Não podemos esquecer que o salário do pecado é a morte, não só porque a frase aparece literalmente na Bíblia e porque o resultado pode ser visto na vida de muitas personagens da Bíblia.
CRESCENDO NA GRAÇA E NO CONHECIMENTO
2Pedro 3.14-18
Preparado para ser pregado na Igreja Batista Itacuruça, em 24.9.2000 – manhã
1. INTRODUÇÃO
Meu emprego foi como repórter de um jornal. Entre minhas atribuições, estava a de cobrir a prefeitura, mas especificamente o gabinete do prefeito de Cianorte, no oeste paranaense, onde eu morava. Aprendi muita coisa nesse trabalho. Guardei muitas lembranças, mas uma, talvez por me intrigar, tornou-se marcante. Era uma tabuleta na porta do gabinete do prefeito, com os seguintes dizeres: NINGUÉM PODE ALEGAR IGNORÂNCIA DA LEI.
Se bem que seja isto que a lei diga a respeito de si mesma, às vezes, nós descumprimos uma lei por não conhecê-la. Há, por exemplo, rodovias em que não há uma placa indicando o limite máximo de velocidade. Assim mesmo, por mais arbitrário que seja, quem ultrapassá-lo estará sujeito à penalidade, se for flagrado.
Aquela tabuleta da minha juventude tem muito a ver com a advertência de Pedro, no final de sua segunda carta, ao nos lembrar que sabemos de antemão (antecipadamente) quais são os privilégios e os compromissos da vida cristã. Toda a lei que precisamos, para viver, Deus sintetizou em Sua Palavra.
Assim, não podemos alegar que não sabemos que podemos desanimar de nossa fé e vive ser a alegria da salvação, porque a Bíblia nos convida permanentemente a sermos fiéis até à morte (até, querendo significar “ao ponto de ter que morrer” e “até o tempo de morrer”).
Não podemos ignorar sabemos que a vida cristã sem a leitura da Bíblia e a oração não é qualquer vida, mas não vida cristã autêntica, porque somos concitados a seguir os conselhos de Deus na Sua Palavra escrita e pela comunhão da palavra dita a Ele e ouvida dele por nós.
Não podemos esquecer que o salário do pecado é a morte, não só porque a frase aparece literalmente na Bíblia e porque o resultado pode ser visto na vida de muitas personagens da Bíblia.
Não podemos fazer de conta que não sabemos que sempre haverá quem pretenda nos instruir para a destruição, porque a Bíblia toma o cuidado de nos lembrar desta realidade desde suas primeiras páginas.
Não podemos perder de vista que nossa vida não se esgota aqui, mas se completará na eternidade, sob pena, como diz a Bíblia, de sermos os mais miseráveis de todos os seres humanos.
2. A SÍNTESE DE PEDRO
A síntese magistral de Pedro acrescenta ainda um conselho, o de crescermos na graça e no conhecimento, como escreveu:
Portanto, amados, enquanto esperais estas coisas, empenhai-vos por serdes achados por Ele em paz, sem mancha e sem culpa.
Considerai que a paciência do nosso Senhor é para a salvação, como também o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada. Ao falar acerca destes assuntos em todas as suas epístolas, nas quais há pontos difíceis de entender, que os ignorantes e inconstantes deturpam, como o fazem também com as outras Escrituras, para sua própria destruição.
Vós, portanto, amados, sabendo isto de antemão, guardai-vos; não aconteça que sejais arrastados pelo erro dos que não têm princípios morais e caiais da vossa firmeza. Antes, crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. A ele seja dada a glória, assim agora, como até o dia da eternidade.
(2Pedro 3.14-18)
1. A Bíblia e a vida têm pontos e momentos de difícil entendimento (verso 16).
Todos afirmamos que a Bíblia é o livro pelo qual conduzimos as nossas vidas, já que é a Palavra escrita de Deus para nós.
No entanto, não é fácil entender a Bíblia. O próprio Pedro reconhecida essa dificuldade, ao mencionar as epístolas de Paulo. Para os leitores de hoje as “simples” cartas de Pedro também contêm dificuldades de entendimento.
A Bíblia, em geral, tem um vocabulário pesado. Seu ensino é profundo. Seus princípios são elevados. Nela há afirmações simples, que precisam ser apenas praticadas por nós, seus leitores, e afirmações complexas, diante das quais os leitores temos que reconhecer que precisam continuar pesquisando para alcançar, seja pela profundidade, seja pelo fato que vêm de outras culturas, em que as pessoas tinham cabeças e tecnologias diferentes da nossa.
