CREDO APOSTÓLICO, O CREDO CRISTÃO, 7 – Foi crucificado, morto e sepultado

CREDO, 7

1
Creio em Deus Pai, Todo-poderoso,
Criador dos Céus e da terra.

2
Creio em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor,

3
o qual foi concebido pelo poder do Espírito Santo;
nasceu da virgem Maria;

6
padeceu sob Pôncio Pilatos,

7
foi crucificado, morto e sepultado;

8
desceu à mansão dos mortos,
ressurgiu dos mortos ao terceiro dia;

9
subiu ao Céu;
está sentado à direita de Deus Pai Todo-poderoso,
donde há de vir para julgar os vivos e os mortos.

10
Creio no Espírito Santo;

11
na santa Igreja católica;
na comunhão dos santos;

12
na remissão dos pecados;

13
na ressurreição do corpo;

13
na vida eterna.
Amém.

7
CREIO QUE JESUS FOI CRUCIFICADO
(Marcos 8.31-33)

Creio que Jesus “foi crucificado, morto e sepultado”.

A cruz foi a forma pela qual Jesus morreu, mas só podemos compreender o significado desta morte tendo a ressurreição dele também em nossa horizonte. Sem a ressurreição, a morte de Cristo é mais uma, como de um mártir. Sempre que falar na cruz, precisamos falar no túmulo vazio e vice-versa.

A cruz domina o Novo Testamento. 1 A crucificação de Jesus é o último momento da grande semana da paixão. Quando folheamos os quatro evangelhos, que contam a história de Jesus, percebemos a importância que dão a esta última semana: Lucas dedica-lhe um quarto de suas páginas; Mateus e Marcos separam um terço dos seus volumes para contar esta história, e praticamente a metade do Evangelho de João se ocupa desta semana. No cume desta semana, pousa soberana a crucificação, momento dramático na vida de Jesus, pelo sofrimento envolvido e por seu significado, já que era a sua missão. Jesus mesmo disse que deveria ser morto. Relata-nos Marcos:

Então Jesus “começou a ensinar-lhes que era necessário que o Filho do homem sofresse muitas coisas e fosse rejeitado pelos líderes religiosos, pelos chefes dos sacerdotes e pelos mestres da lei, fosse morto e três dias depois ressuscitasse.
Ele falou claramente a esse respeito.
Então Pedro, chamando-o à parte, começou a repreendê-lo. Jesus, porém, voltou-se, olhou para os seus discípulos e repreendeu Pedro, dizendo:
— Para trás de mim, Satanás! Você não pensa nas coisas de Deus, mas nas dos homens”.
(Marcos 8.31-33 — NVI)

A crucificação era a sua “hora”, como uma espécie de consumação de sua vida, aos 30 anos (prováveis) de idade.

Coro Masculino

Por sua vez, a ressurreição é o primeiro momento da semana seguinte, na qual ainda nos encontramos. Nós somos o povo da ressurreição, o povo que vive do poder da ressurreição de Jesus, o povo que vai ressuscitar pelo poder dEle quando vier na glória absoluta.

O GRANDE SÍMBOLO

A cruz, com toda justeza, se tornou o símbolo do cristianismo. Como escreveu Emil Brunner (em 1934), ela é o símbolo da fé cristá, da igreja cristã. da revelação cristã. Por isto, precisamos, como lutaram os reformadores, interpretar corretamente a cruz. Aquele que compreende a cruz corretamente (…) compreende a Bíblia, compreende Jesus Cristo”. 2
Nas palavras de John Stott, “a cruz é a última revelação do amor de Deus. A cruz é a vitória definitiva sobre o mal. A cruz é o fundamento de nossa salvação. A cruz é o maior exemplo do autossacrifício [já dado]. A cruz é a mais poderosa inspiração para a devoção cristã”. 3

A cruz nos declara absolvidos dos nossos pecados, que sempre levamos a sério, talvez embebidos da ideia da bondade humana inata, na trilha do que disse Swuami Vivekananda (1863-1902) em 1893: “É um pecado chamar um homem de pecador. É um permanente libelo contra a natureza humana”. 4
Ás vezes, penso que muitos cristãos evangélicos concordam com esta negação da cruz.

O NOSSO PROBLEMA COM A CRUZ

Nós, cristãos evangélicos, temos problema com a cruz, ou melhor, com a representação da cruz. Olhemos para a maioria dos nossos templos, externa e internamente. O símbolo do cristianismo se encontra ausente. Poucos pastores usamos (e eu estou na maioria que não usa, mas estou errado) uma cruz em nossos paletós ou camisa. Fomos profundamente moldados por um sentimento anticatólico, em parte por imposição e em parte por herança. Quando os evangélicos receberam a permissão de construir templos no Brasil, o decreto imperial determinava, logo no artigo 5:

“A Religião Catholica Apostolica Romana continuará a ser a Religião do Imperio. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu culto domestico, ou particular em casas para isso destinadas, sem fórma alguma exterior do Templo”.

