seja apto e plenamente preparado para toda boa obra”. (2Timóteo 3:16-17)
Sabendo destas verdades, podemos nos abrir sobre o que a Bíblia nos diz sobre a vida.
(CONTINUA)
ISRAEL BELO DE AZEVEDO
LEIA AQUI A CONTINUAÇÃO DO ESTUDO. (PARTE 2)