Há ainda uma situação que agrava nossas dificuldades: nem sempre a Bíblia tem respostas imediatas para nossas perguntas imediatas e nossos problemas contemporâneos. A Palavra de Deus não é óbvia sobre assuntos óbvios, pela razão que os problemas e perguntas de hoje têm um grau de complexidade diferente do período em que foi escrita. A propósito, antes de alguém descartá-la, lembremos que ela é perene precisamente por conter respostas que não são óbvias mas que ultrapassam todos os tempos. É por não ser imediata é que ela é atemporal e insuperada. Se isto é uma afirmação de fé, e o é, é informação que nos deixa por vezes a pé diante das decisões e respostas que o tempo impõe.
Reconhecer essas dificuldades na leitura e compreensão da Bíblia nos torna humildes e nos desafia a estudá-la com mente aberta e com espírito devocional.
A vida, por sua vez, especialmente quando agitada por algum imprevisto forte ou sofrimento agudo, nos faz perguntas para as quais não temos respostas que nos satisfaçam.
Gostaríamos que nossas vidas se desenvolvessem segundo um plano articulado, com as coisas dando sempre certo, especialmente quando oramos para que dêem certo. Nem sempre, no entanto, as coisas são assim. Há momentos em que tudo parece fugir ao nosso controle. Pior que isso: há momentos em que tudo parece conspirar contra nós.
Reconhecer essas dificuldades na vida nos torna humildes e põe em evidência nossas próprias limitações, limitações que nos ajudam a crescer.
2. Para entendermos a Bíblia e a vida, precisamos nos empenhar (verso 14).
Sabemos que precisamos ler a Bíblia, mas nossos conhecimentos são poucos, nosso tempo é pouco, enquanto as oportunidades de outras leituras e de outras formas de crescimento e lazer são muitas.
Na maioria de nós, não nos tornamos leitores da Bíblia sem disciplina, sem forçar nossa própria natureza. Então, disciplinemo-nos.
Se não gostamos de ler, não apenas a Bíblia mas qualquer tipo de livro, busquemos alternativas, como utilizar CD-ROM bíblico, um filme bíblico, um jogo bíblico, uma música bíblica. O importante é que ouçamos/vejamos/sintamos/toquemos a Palavra de Deus.
Sabemos que a aquisição da sabedoria de vida também não se dá de uma hora para outra. Ter sabedoria de vida exige cuidado, atenção, disciplina, meditação, esforço e reflexão.
Partindo do pressuposto que o temor de Deus é o princípio da sabedoria, aprofunde-se na vida, para vive-la com intensidade. Saiamos da superfície, busquemos a profundidade, emoldurada pelos valores essenciais do Reino de Deus, contra os princípios do reino deste século, que escravizam em nome da liberdade e que matam em nome da vida.
3. Este empenho deve partir da salvação como um fato consumado e como uma conquista (versículo 14)..
A salvação se consumou na cruz, quando Deus deletou nossas culpas de uma vez por todas. Quando Jesus morreu, ele morreu pelo pecado uma vez por todas (Romanos 6.10). Ele “sofreu pelos pecados uma vez por todas, o justo pelos injustos, para nos conduzir a Deus” (1Pedro 3.18). Deus, portanto, se revelou de modo completo e definitivo em Jesus. Esta é a base sobre a qual construímos o edifício de nossas vidas.
Nossa percepção desta revelação absoluta vai se dando num crescendo, à medida que nos santificamos. A oração de Paulo pelos filipenses — e a nossa oração por nós — é que o amor aumente “cada vez mais em conhecimento e em toda a percepção” (Filipenses 1.9). O mesmo apóstolo instruiu aos tessalonicenses — e a nós — a como viveram “de modo a agradar a Deus”, exortando-os — e a nós — a crescerem cada de vez mais agradando a Deus (1Tessalonicenses 4.1).
Como nos lembra John Stott, “Deus não tem nada a nos ensinar além do que Ele já nos ensinou [de uma vez por todas] em Cristo; nós, porém, temos muito mais a aprender, pois o Espírito Santo, ao testificar de Cristo, capacita-nos assim a entender muito mais completamente a revelação de Deus. E Deus nada mais tem a nos dar além daquilo que na nos concedeu em Cristo, mas nós temos muito mais a receber na medida em que o Espírito Santo vai nos capacitando a nos apropriarmos cada vez mais completamente das dádivas de Deus”. (A verdade do Evangelho, p. 35)
Em outras palavras, salvação que apenas se recebe e também não se conquista não nos capacita para viver. Nós temos que torná-la operacional. Deus escreveu nossos nomes no livro da vida. Podemos fruir desta verdade no céu, onde e quando Ele vai abrir o livro e pronunciar nossos nomes. No entanto, podemos fruir desta verdade desde agora, ao termos uma vida de comunhão tal que ouvimos nossos nomes serem pronunciados.