Por esta razão e em defesa do princípio de separação entre igreja e estado, os evangélicos se uniram contra a construção do monumento ao Cristo Redentor, pago com recursos públicos e inaugurado em 1932. Ademais, o catolicismo acabou transformando o crucifixo como um objeto de veneração e proteção, e não apenas um símbolo do maior gesto de Deus por nós.

Na verdade, “a centralidade da cruz teve origem na mente do próprio Jesus. Foi por lealdade a ele que seus seguidores se apegaram com tanta tenacidade a esse sinal”. 5

Os primeiros cristãos estavam certos em escolher a cruz como seu símbolo. Eles poderiam escolher a manjedoura onde Jesus nasceu, mostrando como Deus se torna como um de nós; o barco onde Jesus ensinava, indicando como podemos pensar como ele pensou;  o pão que Jesus multiplicou para as multidões, por mostrar seu interesse pelas necessidades humanas; a toalha com que Jesus lavou os pés dos discípulos, por seu convite à humildade; o túmulo vazio onde Jesus ressuscitou, demonstração de sua vitória sobre a morte; o peixe que Jesus comeu com os discípulos antes da ascensão; a pomba que noticiou a plenitude do poder do Espírito Santo aos primeiros cristãos, confirmando a promessa que fizera; o trono em que Jesus está assentado ao lado do Pai. Como escreveu John Stott, “qualquer um desses poderia ter sido um símbolo apropriado da fé cristã”. No entanto, os primeiros cristãos colocaram todos esses símbolos um ao lado do outro, mas abaixo da cruz, pondo em evidência a indiscutível “a necessidade e a centralidade da morte de Jesus”. 6

Pouco lhes importava que a cruz era um símbolo de vergonha, uma loucura, como disse com ironia o apóstolo Paulo (1Coríntios 1.18, 21, 23 e 25; 2.14) e como verdade o filósofo britânico Alfred Ayer, para dizer que o Cristianismo é a pior das religiões, porque se fundamenta “sobre as alienadas doutrinas do pecado original e da expiação vicária, que são intelectualmente desprezíveis e moralmente ultrajantes”. 7

Caro Alfred Ayer, caro Swami Vivekananda, o que posso lhes dizer é que vocês não me conhecem. Se me conhecessem, jamais negaram a realidade do pecado; se me conhecessem um pouco mais, logo perceberiam o que a Bíblia diz a meu respeito: eu sou um pecador, que preciso de perdão. Graças a Deus, não sou um culpado condenado, mas um culpado absolvido pela graça de Deus.

O SIGNIFICADO DO SÍMBOLO

Para nós, então, não importam o que não a aceitam, a cruz significa que Jesus morreu por nossos pecados (Romanos 5.8, 1Coríntios 15.3), de uma vez por todas, isto é, de modo completo, definitivo e suficiente (1Pedro 3.18); a cruz nos mostra que Jesus que se entregou por nós (Gálatas 1.4) por amor, amor  que o levou a fazer o sacrifício que nós precisaríamos fazer e não precisamos mais (1João 4.10); na cruz fomos comprados para Deus pelo sangue de Jesus (Apocalipse 5.9); na cruz Jesus perdoou os nossos pecados (Efésios 1.7); por causa da cruz, nós podemos nos aproximar de Deus sem barreiras (Hebreus 10.19-22).

Em resumo, na cruz fomos justificados, isto é, declarados salvos, para uma vida digna deste sacrifício. “A justificação é completa. Não tem degraus. No dia em que morrermos não seremos mais justificados que no dia em que nos convertemos. A santificação, contudo, é incompleta. Embora comece quando somos convertidos e regenerados, continua ao longo de nossa vida na terra e será completada quando Cristo aparecer “seremos semelhantes a ele, porque haveremos de vê-lo como ele é” (1João 3.2).
Por tudo isto, “Cristo é aquilo que sua cruz é. Tudo o que Cristo era no céu e na terra foi colocado naquilo que fez aqui. Você não pode compreender Cristo sem compreender sua cruz. 8

A MENSAGEM DA CRUZ

Um hino nos ajuda a compreender o significado existencial da cruz para as nossas vidas.

“Rude cruz se erigiu, dela o dia fugiu,
revelando vergonha e pavor.
Mas eu amo a Jesus, que morreu nessa cruz,
dando a vida por mim, pecador.

Sim, eu amo a mensagem da cruz;
suas bênçãos eu vou proclamar.
Levarei eu também minha cruz
‘té por uma coroa trocar.

Lá da glória dos céus o Cordeiro de Deus
ao Calvário humilhante baixou;
e essa cruz tem pra mim atrativos sem fim
porque nela ele me resgatou.

Eu, aqui, com Jesus a vergonha da cruz
quero sempre levar e sofrer.
Ele vem me buscar, e com ele no lar
sua glória pra sempre vou ter”.
(Harpa Cristã, 291)

O que faremos com a mensagem da Cruz?

Precisamos aceitar a cruz, recebendo-o o presente de Deus para nós. Merecíamos a cruz, mas Jesus, que não a merecia, livrou-nos dela, ao morrer uma vez por todas em nosso lugar.
Um poema de Gióia Jr nos ajuda a atender o preço que teríamos que pagar pelo nosso pecado:

Nada era dEle
Inspirado em Stanley Jones

Disse um poeta um dia,
fazendo referência ao Mestre amado:
“O berço que Ele usou na estrebaria,
por acaso era dEle?

– Era emprestado!

E o manso jumentinho,
em que, em Jerusalém, chegou montado
e palmas recebeu pelo caminho,
por acaso era dEle?

– Era emprestado!

E o pão – o suave pão
que foi por seu amor multiplicado,
alimentando toda a multidão -,
por acaso era dEle?

– Era emprestado!

E os peixes que comeu junto ao lago
e ficou alimentado,
esse prato era seu?

– Era emprestado!

E o famoso barquinho?
aquele barco em ficou sentado,
mostrando à multidão qual o caminho,
por acaso era dEle?

– Era emprestado!

E o quarto em que ceou
ao lado dos discípulos, ao lado
de Judas, que o traiu, de Pedro, que o negou,
por acaso era dEle?

– Era emprestado!

E o berço tumular,
que, depois do Calvário, foi usado
e de onde havia de ressuscitar,
o túmulo era dEle?

– Era emprestado!

Enfim, NADA era dEle!
Mas a coroa que ele usou na cruz
e a cruz que carregou e onde morreu,
essas eram, de fato, de Jesus!”

Isso disse um poeta, certo dia,
numa hora de busca da verdade;
mas não aceito essa filosofia
que contraria a própria realidade…
O berço, o jumentinho e o suave pão,
os peixes, o barquinho, o quarto e a sepultura,
eram dEle a partir da criação,
“Ele os criou” – assim diz a Escritura…

Mas a cruz que Ele usou
– a rude cruz, a cruz negra e mesquinha
onde meus crimes todos expiou,
essa não era Sua,
ESSA CRUZ ERA MINHA!
(Gióia Jr – 1931/1996)

 

Em sua identificação conosco, Jesus se submete à morte, prevista para crimes que o Império Romano considerava hediondos.

2. Identifique-se com o crucificado. Deseje se parecer com ele. Deseje ser parte da comunidade do crucificado. Se for o caso, ostente a cruz, não como um objetio de veneração, mas de identificação.
Sem dúvida, “a comunidade cristã é uma comunidade da cruz, pois foi trazida à existência pela cruz, e o foco da sua adoração é o Cordeiro que foi morto, e que agora é glorificado. De modo que a comunidade da cruz é uma comunidade de celebração, uma comunidade eucarística, incessantemente oferecendo a Deus através de Cristo o sacrifício de louvor e ações de graça”. 9

3. Viva como alguém alcançado pela cruz. Viva com Paulo entre os gálatas:

“Mas eu me orgulharei somente da cruz do nosso Senhor Jesus Cristo.
Pois, por meio da cruz, o mundo está morto para mim,
e eu estou morto para o mundo”.
(Gálatas 6.14 — NTLH)

A cruz deve nosso crivo, levando-nos a perguntar a nós mesmos: Isto que estou fazendo tem sentido à luz da cruz? Isto que estou pensando afirma a cruz? Isto que estou desejando tem a aprovação da cruz?

4. Medite sobre a cruz. Contemple a cruz. Cante sobre a cruz. Celebre a cruz. Uma forma de celebrar a cruz é participar da Ceia do Senhor. Não deixe que a cruz desapareça. Cícero, horrorizado com a violência da cruz, sugeriu, com veemência, que “a simples palavra ‘cruz’ deveria ser removida não somente da pessoa de uma cidadão romano, mas de seus pensamentos, seus olhos e seus ouvidos”. 10

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1 MORRIS, Leon. Citado por SOTT, John. Evangelical truth. Downers Grove, Ill: Intervarsity Press, 1999, p. 71.
2 BRUNNER, Emil. The Mediator.  London: Lutterworth, 1934, p. 141.
3 STOTT, John. Evangelical truth…, p. 76.
4 VIVEKANANDA, Swuami. Complete works. Vol 1. Disponível em <
http://www.advaitaashrama.org/cw/content.php>
5 STOTT, John. A cruz de Cristo. São Paulo: Vida, 1986, p. 12.
6 STOTT, John. Porque sou cristão. Viçosa: Ultimato, 2004, p 36.
7 STOTT, John. Evangelical truth…, p. 84.
8 FORSYTH, P.T. Citado por SOTT, John. Evangelical truth…, p. 70.
9 STOTT, John. A cruz de Cristo…, p. 151.
10 STOTT, John. A cruz de Cristo…, p. 57.

 

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