O problema, portanto, não é se o crente pode ou não perder a salvação, mas porque muitos não querem desfrutar dela desde já.
4. Devemos nos empenhar para evitar o erro, seja ele teológico (doutrina errada), ético (vivência fora dos padrões morais de Deus) ou existencial (falta de entusiasmo pelas coisas que são de Cima).
Devemos nos empenhar para evitar o erro teológico, especialmente aquele que parece correto. Se não estudamos, sequer sabemos que o que achamos certo está errado. Nós não somos a fonte da doutrina correta, mas a Bíblia. As confissões de fé adotadas por nossa denominação ao longo dos séculos não são a fonte da verdade, mas a Bíblia. A ideologia contemporânea, por mais bonita que seja e por mais que dialoguemos com ela, não é a fonte de nossa doutrina, que deve se fundamentar tão-somente na Bíblia.
Devemos nos empenhar para evitar o erro ético, levando uma vida fora dos padrões morais elevados da Palavra de Deus. Antes, devemos nos convencer que os padrões de Deus são melhores que os nossos, embora nos doa viver por eles. Mais que o convencimento, precisamos pedir a Ele a nos ajudar a viver por eles. Além de pedir, devemos exercitar nossa mente e nosso corpo em direção à vivência prazerosamente dos padrões de Deus.
Devemos nos empenhar para evitar o erro existencial, vivendo sem entusiasmo um cristianismo do faz-de-conta-que-eu-sou-cristão. Boa parte dos crentes não tem noção da realidade da fé que vivem. Acostumaram dizer-se cristãos que acabem acreditando que são cristãos. Eles são cristãos, mas não sabem nada acerca de Cristo. Eles são cristãos, mas não têm nenhum interesse em viver como cristãos. Precisamos de cristãos apaixonados, de cristãos que acreditem em Cristo, de cristãos que amem a Cristo, de cristãos que vivam por Cristo, de cristãos que morram por Cristo.
5. Devemos nos empenhar para crescer na compreensão e vivência da graça e no conhecimento de Jesus.
Entender o que significa crescer no conhecimento de Jesus é fácil. Podemos fazer uma analogia com a educação formal, em que há uma graduação: ensino fundamental, ensino médio, ensino superior. Se queremos conhecer a Cristo, isto se dará por um processo educacional, começando das coisas simples para as mais complexas.
Agora, entender o que significa crescer na graça de Jesus é menos fácil. A graça é um presente que o Pai nos deu e dá. Se é um dom divino, é e está completo em si mesmo. Por isto, ela nos basta.
Quantos, no entanto, sentimos que a graça de Jesus nos basta? Muitas vezes, queremos mais que a graça, até cairmos do cavalo a caminho de Damasco. Pois crescer na graça é isto: desenvolver a certeza que a graça de Jesus nos é suficiente.
Isto é algo que se desenvolve. A graça é completa, mas a percepção de sua suficiência vai se completando aos poucos.
Crescer na graça deve implicar em crescer no conhecimento. Estas duas dimensões não se excluem. Ao contrário, elas se incluem de tal modo, que se tornam inseparáveis.
Eis aqui um programa de ação para quem quer crescer na graça e no conhecimento.
1. Tenhamos como objetivo de vida o crescimento.
2. Usemos os recursos divinos para o nosso crescimento:
. lendo regularmente a Bíblia
. orando pelos outros, por nós e pelo Reino de Deus
. participando dos cultos públicos na Igreja
. participando dos programas educacionais (como a Escola Dominical) oferecidos pela Igreja
. sendo parceiros de Deus para a salvação de outras pessoas
3. Usemos os recursos humanos para o nosso crescimento:
. Versões variadas (IBB, SBB, Trinitariana, Ecumênica, BJ, NVI)
. Bíblias de estudo (Genebra, Anotada, Vida)
. Referências cruzadas e Concordâncias
. Livros cristãos que ensinem, desafiem e divirtam:
— Dicionários Bíblicos
— Comentários Bíblicos (presentes nas revistas da EBD)
— Manuais e Introduções à Bíblia
— Dicionários Teológicos
— Recursos eletrônicos (CD-ROMs bíblicos e teológicos, páginas eletrônicas:
www.bibliaworldnet.com.br, www.bible.org, www.ccel.org/wwsb)
4. Avaliemos o nosso crescimento:
. estamos crescendo?
. quanto crescemos?
. por que (não) crescemos?
5. Procuremos crescer, para dar a Jesus toda a glória, isto é, para viver de modo a tê-lo como Senhor e Salvador.